Depois de um ano em que, pela primeira vez na nossa história, as comemorações populares do 25 de Abril não estiveram nas ruas do País, por força da pandemia, 2021 é um ano de retoma dos festejos onde estes pertencem: as ruas do povo.
Por seu turno, a Assembleia da República volta a assinalar este ano a data com uma comemoração limitada nas presenças, por motivo das restrições associadas à pandemia.
Recorde-se que em 2020, como consequência da incerteza dominante em torno da pandemia, e enquanto se vivia o primeiro confinamento, se optou, a nível nacional, por dinamizar a iniciativa «Grândola à janela». A Associação 25 de Abril e várias outras organizações cívicas, sindicais e partidárias propuseram a todos os portugueses que cantassem a música de José Afonso, «Grândola, Vila Morena», uma das senhas do Movimento das Forças Armadas (MFA) na noite da Revolução.
Apesar dos sobressaltos demagógicos e populistas, a Assembleia da República não suspendeu a democracia e comemorou o 25 de Abril. À tarde, 15h, a Grândola vai cantar-se à janela e trazer Abril à rua. Aconteceu esta manhã no plenário da Assembleia da República (AR) a sessão solene evocativa dos 46 anos do 25 de Abril de 1974, uma cerimónia que, embora realizada num formato reduzido, contou também com a participação de diversas personalidades convidadas, incluindo o antigo Presidente da República, Ramalho Eanes. Já quanto a Cavaco Silva, o também ex-Presidente declinou o convite e não marcou presença, o que não surpreendeu face à difícil relação que mantém com o dia da Revolução. Aliás, ainda está na memória de todos a dificuldade com que lidou com a solução política saída das eleições de 2015. Outras personalidades convidadas lamentaram não poder participar, como foi o caso de Mota Amaral, que justificou a ausência com as restrições impostas a viagens entre os Açores e Lisboa. Aliás, o social-democrata e ex-presidente da Assembleia da República exprimiu a Ferro Rodrigues o seu apoio à decisão de comemorar na Assembleia da República a Revolução do 25 de Abril, desejando-lhe força para aguentar a crítica «dos que não gostam do espírito de Abril». A sessão abriu com uma intervenção de Ferro Rodrigues, presidente da Assembleia da República, sublinhando o facto de, mesmo na inédita situação de estado de emergência, a AR não ter parado e de manter intactos os seus poderes, seguindo-se as intervenções dos representantes de todos os partidos com assento parlamentar. José Luís Ferreira do PEV, lembrou o fascismo, a censura e a guerra colonial. O deputado do PEV falou da importância do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e dos ataques de que tem sido alvo, nomeadamente pelo governo PSD/CDS, enquanto a líder parlamentar do PAN apontou para a necessidade de cumprir Abril na saúde, na habitação, na educação e na exigência de se combater a pobreza, que atinge mesmo aqueles que trabalham. Telmo Correia, líder parlamentar do CDS/PP, fez questão de centrar o seu discurso na discordância do seu partido relativamente a esta sessão solene, voltando a criticar a sua realização. Jerónimo de Sousa, por seu lado, falou do 25 de Abril como um tempo novo que não pode ser apagado nos tempos difíceis que vivemos, recordando que estão de volta os que «há pouco diziam que vivíamos acima das nossas possibilidades», com «velhas receitas» a agigantar «catastróficos cenários» e ensaiando, de novo, «o discurso da inevitabilidade do corte dos salários, das pensões e dos direitos». Recordando que «não é inevitável que o surto epidémico se traduza em regressão na vida dos trabalhadores e povo», o secretário-geral do PCP sublinhou que «os portugueses não estão todos nas mesmas condições», nomeadamente «os que continuam a colocar milhões na Holanda e nos offshore para fugir ao fisco e aqueles que vão passando de emprego precário em emprego precário e sem meios de vida», enquanto os que «estão na origem das gritantes desigualdades existentes» se arvoram agora em «campões do consenso nacional». O líder comunista, depois de falar ainda da «importância