|Chipre

Sotiroula Charalambous: Chipre só será cumprido com a «reunificação»

De passagem por Lisboa, a convite da CGTP-IN, Sotiroula Charalambous, secretária-geral da Federação Pancipriota do Trabalho (PEO), falou com o AbrilAbril sobre o papel de um sindicato num país que ainda vive sob ocupação militar da Turquia.

Sotiroula Charalambous, eleita em Dezembro de 2021, é a primeira mulher a assumir o cargo de secretária-geral na Federação Pancipriota do Trabalho (PEO). Charalambous foi ministra do Trabalho e da Segurança Social entre 2008 e 2013, num governo do Partido Progressista do Povo Trabalhador (AKEL)
Créditos / AbrilAbril

Uma delegação da Federação Pancipriota do Trabalho (PEO), a maior central sindical de Chipre, visitou Portugal a convite da CGTP-IN. Para além de Pieris Pieri, Chefe do Departamento de Relações Internacionais da PEO e Nikos Grigoriou, secretário do sindicato que organiza os trabalhadores e empregados em empresas semipúblicas e autarquias locais, esteve presente a secretária-geral, Sotiroula Charalambous.

Encontro da delegação da PEO, composta por Sotiroula Charalambous, secretária-geral, Pieris Pieri, Chefe do Departamento de Relações Internacionais e Nikos Grigoriou, secretário do sindicato que organiza os trabalhadores e empregados em empresas semipúblicas e autarquias locais de Chipre, com a CGTP-IN (e a secretária-geral, Isabel Camarinha). Créditos

Sotiroula Charalambous foi eleita secretária-geral (a primeira mulher a ocupar o cargo na história da federação sindical) em Dezembro de 2021, num momento de convulsões históricas no mundo do trabalho: para além de apanhar o rescaldo da pandemia Covid-19, Sotiroula coordenou a PEO nos momentos finais de uma década de gestão neo-liberal de Nicos Anastasiades, responsável por brutais cortes no investimento público e resgates a bancos (o seu nome constava nos Pandora Papers, ao lado de Volodymyr Zelensky e Sebastian Piñera, do Chile).

O panorama laboral mudou significativamente ao longo destes 10 anos. Anastasiades procurou, desde o primeiro momento, quebrar a espinha ao movimento sindical, focando-se, sobretudo, em pôr termo à preponderância da contratação e dos acordos colectivos de trabalho: a sua proposta de salário mínimo nacional, aplicada em 2023 pela primeira vez, tem essa mesma ambição, flexibilizar o trabalho e reforçar o poder do patronato.

A eleição, a 12 de Fevereiro de 2023, do também neo-liberal Nikos Christodoulides, antigo porta-voz e ministro dos Negócios Estrangeiros dos governos de Anastasiades, não augura um futuro fácil para os trabalhadores cipriotas, que assistiram, nos primeiros dois meses do novo mandato, a um sucessivo quebrar de promessas eleitorais.

AbrilAbril teve a oportunidade de falar com Sotiroula Charalambous durante a sua passagem por Portugal: uma conversa em torno das expectativas dos trabalhadores em relação ao novo presidente cipriota, a contestação ao salário mínimo nacional imposto em vigor em Chipre e o papel do sindicalismo na luta pela reintegração do território ocupado pela Turquia.

Nikos Christodoulides venceu, há pouco mais de dois meses, as eleições presidenciais. Esperam alguma novidade da sua governação? A verdade é que Christodoulides foi porta-voz do anterior governo, bem como seu ministro até 2022... 

Ao longo de toda a campanha eleitoral, o presidente Christodoulides afirmou-se um membro orgulhoso da Aliança Democrática, o partido neoliberal de direita do qual oriunda o antigo presidente Nicos Anastasiades.

Tendo em conta a sua carreira política e as muitas contradições que ficaram evidentes durante a campanha, seja entre as forças políticas e económicas que o apoiaram ou olhando para as suas primeiras decisões como Presidente (disse uma coisa antes ser eleito e aplicou outra, na prática), estamos muito cautelosos quanto à possibilidade de vir a ter políticas diferentes das que tivemos na década passada.

É expectável que o novo Presidente quebre mais algumas das suas promessas? A proposta de isenção fiscal que apresentou foi criticada por ser semelhante à de Liz Truss [Partido Conservador britânico], ajudando os mais ricos de Chipre

|

Candidato conservador vence eleições presidenciais no Chipre

Nicos Anastasiades foi reeleito este domingo para a presidência do Chipre, com 56% dos votos, ficando à frente de Stavros Malas (44%), apoiado pelo AKEL, na segunda volta das eleições. Na sua declaração, o secretário-geral do AKEL sublinhou que «a luta não acaba aqui».

Bandeira da Grécia e de Chipre pintadas numa parede junto à linha que divide a capital cipriota, Nicósia (imagem de arquivo)
Créditos / Sputnik News

De acordo com as autoridades, participaram no acto eleitoral 73% dos cerca de 550 mil cipriotas com direito a voto. A maioria optou por reeleger o conservador Nicos Anastasiades, que fez do relançamento das negociações sobre a reunificação da ilha uma das bandeiras da sua campanha, na sequência do falhanço, em Julho último, das conversações apoiadas pelas Nações Unidas.

Stavros Malas, candidato independente que contou com o apoio do Partido Progressista do Povo Trabalhador (AKEL, comunista), também fez das negociações da reunificação um tema prioritário e criticou o seu oponente por, enquanto participante nas últimas, não ter ido suficientemente longe para garantir um acordo.

