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A proteção civil e a gestão autárquica

Entre os temas totalmente arredados do debate eleitoral, destacam-se as matérias associadas ao sistema municipal de proteção civil, um domínio absolutamente essencial enquanto variável do desenvolvimento dos territórios locais.

Funcionários do Município de Setúbal em acções de desinfecção e limpeza, a 26 de Março de 2020
Créditos / mun-setubal.pt

Os resultados das últimas eleições para as Autarquias Locais constituem um valioso instrumento de estudo, em múltiplas perspetivas.

Para abordar o tema com rigor e utilidade instrumental, é necessário recorrermos a diversos domínios do conhecimento. É no cruzamento da dimensão multidisciplinar dos resultados do referido ato eleitoral, que encontramos resposta para as perplexidades e interrogações que eles convocam.

Proponho uma breve reflexão quanto ao ato eleitoral do passado dia 26 de setembro.

Em primeiro lugar importa lamentar e criticar severamente a falta de debate sobre os compromissos programáticos dos candidatos aos órgãos autárquicos que se apresentaram ao eleitorado, dada a captura deste debate pelos atores da política nacional, como se o que estivesse em causa fosse a escolha de deputados. Este procedimento resultou, antes demais, no total desrespeito pela importância do Poder Local, tendo como consequência o desinteresse de muitos cidadãos em participarem na eleição dos seus autarcas.

«Agora que se inicia um novo ciclo da vida e atividade das autarquias do país é oportuno apelar aos eleitos para que se empenhem no fortalecimento das estruturas locais de proteção civil e na promoção de uma cultura de risco junto da população que representam»

A contaminação das eleições autárquicas com os temas da agenda da governação do país, remeteu para um plano secundário as agendas locais. Esta constatação pode ser confirmada no visionamento de dezenas de horas de debates televisivos e na leitura de muitos dos textos publicados na imprensa escrita.

Entre os temas totalmente arredados do debate eleitoral, destacam-se as matérias associadas ao sistema municipal de proteção civil, um domínio absolutamente essencial enquanto variável do desenvolvimento dos territórios locais. Questões como o planeamento municipal do risco; a organização dos serviços municipais de proteção civil; o reforço do dispositivo de resposta local ao socorro, com particular destaque para os Bombeiros; a transferência de competências e consequente atribuição de responsabilidades aos municípios, remetendo-os a um papel de serviços desconcentrados da administração central, foram linearmente ignoradas pela maioria das candidaturas.

O poder local democrático deve ser respeitado, considerando os 45 anos de constante desenvolvimento por ele proporcionado, nos vários recantos do país.

Os eleitos nos órgãos autárquicos são a emanação genuína da democracia local, salvo algumas exceções que só servem para confirmar a regra.

Agora que se inicia um novo ciclo da vida e atividade das autarquias do país é oportuno apelar aos eleitos para que se empenhem no fortalecimento das estruturas locais de proteção civil e na promoção de uma cultura de risco junto da população que representam.

Façam um adequado diagnóstico da situação existente, formulem estratégias de reforço da proteção e segurança dos territórios, reivindiquem do Governo da República as soluções que identifiquem como prioritárias e recusem medidas que desrespeitem a sua autonomia constitucional.

Esta é mais uma oportunidade para dotar o país de um sistema de proteção civil sólido, construído da base para o topo, alicerçado nos municípios.

É certo que há autarcas que, em maioria ou com responsabilidade de pelouros em minoria, já trabalham para este objetivo. Por dever de justiça e apenas a título de exemplo, destaco o município de Setúbal, em maioria CDU, e o vereador da proteção civil da CM de Matosinhos, eleito também pela CDU no anterior mandato, na situação de minoria.

Porém é preciso que estes exemplos sejam assumidos por todos, porque a proteção civil não é um domínio secundário da gestão autárquica.

Este é o tempo de desfazer este perigoso equívoco, instalado na prática de muitos.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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