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Protestos em várias cidades francesas, Paris em brasa

Violentos confrontos no centro da capital francesa marcaram o terceiro protesto dos «coletes amarelos». A oposição acusa o governo Macron de facilitar as acções de grupos extremistas, em seu proveito.

As políticas fiscais e sociais do presidente Emmanuel Macron têm sofrido forte contestação em França. Manifestação em Paris, 1 de dezembro de 2018.
Créditos / LUSA

Em diversas localidades francesas ocorreu hoje a terceira jornada de mobilização nacional dos chamados «coletes amarelos» (gilets jaunes). Cerca de 75 mil manifestantes foram estimados em toda a França, dos quais cerca de 6 mil em Paris.

Além de Paris, Biarritz, Bordeaux, Brest, Charleville-Mézières, Dijon, Dunkerque, Lille, Marseille, Montpellier, Orléans, Rennes, Pau, Saint-Etienne, Strasbourg, Toulouse, Villefranche-sur-Saône, foram algumas das cidades para as quais foram convocados protestos.

O movimento, iniciado autonomamente nas redes sociais como protesto contra o aumento anunciado do preço de gasóleo, rapidamente alargou a grupos políticos à esquerda e à direita do espectro político e se tornou num veículo de protesto contra o aumento do custo de vida, a falta de aumento de salários, os impostos elevados e, em geral, contra o presidente Emmanuel Macron, cuja popularidade atingiu níveis mais baixos do que os obtidos pelo seu predecessor socialista François Hollande – algo que os sociólogos julgavam difícil de suceder.

Se na maioria do país e noutros pontos da capital o protesto decorreu de forma relativamente pacífica, no centro de Paris, sob o foco das atenções dos meios de comunicação, um grupo organizado de manifestantes levantou barricadas, ateou fogos, vandalizou monumentos, lojas e viaturas, confrontando violentamente as forças policiais que se lhes opuseram. Mais de 110 feridos, entre os quais cerca de 20 polícias, e cerca de 290 detenções, é o saldo mais recente dos distúrbios aí ocorridos durante o dia de hoje, segundo o jornal Le Monde, que cobriu os acontecimentos.

Os confrontos iniciaram-se perto do Arco do Triunfo mas alastraram aos arruamentos limítrofes, muitas deles frequentados por turistas. Jornalistas descreveram o grupo de manifestantes como apresentando-se com máscaras e envergando coletes amarelos aparentemente novos – como se apercebeu e comentou a jornalista que cobria os protestos para a RTP – indicando a possibilidade de terem sido adquiridos não por «coletes amarelos» da primeira hora mas por alguém que que por eles se pretendia fazer passar.

Apesar de a concentração dos coletes amarelos estar marcada para as 14h, eram cerca das 9h30 de sábado quando um grupo de manifestantes tentou erigir as primeiras barricadas nos Campos Elíseos.

Apesar de a concentração dos coletes amarelos estar marcada para as 14h, eram cerca das 9h30 de sábado quando «algumas centenas de pessoas» se reuniram junto ao Arco do Triunfo e um grupo de manifestantes tentou erigir as primeiras barricadas nos Campos Elíseos. A polícia teve de garantir a segurança do túmulo do soldado desconhecido, sob o Arco do Triunfo.

Um grupo de manifestantes que tentara forçar os controlos policiais na Praça da Estrela (Place de L’Étoile) – onde viriam a dar-se os maiores confrontos – reagrupa-se na Avenida MacMahon, onde improvisa uma barricada e daí apedreja a polícia. Uma bandeira com a cruz céltica dos fascistas franceses é exibida e um jornalista do Le Monde viu, em paredes graffitadas, o tag «justiça para Esteban» – o skinhead Esteban Morillo, foi condenado em primeira instância pelo assassinato do antifascista Clément Méric. Quando, cerca de uma hora depois, a polícia consegue limpar a barricada, os militantes, envergando coletes amarelos, espalham-se pelas ruas contíguas.

Apesar de todas as passagens para a Praça da Estrela estarem guardadas por um forte contingente policial, os confrontos no local mantiveram-se durante todo o dia, com os manifestantes e a polícia, a sucederem-se no controlo da praça. O Le Monde destacou a determinação dos «coletes amarelos» em não abandonarem a praça, comportando-se de forma pacífica e exigindo continuamente a demissão do presidente Macron, entre uma «minoria de arruaceiros» e um dispositivo policial «impressionante», que fez uso de granadas de gás lacrimogéneo, granadas ensurdecedoras e canhões de água para dispersar grupos mais agressivos.

A concentração policial de forças na Praça da Estrela – cerca de 5 mil polícias foram destacados para a protecção dos Campos Elíseos, segundo o ministro do Interior Christophe Castaner – não teve correspondência noutros pontos da cidade, com resultados desastrosos.

Afastados da Praça da Estrela, os grupos mais agressivos de manifestantes lançaram o caos nos bairros elegantes do centro de Paris. Viaturas de luxo foram destruídas no 16.º bairro, perto do Trocadéro, e na avenida Kléber, a 100 metros da praça da Estrela, onde um quiosque de jornais serviu para alimentar as chamas que os bombeiros procuravam extinguir e um manifestante parte as câmaras de vigilância. Lojas são pilhadas na rua do Rivoli e os grands magasins Lafayette e Printemps, no boulevard Hausmann, são evacuados e fechados, com trabalhadores no seu interior, para evitar a mesma sorte. Um grupo ataca o antigo palácio da Bolsa e a estação do metro é fechada. Viaturas da polícia são atacadas na rua Danielle-Casanova e nas proximidades do Jardim das Tulherias, onde o museu do Jeu de paume sofreu danos. Na praça de Santo Agostinho, no 8.º bairro, uma loja Monoprix foi saqueada.

O ministro do Interior confirmou que os distúrbios não partiram dos manifestantes mas de arruaceiros e referiu à antena TF1 «uma estratégia de profissionais da desordem»: «não são coletes amarelos, são gente que veio para partir, pilhar, ferir e talvez matar (…) «camuflados como coletes amarelos».

Apenas cerca das 19h a situação se encaminhou para a normalização.1

Na Praça da República, a manifestação da CGT

Às 14h principiou, na Praça da República, uma manifestação convocada pelos sindicatos da Confederação Geral de Trabalhadores (CGT), com antecedência à dos «coletes amarelos». Manifestantes deste movimento juntaram-se aos cerca de 1500 sindicalistas, «contra o desemprego e a precariedade», e desfilaram cantando «on est là, même si le patronat veut pas».

Noutras localidades, os sindicatos procuraram uma convergência com os «coletes amarelos». Em Rennes, sindicalistas da CGT dirigiram-se-lhes e defenderam uma «convergência de lutas», que não obteve resposta positiva, noticia o Le Monde. Ao contrário, segundo o mesmo jornal, em Orléans uma manifestação da CGT «pelo aumento de salários e em defesa do poder de compra» foi integrada por vários «coletes amarelos».

Desde 20 de Novembro que a CGT vinha a apelar aos cidadãos, «activos ou na reforma», para se manifestarem este sábado na base, segundo o Le Monde, «de reivindicações ligadas ao poder de compra e à justiça social».

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