Recorde-se que as eleições de ontem tiveram lugar na República do Chipre, país-membro da União Europeia reconhecido internacionalmente e que ocupa perto de dois terços da ilha mediterrânica. O território restante foi ocupado pela Turquia em 1974, que ali criou a República Turca de Chipre do Norte, não reconhecida a nível internacional.

Na primeira ronda das presidenciais, realizada a 28 de Janeiro, Anastasiades obteve 35,5% dos votos e Malas 30,25%.

Andros Kyprianou: «A luta não acaba aqui»

Na declaração que ontem fez sobre o resultado das eleições, o secretário-geral do AKEL, Andros Kyprianou, sublinhou a defesa dos interesses do povo, bem como as diferenças profundas que os comunistas têm com as políticas socioeconómicas de Anastasiades, que no último mandato «deu muito para poucos e muito pouco para muitos».

Também sobre a «questão de Chipre» – que o AKEL considera prioritária –, Kyprianou manifestou divergências em relação ao presidente reeleito, exigindo que dê provas de empenho.

No seu discurso, o líder dos comunistas cipriotas destacou que «a luta não acaba aqui» e garantiu que o AKEL a vai intensificar, em defesa dos interesses do povo do Chipre – para combater a pobreza, a desigualdade e o desemprego – e contribuindo para a reunificação da ilha.

Tipo de Artigo: 
Notícia
Imagem Principal: 
Mostrar / Esconder Lead: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Imagem: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Vídeo: 
Esconder
Mostrar / Esconder Estado do Artigo: 
Mostrar
Mostrar/ Esconder Autor: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Publicação: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Actualização: 
Esconder
Estilo de Artigo: 
Normal

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui

As primeiras decisões políticas do presidente Christodoulides revelam uma grande incoerência em relação ao que prometia antes das eleições. Permitam-me que vos dê dois exemplos concretos: antes das eleições, garantiu que o Conselho de Ministros seria constituído por 50% de mulheres. Expressou esta posição na noite da sua eleição mas, ao nomear o conselho, tratou logo de quebrar o seu compromisso.

Prometeu proteger todos aqueles que recorreram a empréstimos das execuções das hipotecas sobre os seus bens imobiliários. Quando o AKEL  (Partido Progressista do Povo Trabalhador) apresentou, recentemente, uma proposta de prorrogação do período de validade da lei que suspende essas mesmas execuções hipotecárias por alguns meses (até que o governo apresentasse, como prometido, uma proposta completa), o governo recusou.

Para nós, é evidente que só através da luta conseguiremos avançar durante este mandato. 

Não caracterizariam, portanto, a nova presidência como pró-laboral?

Christodoulides tentou apresentar-se com um rosto popular, disponível a escutar a sociedade, os trabalhadores e os seus problemas. No entanto, em questões cruciais para os trabalhadores como a do pagamento integral do Subsídio de Custo de Vida (que é actualmente atribuído a 50% do aumento da inflação), não foi claro. Na realidade, ele dizia uma coisa nas reuniões que mantinha com as organizações patronais e outra completamente diferente nas reuniões com os sindicatos. 

Relativamente a outra questão importante que diz respeito à vida dos trabalhadores (parar o corte de 12% nas pensões dos trabalhadores que optaram por se reformar aos 63 anos), escolheu não tomar qualquer posição. Todos os políticos, e forças políticas, são julgados pelo que fazem na prática. O Sr. Christodoulides será julgado da mesma forma.

Quais são os maiores desafios que os trabalhadores cipriotas enfrentam, neste momento?

Como em todos os países europeus, os trabalhadores de Chipre enfrentam, hoje, os problemas acumulados pelas políticas de desregulamentação, de cortes no Estado social, privatizações, desvalorização do trabalho. A tudo isto, somam-se os problemas provocados pelos preços muito elevados e pelo aumento das taxas de juro.  

«Para nós, é evidente que só através da luta conseguiremos avançar durante este mandato.»

Combater a desvalorização do trabalho promovida pelos contratos individuais, a violação e a degradação dos acordos colectivos, a externalização de serviços e a pressão exercida pelo patronato sobre os trabalhadores (para que estes não se organizem) é o maior desafio que enfrentamos nos últimos anos. Em 2012/13, o Chipre tinha uma taxa de sindicalização de 70%. Passados 10 anos, 1 em cada 2 trabalhadores trabalha sem condições de emprego regulamentadas pelos acordos colectivos. Este é o nosso principal objectivo para o próximo período.

A introdução de medidas, institucionais, que tornem obrigatória a aplicação, aos contratos de todos os trabalhadores, dos princípios basilares dos acordos colectivos em cada sector e, ao mesmo tempo, a renovação dos acordos com aumentos salariais satisfatórios é indispensável. 

E para além do reforço dos acordos colectivos? Quais são as principais reivindicações e lutas da PEO nos próximos meses?

Uma grande questão que temos pela frente é a continuação da luta e da resistência contra as privatizações. Nos últimos anos, conseguimos impedir a privatização da electricidade e das telecomunicações, mas precisamos de estar constantemente vigilantes nesta questão.

Outro objectivo principal passa por exigir uma política social integrada, com um aumento dos recursos públicos a serem canalizados para os hospitais públicos, para a educação, a criação de estruturas de assistência e protecção social ou a política de habitação (especialmente para os jovens). 

