|Legislativas 2022

PSD: Função pública a perder poder de compra e privatizações encapotadas

Salário mínimo dependente da vontade dos patrões, função pública empobrecida, mercantilização da água e revisão da Lei de Bases da Saúde, escancarando a porta aos privados, são algumas das propostas do PSD.

O presidente do PSD, Rui Rio, durante a sua intervenção na sessão de encerramento da «Universidade de Verão» da JSD, em Castelo de Vide. 9 de Setembro de 2018
CréditosNuno Veiga / Agência Lusa

Nos vários debates e entrevistas do presidente do PSD, Rui Rio tem assentado a sua oratória no argumento de que é alternativa, rejeitando responsabilidades pelo programa recessivo aplicado pelo governo de Passos e Portas, que o então líder do PSD assumia orgulhosamente estar «muito além do memorando da troika». Mas, analisando o programa às eleições de 30 de Janeiro, percebemos que a matriz está lá. 

Privatização é palavra que praticamente não se usa no programa dos social-democratas, salvo quando se fala da morosidade da Justiça. «Ainda em matéria de morosidade da Justiça, é preciso proceder à identificação de áreas possíveis de descongestionamento dos tribunais, sem o recurso à privatização» – embora a ressalva já suscite preocupação. 

O facto, porém, de o programa não fazer referência a privatizações não significa que isso não esteja na agenda do PSD. Veja-se o caso da TAP, onde no texto se defende uma «solução de viabilização» da empresa, «em termos sustentáveis, europeus, de acordo com as boas práticas de gestão», mas que Rui Rio já admitiu que é para privatizar. 

A redução da chamada «carga fiscal» é uma das bandeiras do PSD, embora a tradição das políticas de direita, designadamente no último governo do PSD e do CDS-PP, seja aumentar brutalmente os impostos sobre o trabalho.

Tal como em 2019, e à semelhança do que propõem os restantes partidos de direita, o PSD defende uma redução do IRC, nomeadamente de 21% para 17% (em 2023 e 2024), e do IRS, de 800 milhões em dois anos (2025 e 2026) através da redução das taxas de imposto, também nos escalões mais altos, prevendo-se 350 milhões de euros para os escalões de rendimento até 60 mil euros e 50 milhões de euros para os escalões entre os 60 mil e os 100 mil euros.

Já quanto a salários, o partido de Rui Rio reconhece, e bem, que Portugal «não pode desenvolver-se com base num modelo de crescimento assente em salários baixos». Mas a solução que propõe é manter tudo na mesma, ao apostar na «valorização» da concertação social e na «limitação da intervenção do Estado nos processos de negociação colectiva», de modo a promover, no entendimento dos social-democratas, a «dignificação do trabalho».

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PS faz depender aumento dos salários de mais benefícios fiscais para as empresas

O AbrilAbril detalha algumas das propostas e inconsistências dos programas eleitorais às legislativas de 30 de Janeiro. Hoje falamos das propostas do PS. 

CréditosInácio Rosa / Agência Lusa

Tomando o exemplo recente, em que o Governo de António Costa compensou as empresas pelo aumento do salário mínimo para 705 euros, no valor de 100 milhões, o PS apresenta no seu programa às legislativas de 30 de Janeiro a criação de um quadro fiscal para que as empresas assegurem, «a par da criação de emprego líquido, políticas salariais consistentes em termos de valorização dos rendimentos e de redução das disparidades salariais, centrado na valorização dos salários médios».

Tal como o AbrilAbril tem vindo a denunciar, a compensação das empresas por um direito dos trabalhadores, além de onerar as contas públicas e comprometer o financiamento das funções sociais do Estado, é um contributo para a campanha de que a subida dos baixos salários trava a competitividade do País. 

O PS, que recusou ir além dos 705 euros de salário mínimo nacional (SMN) para 2022, meta que os patrões não queriam ultrapassar, volta a invocar a concertação social para o que chama de «acordo de médio prazo». O objectivo é atingir «pelo menos os 900 euros em 2026», mas fazendo depender a trajetória plurianual de actualização do SMN da «dinâmica do emprego e do crescimento económico». 

