|Economia

Como vamos de «novo normal»?

A crise pandémica em que ainda continuaremos expôs muitas das fragilidades do modelo económico em que vivemos. Há que afirmar um novo paradigma económico, com maior intervenção do Estado na economia.

Nós por cá…

A pandemia contribuiu para uma maior compreensão de como agir sobre o colapso da economia, de forma consequente e não apenas através de slogans debitados urbi et orbi pelo mainstream.

O desejável «novo normal» não ignora que há quem queira um «velho normal». Não são muitos e até terão o apoio de grupos económicos com saudades também desse «velho normal».

Desta compreensão resultou uma grande ousadia na aceitação de medidas que para muitos, numa conjuntura anterior, não seriam aceitáveis, com vista a combater a recessão. Isso poderá ser acompanhado pela intervenção popular e reflectir-se num aprofundamento da democracia. Mas se pesarem mais os interesses ultra-minoritários da sociedade portuguesa, também teremos uma regressão da democracia.

Não será o medo a determinar os nossos passos.

Já em 27 de Março o Banco de Portugal projectava um colapso na actividade económica até -5,7% (o FMI indicava -8% numa quebra mundial de -3%, e a Comissão Europeia previa -6,8% numa quebra de -7,7% na zona euro). Previa ainda uma hecatombe no turismo e uma quebra global das exportações de -16,7% (com quebra de -18,7% nas importações). Estimava ainda uma destruição de emprego que levaria a -10,1% o desemprego, uma quebra do investimento em -14% e uma quebra substancial do consumo privado.

«O conjunto de diplomas com medidas do Governo de apoio às empresas e para a assistência à família e prestações sociais foram medidas positivas, mas que ficaram aquém das necessidades e tiveram efeito retardado pelo atraso com que chegaram à economia e aos cidadãos. As garantias aos trabalhadores das remunerações integrais do seu trabalho estão ausentes destas medidas. E, no entanto, elas são muito importantes para fazer face a despesas acrescidas das famílias no presente e reduzir o impacto económico das consequências da pandemia, e para acelerar o crescimento económico ainda no período desta.»

Com estas previsões, nas quais já há algum tempo várias outras fontes também convergiam, o Governo dispunha das pistas para actuar imediatamente sobre as variáveis em que a sua iniciativa poderia intervir positivamente, já que outras dependiam de factores externos (efeitos da crise importados, da redução drástica do turismo, da procura externa noutros sectores, do investimento privado em geral, obtenção de uma vacina grátis para cobertura universal, etc.). Para não falar já de medidas drásticas da união Europeia (UE), quer quanto ao crédito quer quanto a subsídios às pequenas e médias unidades produtivas e de serviços de proximidade, e para cobertura dos níveis de rendimento perdidos pelos trabalhadores. E de preparar medidas, que contrariem a situação para que fomos remetidos pela Comissão Europeia em matéria da produção agrícola, e garantir o equilíbrio da balança agro-alimentar.

Face a essas previsões e à capacidade de actuar internamente sobre algumas das projecções negativas atrás referidas para o relançamento da economia, a resposta tem de assentar na capacidade de produção para o mercado interno e nas pessoas que, para consumirem, têm de dispor de dinheiro que resulte não apenas do trabalho, que muitas perderam, mas de um apoio a fundo perdido de maneira a poderem adquirir os bens essenciais. E esta procura contribuirá, só por si, para o crescimento da economia, particularmente das pequenas e médias unidades económicas. E deve ser aumentado e estrategicamente dirigido o investimento público.

Na economia e sendo a maior parte da nossa estrutura produtiva quase exclusivamente com posta por MPME, incluindo as start-up, há que ser consequente nos apoios. Há situações alarmantes, sem resposta, de muitas pequenas e microempresas, socialmente muito úteis, e que foram o recurso de vida de muitos trabalhadores despedidos ou precários. Acenar-lhes com novos endividamentos, mesmo em condições mais favoráveis, é retirar a essas unidades produtivas quaisquer horizontes e ambições. Isto é mesmo assim por muito que debutantes da economia andem por aí a pregar que «se elas não resistem, não interessa salvá-las, interessa dar espaço a empresas mais competitivas, mais modernas, assentes no digital». Mas que absorveriam os escassos apoios comunitários, claro…

O conjunto de diplomas com medidas do Governo de apoio às empresas e para a assistência à família e prestações sociais foram medidas positivas, mas que ficaram aquém das necessidades e tiveram efeito retardado pelo atraso com que chegaram à economia e aos cidadãos. As garantias aos trabalhadores das remunerações integrais do seu trabalho estão ausentes destas medidas. E, no entanto, elas são muito importantes para fazer face a despesas acrescidas das famílias no presente e reduzir o impacto económico das consequências da pandemia, e para acelerar o crescimento económico ainda no período desta.

