Qual a atitude da União Europeia?
Antes do falhanço da COP 25, devido às ausências (EUA) ou discordâncias de alguns países (Brasil, Chile, Austrália, Polónia, República Checa e Hungria), que prolongaram por mais dois dias as tentativas de negociar uma base comum, a nova presidente da Comissão Europeia aproveitou o palco da COP 25 para anunciar, a 10 de Dezembro de 2019, a sua intenção de ver aprovado no Parlamento Europeu (PE) um Pacto Verde ou Pacto Ecológico Europeu com vista a garantir a neutralidade carbónica para 20501.
Será interessante seguir mais adiante o debate no PE sobre esta proposta.
Esse Pacto iria da energia aos transportes e da agricultura à industria ou ainda à reabilitação de edifícios. Ursula von der Leyen prometeu para Março a primeira Lei Climática, e para já um mecanismo de 100 mil milhões de euros para ajudar as regiões na transição energética, sem referir essas regiões e como obteria tal montante. Entre nós a intenção foi anunciada no na edição de 11 de Dezembro do Público, que publicou uma versão de um artigo da presidente da UE adaptado aos leitores em Portugal. E que deve ter tido versões diversas noutra imprensa dos restantes 26 países da CE, variando passagens dele consoante os destinatários. O mesmo jornal desenvolveu depois este projecto, do qual a Polónia já se distanciou.
Ficamos sem saber que objectivos cada um dos 27 terão já decidido assumir ou se pensam só o fazer para o ano, na conferência de 2020 em Glasgow.
«A COP25 será lembrada, mais do que pelas negociações, pela presença excessiva de multinacionais (às quais Al Gore está ligado) e grandes empresas ligadas a combustíveis fósseis. Essa realidade foi denunciada por activistas ambientais, que acusaram entidades como a Iberdrola, a Endesa, a Volkswagen ou o Banco Santander de usarem a Cimeira do Clima para lavar sua imagem»
O primeiro-ministro português, a propósito destas declarações da presidente da CE, enviou uma carta à Comissão Europeia a pedir «sensibilidade política para um escalonamento do IVA da electricidade, o que permitiria combater as alterações climáticas». Aguardemos mais esta decisão que… nos transcende.
Há alguns anos, quando organismos das Nações Unidos caucionaram previsões graves de vários cientistas sobre alterações climatéricas que resultariam da emissão excessiva de gases de efeito de estufa, o ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore colou-se a esses alertas, patrocinando um vídeo que teve circulação mundial. Até se criou a ideia de que descobrira os gases com efeito de estufa…Agora, apesar de descredibilizado, lá foi perorar a Madrid.
Soaram alarmes e os alarmistas aproveitaram.
Os alarmismos
Temos assistido ao surgimento de movimentos políticos como o «Fridays for future» (Sextas-feiras para o futuro) ou, mais recentemente, «Extinction rebellion» (A revolta da extinção), que pintam um quadro da iminência do fim do mundo, o que tornaria praticamente inútil ir à escola, pois não haveria futuro para a juventude de hoje sem uma mudança radical.
Nos gases de efeito de estufa, encontramos o anidrido carbónico (CO2) mas também o metano (CH4), o protóxido de azoto (N2O) e o hexafluoreto de enxofre (SF6). A todos eles, presentes na atmosfera, devemos a vida e que a temperatura média mundial não fosse -15º C, mas sim os actuais +15º C.
Ernst Pauli, no artigo «O contexto do problema do aquecimento global», editado já depois da sua morte, em Outubro passado, descreve claramente o funcionamento físico desta «estufa». Trabalha aí nas respostas cientificamente adequadas a questões como:
O que interessa não é se esses gases contribuem para o aquecimento global, mas qual é a contribuição deles. E em que parte é antropogénico (isto é, imputável à acção do homem) e como isso influencia o efeito de estufa. Quais são as outras influências que actuam na evolução da temperatura e que papel elas desempenham? E onde exactamente está o nosso conhecimento sobre a origem do efeito de estufa? De onde vêm nossas conclusões? Quão confiáveis eles são?
O autor não ficou satisfeito com as suas respostas e sugeriu que a resposta exaustiva a essas questões deverá ser remetida para um debate, mas com bases objectivas.