Depois de ter rejeitado, na Assembleia da República, uma proposta com vista a regular a sucessão das convenções colectivas, eliminando a caducidade e repondo o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, o PS apela no seu programa à valorização da negociação colectiva, «através da sua promoção na fixação dos salários, na actualização das principais convenções colectivas de trabalho», e com «o objectivo de implementar sistemas de progressões e promoções, e garantindo, simultaneamente, a necessária amplitude salarial». 

O mesmo PS, que optou por voltar a suspender a caducidade da contratação colectiva, em vez de lhe pôr fim, defende agora a importância de priorizar a negociação colectiva, reconhecendo que ela «permite alinhar os salários com a produtividade das organizações, promovendo a melhoria da qualidade do emprego e dos salários». 

Outras promessas eleitorais apresentadas na esfera laboral prendem-se com as chamadas «novas formas de equilíbrio dos tempos de trabalho» e as «alterações legislativas para a Agenda do Trabalho Digno», com destaque para a possibilidade de reduzir o horário de trabalho «em diferentes sectores» através da introdução das «semanas de quatro dias».

Mas também aqui encontramos incongruências, uma vez que o PS tem vindo a chumbar sucessivamente propostas como a redução geral do horário de trabalho para as 35 horas semanais, sem perda de direitos, o combate à desregulação de horários ou a consagração de 25 dias úteis de férias para todos os trabalhadores. 

«Mais justiça social»

No campo da fiscalidade, o partido de António Costa clama pelo que é de facto uma emergência nacional, mas deixa cair uma das ferramentas para lá chegar, que é o englobamento obrigatório de rendimentos (de capital, prediais e de trabalho), uma das matérias negociadas no âmbito do Orçamento do Estado (OE) para 2022, e que o PS tinha inscrito no programa eleitoral de 2019.

Recorde-se, no entanto, que a proposta que o Governo apresentou na proposta de OE 2022 tinha uma abrangência simbólica, já que apenas era obrigatório o englobamento da compra e venda de acções para os contribuintes situados no último escalão do IRS, ficando todo o restante rendimento, incluindo o especulativo, livre da obrigatoriedade de ser englobado. 

O PS prevê «dar continuidade ao desenvolvimento de mecanismos que acentuem a progressividade do IRS» e concluir a revisão de escalões, matéria em que também não foi tão longe quanto necessário, tendo em conta que o desdobramento dos escalões proposto no Orçamento (3.º e 6.º) deixava de fora os rendimentos até 1000 euros brutos, ou seja, não aliviava os contribuintes de mais baixos rendimentos.  

Voltando à participação do Estado na valorização dos salários pagos pelo sector privado, o PS volta a puxar pela medida do IRS Jovem, «abrangendo mais jovens, durante mais anos», prevendo-se, à semelhança do que foi a sua proposta no Orçamento, que a intenção seja eliminar o limite máximo de rendimentos para aplicação da isenção. 

A promessa da regionalização

O PS, que vem adoptando truques para adiar a regionalização, como a eleição das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) ou a desconcentração de competências para as autarquias, acena agora com um referendo (ver caixa) à regionalização para 2024.

Entretanto, compromete-se a «identificar novas competências» a descentralizar para as comunidades intermunicipais (CIM), para os municípios e para as freguesias, «aprofundando» áreas já descentralizadas e «identificando novos domínios». 

O PS fala na necessidade de «assegurar serviços de proximidade», quando ainda estão em falta milhares de eleitos autárquicos devido à «reforma administrativa» do PSD e do CDS-PP, que riscou do mapa nacional mais de 1000 freguesias, rurais e urbanas, afastando os eleitos das populações. Uma das promessas do PS na campanha eleitoral de 2015 era revertê-la, mas tudo tem feito para a manter na gaveta.

Curioso é também que a regionalização e a coesão territorial surjam em capítulos distintos do programa eleitoral do PS, o que talvez ajude a explicar a falta de visão que ainda persiste nesta matéria.  

Capitalizar propostas alheias

Ao longo do programa eleitoral do Partido Socialista é possível observar a capitalização de propostas de outras forças políticas, que foram negociadas ao longo dos últimos seis anos, designadamente do PCP. É o caso da redução dos preços dos passes em todo o território, da manutenção dos manuais escolares gratuitos (medida que o PS tem feito depender da devolução no final de cada ano lectivo, a partir do 1.º Ciclo) e da «progressiva gratuitidade da frequência de creche».