Ao mesmo tempo, continuamos a lutar por medidas que aliviem os trabalhadores dos efeitos da inflação, sendo, neste aspecto, a luta que estamos a travar pela reposição integral do subsídio de custo de vida uma questão essencial.

Iniciámos, já, a luta para melhorar o sistema de pensões e, em particular, para abolir a redução para 12% da pensão para aqueles que optam por se reformar aos 63 anos, como referi à bocado.

Uma condição prévia para levar a bom termo as lutas que temos pela frente é, obviamente, o aumento da força organizativa da PEO, um objectivo indispensável para alcançar tudo a que nos propomos. 

A PEO tem mobilizado muitos trabalhadores das plataformas digitais e call centers. Como é que um sindicato faz frente a todas estas novas formas de trabalho, caracterizadas pela precariedade e desregulação

|

Estafetas da Glovo numa luta pelo Futuro

Em apenas cinco dias juntaram-se mais de 600 estafetas num grupo de whatsapp e, lá, decidiram concentrar-se e fazer uma greve que ficou marcada para o dia de hoje. Uma primeira acção que marca o início de futuras lutas. 

CréditosAbrilAbril / AbrilAbril

De mota ou de bicicleta fazem quilómetros para entregar maioritariamente comida, mas também outros bens. Andam todos pelas cidades de lés-a–lés pelo asfalto, levam todos uma mochila idêntica às costas, mas é a sua condição de classe que os une. Nunca param e a pandemia foi um claro exemplo disso. 

Os estafetas das plataformas digitais são muitas vezes apenas chamados pelo nome da empresa para a qual trabalham, apesar das empresas não se quererem responsabilizar por eles. As gigantes multinacionais lucram com o seu trabalho, mas são eles, os trabalhadores, que não dormem horas suficientes, estão sujeitos ao perigo do cansaço acumulado enquanto conduzem horas a fio, são eles que pagam a gasolina e são eles os donos ou responsáveis pelos veículos. São eles que tudo fazem, são também eles que tudo perdem. 

Tendo isto em mente, os estafetas da Glovo realizaram esta segunda-feira uma greve e várias concentrações - em Lisboa, Coimbra e Porto. A razão prende-se com uma nova flexibilização do serviço que irá fazer com que o número de pedidos para cada trabalhador caia e por sua vez fará com que recebam menos dinheiro. Num contexto onde tudo está mais caro, onde a inflação já é mais que uma palavra no dicionário, os trabalhadores arriscam-se a empobrecer ainda mais enquanto trabalham. 

Esta indignação foi o ponto de partida que levou à criação de um grupo de whatsapp que juntou o máximo de trabalhadores possível. No espaço de uma semana, juntaram-se ao grupo mais de 600 trabalhadores e surgiu a ideia de avançar para uma greve e para concentrações. Em Lisboa, meia centena de trabalhadores juntaram-se no Terreiro do Paço, junto ao Terminal Fluvial, e aí fizeram parte da sua luta. O AbrilAbril deslocou-se ao local para falar com alguns trabalhadores. 

No local falámos com Demétrio que tem 39 anos, é brasileiro e trabalha para a Glovo há 5 meses, apesar do mesmo dizer que passou por um processo de 10 meses até a sua conta ser aceite e activada. Passou a trabalhar para a Glovo «a 100%» em Dezembro, após ter sido despedido do seu antigo trabalho e, actualmente, esta é a sua principal e única forma de rendimento. Muitos vendem uma alegada flexibilidade da Glovo como um dos pontos positivos. Vendem neste trabalho o «sonho americano», vendem a ideia que cada trabalhador é o seu próprio empresário. Nunca dizem a dura realidade a que estão sujeitos. 

O caso do Demétrio acaba por ser o reflexo da dura realidade. Segundo ele, de segunda a quarta trabalha 10 horas e de quinta a domingo trabalha 13 horas. Para justificar a acumulação de riqueza por parte dos CEO, dizem que esses trabalharam muito para chegar onde chegaram. Nunca os vemos é a trabalhar sujeitos a estes níveis de exploração: uma semana tem 168 horas e, por acaso, o Demétrio não trabalha metade dessas horas, que seriam 84 - trabalha 82 horas.

Para entendermos bem a questão, até porque só sabíamos que a acção ia acontecer, o Demétrio explicou-nos que nos últimos meses a Glovo diminuiu o valor das rotas de entrega «do ponto A ao ponto B», que «implica uma redução nos ganhos, e que significa um acrescento a todas as despesas com a mota ou gasolina». A par desta questão, vai passar a haver uma alteração no modelo de funcionamento da plataforma que deixará de contemplar agendamentos das horas de trabalho, uma forma inteligente que permite à Glovo dizer, cinicamente, que não tem nenhum vínculo com os trabalhadores. 

Segundo o Demétrio, apesar das horas de trabalho não serem as melhores, até porque são feitas pelo facto de não haver um salário base e esta ser a forma de compensar, isto vai levar a que cada trabalhador trabalhe a qualquer hora sem nenhuma regulação, havendo horas em que todos estarão ligados em serviço. Verifica-se também que, além da redução do auferido por entrega, haverá assim menos entregas por estafeta. 

Surge então o grande problema. O Demétrio, que acabou por ser um dos impulsionadores do que ele caracteriza como «movimento», diz que já houve tentativas de contacto com a administração da multinacional em Portugal, mas sempre sem sucesso porque não há nenhum humano com quem possam falar. Só existe um email ou a aplicação e para as reivindicações nunca há respostas. 

