“Jamais alguém viu o Estado. Quem poderia, no entanto, negar que ele é uma realidade? O lugar que ocupa na nossa vida quotidiana é de tal ordem que ele não poderia ser daí retirado sem que, do mesmo lance, ficassem comprometidas as nossas possibilidades de viver. Revestimo-lo de todas as paixões humanas: ele é generoso ou somítico, engenhoso ou estúpido, cruel ou complacente, discreto ou abusivo”.
Esta consideração pertence a Georges Burdeau, um cientista político francês e professor de direito público e foi publicada na sua obra O Estado.
O Estado possui três elementos constitutivos: o elemento humano, o mesmo é dizer o povo como conjunto de cidadãos; o elemento funcional, ou seja, a soberania, tanto externa como interna; o elemento espacial, correspondente ao território onde o Estado assume a respetiva jurisdição.
A nossa Constituição define: “A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efetivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa”.
O artigo 27.º da Constituição da República Portuguesa consagra que “Todos têm direito à liberdade e segurança”.
É neste contexto que a Segurança assume uma particular relevância na estruturação do Estado Moderno.
Numa iniciativa conjunta das Comissões Parlamentares de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e da Defesa, em parceria com o Grupo de Reflexão Estratégica sobre Segurança Interna (GRESI) da Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa, no passado dia 23 de abril realizou-se na Assembleia da República uma conferência subordinada ao tema “Estado de Direito e Segurança”.
No primeiro painel alguns elementos do referido GRESI abordaram a temática da Segurança nas suas múltiplas dimensões. Quanto ao segundo painel este contou com a participação de deputados em representação do PCP, PS, PSD, CDS e BE.
A conclusão essencial que se pode retirar desta iniciativa é que se impõe uma reflexão serena sobre a Segurança, nomeadamente em Portugal, tal como defendeu o deputado António Filipe do PCP, para que este direito fundamental não resulte numa deriva securitária, que se sobreponha ao direito constitucional à liberdade.
Outra conclusão é que se torna necessário um aprofundamento da temática da Segurança Comunitária e da Proteção Civil no contexto do Sistema de Segurança Interna. Esta dimensão da Segurança foi simplesmente ignorada nas várias intervenções deste evento.
Falta pensamento doutrinário a este domínio da Segurança. Por isso ele continua a ser tratado como mera questão de conjuntura política, a belo prazer de cada Governo e governante, num experimentalismo inconsequente e quase sempre influenciado por uma confrangedora ignorância político-jurídica.
Em face do exposto, urge criar um Centro de Estudos de Segurança conforme foi defendido nesta Conferência, enquanto espaço de reflexão científica e interdisciplinar, que produza novas abordagem em contraponto a uma conceção tradicional da Segurança, marcadamente militarista, ainda prevalecente na comunidade académica.
A Segurança deixou de estar centrada exclusivamente no Estado para estar, também, centrada no indivíduo.
Esta nova visão deve orientar a produção científica, integrando vários domínios da ciência na construção de um novo edifício conceptual, agregando os domínios do Security e do Safety, na Segurança Humana.
Só com esta alteração de paradigma, será possível garantir aos cidadãos uma resposta efetiva do Estado aos múltiplos riscos a que estão expostos, numa sociedade contemporânea marcada por múltiplas ameaças que vão do cibercrime aos eventos extremos de natureza climática.
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