«Não há como descartar a hipótese de que a questão tributária seja um elemento relevante para explicar a diferença para países subdesenvolvidos, da periferia do sistema capitalista», afirma ao Brasil de Fato o economista Bruno Moretti, doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília e assessor técnico do Senado Federal.
Segundo dados divulgados no projecto «Our World in Data», da Universidade de Oxford, no Reino Unido, com actualização na passada quinta-feira, 99,05% da população do território ultramarino britânico de Gibraltar, na costa sul da Espanha, recebeu ao menos uma dose da vacina.
Em Seychelles, arquipélago de 115 ilhas no Oceano Índico, próximo da costa leste de África, a vacina chegou a 71,76% da população. De seguida aparecem os Emirados Árabes Unidos, na península arábica, com 59,11%. Nas Ilhas Cayman, situadas 260 km ao sul de Cuba, 32,12% dos habitantes começaram a ser imunizados.
O intruso no «top-5», com 91,55%, é Israel, que não é considerado um paraíso fiscal e aparece atrás apenas de Gibraltar no ranking.
Paraísos ou refúgios fiscais são territórios cuja legislação facilita a aplicação de capitais estrangeiros, com alíquota de tributação nula ou muito menor que nos países de origem. Na maioria deles, as operações financeiras acontecem sob segredo fiscal.
Abrir uma conta nesses países é uma manobra comum, entre grandes empresários, para pagar menos impostos e ocultar bens e património, não se tratando de uma operação ilegal, desde que o dinheiro ou bem tenham origem lícita e sejam declarados ao fisco do país.
Crítica deve ser feita ao centro do sistema económico
De entre os quatro paraísos fiscais citados, os Emirados Árabes Unidos têm mais população, com cerca de dez milhões de habitantes. Os restantes estão entre os 50 menos populosos do mundo, mas essa não será a única explicação para sua posição privilegiada no ranking global da imunização.
«A massa de recursos que esses países recebem, com tratamento fiscal privilegiado, nenhum ou pouquíssimo pagamento de imposto sobre essas rendas, contribui para essa disparidade», acrescenta o economista Bruno Moretti.
Na comparação com os vizinhos, fica claro que os paraísos fiscais começaram a vacinar antes. Seychelles foi o primeiro país do continente africano a aplicar a vacina contra a Covid-19, em Janeiro de 2021.
O economista Bruno Moretti adverte, no entanto, que a crítica às causas dessa desigualdade deve ter como alvo os países do centro do capitalismo, e não apenas a legislação desses refúgios fiscais.
«Esses paraísos fiscais são uma parte importante da "regra do jogo", para preservar o valor dessas massas de riquezas, concentradas em países centrais. E isso faz toda a diferença para explicar a desigualdade do caso específico, do acesso às vacinas», explica Moretti.
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