dos serviços púbicos» e da «falácia do discurso da diabolização do Estado e do investimento público ou da despesa pública», concluiu com a necessidade de «recuperar para o País o que nunca devia ter sido privatizado», no sentido de «produzir cá o que nos impuseram comprar lá fora, modernizando e diversificando as actividades económicas». Moisés Ferreira lembrou o significado do 25 de Abril, valorizando o SNS e lembrando que este é filho da Revolução, ao mesmo tempo que criticou o sector privado que faz da saúde um negócio. Falou da exigência no emprego, na justiça social e no papel do Estado nos sectores estratégicos da economia. Rui Rio referiu a importância da resposta da legalidade democrática à crise sanitária e o facto de a democracia não estar suspensa. O líder social-democrata sublinhou ainda que Portugal deve prepara-se para uma eventual nova vaga do surto e a exigiu o reforço do SNS em toda a sua dimensão, esquecendo o papel do PSD na destruição dos serviços públicos, incluindo do próprio Serviço Nacional de Saúde. Ana Catarina Mendes saudou o 25 de Abril de 1974 e as suas conquistas, nomeadamente a descolonização e a paz. Recordou o fascismo e a tortura, a emigração forçada e as mulheres sem igualdade de direitos. A líder parlamentar do PS falou da consolidação da democracia, valorizando o papel da AR e sublinhando que o medo não pode sequestrar a liberdade. Evocou também o 25 de Abril de há 45 anos, dia em que foi eleita a Assembleia Constituinte. Por fim, o Presidente da República encerrou a sessão, com um discurso onde sublinhou o facto de a AR não ter interrompido a sua actividade e o seu papel fiscalizador, considerando mesmo que teria sido civicamente vergonhoso se o tivesse feito. Marcelo Rebelo de Sousa destacou ainda ser essencial evocar datas como o 25 Abril, o 10 de Junho, o 5 de Outubro ou o 1 de Dezembro. Depois de recordar que cumprir Abril é também combater a actual crise de saúde e a crise social, evocou os líderes dos quatro partidos da Assembleia Constituinte e os dois únicos deputados constituintes presentes nesta sessão, ele próprio e Jerónimo de Sousa. Após as comemorações oficiais desta manhã, à tarde é a vez das comemorações populares. A Comissão Promotora das Comemorações Populares do 25 de Abril apelou a todos os cidadãos para que, às 15h, se «reúnam» à janela para cantar a «Grândola» e o Hino Nacional, celebrando assim a Revolução de Abril. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
Abril sempre, agora mais que nunca
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Já este ano, na capital do País, a decisão de se realizar novamente o desfile foi tomada no seio da comissão promotora das comemorações populares, e a ideia, para já, é a de encurtar ligeiramente o trajecto, começando na rotunda do Marquês e terminando nos Restauradores, quando, em anos anteriores, terminava no Rossio.
Assim, a Avenida da Liberdade vai novamente comemorar Abril, mas a comissão promotora também propõe que quem não puder estar presente volte a cantar a «Grândola» à janela, pelas 18h.
«Vai ser um 25 de Abril seguro. O 1.º de Maio do ano passado foi fundamental para que isto acontecesse e muitas acções de luta que se seguiram foram perfeitamente seguras, sem registo de terem contribuído para quaisquer focos de infecção», explica AbrilAbril Rita Branco, dirigente da Interjovem/CGTP-IN, uma das organizações promotoras da iniciativa.
Para esta jovem enfermeira, é inaceitável que se utilize a «desculpa do vírus» para «confinar direitos». Por isso, entende que «é importante os jovens demonstrarem descontentamento» com a destruição de direitos conquistados por gerações anteriores.
«Não queremos outro caminho senão aquele que foi conquistado no 25 de Abril», reforça a sindicalista, que explica também que «os jovens não estão conformados», até porque se vive «um dia-a-dia em que é ter dificil ter um emprego e um trabalho com direitos». Critica ainda a imposição do teletrabalho como regra, ainda por cima «quando as despesas ficam do lado dos trabalhadores».