Apesar disto, há uma consciência que há grande potencial de luta. Se em tão poucos dias tantos trabalhadores aderiram a um grupo, isso só demonstra que o patronato não se poderá esconder para sempre numa aplicação de telemóvel. Por enquanto, o Demétrio não tem conhecimento de trabalhadores com dificuldades económicas, mas diz que já se prevê que aconteça e, como tal, o desenvolvimento da luta terá que acontecer. 

Após falarmos com o Demétrio, começámos a observar todos os trabalhadores. Notámos que todos falavam entre si, mas estavam algo divididos por barreiras linguísticas. Foi então que fomos falar com Haider Ali, de 37. O Haider está em Portugal há 5 anos, trabalha na Glovo há 3 anos e veio do Paquistão. Estava acompanhado por colegas que vieram da Índia, Bangladesh e Nepal. 

Apesar de uma outra nacionalidade, o factor trabalho une o que o Demétrio e o Haidar dizem. Mesmo não falando bem inglês, o Haidar dizia que «temos que criar unidade, fazer passar a nossa mensagem e alcançar os nossos objetivos. Caso contrário, a Glovo não nos vai responder», acrescentando que «a empresa só quer saber do que o cliente diz e não do que nós dizemos». 

Para o Haidar, isto é apenas o início. Para ele, a luta é o início e alertar as pessoas para o facto de trabalharem muito e receberem pouco. Dizia, apesar de estar meia centena no protesto, que «um dia vamos ser muitos mais». A situação é preocupante e, segundo ele, «está tudo a ficar mais caro e a Glovo passa a pagar menos. Fazemos 1,60€ por dois quilómteros. Somos nós que pagamos a gasolina, os telemóveis e o cartão de telemovel». A denúncia da sua situação não ficava pelo pouco que ganhavam. Para além disso, não têm férias, nem segurança na estrada e, caso algo lhes aconteça, a Glovo desresponsabiliza-se, mesmo trabalhando 10 horas/dia, no mínimo. 

Apesar de ter receio de consequências negativas por ser imigrante, Haidar sabe que isto é necessário e mais uma vez repetia que «as pessoas vão ganhar consciência. Isto é necessário». 

No final da concentração realizou-se um plenário improvisado. Em muito ajudou o facto de estar presente um dirigente da Interjovem-CGTP que, com o seu contributo e experiência, procurou dar consequência à acção. Seria fácil os trabalhadores ficarem por aqui, mas o plenário, mesmo que improvisado, levou os trabalhadores a afastarem tendências aventureiristas, discutir os melhores passos e a forma como se deviam organizar. 

Neste pequeno momento respirou-se a profunda democracia. A discussão era feita em português e imediatamente traduzida de forma a que todos pudessem participar. Ficou fechada nova acção para o dia 2 de Junho, mas também os passos a dar até esse dia. Ficou definida uma divisão geográfica por Lisboa. Uns ficavam de contactar com os colegas em Oeiras, outros em Cascais, mais uns quantos em Sintra e uns tantos na cidade de Lisboa. Depois formaram grupos de trabalho dentro dos concelhos e, para facilitar, os portugueses e brasileiros, por facilidade linguística, passavam a palavra entre si, enquanto os indianos, nepaleses ou paquistaneses ficavam com a mesma responsabilidade com quem conseguiam falar. 

A acção acabou com os estafetas a subirem para as motas, a substituírem as palavras de ordem pela buzinas e a entrarem na estrada para, todos juntos, mostrarem o seu descontentamento e fazerem-se ouvir. Deixamo-los de ver na primeira curva mas continuamos a ouvi-los.

Esta foi a primeira de muitas lutas. Foi o início de um processo que poderá ser longo, atribulado, mas trará certamente frutos.

Tipo de Artigo: 
Notícia
Imagem Principal: 
Mostrar / Esconder Lead: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Imagem: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Vídeo: 
Esconder
Mostrar / Esconder Estado do Artigo: 
Mostrar
Mostrar/ Esconder Autor: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Publicação: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Actualização: 
Esconder
Estilo de Artigo: 
Normal

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui

A digitalização e as novas tecnologias estão a mudar a forma de trabalho tal como a conhecemos tradicionalmente, mas não alteram a exploração e a dependência do trabalho assalariado.

Pelo contrário, pode dizer-se que estas novas formas de trabalho são altamente inseguras, desregulamentadas, em que os trabalhadores são privados dos direitos mais básicos, até o de serem classificados como trabalhadores assalariados. Em Chipre, a maioria dos estafetas das plataformas digitais são jovens migrantes, que estão no país como estudantes ou requerentes de asilo empregados por empresas de prestação de serviços subcontratadas pelas plataformas digitais. Este regime torna-os altamente vulneráveis.

Nos últimos meses, organizámos e demos início a um processo de luta dos trabalhadores da empresa Wolt [adquirida recentemente pela DoorDash, uma das maiores multinacionais do sector]. Estamos, neste momento, num processo negocial com a empresa para exigir um acordo colectivo que regule as suas condições de trabalho. 

A PEO envolveu nesta discussão tanto as plataformas digitais como as empresas intermediárias. É um esforço difícil, mas estamos optimistas de que a organização e a combatividade demonstradas pelos trabalhadores trarão resultados. A experiência recente mostra-nos que a questão dos trabalhadores das plataformas digitais é uma questão em que é necessária uma coordenação entre organizações como a PEO e a CGTP, tendo em conta que, a nível europeu, está em curso a discussão para a criação de uma directiva da União Europeia sobre o assunto, onde os sindicatos devem intervir. 