E refere, por exemplo, que os dados recolhidos sobre as temperaturas e as concentrações de gases na atmosfera variam muito conforme os tempos. De há 70 anos a esta parte, existem estações de medição em todo o mundo que nos fornecem os dados actuais mais completos e precisos do que em qualquer outro momento da história da Terra. Existem medições básicas de temperatura que remontam ao século XIX. Para as épocas anteriores, temos relatos históricos, tabelas e outros documentos, em particular os anéis de crescimento das árvores, que dão indicações sobre as variações de temperatura de maneira ininterrupta que podem remontar a aproximadamente 12 mil anos atrás. No último meio milhão de anos, apoiamo-nos nos núcleos de gelo nos quais a composição do ar dos séculos anteriores foi armazenada e, para épocas ainda mais distantes, na análise de sedimentos geológicos.
a luta em defesa da Natureza, do planeta e dos seus recursos, como a luta pelo direito ao desenvolvimento – dois objectivos que não são contraditórios, antes complementares – exigem um confronto com as políticas e orientações da União Europeia»
Um planeta Terra estável e modificado apenas pelo homem não existe. Mas esta imagem é um não dito escondido nas entrelinhas do alarmismo. Não só esta imagem é falsa, mas também é pretensiosa, por assim dizer antropo-arrogante: a natureza extra-humana é colocada num pedestal como uma imagem piedosa aparentemente destruída pelo homem. A natureza não é vista como complexa e necessária à nossa actividade e existência, à qual nos devemos adaptar de acordo com suas próprias leis. A partir daqui, segue-se um caminho curto e indiferenciado, levando a um pessimismo apocalíptico que, por exemplo, lamenta a sobrepopulação em geral e conduz rapidamente a uma ecologia profunda e esotérica singular. Esse caminho deve, no entanto, levar a uma busca precisa e livre de estereótipos, que desenvolva estratégias de acção e acordos políticos lá onde possamos identificar, com certeza, as causas e avaliar as consequências das nossas acções com suficiente segurança.
Muito mais que desconstrução é o progresso técnico que deve ser desenvolvido.
No domínio das mudanças climáticas, em particular, muitas questões ainda precisam de ser resolvidas graças ao progresso científico. Se as nossas estratégias de acção não funcionarem onde temos conhecimento comprovado, podemos estar contribuindo mais para a destruição do que para a preservação da «natureza». No que diz respeito às mudanças climáticas antropogénicas, o nosso conhecimento ainda é muito incompleto e há boas razões para pensar que a visão «politicamente correcta» não está suficientemente correcta no plano científico.
No artigo de Ernst Pauli essas fontes de dados e as respostas às outras questões são descritas com mais detalhe.
No seminário que o Partido Comunista Português (PCP) e o Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL) organizaram em Setembro deste ano, em Palmela, «O Capitalismo não é verde. Uma visão alternativa sobre as alterações climáticas», o físico meteorologista Rui Salgado lembrou dois factos que os nossos jornalistas de investigação teimam em ignorar.
Em primeiro lugar, que foi o físico soviético Mikhail Ivanovich Budyko (1920-2001), provavelmente, o primeiro investigador a estimar quantitativamente o efeito do aumento do CO2 devido às actividades humanas, e a incluir nos seus cálculos, ainda que de forma simplificada, o efeito de retroacção positiva entre o aumento da temperatura e o degelo do Árctico. Em resultado de estudos efectuados no âmbito da planificação socialista, que incluíam, desde o pós-guerra, estudos sobre os efeitos climáticos de grandes projectos. E que um conhecido climatologista americano, William Hay, reconheceu a importância da questão das alterações climáticas ouvindo a intervenção de Budyco, em Leninegrado, numa reunião americano-soviética de cientistas, em 1982.
Em segundo lugar, que em 1992 Fidel Castro discursou na Assembleia Geral das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e explicou então que são os pobres os mais afectados pelas alterações climáticas: «Os primeiros a sofrer as consequências das alterações ao meio ambiente são os pobres. Eles não possuem carros, ar condicionado nem, possivelmente, móveis, isto se tiverem casa. Sobre eles caiem mais directamente os efeitos das grandes emissões de dióxido de carbono causadoras do aquecimento da atmosfera».
Quatro propostas e orientações
Antes desse seminário do PCP, nas eleições de Maio passado para o Parlamento Europeu, aquele Partido avançou com quatro orientações para encarar esta questão:
1. O fim do mercado do carbono, como fim do regime de comércio de licenças de emissão da UE. A abordagem de mercado deve dar lugar a uma abordagem normativa, devendo as emissões incluídas neste regime ser consideradas em legislação já existente visando limitar as emissões, designadamente industriais (caso da Directiva do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, IPPC, por exemplo);
2. Modificação das políticas agrícolas e comerciais vigentes, entre outros aspectos orientando as políticas agrícolas para a salvaguarda da soberania alimentar e para o apoio à produção local e às cadeias de abastecimento curtas, e orientando as políticas comerciais para a complementaridade e não para a competição (como pressupõe a desregulação e liberalização do comércio internacional) – entre produções, produtores e países;
3. Consolidação e aprofundamento das medidas tomadas no âmbito do passe social, tendo em vista, a prazo, uma gratuitidade dos transportes públicos (avaliando e eventualmente replicando experiências em curso noutros países);
4. Controlo público do sector energético.
Quatro propostas. Quatro orientações que permitiriam lograr uma redução das emissões de gases com efeito de estufa (com origem antropogénica) para a atmosfera terrestre. Além de outros efeitos positivos sobre o ambiente, a economia e a sociedade.