«Os jovens vão estar presentes [no desfile do 25 de Abril] e o 25 de Março foi um exemplo disso», avança Rita Branco, que entende que «estamos a lutar pelo que é essencial e básico. É impossível para um jovem viver com um salário de 600 euros e pagar rendas de casa de 400 euros ou mais. Há muita coisa por concretizar, como o direito à cultura, ao desporto, à parentalidade, entre outros, e lutamos para que os façam cumprir. Os direitos existem e têm de se cumprir».
Em todo o País, sair é rua em Abril é de «extrema importância»
No Porto, as comemorações já estão a ser desenhadas pela comissão promotora. O AbrilAbril falou com Tiago Oliveira, dirigente da União de Sindicatos do Porto, que lembrou a importância de «trazer o 25 de Abril novamente à rua, afirmando as principais reivindicações dos trabalhadores e do povo».
Para o sindicalista, «o sentimento geral é de que se deu um passo em frente quanto à consciência da importância de trazer para a rua os problemas vividos pelo povo nos dias de hoje», o que também se sente na preparação do 1.º de Maio.
Assim, o Porto vai ter o «Desfile da Liberdade», que sai pelas 14h30 das instalações antigas da PIDE e ruma até à Avenida dos Aliados. Está ainda a ser articulada com a Câmara Municipal do Porto a realização de um concerto no dia 24 de Abril, pelas 22 horas.
Durante anos, as escolas ensinaram que ao libertador 25 de Abril se seguiu um período de excessos revolucionários e que o 25 de Novembro teria devolvido a democracia portuguesa à sua pulsão original. Sucessivas gerações de jovens aprenderam, nos bancos das escolas, que ao libertador 25 de Abril se seguiu um período de excessos revolucionários em que a tentação de um regime totalitário de esquerda pairou sobre Portugal. O 25 de Novembro teria sido feito para afastar esse perigo e restituído a democracia portuguesa à sua pulsão original. Deste movimento, a democracia portuguesa, tal como a conhecemos, seria a mais directa herdeira, expressando os anseios da maioria do povo e não da minoria revolucionária que teria «usurpado» o poder no PREC de 1975. A permanente colaboração do «arco de governação» do regime – como se auto-designaram o PS, o PPD/PSD e o CDS/PP – foi tão estreita, durante quase 40 anos, que a simples perspectiva dos acordos de incidência parlamentar entre o PS e os partidos das bancadas à esquerda no Parlamento (PCP, BE e PEV) deixou a direita portuguesa (incluindo a que se encontra na orla do PS) em estado de choque, predestinando catástrofes e demónios (o «diabo» que aí vinha e que se perdeu no caminho), no que foi acompanhada pelos meios de comunicação de referência – habituados e adequados ao «centrão» – nos quais se desencadeou uma virulenta campanha contra a nova solução política. Dois anos depois, com muito ainda para fazer, o país confirma aquilo que os opositores à política de direita vinham de há muito a afirmar e a defender: que governar com a esquerda (mesmo se o governo não é de esquerda mas apenas unicolor do PS) é possível, necessário e benéfico não só para os trabalhadores como para os interesses do povo português. E que quanto mais forte for a esquerda consequente menos vacilante será a tentação de direita do governo PS, após ter ultrapassado o jejum de governação de vários anos. A «narrativa tradicional» foi desde sempre negada por aqueles que se afirmaram, ao longo destes anos, em teoria e na prática, herdeiros e defensores das conquistas revolucionárias obtidas pelos trabalhadores e pelo povo português com a Revolução de Abril, mas era aceite por todo o restante espectro político e de opinião. «o 25 de Novembro esteve na origem da destruição das conquistas da revolução» baptista Alves, coronel na reserva Recentemente, fruto do novo quadro político, têm surgido publicações que contestam a «narrativa tradicional» em vários aspectos. É o caso dos livros de Ribeiro Cardoso, O 25 de Novembro e os media estatizados, e de Miguel Carvalho, Quando Portugal ardeu, ambos publicados em 2017. No primeiro é