Mas também a redução dos impostos sobre as pequenas e médias empresas, «acabando definitivamente com o Pagamento Especial por Conta», e o aumento extraordinário das pensões, com retroactivos a 1 de Janeiro. 

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A crítica à proposta de fazer depender o aumento dos salários da vontade dos patrões tem respaldo na actuação destes no período (2015-2019) de maior crescimento económico dos últimos 20 anos, com as associações patronais a exercerem pressão para obterem contrapartidas face a tímidos aumentos, que não conseguiram tirar trabalhadores da pobreza, esteve sempre presente. 

Já quanto aos salários dos trabalhadores da Administração Pública, cuja actualização em 2022 não chega para recuperar poder de compra, o programa dos social-democratas define que a política salarial do Estado deverá evoluir «dentro das limitações financeiras existentes», e o que propõe é manter a estratégia de empobrecimento, com actualizações em linha com a inflacção.

O PSD defende o que diz ser uma «política de saúde orientada para a prevenção da doença», embora se posicione para beneficiar o negócio de quem lucra com ela. Entra aqui a vontade de «reorganizar» o sistema de saúde e rever a Lei de Bases da Saúde, que, com a exigência da gestão privada dos hospitais públicos ter de ser «excepcional», «supletiva» e «temporária», trava as ambições do sector privado. 

Os social-democratas defendem um «novo modelo» de organização e de financiamento, e Rui Rio já disse inclusive que «atirar mais dinheiro para o SNS» não é uma prioridade, escamoteando o facto de o serviço público ser alvo de um subfinanciamento crónico, traduzido nas dificuldades que se lhe conhecem, e que a proposta vertida pelo Governo no Orçamento do Estado para 2022 também não corrigia. De resto, e como já admitiu Rio, no âmbito da revisão constitucional que o PSD deseja realizar, perspectiva-se a retirada do direito de acesso «tendencialmente gratuito» ao SNS.   

A regionalização é um dos temas em que, de forma coerente, o PSD apenas refere o desígnio de «abrir à sociedade portuguesa esta discussão sobre a reorganização territorial do Estado», sem se comprometer com prazos e carregando baterias no argumento de que a descentralização – ou mera desconcentração de competências, tal como negociada com o PS – é o remédio para a correcção de assimetrias. E são várias as responsabilidades que, ao longo do programa, os social-democratas remetem para os municípios, como é o caso das creches, o reforço e promoção de programas de integração de imigrantes e o combate à pobreza. 

A «participação de privados na estrutura do grande edifício dos sistemas de abastecimento público» de água, a que Cavaco Silva abriu as portas em 1993, e que o PSD insiste em dizer que é «vantajosa» (apesar da oposição de populações e dos eleitos autárquicos), continua a ser a tónica. 

«Mantendo a gestão do sector na esfera pública, através de empresas de capitais públicos, o recurso a outsourcing de empresas privadas para a prestação de serviços bem definidos é o modelo que consideramos mais adequado», refere-se no programa, onde se insiste também na «necessidade de harmonização de preços da água em Alta e dos serviços de tratamento de efluentes».

O PSD evoca aqui o espírito de «coesão territorial e social», mas a realidade desmente a «bondade» da estratégia, como se viu recentemente no caso das Águas do Interior Norte, onde a uniformização das taxas e tarifas em todos os concelhos abrangidos por esta empresa intermunicipal acentuou desigualdades e levou ao exagerado aumento da factura.

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IL: «Temos de nos habituar a viver sem» serviços públicos

A citação, proferida esta manhã por um dirigente da IL sobre a TAP, está vertida de forma subliminar no programa deste partido, que hoje analisamos, onde se perspectiva o fim das funções sociais do Estado. 

Créditos / RTP

«Reformar o Estado», ou seja, «emagrecê-lo», é a ideia-chave da Iniciativa Liberal (IL) às eleições para a Assembleia da República, alicerçada no raciocínio de que assim será possível um Estado «mais forte e mais capaz», e alcançar a «maximização da liberdade individual e da igualdade de oportunidades». Mas as propostas vertidas no programa dos liberais não batem certo com o argumentário. 

