Rodrigo Celestino e José Bernardo da Silva (mais conhecido como Orlando), ambos militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), foram assassinados a tiro por quatro homens, este sábado, no acampamento Dom José Maria Pires, no município de Alhandra (estado da Paraíba).
O facto de ambos serem coordenadores do acampamento «evidencia o carácter de crime para intimidar a luta pela terra», destaca o MST numa nota, acrescentando que, actualmente, 450 famílias vivem e produzem «numa terra que foi encontrada abandonada, totalmente improdutiva».
O acampamento Dom José Maria Pires, localizado na área da antiga fazenda Garapu – ligada ao Grupo Santa Tereza –, foi ocupado pelas famílias em Julho de 2017, explica a mesma fonte.
«Nestes tempos de angústia e de dúvidas sobre o futuro do Brasil, não podemos deixar os que detêm o poder político e económico traçar o nosso destino. Portanto, continuamos reafirmando a luta em defesa da terra como central para garantir dignidade aos trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade», declara o MST.
Solidariedade com as vítimas e o MST
Diversas organizações, sindicatos e partidos políticos manifestaram o repúdio perante o assassinato dos dois agricultores, como o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), a Confederação dos Trabalhadores da Agricultura (Contag) e os amigos do MST na Paraíba. Numa nota, estes últimos afirmam: «Consideramos que o assassinato covarde desses companheiros se inscreve como acto contínuo da truculência exacerbada pelo cenário político vivido no país com a ascensão do ideário neofascista e de criminalização das organizações e movimentos populares deste país.»
Também a Procuradoria Geral da República, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão e a Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão na Paraíba, órgãos que integram o Ministério Público Federal, emitiram uma nota em que manifestam solidariedade aos familiares das vítimas e repudiam o crime.
Por seu lado, a presidente do Partido dos Trabalhadores, Gleisi Hoffman, denunciou a execução dos militantes do MST na Paraíba, que classificou como «muito grave». «A violência contra lideranças sociais deve crescer em todo o Brasil, antes mesmo da posse de Bolsonaro», disse, citada na página do MST.
Paraíba: longo historial de luta pela terra
O portal Brasil de Fato afirma que a luta pela terra na Paraíba é antiga. «As Ligas Camponesas, um dos movimentos mais importantes pela Reforma Agrária, estava intensamente presente no estado entre as décadas de 1950 e 60, principalmente na região de Mari, no agreste paraibano».
A região continua marcada por conflitos, como explicou ao Brasil de Fato o professor e investigador da questão agrária Marco Antonio Mitidiero Júnior: «O acampamento Antas está na beira da estrada há 20 anos e fica a cerca de 500 metros da casa onde viveram João Pedro e Elisabeth Teixeira, das Ligas Camponesas». João Pedro Teixeira foi assassinado em 1962.
No entanto, para Mitidiero os conflitos de natureza agrária são mais intensos no Brejo e na Zona da Mata da Paraíba. Alhandra, município onde ocorreram os assassinatos deste sábado, fica precisamente na Zona da Mata e é marcada pela violência. A título de exemplo, o deputado e padre Luiz Couto, do PT, vive aqui sob protecção da Polícia Federal há mais de dez anos, depois de ter denunciado a acção dos pistoleiros.
Região violenta
Alhandra fica na Zona da Mata, que começa no litoral do estado de Alagoas e vai até ao Rio Grande do Norte, no Nordeste do Brasil. «É uma região violenta e muito cobiçada por conta da cana-de-açúcar e pelo minério de calcário», afirmou o professor, acrescentando que «há muitos conflitos e registo de inúmeras ocorrências de violências e ameaças».
Contudo, sublinha, nos últimos anos o número de assassinatos tem vindo a cair na região. Antes das mortes de sábado, o assassinato mais recente tinha ocorrido em 2016. Tratou-se, então, de Ivanildo Francisco da Silva, que levou três tiros em sua própria casa, no assentamento Padre João Maria, no município de Moageiro. Era presidente do PT local e membro da Comissão Pastoral da Terra (CPT).
De acordo com o Brasil de Fato, que refere dados de Mitidiero e da CPT Nacional, 31 pessoas perderam a vida, na região, por defenderem os direitos dos trabalhadores rurais entre 1962 e 2018.
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