O Comité do Património Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que se encontra reunido em Riade (Arábia Saudita), declarou esta terça-feira o Museu Sítio de Memória ESMA, em Buenos Aires, como Património da Humanidade.
Na rede social Twitter ou X, o presidente da Argentina, Alberto Fernández, divulgou uma mensagem de vídeo, na qual agradece ao comité pela decisão tomada, em especial quando o seu país assinala os 40 anos do fim da ditadura civil e militar.
«A memória colectiva é o que faz com que os povos não repitam as suas histórias e permite avançar em direcção a um futuro melhor», afirmou.
Onde hoje existe a instalação museológica, na capital argentina, funcionou o centro clandestino de detenção, tortura e extermínio da Escola Mecânica da Armada (ESMA), um dos mais de 700 que existiram no país austral durante a última ditadura (1976-1983).
Chama-se Juan e é filho de Mercedes del Valle Morales, que foi sequestrada e desapareceu em 1976, em Tucumán, durante a ditadura argentina. A identificação foi anunciada poucos dias depois da do neto 131. A presidente da associação Avós da Praça de Maio, Estela de Carlotto, confirmou esta quarta-feira, numa conferência de imprensa em Buenos Aires, a restituição da identidade ao neto número 132. De Carlotto expressou a «enorme alegria» por esta nova restituição – apenas uma semana depois de ter anunciado a do neto 131 –, no contexto da longa luta que a associação a que preside trava pela identificação das crianças que foram «ilegalmente apropriadas» durante a ditadura argentina (1976-1983). O homem que recuperou a sua identidade, indica a agência Télam, pertence a uma família «ceifada» pela ditadura cívico-militar. A sua mãe foi sequestrada quando tinha 21 anos (tinha nascido a 20 de Agosto de 1954), no dia 20 de Maio de 1976, na cidade de Monteros (província de Tucumán), e os seus restos mortais acabariam por ser identificados pela Equipa Argentina de Antropologia Forense (EAAF) em 2010 e exumados no Cemitério do Norte de San Miguel de Tucumán. Após mais de três anos de audiências, terminou, esta quarta-feira, o chamado Mega-Processo do Campo de Maio, com a condenação de 19 envolvidos em crimes perpetrados na ditadura militar (1976-1983). Ao longo de três anos e três meses, o julgamento que teve início a 29 de Abril de 2019 permitiu conhecer múltiplos detalhes dos horrores cometidos num dos maiores centros clandestinos de detenção, tortura e morte que funcionaram no período da ditadura militar na Argentina. Ao todo, foram ouvidas 327 testemunhas, foram contabilizadas 350 vítimas e foram julgados 22 réus, de que ficaram 19 no final do processo (dois morreram de causas naturais e um foi apartado da causa por doença irreversível), que foram acusados dos crimes de torturas, sequestros e homicídios, bem como de assaltos, roubos agravados e abuso sexual agravado. A declaração do veredicto do Tribunal Oral Criminal Federal n.° 1 de San Martín (Buenos Aires), adoptado por unanimidade, começou com a leitura dos nomes de todas as vítimas. Na decisão judicial, os juízes sublinham que se trata de crimes contra a humanidade e, como tal, imprescritíveis. Dez dos 19 acusados foram condenados a pena perpétua, incluindo Santiago Omar Riveros, ex-comandante do Comando de Institutos Militares, que já foi condenado a outras 16 penas perpétuas. Os restantes nove réus foram condenados a penas de prisão que oscilam entre os 22 e os quatro anos, refere o diário Página 12. Os crimes julgados foram cometidos na Zona de Defesa IV, a cargo do Comando de Institutos Militares do Campo de Maio, durante a ditadura militar na argentina (1976-1983). A procuradora Gabriela Sosti estima que tenham passado pelo Campo de Maio mais de 6000 pessoas – muitas delas dirigentes e activistas sindicais, bem como militantes de organizações de esquerda – e que o nível de sobrevivência tenha sido inferior a 1%. A Justiça argentina deu mais um passo para pôr fim à impunidade pelos crimes perpetrados durante a ditadura cívico-militar (1976-1983). Ontem, em Córdova, 28 pessoas foram condenadas a pena perpétua por crimes contra a humanidade. O Tribunal Oral número 1 de Córdova decretou a pena máxima para Luciano Benjamín Menéndez, ex-chefe do Terceiro Corpo do Exército, com assento em Córdova, a 715 km de Buenos Aires, e com jurisdição em nove províncias do Noroeste da Argentina. Hoje com 89 anos, Benjamín Menéndez foi condenado pela sua participação directa em sequestros, torturas, assassinatos, desaparecimentos de corpos e outros crimes contra a humanidade levados a cabo nos centros de detenção clandestinos de La Perla e La Ribera, informam a Prensa Latina e a TeleSur. A sentença de Menéndez, que foi a primeira a ser decretada pelo tribunal, foi celebrada com alegria e emoção por