A procura interna, o consumo das famílias, não só agora como na fase que se vai seguir, será determinante para, como já referimos atrás, relançar a economia, promover emprego, assegurar que os bens e serviços das empresas são vendidos.

Neste ou noutro quadro social mais grave, menor será a resistência à COVID-19 e a outras doenças. E isso não ficará a depender da vacina que seja testada em humanos e aceite pelas organizações internacionais competentes.

Como sublinhou a CGTP-IN, a história recente do país demonstra que «é na valorização do trabalho que se encontram soluções. Cortar nos salários, nas pensões e apoios sociais significa a introdução de dificuldades acrescidas a milhões de portugueses e amputar o potencial de retoma da economia nacional, num quadro em que o comércio internacional e a procura externa estarão em contracção.»

Nos casos de agregados familiares, no de muitas empresas, e de países – neste caso como sublinhou o Papa Francisco –, a perspectiva da eliminação ou redução das dívidas tem que ser hoje considerada como básica para o desenvolvimento e para a correcção de assimetrias. Mesmo que isso se constitua, para já, como excepção nas regras comunitárias. Mas sendo certo que essas regras terão que ser revistas, depois, nesse sentido.

Depois de se recuperar a confiança abalada com o medo da pandemia, há que cuidar da recuperação da confiança que se poderia perder se apenas olhássemos para as previsões financeiras do PIB e da dívida ou as previsões catastróficas do FMI.

O respeito integral dos direitos fundamentais dos trabalhadores e de outras camadas da população, é o caminho para a democracia sair reforçada na parte mais inquietante desta crise. Esse é o rumo para uma sociedade mais justa, porque mais coesa e menos desigual, garantindo direitos constitucionais, e reforçando o papel democrático do Estado no garantir desses direitos, e um perfil produtivo e de investimento que dê resposta às necessidades dos trabalhadores.

Esta crise epidemiológica foi já motivo para a chamada «desmaterialização do trabalho». Como Demétrio Alves chamou à atenção, «a médio e longo prazo a COVID-19 pode contribuir para a crescente adopção do trabalho desmaterializado feito à distância, numa perspetiva negativa para os trabalhadores».

Não se peça aos trabalhadores que, além de contribuírem para a segurança social resultante dos seus descontos, aceitem serem o elo cada vez mais fraco dum sistema injusto!

Os contratos precários contribuíram para o aumento dos despedimentos, o lay-off e o teletrabalho são antecâmaras para mais despedimentos, a falta das progressões nas carreiras ou aumentos que cubram a inflação coexiste com situação inversa, no nível remuneratório e na política de prémios, ao nível de administrações e quadros dirigentes, quer no sector público quer no privado.

Agostinho Lopes salientou que a pandemia fez entrar pela janela o que foi expulso pela porta da política de direita: as preocupações com o abastecimento alimentar do nosso povo. E afirmou que «Não temos terras nem clima para produzir 100% dos cereais que necessitamos. Mas conseguir 50% é uma coisa e estar reduzido a 4%, a caminho de zero por cento, é outra radicalmente diferente! É a dependência absoluta do país no abastecimento de um bem essencial à sobrevivência desta colectividade humana» e ainda que «Portugal não pode, seguindo as orientações determinadas por esses grupos de interesses, especializar o seu território em eucalipto, azeite e alguma produção hortícola, reduzindo as potencialidades e a diversidade do seu agro segundo os interesses do lucro desses grupos transnacionais e nacionais. É muito importante o equilíbrio da Balança Agroalimentar».

É certo que são necessários quer o relançamento do turismo – que será pouco realizável este ano – quer a exportação de outros sectores a cuja oferta tem que corresponder uma procura do exterior, o que será, a curto prazo, também difícil de recuperar. Mas a criação do músculo interno não vai assentar essencialmente nas exportações. Tem de assentar, para já, no estímulo a sectores abandonados como a agricultura, agropecuária e pescas para garantir a nossa soberania agroalimentar, no comércio e serviços em correspondência com a procura de proximidade. Insistimos que esta procura interna, adiada pela redução do poder aquisitivo das populações, devido ao isolamento e à quarentena, aos encerramentos de empresas e despedimentos, lay-off e maior precarização do trabalho, é essencial para um novo e diferente fôlego da economia.