Estas quatro propostas e orientações chocavam de frente com as políticas da União Europeia e com as suas orientações sectoriais. Razão pela qual, referia o PCP, no imediato, a luta em defesa da Natureza, do planeta e dos seus recursos, como a luta pelo direito ao desenvolvimento – dois objectivos que não são contraditórios, antes complementares – exigem um confronto com as políticas e orientações da União Europeia.
Países europeus que ultrapassam os limites nacionais para as emissões de GEE
A Pordata indica-nos as emissões por país e sectores de actividade de 1990 a 2017.
A Agência Europeia do Ambiente (EEA) tem vindo a identificar os países da União Europeia (UE) que continuam a ultrapassar os limites nacionais de emissão de poluentes do ar.
A EEA explicava que com base nos dados recolhidos em cada país, desde 2010, foram 10 os Estados membros que «persistentemente excederam os respectivos tectos de emissões» para NOx, NMVOCs e NH3, poluentes susceptíveis de afectar a saúde das populações2.
A Alemanha era em 2016 o único país que ultrapassava três dos quatro limites fixados em 2014 para cada um os poluentes, em 2014. Ou seja, as emissões de óxido de azoto, NOx3, NMVOCs4 e amoníaco, NH3, foram superiores ao estipulado.
O poluente NOx está mais relacionado com o tráfego automóvel, enquanto a maior parte (95%) do NH3 tem origem na actividade agrícola, principalmente devido aos fertilizantes e ao tratamento do estrume dos animais.
Altas concentrações de um dos componentes do NOx podem causar a inflamação das vias respiratórias e levar a problemas do sistema respiratório e a doença cardiovascular, recordava a EEA, acrescentando que o NH3 forma partículas nefastas na atmosfera e que ambos os poluentes afectam o equilíbrio dos ecossistemas.
O que se pode exigir à comunidade internacional
A COP25 será lembrada, mais do que pelas negociações, pela presença excessiva de multinacionais (às quais Al Gore está ligado) e grandes empresas ligadas a combustíveis fósseis. Essa realidade foi denunciada por activistas ambientais, que acusaram entidades como a Iberdrola, a Endesa, a Volkswagen ou o Banco Santander de usarem a Cimeira do Clima para lavar sua imagem.
A luta contra as alterações climáticas é um desafio comum a todos os países que exige confiança para o ganhar, vontade para agir e uma cooperação sincera. A comunidade internacional deve trabalhar para alcançar uma combinação entre a contenção das alterações climáticas e a promoção do desenvolvimento económico e social e alcançar a transição verde de baixo carbono no processo de aceleração do desenvolvimento. As responsabilidades comuns, mas diferenciadas, no quadro do multilateralismo, devem ser assumidas para ajudar os países em desenvolvimento a promover as suas capacidades para lidar com esta questão.
- 1. Quando as emissões de CO2 são completamente absorvidas, por exemplo através das florestas.
- 2. No caso do incumprimento da meta para NOx, a lista era composta pela Áustria, Bélgica, França, Alemanha, Irlanda e Luxemburgo. Apresentavam emissões de NMVOCs acima dos limites a Dinamarca, Alemanha, Irlanda e Luxemburgo, enquanto para o NH3 a Irlanda saía deste grupo e entravam a Áustria, Finlândia, Holanda e Espanha. Já no que respeita aos limites fixados por directiva comunitária para o dióxido de enxofre (S02) eles estavam a ser cumpridos. Os objectivos definidos por cada país, mesmo quando não foram afectados pela necessidade de recorrer, estiveram depois condicionados por incidentes como grandes fogos ou períodos de seca. Foi o caso de Portugal que, depois dum bom desempenho na redução de emissões até 2017, acabou por voltar a crescer nas emissões.
- 3. Número de oxidação que corresponde à carga do átomo ou carga que um elemento assume quando estabelece uma ligação química com outro.
- 4. Compostos orgânicos não voláteis, com excepção do metano, correspondendo a uma agregação mais fácil de estudar.
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