Esta manhã, um dirigente da IL dizia à Rádio Observador, num debate sobre a TAP, que os portugueses tinham de se habituar a viver sem ela. Olhando para as mais de 600 páginas do programa dos liberais, percebemos que o intuito é que nos habituemos a viver sem serviços públicos, num país mais desigual e empobrecido, e com maiores índices de precariedade laboral

Entre as propostas que concorrem para esta conclusão está o restabelecimento do banco de horas individual, por «comum acordo» entre empregado e empregador, com o horário normal de trabalho a poder esticar até «duas horas por dia, 50 por semana e 150 por ano». Na base da proposta está uma «gestão mais eficiente» das empresas, mas que na prática significa deixar de pagar o trabalho extraordinário. Quanto ao teletrabalho, o partido liderado por Cotrim de Figueiredo defende a revisão de «restrições [...] que criem obstáculos ao trabalho remoto». 

No plano dos rendimentos, a IL volta a propor a substituição do salário mínimo nacional pelo «salário mínimo municipal», associando a ideia de que tal fomentaria a «coesão territorial». Colocar os municípios a definir o salário mínimo «que mais se adequa à sua economia local» levaria ao aumento das desigualdades observadas a nível territorial. Os liberais sustentam a ideia no facto de o custo de vida variar bastante entre diferentes municípios do País, negligenciando, por exemplo, que nalgumas regiões o acesso a serviços públicos, designadamente à saúde, é mais limitado. 

Entre as condições deste salário mínimo «municipal» (ou «razoável»), a IL deixa clara a sua visão sobre as relações entre trabalhadores ou sindicatos e empresas, que, neste caso, seriam os municípios. Em resposta à possibilidade de os sindicatos poderem «ter influência sobre executivos camarários, obrigando-os a subir salário mínimo para além do que os empregadores podem pagar», a IL assume que o «risco» é «mitigado pelo facto de que as empresas podem mover-se para outras cidades, dando um incentivo aos executivos para serem razoáveis na determinação do nível de salário mínimo». Ou seja, toda uma estratégia para estagnar a evolução do salário mínimo nacional, que, qualquer que seja a região, é baixo para responder às necessidades de centenas de milhares de trabalhadores e suas famílias. 

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PS faz depender aumento dos salários de mais benefícios fiscais para as empresas

O AbrilAbril detalha algumas das propostas e inconsistências dos programas eleitorais às legislativas de 30 de Janeiro. Hoje falamos das propostas do PS. 

CréditosInácio Rosa / Agência Lusa

Tomando o exemplo recente, em que o Governo de António Costa compensou as empresas pelo aumento do salário mínimo para 705 euros, no valor de 100 milhões, o PS apresenta no seu programa às legislativas de 30 de Janeiro a criação de um quadro fiscal para que as empresas assegurem, «a par da criação de emprego líquido, políticas salariais consistentes em termos de valorização dos rendimentos e de redução das disparidades salariais, centrado na valorização dos salários médios».

Tal como o AbrilAbril tem vindo a denunciar, a compensação das empresas por um direito dos trabalhadores, além de onerar as contas públicas e comprometer o financiamento das funções sociais do Estado, é um contributo para a campanha de que a subida dos baixos salários trava a competitividade do País. 

O PS, que recusou ir além dos 705 euros de salário mínimo nacional (SMN) para 2022, meta que os patrões não queriam ultrapassar, volta a invocar a concertação social para o que chama de «acordo de médio prazo». O objectivo é atingir «pelo menos os 900 euros em 2026», mas fazendo depender a trajetória plurianual de actualização do SMN da «dinâmica do emprego e do crescimento económico». 

Depois de ter rejeitado, na Assembleia da República, uma proposta com vista a regular a sucessão das convenções colectivas, eliminando a caducidade e repondo o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador, o PS apela no seu programa à valorização da negociação colectiva, «através da sua promoção na fixação dos salários, na actualização das principais convenções colectivas de trabalho», e com «o objectivo de implementar sistemas de progressões e promoções, e garantindo, simultaneamente, a necessária amplitude salarial». 

O mesmo PS, que optou por voltar a suspender a caducidade da contratação colectiva, em vez de lhe pôr fim, defende agora a importância de priorizar a negociação colectiva, reconhecendo que ela «permite alinhar os salários com a produtividade das organizações, promovendo a melhoria da qualidade do emprego e dos salários». 