Esta crise permitiu constatar, apesar da grande dedicação de diferentes grupos profissionais que expuseram as suas vidas para defender doentes e populações inteiras, que podíamos ter, um SNS mais forte e mais preparado para uma crise inesperada, se este não tivesse sido sacrificado a políticas de redução do défice público. Confrange que, por submissão a critérios da União Europeia, hoje ainda mais postos em causa, nem agora o Governo compreenda que melhor do que um excedente de 0,2% nas contas públicas de 2019 teria sido o reforço do SNS nos últimos anos.

O Primeiro-Ministro descobriu nas últimas semanas que afinal Portugal pode produzir bens de que não dispõe. Passar isto à prática é que é neste momento relevante para que tal reconhecimento não passe por circunstancial. Já alguns industriais passaram à prática que fosse em Portugal que os seus activos criassem cadeias de valor até aqui deixadas para outros países. E importa ter presente que isso já poderia ter começado a ser feito antes, desde 2016, numa política de substituição de importações, com uma nova visão dos interesses nacionais.

Não pode deixar de contar, para acerto de agulhas, que nos mantemos numa crise com uma economia assente em baixos salários, precariedade e baixas qualificações, e com direitos muito afectados. Com serviços públicos debilitados por anos de política de direita e pelas políticas de desinvestimento e “consolidação orçamental”. Fortemente dependente do turismo (cujos efeitos de retracção podem não ser de curto prazo). Sem investimento público (que tem sido negativo em termos líquidos). E com uma bolha imobiliária especulativa que poderia estar em vias de rebentar (no período de 2016 a 2019 os preços da habitação já tiveram um aumento médio anual de 9.1%). Acresce uma revisão da legislação de trabalho que criou novas formas de precariedade e manteve a caducidade das convenções colectivas.

Perspectivas de privatizações ou maior intervenção do estado para ter garantias de sobrevivência socialmente útil, incluem, entre outras, a TAP, mas também todo o nosso sistema financeiro que se furta às suas obrigações para com o país.

À escala global

A crise de 2008 constituiu a oportunidade para um acentuar do neoliberalismo em favor das grandes empresas multinacionais, sob o comando norte-americano. Deu lugar a agressões dos EUA e seus aliados a diversos países árabes e do norte de África, para afastar governantes incómodos e obter maior domínio do petróleo. Acentuou o federalismo na União Europeia com rupturas no seu seio, o Brexit e novo fôlego da extrema-direita e dos fascistas. Trouxe uma maior agressividade da NATO para com a Rússia, o confronto norte-americano contra a China e a ingerência golpista dos EUA, nomeadamente na América Latina, contra regimes progressistas.

Nestes doze anos, depois dos efeitos dessa crise ficou mais claro que uma política mais «musculada» foi também reflexo de debilidades endógenas do imperialismo e um debilitamento do neoliberalismo.

Mas a actual crise pandémica está a provocar tempestades em todo o lado. No mundo 95% do transporte aéreo, 80% do transporte terrestre, 60% das fábricas pararam, caiu 2/3 do PIB mundial, há falências em larga escala das empresas e um desemprego galopante.

E não é o mercado que vai resolver estes problemas.

Já em plena pandemia da COVID-19 tem havido países que não param, por causa dela, as agressões e conflitos: Israel contra a Síria e ameaçando agora estender a sua «soberania» aos territórios da Cisjordânia que se mantêm como parte integrante da Palestina; EUA e Colômbia contra a Venezuela, com mais uma invasão falhada; conflitos provocados no Corno de África e em Moçambique, mas também contra Myanmar, de grupos terroristas de inspiração islamita radical.

Mas, para quem, como é o caso dos EUA, ainda quer ostentar o título de maior potência mundial, a COVID-19 está a ter mais impacto sobre o americano médio do que acontecimentos das últimas duas décadas, incluindo as guerras no Médio Oriente, o 11 de Setembro ou o colapso do imobiliário.

A investida contra o petróleo de outros saiu razoavelmente furada com o novo papel da OPEP+1, embora com condicionamentos que resultam de acção concertada dos EUA e da Arábia Saudita, e que se traduziu numa situação de preço especialmente baixo, vantajoso para os países importadores, mas terrível para quem faz orçamentos a pensar nos proveitos da sua exportação (por exemplo a Venezuela, o principal produtor, Angola e Rússia, também entre os grandes produtores).