Nos últimos anos, sucessivos governos portugueses têm feito os possíveis por bloquear toda a negociação colectiva. Quais são os aspectos da desregulamentação do trabalho que estão a ser impostos pelo governo de Chipre?

A maioria das nossas convenções colectivas são celebradas ao nível das empresas. Existem acordos em grandes sectores, como o a construção, hotelaria e do sector público. 

Formalmente, podemos argumentar que o governo cipriota não colocou quaisquer obstáculos ao processo de negociação colectiva, mas a realidade é que as políticas do governo de cortes salariais no sector público e o congelamento do salário mínimo também afectaram os acordos colectivos no sector privado. Até 2015, vários acordos colectivos foram congelados. Só através de muitos esforços e lutas conseguimos repor os salários e benefícios que tinham sido reduzidos.

Além disso, a cobertura política dada pelo governo à promoção de contratos individuais em locais onde havia contratação colectiva e a promoção, pelo próprio governo, de formas de trabalho como o trabalho a termo certo e por conta própria, deram apoio e espaço aos patrões do sector privado para promover a desregulamentação do trabalho e o enfraquecimento dos acordos colectivos.

2023 ficou marcado pela introdução de um salário mínimo nacional (SMN) em Chipre: algo que foi duramente criticado pela PEO. Um dos mecanismos mais interessantes em vigor anteriormente era a Indexação Automática de Salários, algo que não existe aqui em Portugal. Após alguns meses da sua aplicação, a perspectiva da PEO sobre o assunto mudou?

|

Diferença salarial entre nacionais e migrantes aumenta em países de maior rendimento

Um estudo da OIT revela que a diferença salarial entre trabalhadores migrantes e nacionais é de quase 13%, havendo países em que chega aos 42%, apesar de terem qualificações semelhantes. 

PCP promove a defesa dos direitos dos trabalhadores migrantes
Créditos

De acordo com o novo estudo da Organização Internacional do Trabalho (OIT), a que o AbrilAbril teve acesso, em países como Chipre, Itália e Áustria a diferença salarial por hora é mais elevada, com 42,3% e 25%, respectivamente. Na Finlândia é inferior à média, com 11%, e no conjunto da União Europeia é de quase 9%.

Segundo o relatório, nos últimos cinco anos, a diferença salarial aumentou em alguns países de elevado rendimento. Em Itália, os trabalhadores migrantes ganham 30% menos do que os nacionais, de acordo com os dados mais recentes, em comparação com os 27% de 2015. Em Portugal, a diferença salarial é de 29%, em comparação com os 25% de 2015, enquanto na Irlanda é de 21%, registando-se também uma subida relativamente a 2015 (19%).   
  
O relatório «The Migrant gap: understanding the wage diferences between migrants and nationals» revela que, nos países de elevado rendimento, os migrantes têm mais probabilidades de ter um trabalho com vínculo precário e muitas vezes enfrentam desigualdade de tratamento no mercado de trabalho, incluindo no que respeita a salários, acesso ao emprego e formação, condições de trabalho, Segurança Social e direitos sindicais.

Não obstante ganharem menos do que os nacionais, e de ser maior a probabilidade de trabalharem em empregos menos qualificados, que não correspondem à sua formação escolar e competências, os trabalhadores migrantes apresentam-se com qualificações semelhantes dentro da mesma categoria profissional.

Para ilustrar o desequilíbio, o relatório foca o exemplo dos EUA e da Finlândia, onde a percentagem de trabalhadores migrantes com o Ensino Secundário é de 78% e 98%, respectivamente, apesar de a percentagem de trabalhadores migrantes em empregos altamente ou semi-qualificados ser de apenas 35% nos EUA, e 50% na Finlândia.   
  
No caso das trabalhadoras migrantes, a penalização salarial duplica. Segundo a OIT, a diferença salarial entre os trabalhadores nacionais masculinos e as mulheres migrantes nos países de elevado rendimento é estimada em quase 21% por hora, acima da diferença salarial entre homens e mulheres (16%) nesses países.   
  
A organização constata ainda que a pandemia afectou mais os trabalhadores migrantes do que o resto da população activa, já que os seus postos de trabalho se prestam menos ao teletrabalho e «um grande número trabalha na linha da frente com maior exposição ao vírus».  

Tipo de Artigo: 
Notícia
Imagem Principal: 
Mostrar / Esconder Lead: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Imagem: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Vídeo: 
Esconder
Mostrar / Esconder Estado do Artigo: 
Mostrar
Mostrar/ Esconder Autor: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Publicação: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Actualização: 
Esconder
Estilo de Artigo: 
Normal

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui

Antes de responder à tua pergunta é importante esclarecer que, até à data, não existia um salário mínimo nacional em Chipre, havia, sim, um salário mínimo que se aplicava apenas a profissões específicas.

Em Chipre, historicamente, os salários, bem como as condições básicas de emprego, são definidos através de acordos colectivos de trabalho a nível sectorial. A extensa desregulamentação do trabalho que ocorreu nos últimos anos levou ao aumento do número dos trabalhadores que não têm direitos mínimos garantidos, seja o salário mínimo, o horário de trabalho digno, as horas extraordinárias, o 13.º mês, etc... 

