Foi criado em 1999 pelo Ministério da Saúde para que os adolescentes tivessem um espaço dedicado exclusivamente aos seus problemas e pudessem partilhar todas as suas dúvidas num espaço confidencial e privado. Desde então, ajudou dezenas de milhares de jovens, mas após 2013 começou a perder profissionais de saúde. «Hoje, tem apenas dois médicos, uma enfermeira e uma psicóloga, sendo que duas vão reformar-se em breve». A informação é avançada na edição desta quarta-feira do Jornal de Notícias, que falou com membros da equipa do centro Aparece – Saúde Jovem.
Começou por funcionar no Centro de Saúde da Lapa, passando depois para o de Sete Rios. Em 2020, devido ao surto do novo coronavírus, a já «frágil» situação do centro agravou-se quando tiveram de ceder o espaço para um covidário. Segundo a notícia, as instalações não foram devolvidas e «os jovens passaram a ser atendidos em salas dispersas, alterando a missão do equipamento», que dantes conseguia proporcionar confidencialidade aos jovens utentes que o procuravam.
O encerramento das urgências pediátricas do Beatriz Ângelo, em Loures, dá o mote à manifestação que o MUSP promove este sábado, junto ao Ministério da Saúde. O AbrilAbril foi conhecer o que se vive numa parte do território. Desde o passado dia 1 de Março que os utentes servidos pelo Hospital Beatriz Ângelo têm as urgências encerradas à noite e ao fim-de-semana, mas a dificuldade no acesso à saúde, nos quatro concelhos servidos por aquela unidade hospitalar, não só não começou agora, como vai muito além deste encerramento faseado que o Governo PS prevê estender-se, pelo menos, até 30 de Junho. Mas já lá vamos. Amanhã, pelas 10h30, o Movimento de Utentes dos Serviços Públicos (MUSP) realiza uma acção distrital junto ao Ministério da Saúde, em Lisboa, estando até ao momento garantidas as presenças das comissões de utentes de Alenquer, Azambuja, Lisboa, Sintra, Vila Franca de Xira e Loures. O protesto é pela defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e contra o encerramento das urgências pediátricas do Beatriz Ângelo devido à falta de médicos especialistas para completar as escalas, que, denuncia Fernanda Santos, da Comissão de Utentes do Concelho de Loures, ao AbrilAbril, está a provocar grandes transtornos à população, em particular dos concelhos de Mafra e de Sobral de Monte Agraço, os mais distantes. No caso de Mafra, o concelho é servido pelo Hospital Beatriz Ângelo e pelo Hospital de Torres Vedras, que também fechou as urgências pediátricas à noite e ao fim-de-semana, o que faz com que as pessoas tenham que se deslocar para Lisboa. Em resultado deste constrangimento de não ter assistência próxima a partir das 21h (hora a que só os hospitais de Lisboa poderão dar resposta), leva a que as urgências do Beatriz Ângelo estejam cheias durante o dia. «Há pessoas que estarão a tentar aguentar a situação até à manhã do dia seguinte para poderem recorrer às urgências», afirma Fernanda Santos. A falta de transportes públicos durante a noite é outra questão a condicionar a vida de muitas famílias. «Se isso acontece dentro de Loures e de Odivelas, que são dois concelhos que estão na periferia de Lisboa, imaginemos utentes de concelhos mais longe, como Sobral [de Monte Agraço] e Mafra, que nalguns casos têm de fazer 50 quilómetros para chegar a um hospital a Lisboa», alerta a responsável. «Já havia dificuldades para se deslocarem ao Beatriz Ângelo ao fim-de-semana e durante a noite, e como neste momento os transportes da TML [Transportes Metropolitanos de Lisboa] estão a ter ainda alguns problemas de resposta em relação ao que seria necessário, mais dificuldades temos», acrescenta, salientando, que, «em qualquer lugar, não há transportes durante a noite a partir de uma determinada hora». Muitas vezes em reacção ao que apelidou de «reorganização» dos serviços de urgência pediátrica nos distritos de Lisboa e de Setúbal, que fez avançar através da comissão executiva do SNS, o ministro Manuel Pizarro tem alegado que o problema da saturação das urgências se deve ao facto de receberem doentes não urgentes, que poderiam facilmente resolver a sua situação nos centros de saúde. Para que a afirmação fosse completamente verdadeira seria necessário que os cuidados de saúde primários conseguissem responder de forma adequada. A falta de médicos de família tem sido um obstáculo a essa resposta. «De facto poderiam resolver sem ir às urgências se houvesse um médico que lhes pudesse responder», salienta Fernanda Santos, para de seguida afirmar que «cerca de 32% da população do concelho de Loures» (o total de população, de acordo com os censos de 2021, são 30 254 habitantes) não tem médico de família. «Não sabemos quantas crianças estarão a ser afectadas, o que sabemos é que os atendimentos complementares não estão a responder», denuncia. «Ao fim-de-semana funcionam apenas entre