A UE foi deslizando de um importante pólo económico mundial para o que alguns entendem como inexistente na cena internacional dos dias de hoje, por efeitos do acentuar da crise do capitalismo e das suas divisões internas à UE.

E, no entanto…

O imperativo da liberdade, contra as medidas de combate à Codiv-19, que os apoiantes de Trump invocam, suporta um projecto ultraliberal, de natureza fascista. Que poderá aproveitar parte da força dos cerca de 40 milhões de novos desempregados registados nos últimos dois meses…

À esquerda, não podemos deixar de referir que as formas já adoptadas de combate ao novo coronavírus, sem um controle democrático constante, como as medidas de condicionamento e confinamento, a maior facilidade na obtenção de dados pessoais, maiores controles à liberdade de circulação e maior vigilância, enfim restrições importantes a direitos, liberdades e garantias, podem integrar programas políticos semelhantes aos desses ultra-liberais norte-americanos.

Os que trabalham para a centralização e militarização da Europa podem aproveitar as transformações que estão em curso nas suas sociedades para colher mais apoios para os seus projectos, que não serão propriamente para se oporem à NATO.

A China, o Ocidente e o futuro

A Rússia, e especialmente a China, passaram nos últimos anos a ter papel crescente no apoio a países subdesenvolvidos e em vias de desenvolvimento e no reforço dos BRICS (África do Sul, Brasil, China, India e Rússia).

O desenvolvimento de uma nova rota da seda vai gerando a recuperação da ideia da Eurásia, que já uniu Europa e Ásia noutras épocas da História sem que isso tivesse tido papel de invasões, de submissão de outros. Bem pelo contrário. Em resultado desta pandemia, os BRICS estão já a criar um sistema de alerta precoce de riscos biológicos e que facilitarão o intercâmbio de medicamentos, vacinas imunobiológicas, equipamentos médicos e ferramentas de diagnóstico do coronavírus, estabelecendo também a cooperação entre eles no desenvolvimento de métodos sustentáveis e de baixo custo para testar doenças infecciosas, para vacinação e para pesquisas globais.

Trump, nem por razões de classe, nem pelo seu carácter, nem pela limitada formação cultural que revela, entende, por exemplo, os chineses e o seu partido comunista.

Aquilo que alguns designam por «paciência de chinês» tem por trás muitos séculos de história, se bem que se tenha sofrido alterações com o fim dos impérios e a implantação da República, o domínio inglês e a «guerra dos Boxers», duas guerras contra as invasões e ocupações nipónicas e a mortandade por elas causada. E a revolução comunista nas suas diferentes fases.

A China, em oitenta anos, passou de uma situação de quase indigência do sistema imperial para com a sua soberania a outra situação, em que se transformará na maior potência mundial em quase todos os domínios.

E a resposta extraordinária – mesmo para os que têm reservas ao regime político que nela vigora – que deu ao novo coronavírus, pela sua decisão, unidade, medidas drásticas de contensão e confinamento, e a capacidade de relançar em força a sua economia, já está a ter resultados.

Nem Trump certamente sabe que outro gigante asiático, a Índia, tem um cruzamento cultural com a China. Kishore Mahbubani, diplomata de Singapura, autor de diferentes livros sobre estes assuntos, fala de um leste asiático «profundo», ligando o confucionismo e o budismo mas também com a tradição filosófica do taoismo que sustenta a vida em harmonia com Tao.

A projecção internacional da China reflecte o ressurgimento de uma civilização, a civilização mais forte e resistente da História.

Esta projecção internacional da China não é a mesma coisa mas coincide com a previsão de alguns historiadores e imprensa como o Finantial Times, de que estamos a entrar nesse «Século Asiático».

As economias de países asiáticos somadas estão a caminho de superar o PIB do resto do mundo, segundo cálculos de instituições financeiras e jornais especializados com base em projeções de crescimento.

Mais ainda, segundo um relatório do banco britânico Standard Chartered Plc, sete das dez maiores economias do mundo serão asiáticas até 2030.

Sobre o papel da China no futuro no futuro, a BBC News Brasil escreve:

«Nos últimos dois séculos, o "Ocidente", mais especificamente a Europa e os Estados Unidos, foram os motores da economia mundial e da industrialização. Mas esta realidade, porém, está a mudar rapidamente com o acelerado crescimento da China que, como consequência, tem ajudado a dinamizar as economias dos demais países da região, como Vietname, Indonésia, Filipinas, Tailândia e Bangladesh.»