Nos últimos anos, iniciámos uma luta com dois objectivos: introduzir um quadro jurídico vinculativo de direitos mínimos para os trabalhadores não sindicalizados e que não são abrangidos por acordos colectivos de trabalho, ao mesmo tempo que lutámos por medidas institucionais para que os termos básicos dos acordos colectivos acordados entre sindicatos e associações patronais se apliquem a todos os trabalhadores de cada sector.

Discordámos da decisão do governo em relação ao salário mínimo, organizando uma mobilização em massa dos trabalhadores, porque o SMN aplicado é muito baixo [885 euros nos primeiros seis meses de trabalho, 940 depois], porque o governo excluiu grandes grupos de trabalhadores (como é o caso das trabalhadores domésticas e agrícolas) e, também, porque o decreto sobre o salário mínimo não especifica que, nos locais de trabalho onde existam acordos colectivos, os valores devem ser os que já estão previstos nos acordos colectivos (ou seja, impedir que o SMN signifique, na prática, um corte salarial). 

Na verdade, em vez de pôr um fim à mão-de-obra barata e sem direitos e ao ataque aos acordos colectivos, o governo está a encorajá-lo. 

A indexação automática, ou seja, o mecanismo através do qual os salários são automaticamente ajustados todos os inícios de ano com base na inflação, é uma das maiores conquistas dos trabalhadores cipriotas. Conseguimos, ao longo de várias lutas, proteger esta medida dos ataques do patronato e dos governos conservadores de direita. Até a conseguimos proteger quando a Troika exigiu o seu fim. Agora, estamos a lutar para que a indexação automática seja de 100% da inflação, e não referente a apenas 50%.

O caso de Chipre não é diferente de outros países europeus. Os preços estão a aumentar rapidamente, os lucros das empresas estão a crescer de forma exponencial e apenas os salários estão estagnados. Qual é, neste momento, o papel de um sindicato? Que formas de acção pode um sindicato tomar para enfrentar a situação?

Sem dúvida. Nos últimos anos, os lucros não têm parado de aumentar enquanto os salários têm estagnado, em que os aumentos, quando os há, são muito baixos, aumentando assim as desigualdades sociais e económicas, o que se tem vindo a acentuar devido ao aumento dos preços e das taxas de juro. Num relatório do Instituto do Trabalho da PEO (INEK/PEO) sobre a economia e o emprego, registamos que, entre 2013 e 2022, os lucros aumentaram 44%, enquanto os salários se ficaram pelos 6%.

Reivindicamos de todas as formas. Tanto à mesa das negociações como através de greves, com a mobilização militante dos trabalhadores. O papel dos sindicatos é, hoje, mais necessário do que nunca para os trabalhadores. Com persistência e paciência, tentamos aproximar os trabalhadores da nossa organização, para reforçar a nossa voz e a nossa eficácia.

A PEO tem actividade na zona ocupada pelas forças turcas? Existem muitas diferenças de tratamento entre os trabalhadores em Chipre e nas zonas sob ocupação?

|

«Nunca aceitaremos a partição da nossa terra e do nosso povo»

Assinala-se mais um «aniversário negro» do golpe de estado que levou à  ocupação turca de Chipre e o AbrilAbril conversou com Giorgos Koukoumas sobre a luta histórica do seu povo pela reunificação.

Giorgos Koukoumas, dirigente do Partido Progressista do Povo Trabalhador (AKEL) do Chipre
Créditos

Giorgos Koukoumas, membro do comité central do Partido Progressista do Povo Trabalhador (AKEL) e deputado eleito pelo distrito de Famagusta, fala-nos da actualidade e urgência da libertação dos territórios ocupados desde 1974.

Passam 47 anos sobre o golpe de estado promovido pela junta fascista da Grécia, a que se seguiu a ocupação turca do norte da ilha, que se mantém aos dias de hoje. Como é que o povo, e em particular a juventude, encaram esta realidade, a viver numa zona profundamente militarizada, nomeadamente com as bases do Reino Unido na ilha?

O Chipre é um país tão pequeno e, no entanto, permanece dividido pela força das armas, e ao mesmo tempo é uma das zonas mais militarizadas do mundo. Por muitos anos, desde 1974, o status quo criou uma ilusão de estabilidade. Nos anos recentes, todavia, a intensificação da agressão da Turquia contra Chipre – e também sobre outros estados da região – confirmou que o status quo ocupante de partição coloca enormes perigos à paz, à segurança e ao nosso futuro. O povo cipriota – cipriotas-gregos e cripriotas-turcos – e a sua juventude têm o direito de viver numa terra livre, unida e segura, sem estarem divididos por arames farpados, exércitos, campos de minas e bases militares. É suficiente pensar que se os milhares de milhões gastos em décadas de armamento militar tivessem sido canalizados para o desenvolvimento social e as necessidades das populações, o nosso país seria um lugar muito melhor.

Ao longo dos anos o povo tem enfrentado muitas dificuldades, consequência desta divisão do país. Quais os interesses em jogo e quem ganha com a manutenção desta ocupação?

A partição foi uma escolha estratégica da NATO e o seu objectivo final era o de uma «dupla enosis» [«dupla união»], que era uma parte da ilha a ser unida à Grécia, membro da NATO, e a outra parte do território a outro membro da NATO, a Turquia. Através disto, ficaria assegurado que o Chipre permaneceria eternamente sob o controlo da NATO, como base militar conra os povos da região – um «porta-aviões insubmergível» –, como base espiã e de vigilância contra a União Soviética e como um centro de controlo dos corredores comerciais. A Turquia, a Junta grega de Atenas e os chauvinistas das comunidades cipriota-grega e cripriota-turca colaboraram com a implementação deste plano, resultando no massacre do povo e na partição do nosso país.

|

Líderes das comunidades grega e turca reunidos em Crans-Montana, na Suíça

Nova ronda de negociações para a reunificação de Chipre

Os líderes da República de Chipre e do regime implantado no Norte da ilha pelas forças turcas ocupantes regressaram à Suíça para retomar a «Conferência sobre Chipre». As questões da segurança e das «potências-garante» estão no centro das discussões.