posto em causa o pretenso «assalto aos meios de comunicação» que teria sido feito em 1975 por militantes revolucionários e exposto o violento processo de saneamentos e apropriação dos meios de comunicação que se seguiu ao 25 de Novembro. No segundo é o combate da direita (por vezes até ao PS, como fica claro) contra a pretensa «tentativa de sovietização» da sociedade portuguesa que se desmascara como não tendo passado de um pretexto invocado pela contra-revolução para desencadear uma campanha de violência contra civis e associações políticas que os seus representantes no actual parlamento sempre esquecem quando se trata de invocar os seus pergaminhos democráticos. É também o caso do, e mais recente, Diário da Contra-Revolução, apresentado ao público no passado dia 12 de Abril pela Associação Conquistas da Revolução (ACR). Para falar sobre o livro, que se publica por ocasião do 44.º aniversário do 25 de Abril de 1974, o AbrilAbril falou com dois dos fundadores e dirigentes da associação que tão firmemente tem pugnado pela conservação da memória da Revolução de Abril e dos revolucionários que a protagonizaram. A Associação Conquistas da Revolução (ACR) tem por mote «Defender Abril | Construir o Futuro». Criada em 2011, o seu objectivo é «preservar, divulgar e promover o apoio dos cidadãos aos valores e ideais da Revolução, iniciada em 25 de Abril de 1974, esse que foi o momento mais luminoso da História de Portugal, cultivando o espírito revolucionário e a consciência social progressista, com a construção de uma democracia política, económica, social e cultural amplamente participada, que a Constituição da República Portuguesa, aprovada em 2 de Abril de 1976, viria a consagrar». Além das diversas iniciativas que tem promovido e das edições que tem vindo a publicar, um dos pontos altos da sua actividade foi a realização, em 2014, do Congresso Conquistas da Revolução, por ocasião do 40.º aniversário da Revolução de Abril. Fomos recebidos pelo comandante Manuel Begonha e pelo coronel Baptista Alves, pouco antes do jantar comemorativo anual dos associados e amigos da ACR. Manuel Gastão Nunes Bacelar Begonha, capitão-de-mar-e-guerra engenheiro mecânico, teve uma participação destacada no chamado Processo Revolucionário em Curso (PREC), designadamente como membro do Conselho de Classes da Armada e da Assembleia do Movimento das Forças Armadas (MFA), Delegado do Conselho da Revolução e como coordenador da Comissão Dinamizadora Central (CODICE) da 5ª Divisão do EMGFA, sendo responsável pelas Campanhas de Dinamização Cultural e Acção Cívica. José Manuel da Costa Baptista Alves, coronel engenheiro electrotécnico da Força Aérea, regressou de uma comissão de serviço em Angola para integrar uma comissão civil no extinto Fundo de Fomento de Habitação durante os IV, V e VI governos provisórios, além de ter exercido diversos cargos militares no âmbito da sua especialidade. Manuel Begonha esteve à frente da direcção durante os primeiros mandatos dos corpos gerentes e é o presidente da Mesa da Assembleia-geral para o período de 2018 a 2021. Baptista Alves é o Presidente da Direcção no mesmo mandato. Ouçamo-los. A associação propõe-se «preservar a memória de Vasco Gonçalves» e dos militares e civis que participaram no processo revolucionário, recolhendo os testemunhos dos que viveram e protagonizaram esse período extraordinário da nossa história. «Sem deixar testemunhos», refere Manuel Begonha, «outros podem dizer o que quiserem» sobre os eventos desse período e as figuras revolucionárias que incorporaram a vontade de libertação do povo português, as quais, tendo responsabilidades no Estado saído da Revolução de Abril, se colocaram ao serviço das populações e da esperança destas num Portugal democrático e socialista1. O 25 de Abril «começou por ser um golpe de estado a que se seguiu uma revolução» protagonizada pelo povo, e é sob o impulso deste que as leis são criadas. Por essa razão – considera Manuel Begonha – «os decretos-lei publicados – sobretudo a partir do Segundo Governo Provisório, chefiado por Vasco Gonçalves – reflectem com veracidade o andamento da revolução». Aponta também que «a maior parte dos decretos-lei revolucionários, ao contrário do que se pensa, foi publicado durante a vigência deste governo», entre Setembro de 1974 e Março de 1975, e não depois da tentativa de golpe de 11 de Março. Os decretos-lei, afirma Manuel Begonha, «constituem um importante instrumento de consulta» para quem queira conhecer e compreender a verdadeira história da Revolução de Abril na sua fase ascendente e foi essa noção que impulsionou as primeiras publicações da Associação Conquistas da Revolução (ACR). Em 2014, a marcar o 40.º aniversário do 25 de Abril, a ACR publicou Vasco: nome de Abril e Conquistas da Revolução. O primeiro livro é dedicado ao militar que, à frente de quatro governos provisórios, entre Julho de 1974 e Setembro de 1975, desempenhou «um papel determinante» durante o período «mais exaltante, inovador e criativo da revolução portuguesa». O livro reúne os «depoimentos de 72 pessoas com conhecimento directo de Vasco Gonçalves» e ajuda a compreender melhor a personalidade do homem cujo nome se liga indissoluvelmente ao processo revolucionário e libertador em Portugal. Conquistas da Revolução reúne os decretos-lei que plasmam «os históricos avanços sociais, políticos, económicos e culturais» decorrentes da aliança entre o movimento operário e popular e os militares revolucionários do MFA, que se traduziram em «profundas transformações revolucionárias (liberdade; paz; direitos laborais, sociais e culturais; nacionalizações; reforma agrária; descolonização; independência nacional)» que viriam a ser consagradas na Constituição da República Portuguesa de 1976. A legislação é dividida por dois capítulos, «Liberdades de Abril» e «Processo revolucionário», sendo completada por depoimentos de Duran Clemente, Manuel Begonha e Modesto Navarro, e de um conjunto de anexos explicativos. Tratou-se de um «trabalho exaustivo de selecção sobre os decretos-lei representativos do período», em que, por vezes, «os preâmbulos eram mais importantes» do que os conteúdos legislativos. O coronel Baptista Alves foi o impulsionador do projecto editorial e, desde o início, previu a sua continuidade, desta vez historiando a contra-revolução legislativa que se desenvolveu a partir do Primeiro Governo Constitucional. O Diário da Contra-Revolução cobre, com metodologia igual à do precedente volume, os decretos-lei publicados entre 1976 e 1982, do primeiro ao oitavo governos constitucionais. A ordem cronológica dos decretos-lei mantém-se, sendo completada por uma série de «textos temáticos, testemunhos de revolucionários», abordando os direitos atingidos pela acção legislativa contra-revolucionária dos sucessivos governos nesse período. Colaboram na edição Abílio Fernandes, Américo Nunes, Avelãs Nunes, António Gervásio, Modesto Navarro, António Quintas, Carlos Carvalho, Carlos Silva Santos, Fernando Correia, Jorge Sarabando, José Ernesto Cartaxo, Lino Paulo, Maria José Maurício, Mário Nogueira, Marques Pinto, Nuno Lopes e Ribeiro Cardoso. «O futuro com que sonhei não é cada vez mais saudade, é, sim, cada vez mais, necessidade imperiosa. Assim o povo o compreenda» vASCO gONÇALVES Aí se coloca o «25 de Novembro como ponto de partida para a contra-revolução» que atingiu a economia (nacionalizações, reforma agrária), os direitos laborais (unidade sindical, controlo operário, contratos de trabalho), os direitos sociais (educação, saúde, habitação, direitos das mulheres, cultura, comunicação social) e mesmo as relações internacionais (integração europeia, relações entre Portugal e Angola). Os decretos-lei demonstram – afirma Baptista Alves – que «o 25 de Novembro esteve na origem da destruição das conquistas da revolução», sobretudo naquela operada durante os dois primeiros governos constitucionais, em que foram «tomadas as medidas mais destruidoras». O livro termina com a primeira revisão