milhares de pessoas que se concentravam frente à instituição, muitas delas exibindo fotos das vítimas. Este mega processo penal foi o mais longo da história judicial de Córdova. Iniciado em Dezembro de 2012, abordou 22 expedientes por crimes contra a humanidade cometidos entre Março de 1975 e 1979 nos centros clandestinos de detenção, tortura e extermínio de Córdova conhecidos como La Perla (o maior do interior da Argentina durante a ditadura), Malagueño o Perla chica, Campo La Ribera e D2. No processo, figuraram 720 vítimas, 581 testemunhas e 43 arguidos – que chegaram a ser mais de 50. Durante as mais de mil horas de audiência, destaca-se ainda o facto de, pela primeira vez, o roubo de bebés ter sido julgado em Córdova. Trata-se, em concreto, da subtracção do bebé de Silvina Monica Parodi Orozco, nascido em cativeiro. A mãe, grávida de seis meses, foi sequestrada, tendo desaparecido posteriormente, tal como o seu marido, Daniel Francisco Orozco. A criança de então ainda é procurada pela avó, a presidente da filial cordovesa das Avós da Praça de Maio, Sonia Torres (mãe de Silvina Parodi), refere a Prensa Latina. O tribunal decretou ainda nove condenações a penas até 21 anos de cadeia e seis absolvições. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Sosti destacou o modo como a repressão se centrou nas «empresas siderúrgicas que nesse momento marcavam o perfil argentino» e onde existia «uma classe operária muito consciente e militante». Pela boca de um dos acusados – disse –, pôde-se saber «que altas patentes militares se juntavam com empresários da zona norte, ou seja, a pouca distância de onde eram torturados os seus trabalhadores, os responsáveis dessas fábricas encontravam-se com os quadros militares». Entre os cidadãos sequestrados que foram para ali levados, contam-se 14 mulheres grávidas e nove pais de crianças roubadas, referiu a organização Avós da Praça de Maio, que continua à procura de dez crianças, cuja identidade foi alterada. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Foram igualmente sequestrados – e continuam desaparecidos – os avós de Juan, José Ramón Morales e Toribia Del Tránsito Romero, e um tio chamado Julio César Morales. Segundo explicou De Carlotto, a busca de Juan pelo conhecimento da sua identidade começou em 2004, depois do falecimento daqueles que considerava seus pais biológicos, quando os seus irmãos lhe confessaram que não era assim e lhe entregaram o seu primeiro documento nacional de identificação. Juan dirigiu-se então à Comissão Nacional pelo Direito à Identidade (Conadi) para tentar saber mais sobre os seus antepassados biológicos e, após investigações e estudos de ADN no Banco Nacional de Dados Genéticos (BNDG), em 2008 constatou que Mercedes era a sua progenitora, tal como aparecia no seu primeiro documento de identificação, disse De Carlotto. Conhecida a identidade da mãe, Juan quis saber quem era o pai. Para confirmar se tinha sido «vítima de apropriação», era preciso saber se quem o registara como filho próprio era ou não o verdadeiro pai. Como este já tinha falecido, foi necessário recorrer à exumação do corpo e à comparação dos perfis genéticos, explicou a presidente das Avós da Praça de Maio. Mercedes Colás de Meroño, Porota, morreu esta quarta-feira, em Buenos Aires, com 95 anos. Dedicou boa parte da vida a lutar por memória, verdade e justiça para detidos e desaparecidos na ditadura militar. A presidente das Mães, Hebe de Bonafini, revelou que Porota, como era conhecida pelas suas companheiras, estava há vários meses doente e que, depois de ter fracturado a anca, nunca mais se recompôs. «Foi-se embora devagarinho. Todos os dias morria um pouco», disse Bonafini numa carta de despedida, na qual evocou também uma vida de luta e de sofrimento. A vice-presidente da Associação Mães da Praça de Maio nasceu na Argentina em 1925, mas emigrou para Espanha em 1931, com a sua família, depois do golpe de Estado de 1930. O seu pai, José María Colás, era um pedreiro e anarquista navarro, natural de Lodosa. De regresso à sua terra, José filiou-se na central anarquista CNT e, em Agosto de 1936 – durante a Guerra Civil espanhola –, foi fuzilado pelos fascistas. Mercedes era uma menina de 11 anos. Raparam-lhe a cabeça e «passearam-na» pela terra – como então fizeram a tantas outras raparigas e mulheres – como humilhação por ser filha de um «fuzilado vermelho». Algum tempo depois, Porota conseguiu fugir de Espanha através de França e, juntamente com a sua mãe e irmão, regressar à Argentina. Ali, viria a casar com Francisco Meroño, um trabalhador têxtil, com quem teria a sua filha Alicia. Esta viria também a militar em movimentos de esquerda e, em Janeiro de 1976, com 31 anos de idade, foi sequestrada e feita desaparecer pela ditadura