Mesa negocial com os líderes das comunidades cipriotas grega e turca, as «potências-garante», o representante das Nações Unidas e da União Europeia, em Crans-Montana, Suíça. 4 de Julho de 2017
Créditos / Twitter @UN_CYPRUS

Após o fim inconclusivo das negociações iniciadas em Janeiro, os presidentes da República de Chipre e da República Turca de Chipre do Norte (regime implantado após a ocupação ilegal pela Turquia, em 1974, de um terço da ilha) regressaram à Suíça para uma nova ronda de conversações com vista à reunificação do país, na estância alpina de Crans-Montana, desde 28 de Junho.

A Nicos Anastasiades e Mustafa Akinci juntam-se os representantes das «potências-garante» – os ministros dos Negócios Estrangeiros da Grécia e da Turquia, e o enviado especial do Reino Unido (antiga potência colonial) para Chipre –, o representante do secretário-geral das Nações Unidas e o primeiro vice-presidente da Comissão Europeia (em representação da União Europeia, que assume o estatuto de observadora nas negociações).

No centro das discussões estão as questões da segurança e das «potências-garante», que mantêm a faculdade de intervir militarmente na ilha, de acordo com os termos dos tratados de 1960, que tornaram Chipre num país independente. Uma mesa negocial foi estabelecida para abordar exclusivamente estes temas, sendo o principal obstáculo até ao momento a recusa por parte da Turquia em retirar as tropas que mantém no terço Norte da ilha e abdicar do poder de intervenção.

Numa segunda mesa negocial, os representantes de ambas as comunidades – a grega e a turca – discutem todas as outras questões, sobre as quais têm vindo a ser conseguidos avanços mais significativos.

Estas negociações estão a ser entendidas por ambas as partes como uma oportunidade única para resolver a partição da ilha, que dura desde que a Turquia invadiu o Norte de Chipre em resposta a um golpe de Estado, com o apoio da junta militar grega, que pretendia impor a Enosis, a integração de Chipre na Grécia.

Em entrevista ao diário cipriota Haravgi, Toumazos Tsielepis, o dirigente do AKEL (Partido Progressista do Povo Trabalhador) e membro da equipa negocial da República de Chipre, alertou para a possibilidade de, caso não existam avanços nas actuais negociações, estas poderem «colapsar, como as conhecemos nos últimos dez anos».

Após o falhanço do plano Annan, chumbado em referendo, em 2004, as conversações entre ambas as comunidades para a reunificação da ilha, através da criação de um república federativa, foram ganhando força a partir de 2008, com a eleição do então secretário-geral do AKEL, Dimítris Christófias, para a presidência da República.

Tipo de Artigo: 
Notícia
Imagem Principal: 
Antetítulo: 
Líderes das comunidades grega e turca reunidos em Crans-Montana, na Suíça
Mostrar / Esconder Lead: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Imagem: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Vídeo: 
Esconder
Mostrar / Esconder Estado do Artigo: 
Mostrar
Mostrar/ Esconder Autor: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Publicação: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Actualização: 
Esconder
Estilo de Artigo: 
Normal

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui

Hoje, a Turquia de Erdogan vê Chipre como uma extensão da Anatólia e promove a integração das áreas ocupadas e a assimilação cultural dos cipriotas-turcos, apesar da resistência de uma larga parte da sua população. Ao mesmo tempo, é óbvio que a União Europeia e os EUA não pretendem impôr sanções nem adoptar uma forte posição contra a agressão da Turquia, mas, pelo contrário, parecem prontos para um novo «dar e receber» com Erdogan, procurando manter a Turquia afastada da Rússia. Por fim, devemos reconhecer que também em Chipre, através da utilização de conceitos ideológicos nacionalistas, existem interesses que estão confortáveis com o status quo formado sobre décadas. Na comunidade cripriota-turca, há forças que se tornaram presas à ideia de um estado separado, tal como a entidade ilegal que foi criada nos territórios ocupados desde 1983. Por outro lado, dentro da comunidade cipriota-grega – onde alguns se consideram os únicos detentores da República do Chipre – vários círculos económicos e políticos olham para os seus interesses como sendo mais bem servidos no actual status quo, sem a inclusão dos cipriotas-turcos.

O que é certo é que os únicos perdedores da partição do Chipre, seriam os próprios povos, que continuariam divididos dentro do seu próprio país, com a permanente incerteza e perigos pairando sobre as suas cabeças.

Perante a desinformação e a tentativa de revisão histórica em curso, que ferramentas usam e que iniciativas têm feito em defesa da reunificação do Chipre?

