O Ministério da Mulher, Solidariedade Nacional, Família e Acção Humanitária (MAH) do Burkina Faso anunciou esta segunda-feira, em conferência de imprensa, o resgate de 374 menores, entre Janeiro e Março deste ano, que foram «interceptados e salvos do tráfico» de pessoas.
De acordo com as autoridades, as crianças estavam a ser levadas para países vizinhos, onde seriam exploradas como escravos modernos na agricultura ou em explorações mineiras.
«Durante o primeiro trimestre de 2021, 374 crianças foram interceptadas sob suspeita de que poderiam ser vítimas de tráfico», declarou a ministra Hélène Marie Laurence Ilboudo em Ouagadougou, capital do país africano.
«Há algum tempo, os fenómenos que afectam as crianças tomaram proporções preocupantes no nosso país», alertou, indicando que em 2020 foram interceptadas 2318 crianças, informa o portal do Estado de Minas.
Uma pesquisa realizada entre 2017 e 2018 deixa em evidência a exploração laboral nos principais pólos de produção de cacau no Brasil, onde o recurso a mão-de-obra infantil é habitual. Cerca de 8000 crianças e adolescentes brasileiros trabalham na cadeia produtiva do chocolate, de acordo com um relatório apresentado no final do mês passado, em Brasília. O informe resulta de uma pesquisa realizada pela Papel Social, entre Julho de 2017 e Junho de 2018, por encomenda da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em parceria com o Ministério Público do Trabalho (MPT). O Brasil é o sétimo produtor de cacau no mundo (o primeiro é a Costa do Marfim) e o segundo da América do Sul (depois do Equador). No Brasil, a produção ocorre em oito estados, com destaque para a Bahia (responsável por 45,1% do volume total) e para o Pará, que é responsável por 49,3% da produção. É também nestes dois estados que se encontram os dois maiores municípios produtores de cacau do país: Ilhéus (na Bahia) e Medicilândia (no Pará). No estado do Pará, o sector é responsável por 255 mil empregos, sendo que o principal pólo produtor se encontra localizado ao longo da Rodovia Transamazónica, onde se concentram 62,7% da produção estadual e 25,1% da produção do Brasil. De acordo com o estudo da Papel Social, os municípios que bordejam esta ligação rodoviária registam altos níveis de «vulnerabilidade social e baixa escolaridade». Aqui, os índices de desenvolvimento humano municipal são baixos, mesmo para os padrões do Pará. A pesquisa agora apresentada foi encomendada pela OIT e o MPT à Papel Social, na sequência de denúncias de ocorrência de trabalho infantil e trabalho escravo na cadeia produtiva do cacau, que foram efectivamente confirmadas. O propósito da pesquisa foi também o de aprofundar o conhecimento da cadeia, visando «superar as violações existentes e propor caminhos para o trabalho decente». De acordo com os depoimentos de famílias recolhidos na pesquisa, os baixos salários pagos pelos intermediários [atravessadores, aqueles que fazem o escoamento das amêndoas de cacau para a indústria, as «moageiras»] estão na origem do trabalho infantil disseminado na produção do cacau. Apesar de o cacau ser considerado de alta qualidade, o preço pago pelos intermediários é tão baixo que as famílias, exploradas, não conseguem «fechar as contas» no fim do mês sem o trabalho das crianças e adolescentes. O Brasil de Fato conversou com o director executivo da Papel Social, Marques Casara, que sublinhou a necessidade da responsabilização da indústria. «A conclusão principal do estudo é de que a prática do trabalho infantil é recorrente na base da cadeia produtiva do cacau. Ela beneficia directamente grandes processadoras de cacau sediadas no Brasil e vinculadas a empresas multinacionais e também às principais indústrias de alimentos que comercializam o chocolate», disse Casara. Questionado pelo Brasil de Fato sobre o modo como as multinacionais do sector da alimentação e de processamento de cacau para fabricação do chocolate beneficiam do trabalho infantil, o director da Papel Social sublinhou que elas «conseguem um produto mais barato quando as famílias usam os seus filhos nas etapas de colheita e do primeiro beneficiamento do cacau, que é feito na própria terra, na propriedade, que é a fermentação desse cacau». «O preço que é pago pelas moageiras, via atravessadores, não permite que o agricultor possa contratar o serviço de uma pessoa adulta para ajudar nessa actividade. Então, esses agricultores colocam os seus filhos e entregam o cacau para atravessadores que posteriormente vendem para grandes empresas», explicou, acrescentando que este «negócio é totalmente à margem da legislação, porque é feito sem nota e sem nenhuma actuação de acordo com as obrigações fiscais». Sobre a questão da responsabilidade nesta situação, Marques Casara aponta o dedo às multinacionais de cacau e chocolate, porque, sobre o monitoramento da cadeia produtiva, as corporações dizem uma coisa, mas, quando se verifica «as práticas que elas dizem adoptar, elas de facto não são adoptadas», enfatiza. Também há responsabilidades da parte do governo federal, na medida em que «sucateou os órgãos de fiscalização ou cortou brutalmente as verbas usadas nas operações de fiscalização – que não permitem que os fiscais, que os auditores do trabalho possam sair dos seus escritórios e verificar quais são as condições de trabalho no campo», denuncia. «Todo chocolate à venda hoje no Brasil está contaminado pelo trabalho infantil. Essa informação eu posso dizer de forma categórica», frisou, explicando que, «como não há monitoramento da origem deste cacau, mesmo o cacau que não foi produzido pela mão-de-obra infantil é indistinguível». Sobre a realização da pesquisa, disse que o que mais o impressionou «foi a situação de abandono das famílias por parte da cadeia produtiva, que precisa delas para obter lucros bastante significativos». «A família produtora de cacau é o principal actor nessa cadeia e, ao mesmo tempo, é a principal vítima de um processo predatório, desumano, e que não leva em conta os direitos fundamentais da pessoa humana. A situação é muito grave», denunciou. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
Mão-de-obra infantil e trabalho escravo contaminam a produção cacaueira do Brasil
Trabalho infantil e trabalho escravo
«Todo chocolate à venda no Brasil está contaminado pelo trabalho infantil»
Processo predatório e desumano
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As crianças, na maioria menores de 16 anos, iam ser transportadas para países limítrofes por traficantes e o seu destino seria trabalhar em plantações ou em minas; algumas, «mais afortunadas», são adquiridas para trabalhos domésticos, segundo revela a fonte.
A responsável do Ministério da Acção Humanitária referiu que os menores, carentes de amparo familiar, foram detectados em autocarros nos postos fronteiriços ou pela população, que denunciou os casos.
Um dos destinos do tráfico de crianças é a Costa do Marfim, o maior produtor de cacau do mundo, país que também interceptou e repatriou menores explorados nos seus campos, acrescentou o ministério.
Do total de crianças resgatadas, 58 foram detectadas em operações de controlo do território por parte das Forças de Defesa e Segurança, tendo sido entregues aos serviços sociais, acrescentou Ilboudo, que destacou também a magnitude do fenómeno das «crianças de rua».
Outros destinos comuns dos menores traficados são as plantações no Mali, a noroeste, e no Gana, a sul, outro grande produtor de cacau a nível mundial.
São frequentes as denúncias, por parte instituições e organizações não governamentais, do recurso a trabalho infantil e a mão-de-obra escrava nas plantações de cacau.
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