argentina, como aconteceu a cerca de 30 mil pessoas no país austral. Quando falava da sua filha, Porota costumava dizer às reportagens que lhe tinha chamado Alicia porque esse nome, ao ser dito, nos obrigava a sorrir: «Mirá, probá, A-li-cia», refere o diário Página 12. Uma vez, contou que a primeira vez que foi à Praça de Maio, para se juntar aos protestos das mulheres que reclamavam o aparecimento dos seus filhos, comprou «um lenço dos que se usam para dançar», pô-lo na cabeça e sentou-se num banco. Então, disse, aproximou-se de uma mulher que participava na manifestação e que lhe perguntou: «A ti quem te falta?». «Eu chorava e respondi-lhe "a minha filha" e ela disse-me "aqui não se vem para chorar, vem-se para lutar, por isso levanta-te e vamos"», recordou Porota, citada pelo Página 12, a propósito do desafio da luta colectiva que travam as Mães da Praça de Maio. Como vice-presidente da Associação, manteve reuniões, juntamente com as suas companheiras, com líderes mundiais como Fidel Castro, Yasser Arafat, o subcomandante Marcos (em plena selva de Chiapas, no México), Lula da Silva, Evo Morales, Rafael Correa e Hugo Chávez, entre outros. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença. Essa medida foi decretada pela Procuradoria de Tucumán de crimes contra a humanidade, que esta quarta-feira informou Juan «que não é filho de quem o criou e confirmou que efectivamente foi vítima de roubo, ocultamento e substituição de identidade no quadro do terrorismo de Estado», disse De Carlotto. Na verdade, ficou-se a saber que a família que criou Juan era dona da quinta em que trabalhava a sua mãe biológica, indica a Prensa Latina. «Hoje abraçamo-lo como o nosso neto 132 e, como um quebra-cabeças que nunca acaba, iniciamos um novo caminho para poder encontrar o seu verdadeiro pai», afirmou De Carlotto. «Apesar da dor que traz cada uma destas histórias, juntamente com a constatação da árdua tarefa que é reconstruir o que a ditadura quis apagar, continuamos a festejar a vida com a alegria que nos dá a conquista da verdade. Por um 2023 com mais encontros, verdades e identidades», frisou. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Internacional|
Avós da Praça de Maio confirmam identidade do neto 132
Internacional|
Condenados na Argentina responsáveis por crimes contra a humanidade
No Campo de Maio, o nível de sobrevivência era inferior a 1%
Internacional
28 condenados a pena perpétua por crimes na ditadura argentina
Contribui para uma boa ideia
Contribui para uma boa ideia
Busca da identidade do pai
Internacional|
Faleceu «Porota», vice-presidente das Mães da Praça de Maio
«A-li-cia» e «aqui não se vem para chorar, vem-se para lutar»
Contribui para uma boa ideia
«Continuamos a festejar a vida»
Contribui para uma boa ideia
Pela sua condição de prova em processos judiciais por crimes contra a humanidade, ao ser recuperado, o local não foi alterado, permanecendo como foi descrito nos depoimentos dos sobreviventes no chamado Julgamento das Juntas (1985) contra as principais chefias militares daquele período e nos processos retomados a partir de 2004.
Pela ESMA passaram cerca de 5000 presos sociais e militantes políticos, trabalhadores, estudantes, profissionais e artistas, que foram sequestrados por elementos das Forças Armadas e das forças de segurança – a maior parte dos quais seria atirada viva ao mar.
Além disso, nasceram ali centenas de crianças que viriam a ser separadas das suas mães e ilegalmente apropriadas ou roubadas.
Para que ninguém, na Argentina, possa negar e esquecer o horror
«Na ESMA, expressou-se o pior do terrorismo de Estado. A Argentina desses anos sofreu a perseguição de todos os que se opunham à ditadura militar. Alguns foram perseguidos, alguns foram detidos, quase todos foram submetidos a torturas. Outros acabaram exilados, muitos foram assassinados, muitos desapareceram da face da Terra», disse o chefe de Estado.
Fernández lembrou que, por ali, passaram homens e mulheres, que depois foram atirados ao Rio da Prata nos chamados voos da morte. «Até ao dia de hoje, continuamos a procurar os seus corpos», afirmou.
Neste contexto, evocou as Mães e Avós da Praça de Maio, «procurando, com desespero, os seus filhos e netos nascidos no cativeiro».
«Foi uma luta exemplar, que encararam mulheres que nunca claudicaram e enfrentaram os ditadores mais ferozes que a Argentina recorda», enfatizou.
«Quando cumprimos 40 anos de democracia, não consigo contar-lhes a tranquilidade que sinto pelo facto de a ESMA ser um sítio de memória da Unesco, para que ninguém na Argentina possa negar ou esquecer o horror que se viveu ali», disse.
Contribui para uma boa ideia
Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.
O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.
Contribui aqui