constitucional, em 30 de Setembro de 1982, na qual é extinto o Conselho da Revolução, e anuncia volumes posteriores, que prosseguirão a inventariação da contra-revolução legislativa – com particular atenção à que decorreu durante o período que ficou conhecido como do «cavaquismo» – até à derrota do governo PSD/CDS em 2015 e da criação de um novo quadro legislativo parlamentar. Em jeito de balanço, Baptista Alves distingue os dois períodos legislativos, o revolucionário e o contra-revolucionário, pela diferença da interacção entre as autoridades (governos e Estado) e o povo: no primeiro período «é o povo que faz a revolução e os decretos-lei andam atrás do povo»; no segundo período é «a contra-revolução» assente nos governos e no Estado que «pretende vergar o povo pela lei», recorrendo à repressão mais violenta sempre que necessário – como foi o caso dos assassínios de defensores da Reforma Agrária, no Alentejo, e de sindicalistas durante o 1.º de Maio de 1982, no Porto. Também afirma ser fácil distinguir os revolucionários dos contra-revolucionários na actividade legislativa realizada até à primeira revisão constitucional: enquanto «os primeiros afirmam as suas convicções claramente» nos preâmbulos que justificam a legislação produzida, os segundos alteram essa legislação dizendo-se, inicialmente, seus partidários, para «apenas mais tarde se assumirem como na realidade são: seus opositores» - é o caso, flagrante, da lei que a pretexto da unidade sindical combateu, efectivamente, esta. Ao despedirem-se, os dois militares chamaram a atenção para a frase de Vasco Gonçalves que encerra o livro: «O futuro com que sonhei não é cada vez mais saudade, é, sim, cada vez mais, necessidade imperiosa. Assim o povo o compreenda». É desta necessidade imperiosa, que a inversão de um longo processo contra-revolucionário vem de novo alimentar de esperança o povo português, que se construirão os caminhos do futuro. 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Defender Abril com os olhos no futuro
Um mito que se desmorona
Uma associação para a memória de Abril
Contra o esquecimento do que verdadeiramente foi o 25 de Abril
A contra-revolução legislativa contra o 25 de Abril
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Já em Coimbra, João Pinto Ângelo, membro do Ateneu de Coimbra, colectividade que é tradicionalmente a principal dinamizadora e que participa na comissão promotora destes festejos em conjunto com mais de 50 organizações, explicou que se prevê a realização de uma concentração às 15h na Praça da Canção.
Para Pinto Ângelo, isto é de «importância extrema», uma vez que, se «o 25 de Abril e os direitos que dele resultaram foram conquistados na rua, a sua afirmação também tem de ser feita na rua». «A ideia de celebrar outra vez na rua surgiu quase no dia 26 de Abril do ano passado, sentiu-se uma ânsia colectiva», disse o dirigente associativo, acrescentando que se nota que «há muita gente que quer voltar a sair à rua neste dia para celebrar, lutar, protestar. São muitos os motivos». E o Ateneu, pelo hábito de participar na dinamização das comemorações, «tem responsabilidade de abrir este dia a todos os que querem exigir a resolução dos seus problemas nos dias de hoje».
Já António Goulart, da União dos Sindicatos do Algarve, explicou que a «plataforma que integra vários sindicatos e organizações da sociedade civil» está a organizar um acto público no dia 25 de Abril às 15h, no Largo de S. Pedro, em Faro, com intervenções das organizações e um momento cultural pelo Grupo de Jograis Acanto-TC.
Para o dirigente sindical «é tempo de regressar à rua», mesmo que ainda não seja possível retomar acções com dimensões de anos anteriores. Isto porque, no momento em que vivemos, «afirmar os valores da Revolução é também dar combate àquelas forças que lhe são contrárias». E reafirma que «a experiência que o movimento sindical ganhou ao longo deste tempo é fundamental para nos permitir organizar uma iniciativa com toda a segurança sanitária».