«A possibilidade de os chineses superarem os EUA económica e tecnologicamente (nomeadamente na banda 5G) já causou reacções do governo americano, nomeadamente depois de 2019. Muitos vêm na guerra comercial iniciada pelo governo de Donald Trump em Abril do ano passado uma reacção, talvez tardia, a essa ascensão da China. Estas atitudes, que continuam com retaliações no campo económico e tecnológico, também se devem ao fracasso da administração norte-americana, se compararmos com a China as respostas à CODIV-19».

«Não é a primeira vez que os americanos adoptam uma postura comercial mais agressiva contra uma nação por encará-la como competidora. Foi o que ocorreu com o Japão nas décadas de 1970 e 1980. O resultado final da disputa com o Japão, encarado como uma vitória americana, contradiz uma argumentação frequentemente usada de que não há vitoriosos em guerras comerciais. O Japão foi obrigado, entre outras coisas, a abandonar o sistema de câmbio fixo, que mantinha sua moeda artificialmente desvalorizada e barateava suas exportações».

«Segundo especialistas ouvidos pela BBC, a China tem mais possibilidades de se defender das ofensivas americanas e a sua ascensão é inevitável».


À boleia da pandemia e dos receios de irreparáveis atrasos dos EUA em relação à China em inovação tecnológica, inteligência artificial, biotecnologia, ausência de uma real infraestrutura digital, etc., o lobby que envolve patrões das grandes empresas tecnológicas (Bill Gates, Eric Schmidt, Josh Marcuse, Jeff Bezos e outros) e o governador de Nova Iorque, Andrew Cuomo, relançaram agora o seu Screen New Deal – já esboçado em 2019 – com o que agora as grandes empresas tecnológicas pretendem lucrar com a pandemia.

O estatuto bicentenário do Ocidente como centro global da riqueza está ameaçado pela afirmação de novas potências da Ásia e África. A questão mais decisiva que o Ocidente enfrenta nas próximas décadas é a de como reagir a esta alteração das regras do jogo.

A consultora McKinsey, analisando este presente/futuro, concluiu que a futura história global começa na Ásia e que nos próximos 20 anos, «a expectativa é de que a Ásia represente 40% do consumo global e 52% do PIB». Concluindo que esta pandemia pode ser considerada como o ponto de inflexão, quando o século asiático realmente já começou.

Os EUA sabem que estão num declínio, em várias vertentes, enquanto outros países, nomeadamente a China, vão apresentando indicadores que ultrapassam os equivalentes dos EUA.

Será acertado que os EUA e outros países ocidentais considerem que o seu inevitável declínio relativo não deveria acentuar o que esta pandemia já revelou quanto às suas debilidades, nomeadamente no combate à mesma. Devia parar com mentiras e mitos que só alimentam a russofobia e a sinofobia, em tudo contrárias a uma cooperação adequada aos nossos tempos.

Passando o Ocidente a estar numa situação de inferioridade relativa, a contenção de complexos negativos daí resultantes poderia ser a melhor forma de manter a sua influência (política, económica e cultural) e ser mais bem-sucedida, a longo prazo, na nova ordem mundial, numa civilização reconfigurada que incorpore a importância histórica e actual do Ocidente no seu seio, provavelmente a partir de meados deste século XXI.

Para um «novo normal»

A crise pandémica em que ainda continuaremos expôs já muitas das fragilidades do modelo económico em que vivemos.

Há que afirmar um novo paradigma económico, que garanta maior intervenção do Estado na economia, até porque podemos viver tempos ainda mais sombrios. O natural aumento da despesa para lhe fazermos frente terá que encontrar uma nova relação entre o Estado e os mercados que a sustente.

Este novo modelo económico e social levará ao renascimento da economia e da sociedade, um papel do Estado mais interventivo e regulador na economia.

Ele resultará do combate democrático de muitos que reconhecem ser necessário um novo modelo capaz de gerar uma sociedade mais justa, mais humana, com maior equilíbrio na distribuição da riqueza, outra consideração do papel dos trabalhadores e reposição dos seus direitos obtidos com muita luta, medidas para reintegrar socialmente os mais vulneráveis, os que ficaram sem nada, o que, para ser viável, não pode permitir redução do orçamento familiar, e garantir mais tempo para a família e mais cultura e tempos livres, mais ética na economia e na política, menor subordinação de tudo em relação ao lucro e à ganância e combate à corrupção, mais atenção às pessoas e às comunidades, menor destruição ambiental e

este é o novo normal pelo qual nos batemos.

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