Outras promessas eleitorais apresentadas na esfera laboral prendem-se com as chamadas «novas formas de equilíbrio dos tempos de trabalho» e as «alterações legislativas para a Agenda do Trabalho Digno», com destaque para a possibilidade de reduzir o horário de trabalho «em diferentes sectores» através da introdução das «semanas de quatro dias».

Mas também aqui encontramos incongruências, uma vez que o PS tem vindo a chumbar sucessivamente propostas como a redução geral do horário de trabalho para as 35 horas semanais, sem perda de direitos, o combate à desregulação de horários ou a consagração de 25 dias úteis de férias para todos os trabalhadores. 

«Mais justiça social»

No campo da fiscalidade, o partido de António Costa clama pelo que é de facto uma emergência nacional, mas deixa cair uma das ferramentas para lá chegar, que é o englobamento obrigatório de rendimentos (de capital, prediais e de trabalho), uma das matérias negociadas no âmbito do Orçamento do Estado (OE) para 2022, e que o PS tinha inscrito no programa eleitoral de 2019.

Recorde-se, no entanto, que a proposta que o Governo apresentou na proposta de OE 2022 tinha uma abrangência simbólica, já que apenas era obrigatório o englobamento da compra e venda de acções para os contribuintes situados no último escalão do IRS, ficando todo o restante rendimento, incluindo o especulativo, livre da obrigatoriedade de ser englobado. 

O PS prevê «dar continuidade ao desenvolvimento de mecanismos que acentuem a progressividade do IRS» e concluir a revisão de escalões, matéria em que também não foi tão longe quanto necessário, tendo em conta que o desdobramento dos escalões proposto no Orçamento (3.º e 6.º) deixava de fora os rendimentos até 1000 euros brutos, ou seja, não aliviava os contribuintes de mais baixos rendimentos.  

Voltando à participação do Estado na valorização dos salários pagos pelo sector privado, o PS volta a puxar pela medida do IRS Jovem, «abrangendo mais jovens, durante mais anos», prevendo-se, à semelhança do que foi a sua proposta no Orçamento, que a intenção seja eliminar o limite máximo de rendimentos para aplicação da isenção. 

A promessa da regionalização

O PS, que vem adoptando truques para adiar a regionalização, como a eleição das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) ou a desconcentração de competências para as autarquias, acena agora com um referendo (ver caixa) à regionalização para 2024.

Entretanto, compromete-se a «identificar novas competências» a descentralizar para as comunidades intermunicipais (CIM), para os municípios e para as freguesias, «aprofundando» áreas já descentralizadas e «identificando novos domínios». 

O PS fala na necessidade de «assegurar serviços de proximidade», quando ainda estão em falta milhares de eleitos autárquicos devido à «reforma administrativa» do PSD e do CDS-PP, que riscou do mapa nacional mais de 1000 freguesias, rurais e urbanas, afastando os eleitos das populações. Uma das promessas do PS na campanha eleitoral de 2015 era revertê-la, mas tudo tem feito para a manter na gaveta.

Curioso é também que a regionalização e a coesão territorial surjam em capítulos distintos do programa eleitoral do PS, o que talvez ajude a explicar a falta de visão que ainda persiste nesta matéria.  

Capitalizar propostas alheias

Ao longo do programa eleitoral do Partido Socialista é possível observar a capitalização de propostas de outras forças políticas, que foram negociadas ao longo dos últimos seis anos, designadamente do PCP. É o caso da redução dos preços dos passes em todo o território, da manutenção dos manuais escolares gratuitos (medida que o PS tem feito depender da devolução no final de cada ano lectivo, a partir do 1.º Ciclo) e da «progressiva gratuitidade da frequência de creche».

Mas também a redução dos impostos sobre as pequenas e médias empresas, «acabando definitivamente com o Pagamento Especial por Conta», e o aumento extraordinário das pensões, com retroactivos a 1 de Janeiro. 