«Há muita coisa por concretizar, como o direito à cultura, ao desporto, à parentalidade, entre outros, e lutamos para que os façam cumprir. Os direitos existem e têm de se cumprir»
Rita BRanco, interjovem
José Russo, presidente da Junta de Freguesia da Malagueira e Horta das Figueiras, fez notar o regresso das «Vozes de Abril», que ocorre com a organização de todas as juntas de freguesia urbanas, com o apoio da Câmara Municipal de Évora. «É muito importante voltar às comemorações nas ruas, mesmo que os constrangimentos impliquem precaução», defende, ao mesmo tempo que explica que se trata de «uma iniciativa que sempre se fez com o movimento associativo, que envolve todos os grupos corais da cidade», e que envolve associações de bairro e de reformados.
A iniciativa desenvolve-se através de «mini-concertos que vão ao encontro das pessoas onde elas estão». Pese embora haver ainda grupos que tradicionalmente participavam na acção cultural e não retomaram a actividade, estão já confirmadas as participações das Vozes do Imaginário e da Eborae Musica. A par disso, José Russo explica que desafiaram «um conjunto de músicos da cidade, de bandas filarmónicas, estudantes». Assim, perto de 20 músicos vão preencher este espaço, em grupos ou a solo, para dar «70 mini-concertos em quatro dias nos mais diversos lugares da cidade». Passam pela Praça do Giraldo e outros locais icónicos da cidade, estarão à porta de escolas, fábricas, mercados, entre muitos outros lugares. «No dia 25 de Abril acontece o concerto em Nossa Senhora de Machede», disse.
Uma das características desta iniciativa é ter um «programa não anunciado, porque são concertos de dez minutos onde se toca a "Grândola" e mais dois temas escolhidos pelos grupos».
Já em Beja, Vítor Picado, vereador na Câmara Municipal de Beja, explicou ao AbrilAbril que se está a organizar uma marcha na cidade dinamizada pelas forças que compõem a CDU, juntamente com muitos democratas. «No âmbito do 47.º aniversário da Revolução Abril, a CDU decidiu trazer à rua a luta dos trabalhadores e de todos os que vêm os seus direitos atacados na pandemia». Assim, o autarca faz um «apelo ao trabalhadores em lay-off, no desemprego, de vários sectores, para que se juntem à construção de um futuro de esperança», participando no desfile, às 14h30, que parte do Cineteatro Pax Julia em direcção ao Jardim do Bacalhau.
Estão garantidas todas as regras sanitárias e o vereador confia num «comportamento cívico responsável», realidade que se estende também à construção do 1.º de Maio. Estes são momentos que, para Vítor Picado, traduzem «a defesa da democracia e do Estado de Direito, assim como a democraticidade e o reforço da cidadania».
