Em resposta à solicitação do Ministério da Administração Interna (MAI), no âmbito da contratação de serviços de gestão, manutenção e operação da rede de comunicações para coordenação de situações de emergência e segurança a nível nacional, o regulador salienta a importância da utilização de infra-estruturas de comunicações detidas por entidades públicas.
O objectivo, revela o parecer publicado no site da Anacom, passa por fazer uma utilização «mais eficiente» desses bens e reduzir a dependência do Estado de interesses de privados, «cujo princípio de orientação para o lucro se poderá encontrar desalinhado com o interesse público».
A ministra da Administração Interna quer ver penalizado o consórcio SIRESP por «falhas de disponibilidade e de desempenho durante o incêndio de Pedrógão Grande», mas não põe em causa a parceria público-privada (PPP). O Governo deu esta quinta-feira uma conferência de imprensa no Ministério da Administração Interna para fazer um ponto de situação dos nove inquéritos, estudos, relatórios e pareceres pedidos pelo Executivo após o incêndio que deflagrou no dia 17 de Junho em Pedrógão Grande, no qual morreram 64 pessoas e 200 ficaram feridas. A ministra da Administração Interna, Costança Urbano Rodrigues, informou que houve descoordenação no posto de comando da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) no incêndio e que o local onde foi instalado não foi o ideal. Referiu ainda que as falhas de comunicações do Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) «dificultaram as operações de controlo e comando». Segundo a ministra, houve também uma «falta de articulação entre a Secretaria-Geral da Administração Interna, PSP, ANPC e GNR no que diz respeito à detecção dos problemas nas comunicações e no accionamento e mobilização da Estação Móvel, que se reflectiu numa excessiva morosidade da sua disponibilização». Os relatórios e inquéritos permitiram ainda concluir que «a rede SIRESP se revelou pouco resiliente em virtude de a interligação das estações base e a restante rede SIRESP ser feita com cabos de fibra óptica, maioritariamente suportados por postes», vulneráveis em caso de incêndio. O Governo que ver penalizado o consórcio SIRESP e apresenta várias medidas, sem no entanto pôr em causa o facto de este sistema ser uma PPP, com interesses envolvidos de várias empresas. O Governo do PSD e do CDS-PP, liderado por Santana Lopes, estava em gestão, e Daniel Sanches, ministro da Administração Interna, assinou a PPP entre um consórcio de empresas – PT, Motorola, Esegur, do Grupo Espírito Santo, e SLN – e o Ministério da Administração Interna para o fornecimento de um sistema de comunicações, o SIRESP, que teve um custo total de 540 milhões de euros, ainda que tivesse previsto um investimento inicial entre 100 e 150 milhões de euros mais 10% por ano, que corresponderia ao custo de exploração. António Costa, como ministro da Administração Interna do governo de José Sócrates, decidiu pela renegociação do contrato com o consórcio, depois de ter anulado o despacho do governo anterior devido ao parecer da Procuradoria-Geral da República, sendo que o novo contrato teria um valor acumulado em 15 anos de 485,5 milhões de euros. Em 2015, o governo do PSD e do CDS-PP chegou a um novo acordo preliminar com o consórcio que resultaria numa poupança de 25 milhões de euros até ao final de 2021, 11% do custo total, mas o acordo ficou à espera de ratificação do Conselho de Ministros, e o processo só foi concluído em Dezembro passado pelo actual Governo. Perante a polémica das falhas do SIRESP na tragédia de Pedrógão, o contrato voltou a estar sob escrutínio. Nele se afirma que o consórcio, que hoje junta a Galilei (ex-SLN, dona do BPN) e a sua subsidiária Datacomp, a PT, a Motorola e a Esegur, não é responsável por falha em casos de «força maior»: «actos de guerra ou subversão, hostilidades ou invasão, rebelião, terrorismo ou epidemias, raios, explosões, graves inundações, ciclones, tremores de terra e outros cataclismos naturais que directamente afectem as actividades objecto do contrato». No ano passado, o SIRESP pagou mais de 6,6 milhões de euros em dividendos aos accionistas que compõem o consórcio, de acordo com o Jornal de Negócios. O valor cobre largamente as duas injecções de capital que as empresas fizeram em 2015 e 2009, no valor total de 4,38 milhões de euros. O contrato milionário isenta de responsabilidades a empresa a quem foi entregue a gestão do sistema nos casos em que este falhe, precisamente, por alguns dos motivos para os quais foi criado: situações de emergência por catástrofes naturais ou por intervenção humana. A ministra anunciou ter determinado à Secretaria-Geral da Administração Interna (SGAI), entidade gestora do SIRESP, que inicie os procedimentos para a aplicação de penalidades ao consórcio, assim como o apuramento de responsabilidades da SGAI sobre o que aconteceu em Pedrógão Grande. Para além disso, deverá ser apresentado, no prazo de 15 dias, um plano de articulação da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) com todos os oficiais de ligação e todos os agentes de protecção civil, «de forma a melhorar a coordenação e a resposta operacional aos cidadãos», determinou o ministério, acrescentando que a Direcção Nacional de Auditoria e Fiscalização (DNAF) da ANPC deverá enviar à Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) o relatório de inspecção – que se encontra em curso – para «apuramento de eventuais responsabilidades disciplinares». Constança Urbano de Sousa informou ainda da continuação das acções de reparação das torres físicas de suporte à rede SIRESP, bem como das acções de reforço de cobertura em instalações criticas e em locais com fraca cobertura. Foi ainda determinado pelo ministério que a SGAI cumpra as recomendações da IGAI, assim como a elaboração de um plano de formação dos utilizadores da rede SIRESP e de planos de comunicações para que fique limitado o número máximo de grupos de conversação nos teatros de operações. A ministra exigiu à ANPC a presença de um técnico de comunicações nos Postos de Comando e Controlo nas «ocorrências com importância elevada», e o SGAI tem a seu cargo a elaboração, no prazo de 60 dias, de uma proposta de enquadramento orgânico do SIRESP com competências de «fiscalização e supervisão da operadora e de interface com os utilizadores». Com agência Lusa Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Nacional|
SIRESP: consequências de uma parceria público-privada
Um contrato milionário que isenta de responsabilidades a empresa
Medidas que não passam pela reversão da PPP
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A recomendação está em linha com a posição do grupo de trabalho criado pelo Governo em 2019, que, recorda agora o regulador, havia defendido que o Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal (SIRESP) fosse dotado de «mecanismos adequados para assegurar a sua robustez, redundância e resiliência, em especial no respeitante aos activos críticos, aos pontos de falha única e à cadeia de fornecimento, a qual deve ser assegurada por fornecedores de confiança e evitando a dependência de um único fornecedor para cada tipo de fornecimento de produto ou serviço».
Neste sentido, a Anacom sugere a substituição atempada de equipamentos em cada uma das cerca de 450 estações de rádio e «equipamentos de core (MSO)», e que o controlo dos equipamentos da rede de transmissão seja assumido por uma entidade pública, «dotada de capacidade técnica adequada à gestão e operação de redes».
No final de 2019, o Estado assumiu o controlo da empresa que foi alvo de parceria público-privada no governo de Santana Lopes, pagando sete milhões de euros ao consórcio liderado maioritariamente pela Altice, apesar das falhas do serviço, designadamente em 2017, e de não ter chegado a funcionar como rede de comunicação única. Entretanto, em Junho do ano passado foi fechado um acordo entre o Governo e a Altice para prolongar o contrato até ao final de 2022, altura em que o SIRESP tem de sair das instalações da dona da Meo.
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