as 10h e as 16h, rapidamente esgotam as vagas porque estão a servir também de médico de recurso para os utentes sem médico, portanto as crianças estão a ser enviadas para os hospitais de Lisboa», acrescenta. Um dos que está a somar crianças vindas destes quatro concelhos é o Hospital de Santa Maria, que, recorda a representante dos utentes, «já estava sobrelotado». «Com o afluxo dos utentes dos concelhos limítrofes, não está a conseguir dar a resposta adequada aos utentes que aí se deslocam», afirma. Mais uma vez, o problema surge a montante. «O Centro de Saúde de Loures tinha duas unidades de saúde familiares e uma fechou por falta de médicos e não se sabe qual será o futuro da outra. Sabe-se que existe um número razoável de médicos que se aposentaram nos últimos anos e que se aposentarão entre este ano e o próximo, mas não estão a entrar médicos em quantidade suficiente», refere Fernanda Santos. No Agrupamento de Centros de Saúde Loures-Odivelas faltam mais de 60 médicos. Em breve, alerta, «serão cerca de 120 mil utentes sem médico de família nos concelhos de Loures e de Odivelas». Mas existem médicos. O que falta, observa a responsável, é vontade do Governo para os contratar, daí chegarmos a este cenário de encerramento das urgências pediátricas, como também reconheceu ao AbrilAbril a presidente da Federação Nacional dos Médicos (FNAM), Joana Bordalo e Sá. «E vamos ver como vai ser o Verão e se não vai ser pior também para as urgências gerais, porque o pessoal tem direito a férias e precisa delas para descansar e poder exercer», reconhece Fernanda Santos, admitindo que, havendo médicos, o Estado «tem que ter meios para os contratar e para que eles permaneçam no SNS», sendo esta uma das reivindicações que querem levar às reuniões que vão solicitar esta semana com o ministro Manuel Pizarro e com Fernando Araújo, director executivo do Serviço Nacional de Saúde. «Muitos jovens médicos querem ficar no SNS, mas depois deparam-se com listas intermináveis de utentes que têm de atender e não têm condições nem tempo para o fazer devidamente, entrando numa espiral de exaustão, de burnout», realça, admitindo que «não dar resposta no público é empurrar para o privado». No início deste mês, os chefes de equipa do Serviço de Urgência do Hospital de Loures apresentaram demissão devido à falta de condições ameaçar a segurança de doentes e profissionais de saúde. Numa altura em que vozes se juntam a pedir o regresso da gestão da parceria público-privado (PPP) ao Hospital Beatriz Ângelo, Fernanda Santos assinala que «basta uma consulta online» para perceber que, desde que abriu portas, os utentes sempre se depararam com problemas no Hospital Beatriz Ângelo, como atrasos nas urgências ou nas consultas de especialidade. «A PPP não é solução, nós precisamos de uma política efectiva que contrate os profissionais e que os fixe. E que tenha os mecanismos necessários para isso e com condições», afirma a representante dos utentes. «Infelizmente, o Beatriz Ângelo sempre foi notícia por longas horas de espera e de fecharem as urgências, no sentido de pedirem ao CODU [Centros de Orientação de Doentes Urgentes] que encaminhasse os doentes para outros hospitais da área de Lisboa», recorda. Outra denúncia vinda a público relacionava-se com os doentes oncológicos. «Desde o início se sabia que os doentes com problemas de cancro eram muitas vezes encaminhados para os hospitais de gestão pública porque os tratamentos eram muito onerosos para a empresa que geria o hospital e daí não dava lucro», afirma. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Local|
Utentes do distrito de Lisboa não aceitam ficar sem saúde
Loures. 32% da população do concelho sem médico de família
Falta de médicos já vem da PPP
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«Por aqui, passam meninas que engravidaram precocemente e não querem ir ao seu centro de saúde porque lá está o pai, a mãe ou os vizinhos», relatou uma enfermeira ao JN, adiantando que por este e outros motivos, este centro é «único». Outra especialista acrescenta que «os jovens já se sentem vulneráveis e terem o mínimo de barreiras ao atendimento ajuda-os». Apesar disso, a falta de pessoal tem diminuído a resposta e ameaça a existência do próprio centro.
Os 8000 jovens que nele já foram seguidos reduzem-se agora a 3500 por causa da falta de recursos. A agravar a situação, metade destes jovens não tem médico de família. A coordenadora do centro Aparece alerta para o «grande impacto» que o desaparecimento desta resposta terá na saúde dos jovens, cuja saúde mental se agravou após a pandemia, mas o Ministério da Saúde ainda não reagiu ao seu pedido por soluções.
Na véspera do debate da nação, na Assembleia da República, este é mais um exemplo a ilustrar a falta de investimento estatal na saúde pública.
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