Escapou da plantação aos 13 anos de idade e do que seria uma vida de servidão para caminhar «entre os lobos» e se transformar numa das maiores figuras dos blues e do rock n’roll. Howlin' Wolf, nascido Chester Arthur Burnett em Junho de 1910 no Mississipi, rompeu esse ciclo que o atiraria inevitavelmente para os campos de algodão tal como havia feito com os seus pais, para fazer dos blues a sua estrada de vida até àquele dia 10 de Janeiro de 1976, quando deixou o mundo dos vivos para entrar no reino dos imortais. Celebremos então os blues e a vida deste trovão que ainda hoje ressoa entre as paredes da casa que Howlin' Wolf construiu.
Howlin' Wolf é daquelas figuras maiores que a vida, misto de lenda e realidade, que só podia existir nesse universo mágico repleto de criaturas demoníacas e crenças fantasmagóricas, de pactos de sangue e de álcool e de estradas vazias a perder de vista, como é o universo dos blues. Provavelmente, a única ligação a esse imaginário existiria apenas no mundo das estórias assustadoras que o seu avô lhe contava em criança, que o faziam fugir a chorar e lhe garantiram assim a alcunha, posta pelo avô, que o acompanhou por toda a vida.
É um dos nomes centrais dos blues do Delta do Mississipi, com uma música marcada pelo ritmo das plantações, pelas suas raízes no folk , essencialmente acústico e tradicional. Wolf conseguiu o que à sua época era uma extravagante raridade, viver da música e dos blues. Quando no início da década de 50 rumou à cidade ventosa de Chicago para se transformar numa lenda da mítica Chess Records – que então já assinava artistas maiores como Muddy Waters e o compositor de serviço Willie Dixon –, Wolf já tinha conquistado alguma fama local e trabalho regular. Como ele passou a vida a dizer, «fui o único bluesman a deixar o Delta no seu próprio carro».
Em Chicago a sua carreira continuou a brilhar no céu dos blues e a própria face da história da música negra mudaria para sempre. A electricidade da grande cidade chegou às guitarras e nada ficou igual. Os blues explodem e com eles a rivalidade entre duas figuras maiores do Delta, Muddy Waters e Howlin' Wolf. E com eles, duas visões da música em colisão, a tradição do Mississipi na música de Muddy Waters, um antigo apanhador de algodão, e as composições inovadoras, arrojadas e desconcertantes de Wolf, o jovem aventureiro que trazia a sua própria visão dos blues do Delta.
Ainda hoje, 42 anos após a sua morte, quando falamos de blues o nome de Howlin' Wolf é incontornável. O lobo destemido, que lançou o seu uivo à volta do mundo, foi referência e influência maior dos nomes da geração do rock que a partir da década de 60 veneraram e se inspiraram na música deste gigante de metro e noventa e 125 quilos. Dos Rolling Stones aos The Doors, passando pelos Cream e Eric Clapton, todos eles beberam e se apropriaram de canções e dos gestos do gigante Howlin' Wolf. A sua figura, os gritos da sua harmónica, a voz rouca vinda das profundezas do Mississipi, a sua criatividade e originalidade apaixonaram a geração do Rock e transformaram a música tal como a conhecemos. E o seu uivo, que não deixa de ecoar, é a demonstração de que mais do que sede de sangue é a sede de vida dos homens que faz o mundo pular e avançar. E na verdade, para isso não precisamos de muito, apenas uma colher cheia basta.
Contribui para uma boa ideia
Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.
O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.
Contribui aqui