No 45.º aniversário da Revolução do 25 de Abril, em que dezenas de milhares de pessoas participaram no habitual desfile em Lisboa, o AbrilAbril falou com várias pessoas sobre a importância do dia nas suas vidas. Ao início da tarde, já milhares de pessoas começavam a reunir-se junto à Praça do Marquês de Pombal, em Lisboa, para participarem no tradicional desfile que comemora a Revolução de 25 de Abril de 1974, a qual faz 45 anos. Começando a descer a Avenidade da Liberdade, o AbrilAbril encontrou Luís Oliveira, ex-trabalhador da Caixa Geral de Depósitos, entretanto reformado, que se encontrava a assistir ao arranque do desfile, junto ao passeio, e aceitou falar. Questionado se tinha o hábito de participar nas comemoraçoes, Luís Oliveira afirmou que vem «sempre ao desfile» desde que este teve início, assinalando que, «curiosamente não assisti ao 25 de Abril em pessoa, porque estava a recuperar de uma intervenção cirúrgica, mas foi o único que falhei». Luís Oliveira explicou que, à altura da revolução de Abril, tinha 18 anos de idade e que o País antes do 25 de Abril era «triste». «Conhecia bem o que se passava à minha volta. Nas traseiras da minha casa havia um imenso bairro de lata que se extendia até Sete Rios, antes tínhamos muito pouco», lamentou. «O que a gente assiste, após 45 anos, é que, apesar de terem havido retrocessos, as conquistas foram enormes. Não há nenhuma comparação entre o Portugal de agora e o Portugal de há 45 anos atrás. Vivemos num País diferente e isso só começou a partir de 25 de Abril de 1974», sublinhou. Por sua vez, Maria Almeida, uma jovem mãe que participava no desfile com o seu filho de dez meses, aceitou falar com o AbrilAbril, tendo explicado que há já vários anos que vem às comemorações mas que é a primeira vez que vem com o seu filho. «Acho que é muito importante virmos às comemorações do 25 de Abril. É uma maneira de, para além de comemorar esta data, fazer cumprir aquilo que foi conquistado com a revolução», afirmou. Para Maria Almeida, o 25 de Abril trouxe grandes avanços para as mulheres, «não só em termos de liberdade, face à subjugação a que estavam sujeitas», mas sobretudo devido a outras conquistas, como os «direitos da maternidade». «Hoje ainda há muito a fazer nesse âmbito, mas actualmente temos mais apoios e condições nesse sentido, como os apoios pré-natais, as licenças de maternidade, tudo isso foram conquistas da revolução» sublinhou. Por outro lado, a jovem mãe afirmou que, apesar de «não ter vivido na altura», sabe que o 25 de Abril trouxe «muitos progressos». «Não só a liberdade e democracia, que acho que são muito importantes, mas também no acesso ao ensino, aos cuidados de saúde ou a uma habitação digna», acrescentou. Já Henrique Costa, um jovem brasileiro vive em Portugal há 12 anos, depois de os seus pais terem emigrado para cá, disse que também tem o hábito de vir às comemorações, tendo afirmado que a revolução de Abril é «inspiradora». «Para mim, como brasileiro e pessoa que não nasceu cá, considero que a revolução de Abril é um momento singular da história portuguesa, em que se rompeu com o fascismo, para um período novo de luta e resistência do povo para transformar o País e conquistar direitos, como o direito à habitação e o direito à igualdade», frisou. Segundo Henrique Costa, no Brasil não houve «um processo destes tão forte e tão aglutinador», de «luta na rua para transformar o País e conquistar uma série de direitos», tendo realçado que, de momento, o actual governo brasileiro está a seguir um «caminho oposto de destruição de direitos sociais e civis». «Nestes 45 anos do 25 de Abril, a revolução de Abril, na minha perspectiva, é uma inspiração para o Brasil, para as difíceis lutas futuras que se aproximam contra o actual governo de Bolsonaro e a ameaça de uma nova ditadura militar», afirmou. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
«Ninguém mais cerra as portas que Abril abriu»
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Na mesma linha, para Adelino Nunes, dirigente da União dos Sindicatos de Aveiro, «é muito importante o regresso às ruas destas comemorações», que no distrito envolvem diversos sindicatos e outras organizações populares. Estão agendadas iniciativas em quatro concelhos – Aveiro, Ovar, Santa Maria da Feira e São João da Madeira –, com a realização de momentos culturais e intervenções de rua. Não serão acções «ao mesmo nível de há três ou quatro anos», porque o momento exige mais contenção, tendo em conta as regras de segurança articuladas com a DGS. Mas o sindicalista lembra que o «25 de Abril foi muito importante para o povo e os trabalhadores, e por isso é urgente que tenha expressão de rua» novamente.
Estão também desenhadas acções e comemorações em muitas outras cidades e concelhos do País, que dão corpo ao entusiasmo popular em ver Abril de novo nas ruas, sempre em cumprimento de todas as regras sanitárias adequadas ao momento.
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