Um discurso genérico com elementos propagandísticos que vende uma ideia de União Europeia que não corresponde à realidade. Esta foi a tónica do discurso de Roberta Metsola, Presidente do Parlamento Europeu, que se deslocou hoje à Assembleia da República para um debate com os vários partidos políticos. No debate ficaram espelhadas as diferenças entre quem é cúmplice de um projecto de integração e abdica dos interesses portugueses e quem defende a soberania, os interesses nacionais e a paz.
A primeira intervenção pertenceu ao europeísta convicto Rui Tavares que funcionou como prelúdio para uma consonância praticamente acrítica ao não abordar os problemas do país resultantes da integração europeia, mas sim um alargamento do projecto europeu e de imposição de valores vendidos como unânimes para justificar ingerências.
Já a deputada única do PAN, Inês Sousa Real na primeira parte da sua intervenção visou colocar a sua preocupação ambiental, mas talvez por opção nunca mencionou a falsa solução ambiental promovida pela União EUropeia com o mercado de carbono e o Comércio Europeu de Licenças de Emissão que aprofunda a desigualdade entre os povos. A sua intervenção ainda tentou invocar a União Europeia a actuar no Irão e Afeganistão numa busca pela ingerência.
A Iniciativa Liberal, num tom de agressividade que já começa a ser normal, apelou a que o processo de adesão da Ucrânia à União Europeia fosse acelerado, e com isso procurou estender a sua intervenção a ataques e calúnias ao PCP. Com a intervenção de Rui Rocha ficou claro que a Iniciativa Liberal vê a União Europeia enquanto instrumento de ingerência e de conflitos na política externa.
Numa linha de inicial valorização da União Europeia e dos «valores europeus» foi também o Chega, partido que beneficia das condições criadas pela mesma para aparecer e crescer. A intervenção deste partido foi na linha do que é sempre, sendo que desta vez foi aproveitada a oportunidade para difundir ainda mais a teoria da grande substituição procurando veicular toda a intolerância que a União Europeia alimenta.
Pelo PSD teve a palavra Catarina Rocha Ferreira que aproveitou o momento para dizer apenas coisas genéricas e valorizar a União Europeia por haver interrails, o programa erasmus ou a inexistência de fronteiras fechadas. Já o PS, com Capoula Santos, apesar de ter tocado na importância dos parlamentos nacionais num exercício de soberania, contradisse-se ao valorizar a existência de sanções para punir o populismo.
À esquerda do PS, o Bloco de Esquerda, mesmo apontando aos impactos negativos da política neoliberal da União Europeia, acabou por desligar essa mesma política dos objetivos de fundo que levaram à criação da mesma, apelando a que se voltasse ao seu «humanismo fundacional». Mariana Mortágua deu como exemplo de humanismo o acolhimento de refugiados ucranianos que segundo ela «mostra o que a Europa pode fazer diferente», e ilibou por completo as culpas da União Europeia em todo o processo de confrontação e instigamento da guerra com a Rússia.
Todas estas intervenções mereceram a simpatia de Roberta Metsola, menos a do PCP, a intervenção que fugiu ao branqueamento das políticas e acção da União Europeia. Paula Santos, líder da bancada parlamentar dos comunistas, começou por falar da vida concreta de quem vive dos rendimentos do seu trabalho e se vê a empobrecer com a perda do valor real dos salários e pensões enquanto «os lucros dos grupos económicos não param de aumentar» num claro «num processo de concentração de riqueza pelo capital.».
Paula Santos, que não se coibiu de dizer qual era a avaliação que os comunistas fazem da União Europeia, mesmo na presença da Presidente do Parlamento Europeu, foi mais longe e disse que «acenam com o Pilar Europeu dos Direitos Sociais, que na verdade para mais não do que nivelar por baixo os direitos sociais» já que se «insiste em políticas que, não só são incapazes de resolver os problemas com que os trabalhadores e os povos estão confrontados, como são responsáveis pelo seu agravamento».
A título de exemplo usou o BCE para ilustrar o seu argumento no caso do suposto combate à inflação, já que ontem essa instituição «decidiu pela oitava vez consecutiva o aumento das taxas de juro no último ano e a perspetiva é que continuem a aumentar» e como tal, «a manter-se esta opção, mais cedo do que tarde, a situação avolumar-se-á com muitas famílias a poderem entrar em situação de incumprimento e a poderem vir a ficar sem a sua casa».
A deputada comunista quis ainda desconstruir a narrativa dos «valores europeus» começando por denunciar o que «mediterrâneo continua a ser o maior cemitério da Europa» já que é negado o auxílio a «milhares e milhares de refugiados, de homens, mulheres e crianças, que fogem da guerra, provocada em muitas circunstâncias pela ingerência dos Estados Unidos da América, da União Europeia e da NATO». À boleia da denúncia feita, foi ainda desconstruído o alegado «Mecanismo Europeu de Apoio à Paz», um conceito estranho já que fora depois criado o «Mecanismo para Apoiar a Produção de Munições, com 500 milhões de euros de dotação e que permitirá usar fundos de coesão e PRR para a produção de munições e de artilharia».
Para o PCP a «União Europeia que mobiliza e disponibiliza milhões de euros para o armamento é a mesma que recusa a valorização dos salários e das pensões, o investimento nos serviços públicos e que empurra os povos para a pobreza. Para aumentar salários e pensões e combater o aumento do custo de vida não é possível, mas para o armamento e a guerra não há qualquer restrição».
Face ao exposto pelos comunistas, Roberta Metsola demonstrou desagrado e não conseguindo responder a nada do que fora colocado pelos comunistas, desafiou Paula Santos e o PCP a irem à Ucrânia e ao seu parlamento dizer directamente aos deputados ucrânianos tudo o que fora dito durante o debate. Certamente que a Presidente do Parlamento Europeu se esqueceu que no país em questão, aconteceu um massacre promovido pelas forças pró-União Europeia que assassinou dirigentes sindicais e os partidos de esquerda, tanto o comunista como outros progressistas, foram ilegalizados, enquanto a extrema-direita e os movimentos neo-nazis são alimentados, ovacionados e ajudados.
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