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Taxar menos os que mais têm. Com o argumento de querer «pôr o País a crescer», a Iniciativa Liberal coloca entre as suas prioridades a introdução de uma taxa única de IRS de 15%, admitindo que o processo comece de forma gradual, com duas taxas de 15% e de 28%. Ao mesmo tempo, propõe a redução do IRC, de 21% para 15%, e a eliminação da derrama estadual, assim como a privatização das poucas empresas estratégicas que restam ao País, como a TAP, a CGD e a RTP. 

Quanto ao Serviço Nacional de Saúde, a proposta da IL é que ele evolua para um sistema onde o financiamento é público, mas a prestação pode ser pública e privada, continuando assim a engordar as empresas que se dedicam ao negócio da doença. Neste sentido, a IL pretende retirar da Lei de Bases da Saúde a exigência de que a gestão privada dos hospitais públicos tem de ser «excepcional», «supletiva» e «temporária. Entre outros objectivos, os liberais colocam a possibilidade de recuperar parcerias público-privado (PPP), como no caso dos hospitais de Loures, Braga e Vila Franca de Xira. 

Com base no demagógico argumento da «liberdade de escolha», a IL propõe uma «reforma do sistema» de Educação pela alteração do «financiamento do Estado para o financiamento do aluno», descapitalizando a Escola Pública e colocando mais uma vez o Estado a comparticipar escolas privadas ou sociais.

O chavão da «igualdade de oportunidades», que a Iniciativa Liberal tanto usa na campanha eleitoral às legislativas de 30 de Janeiro, esbarra na proposta de acabar com a dependência de avaliações do Ensino Secundário para entrada no 1.º ciclo do Superior. Os liberais defendem que seja atribuída às instituições de Ensino Superior a «liberdade e responsabilidade para determinar os seus métodos de admissão (incluindo testes de aptidão, vocacionais ou outros)». Medida que seria um recuo no caminho da democratização do ensino. 

A «reforma do sistema de pensões», ou, simplesmente, a descapitalização da Segurança Social, é outra das propostas da IL, com «a introdução de um pilar de recapitalização baseado na eliminação da taxa social única para os empregadores», ao mesmo tempo que se mantém a «manutenção obrigatória» da TSU dos trabalhadores. Ou seja, uma parte dos descontos seria feita para a Segurança Social e a outra parte para um fundo, que a IL designa por «novo pilar no sistema nacional de pensões de reforma».

Os liberais admitem a possibilidade de, adicionalmente, existirem incentivos fiscais às entidades empregadoras que decidam voluntariamente fazer contribuições adicionais para este fundo, cuja entidade gestora só teria a obrigatoriedade de pertencer ao sector público estatal «em momento inicial».

Uma espécie de jogo bolsista, através do qual a IL pretende fazer acreditar que as reformas dos trabalhadores ficarão mais seguras do que no solidário mecanismo de transferência de rendimentos de contribuintes activos para reformados. O partido de Cotrim de Figueiredo escuda-se na preocupante evolução demográfica no nosso país, com cada vez menos trabalhadores do que reformados e pensionistas, quando a receita seria, por exemplo, diversificar as fontes de financiamento da Segurança Social. 

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Ainda no plano das autarquias, os social-democratas propõem uma «reforma do governo», que mais não é do que uma ameaça ao poder local democrático. «Facilitar a governabilidade, permitindo que o presidente eleito tenha maioria no seu Executivo», é uma das propostas, a que se junta, por exemplo, o estender da limitação de mandatos a três consecutivos aos vereadores, à semelhança do que actualmente se aplica ao presidente da câmara. 

O PSD pretende alargar os mandatos de quatro para cinco anos, criar a «figura da moção de censura ao executivo na Assembleia Municipal com aprovação por maioria qualificada» e «dar mais possibilidades de escolha aos presidentes de câmara na formação do Executivo e aquando da substituição de vereadores».

No plano da Justiça, os social-democratas acenam com um «reforço da transparência», «democraticidade» e «independência» para propor a reforma e recomposição dos órgãos de governo das magistraturas, impondo uma maioria de não-magistrados e, desta forma, o controlo político e partidário da acção dos conselhos superiores.

A revisão constitucional é uma das velhas ambições do partido de Rui Rio, dando seguimento ao projecto de «reformar o sistema político», ou seja, reduzir o número de deputados, de 230 para 215, limitando a dimensão de círculos eleitorais e ameaçando a equidade do sistema eleitoral.

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