O AKEL é o maior pólo que expressa e une aqueles que acreditam na independência, reunificação e desmilitarização. Ao nível político, o AKEL submeteu ao presidente de Chipre uma proposta abrangente com iniciativas que devem ser tomadas quanto à comunidade cipriota-turca e em todas as outras direcções de forma a superar o actual e perigoso impasse. Infelizmente, até agora, não fomos ouvidos. No entanto, não desistimos. Estamos a mobilizar o povo em manifestações contra a ocupação e a partição, a favor da retoma das negociações por uma solução de uma federação bizonal e bicomunal. Usamos o Parlamento Europeu e outras plataformas internacionais para promover a luta pela libertação e pela reunificação. Tomamos iniciativas a todos os níveis para fortalecer a aproximação e cooperação entre cipriotas-gregos e cipriotas-turcos. Lutamos contra o nacionalismo-chauvinismo que está a ser cultivado na sociedade, no sistema de Educação e nos mass media. A solidariedade internacionalista com a luta do povo do Chipre é muito importante para nós. A resolução adoptada no parlamento português, por iniciativa do PCP, que expressa solidariedade com o Chipre, foi disto indicativa.

Tem sido persistente e incansável a acção e luta do povo cipriota para pôr um fim à ocupação turca, nomeadamente pela reivindicação da consagração de uma fe­de­ração bi­co­munal e bi­zonal. Como é que vê a continuidade desta acção num futuro próximo?

A verdade é que a actual fase é extremamente difícil. Primeiro e acima de tudo, devido à insistência da Turquia e da nova liderança cipriota-turca de Ersin Tatar em mudar a base das negociações e em discutir a solução de dois estados, ou seja, da partição. Há várias «ideias» a flutuar, desde os britânicos a outros, no sentido de uma «solução intermédia» entre uma federação e uma confederação, que também são perigosas. O presidente Anastasiades, que por um longo período de tempo parecia relutante em entrar em negociações, não foi suficientemente claro sobre a solução. Porém, nós acreditamos que a maioria do povo cipriota compreende os terríveis perigos que aparecem no horizonte. O AKEL deixou isto claro em todas as direcções. Nunca aceitaremos a partição da nossa terra e do nosso povo. É por isso que concentramos todos os nossos esforços no objectivo de retomar as negociações na base e no quadro acordados, a partir do ponto onde foram suspensas em 2017, na última conferência sobre o Chipre, em Crans-Montana (Suiça).

Tipo de Artigo: 
Entrevista
Imagem Principal: 
Mostrar / Esconder Lead: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Imagem: 
Mostrar
Mostrar / Esconder Vídeo: 
Esconder
Mostrar / Esconder Estado do Artigo: 
Mostrar
Mostrar/ Esconder Autor: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Publicação: 
Esconder
Mostrar / Esconder Data de Actualização: 
Esconder
Estilo de Artigo: 
Normal

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui

Desde a sua criação em 1941, a PEO tem sido a organização conjunta dos trabalhadores cipriotas gregos e cipriotas turcos. Infelizmente, o golpe de estado de Julho de 1974, organizado pela junta grega e pelos seus colaboradores em Chipre, a EOKA B [grupo de extrema-direita ultranacionalista], deu à Turquia a oportunidade de invadir Chipre e ocupar 36% do seu território, impondo basicamente a separação entre cipriotas gregos e cipriotas turcos, o que afectou as nossas possibilidades de representar os cipriotas turcos no Norte.

Podemos não estar activos enquanto PEO nas zonas ocupadas, mas desenvolvemos com os sindicatos cipriotas turcos progressistas, membros da FSM (Federação Sindical Mundial), uma frente comum de luta e de acções que visam a reunificação do nosso país.  

A zona ocupada está sob o controlo político e económico da Turquia. Este facto, por si só, cria muitos problemas aos cipriotas turcos, bem como grandes diferenças no nível de vida dos trabalhadores. Precisamente por esta razão, um dos principais objectivos estabelecidos pela PEO e pelos sindicatos cipriotas turcos é a criação de um sistema unificado de relações laborais e de segurança social com direitos comuns para todos, numa solução futura. 

A reunificação é ainda um objectivo imediato do PEO? Estudos recentes mostram que tanto os cipriotas gregos como os cipriotas turcos são, esmagadoramente, a favor de um Chipre unido

Para a PEO, enquanto federação sindical, as coisas são muito claras. Sem uma solução para o problema de Chipre e a reunificação do nosso país e do nosso povo, não há qualquer perspectiva viável para o povo cipriota no seu conjunto.

À medida que os anos passam sem uma solução, os factos consumados da ocupação consolidam-se e o perigo de se tornar o status quo permanente torna-se cada vez mais real.  Precisamente por esta razão, a PEO, juntamente com as lutas sociais dos trabalhadores, está também a lutar por uma solução para a reunificação de Chipre.

Que impressões ficaram das reuniões PEO realizadas recentemente com a CGTP-IN? Devem os sindicatos estar mais concentrados no desenvolvimento da acção internacional?

Em primeiro lugar, aproveito para agradecer à CGTP-IN e, em especial, à camarada secretária-geral, Isabel Camarinha, pelo convite para visitar Portugal, pela calorosa hospitalidade, fraterna, e pelo excelente programa através do qual pudemos assistir à forma como a central sindical portuguesa trabalha, ver o prestígio e o apreço de que a CGTP-IN goza entre os trabalhadores de Portugal.  

A visita confirmou que podemos estar activos em países diferentes, que temos problemas comuns, preocupações comuns, aspirações comuns. Isto torna necessário que os sindicatos com orientações ideológicas e políticas comuns desenvolvam ainda mais a sua acção e coordenação a nível internacional e europeu, especialmente em organizações como a OIT (Organização Internacional do Trabalho), em questões que dizem respeito aos trabalhadores.

Tópico

Contribui para uma boa ideia

Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.

O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.

Contribui aqui