“[…]
Todo o mundo é composto de mudança,
tomando sempre novas qualidades.
[…]
E, afora este mudar-se cada dia,
outra mudança faz de mor espanto:
Que não se muda já como soía1”
Luís de Camões
Estes versos premonitórios foram escritos há mais ou menos 450 anos pelo mui talentoso e mui sábio Camões. Sim, enquanto houver mundo, haverá nele mudanças/alterações… com novas características...
Sim, atravessamos um tempo em que «aceleram» alterações climáticas com várias (más) consequências. Portanto, trata-se de uma questão civilizacional o enfrentar-se as causas profundas que determinam os exageros que «aceleram», em mau sentido, tais alterações. Causa civilizacional próxima são as emissões para a atmosfera dos Gases do Efeito Estufa (GEE) com o Anidrido Carbónico (CO2) à frente, e a subir lá para cima, pelas atmosferas.
Mas, cá por baixo, o sistema dominante «fabrica» o CO2 (e outros) através da produção super-intensiva de bens e mercadorias de todos os tipos e para todas as finalidades, por forma a sustentar aquela perigosa mega-fraude – económica, social e política – dos «mercados livres» e da «competitividade», em que se especializaram os países ditos «desenvolvidos» e seus «trusts» económicos, financeiros e políticos. Entretanto, também cá por baixo, tentam resistir e sobreviver aqueles sistemas menos «competitivos», afinal os menos poluentes e menos emissores de GEE em geral e CO2 em particular.
Assim, não passará de pura ingenuidade estarmos à espera que os grandes e mais poderosos países emissores de CO2 venham, «simplesmente», a deixar de os emitir sem que haja uma luta forte – externa e interna - e a convergir para esse objectivo…
As alterações climáticas não podem servir como uma grande «lavandaria» do sistema dominante
Não pretendemos subestimar o problema das mudanças críticas que se vêm precipitando nestes âmbitos e suas más consequências. Não pretendemos subestimar aquelas pessoas – e são muitíssimas – que se preocupam e tentam intervir de alguma forma para travar este «comboio».
Todavia, não devemos deixar-nos alarmar tanto, ou alinhar de forma acrítica, a ponto de pensarmos e actuarmos como o sistema dominante quer que pensemos e que actuemos… para se servir de nós!
Sim, assiste-se a uma permanente e super-intensa intoxicação das nossas cabeças a pretexto dos problemas – reais – que temos com as alterações climáticas.
Sendo verdade que tais entidades não são todas iguais e não devem ser metidas, todas, no mesmo saco, todavia, não deixam de convergir no tempo, por vezes até no modo, como intervêm publicamente. Vem o famigerado FMI e fala em «alterações climáticas»; vem a União Europeia e farta-se de falar no assunto; o Governo Português fala nisso de microfone na boca para ampliar; o Vaticano professa, agora, um estilo de religião mais «ambientalista».
A ONU e António Guterres falam principalmente em «alterações climáticas» e dão-lhe toda a prioridade. Aliás, fazem-no mesmo no preciso momento em que o Médio Oriente arde e parece pronto para explodir em nova e muito perigosa guerra (Irão). Ou seja, as candentes questões da guerra e do desarmamento deixaram de ser muito preocupantes, deixaram de ser «emergências» para tais senhores?
A propósito, será que «eles» já pensaram que, de repente, uma guerra, ainda que «regional», pode causar o «inverno nuclear» e, «só» por aí, provocar uma «alteração climática» global, fatal e de facto definitiva?!
Sim, será que estamos perante uma genuína «preocupação ambiental» ou somos confrontados com «alarmismo social», ou com a tentativa de diversificar e «modernizar» (ainda mais) os lucros multinacionais do sistema dominante, o tal «neoliberalismo imperialista» e seus tentáculos servidos pelos seus «executivos» e maiores «propagandistas»?
Ou seja, «bombardeiam-nos» com doses maciças de «CO2 ideológico»! Estes temas, e os excessos «colaterais» que geram, produzem «modas» (alienatórias) nas avaliações por parte da opinião pública. Enviesam premissas, contaminam os debates, inibem conclusões contrárias «à moda».
RNC 2050 é «mais papista que o Papa»!
Cá entre nós, e a título exemplar, temos os conteúdos e objectivos do chamado Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC 2050) que este Governo quer impor por decreto. Gaba-se até de querer ir a mata-cavalos rumo à «neutralidade (económica) carbónica» em menos de 30 anos – o que mais não é do que assumir o papel do «bétinho bom aluno» nesta União Europeia. Na matéria em causa, o Governo Português vai mesmo mais longe do que consagra o Acordo de Paris para o Clima e do que a própria União Europeia, em geral, quer aplicar.
No caminho esboçado neste «RNC 2050», abundam várias tontarias tecno-burocráticas, com destaque para as assumidas (agora com algum pudor…) pelos «mata-vacas» oficiais e oficiosos nas suas projecções descabidas para a grande redução dos efectivos de Bovinos.
Porém, porquê e para quê tanta «invenção encomendada», se Portugal não precisa nem merece – a Pecuária que o diga – tamanho «aperto» nos tais «Gases do Efeito Estufa», ou «GEE»? Acontece, e não é por acaso, que Portugal já reduziu as emissões bastante e emite GEE abaixo da sua «quota» de emissões anuais permitidas. Então, repete-se, porquê tanto «aperto»? Ou será que este Governo quer deixar, «de herança», receitas para o Orçamento do Estado superiores àquelas que já agora lá entram em resultado da venda – em sistema bolsista – dos chamados «créditos do Carbono»?
Em Orçamento de Estado para 2019 está prevista uma receita de 238 milhões de euros provenientes de leilões de Carbono através do Comércio Europeu de Licenças de Emissão (CELE) – o do Fundo Europeu de Carbono – a que se juntam mais 115 milhões de euros de «taxas de CO2» aplicadas sobre combustíveis fósseis. Receitas que, a seguir, vêm engordar substancialmente as verbas do agora «Fundo Ambiental», este com um total de 420 milhões de euros em OE 2019 e, em última análise, a aparecer como mais um «saco azul» para várias manobras orçamentais e de políticas concretas que o Governo opera.
Sim, é necessário manter a cabeça de fora das emissões de «CO2 ideológico» com que o sistema dominante nos «bombardeia»!
- 1. «Como soía», isto é, como de costume.
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