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Três anos após a «tragédia» de Brumadinho, moradores temem novas rupturas

As chuvas fortes no final de 2021 trouxeram novos receios. Há três anos, a ruptura da barragem de Brumadinho, no estado brasileiro de Minas Gerais, provocou a morte a 272 pessoas.

No dia 25 de Janeiro de 2019, a Barragem I da Mina Córrego do Feijão cedeu, libertando 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira 
Créditos / Brasil de Fato

No dia 25 de Janeiro de 2019, a Barragem I da Mina Córrego do Feijão, localizada em Brumadinho (estado de Minas Gerais) e administrada pela empresa Vale desde 2003, cedeu, libertando mais de 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira.

O mar de lama matou 272 pessoas e soterrou casas, animais e vegetação. Além disso, foram afectadas pela ruptura cerca de 950 mil pessoas residentes em 18 dos municípios atravessados pelo rio Paraopeba, por onde a lama correu, ao longo de 305 quilómetros.

Três anos depois do crime ambiental, associações e comissões organizadas por pessoas atingidas obtiveram algumas conquistas, como a indemnização paga a várias famílias, programas de transferência de rendimentos, o direito a assessoria técnica, entre outros acordos alcançados, lembra o Brasil de Fato.

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Atingidos pelo maior desastre ecológico do Brasil exigem justiça

Três anos depois da ruptura dos diques da barragem de Fundão, em Mariana (Minas Gerais), as vítimas do «crime da Samarco» continuam a denunciar falta de justiça e reparação, e vão protestar.

A região de Bento Rodrigues, no município mineiro de Mariana, foi a primeira a ser atingida pela lama tóxica
Créditos / camara.leg.br

A 5 de Novembro de 2015, os diques da barragem de Fundão, da empresa mineira Samarco, cederam. Uma avalanche de lama tóxica matou 19 pessoas e contaminou a Bacia do Rio Doce, nos estados brasileiros de Minas Gerais e Espírito Santo.

Três anos volvidos, as vítimas do maior desastre ambiental no Brasil denunciam a situação de desamparo em que se encontram. No final da semana passada, anunciaram uma concentração em Mariana e outra em Londres, junto a uma sede da BHP Billiton (accionista da Samarco).

Na sede do Sindicato dos Jornalistas de Minas Gerais, em Belo Horizonte, representantes das vítimas revelaram ainda que, durante dez dias, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) vai levar a cabo acções de denúncia ao longo da Bacia do Rio Doce. De acordo com o Brasil de Fato, os protestos têm início em Mariana e passam por mais 13 cidades de Minas Gerais e Espírito Santo.

Enorme desastre ambiental, «crime da Samarco»

A ruptura dos diques da barragem de Fundão, na região de Bento Rodrigues (município de Mariana), onde a empresa Samarco guardava resíduos da exploração mineira de ferro, teve um impacto ambiental tremendo, sendo considerado o maior desastre ecológico na história do Brasil e um dos maiores do mundo.

Na sequência da ruptura, 62 milhões de metros cúbicos de lama tóxica destruíram a localidade de Bento Rodrigues, em Minas Gerais, matando pelo menos 19 pessoas (residentes e funcionários da Samarco), e contaminaram a Bacia do Rio Doce, que abrange mais de 200 municípios no Sudeste do Brasil. O município de Mariana foi destruído, comunidades rurais foram afectadas ao longo de muitos quilómetros, centenas de famílias perderam as suas casas e milhares tiveram prejuízos.

Segundo o MAB, a ruptura da barragem de Fundão atingiu mais de um milhão de pessoas, mas apenas 30 mil cadastros devem ser realizados pela Renova – empresa criada para proceder à compensação dos impactos da ruptura dos diques da barragem, integrada por representantes da Samarco, Vale e BHP Billiton, bem como por entidades ambientais e públicas, a nível estadual e federal.

Um crime não reparado

«Fomos prejudicados, fomos massacrados. Esse crime tocou a gente da nossa realidade, cortou a nossa identidade, apagou o nosso futuro e abortou todos os nossos sonhos», declarou Luzia Queiroz, representante da localidade de Paracatu de Baixo, na conferência de imprensa em Belo Horizonte.


Estiveram também presentes moradores de Bento Rodrigues e técnicos da Cáritas Regional Minas Gerais, entidade que presta apoio às famílias na região, segundo revela o Brasil de Fato.

Antônio da Lua, morador de Bento Rodrigues, localidade surgida no século XVIII e que ficou inabitável após o crime, sublinhou que os habitantes alertavam constantemente para os riscos que a terra corria, com a empresa a responder que «não havia riscos, era seguro».

«Muitos engenheiros falaram que morariam até debaixo da barragem, até chegar o dia em que acabaram com a nossa comunidade. Aquilo foi um crime anunciado!», denunciou, citado pelo Brasil de Fato.

Por seu lado, Luzia Ferreira, moradora de Paracatu de Baixo, lembrou que os prejuízos não foram apenas económicos, na medida em que houve pessoas que perderam ligações a familiares e amigos, ao terem de ir morar na cidade, e que hoje enfrentam dificuldades para se adaptar.

Com a mudança forçada e a dificuldade de adaptação a um novo meio, «muitos adoecem, têm problemas como síndrome de pânico, depressão, tentativas de suicídio e até perdas de memória», sublinhou.

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Apesar destas conquistas, fruto da mobilização popular, prevalece entre os moradores a sensação de injustiça pelas consequências irreparáveis da ruptura.

«Piores anos da minha vida, são os piores. Sem dúvida. Eu sustento... eu vivo, eu durmo, eu tenho meu dia sob remédio. Eu não consigo mais viver sem meus remédios. Eu estou realmente perdida», disse uma moradora da região que preferiu não se identificar.

Também o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), sublinhando os passos dados em direcção à Justiça, lembrou que a Vale ainda não pagou integralmente pela catástrofe, que, além das perdas humanas, provocou danos ambientais irreparáveis.

Impacto ambiental e receio de novas rupturas

Tendo em conta as chuvas fortes que têm caído em Minas Gerais desde Dezembro, os habitantes da região temem que outras barragens, não totalmente seguras, possam ceder.

É essa também a avaliação que fazem alguns especialistas, como Marcos Polignano, coordenador do projecto Manuelzão, que estuda e promove actividades relacionadas com questões ambientais.

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Seis meses depois, vítimas de Brumadinho continuam sem reparação

Há seis meses, a ruptura da barragem do Brumadinho libertou 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira. Quase 950 mil pessoas foram atingidas e a reparação teima em não chegar.

A ruptura da barragem da Vale em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte, libertou 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira; 248 pessoas morreram e 22 continuam soterradas
Créditos / Revista Piauí

No dia 25 de Janeiro deste ano, a Barragem I da Mina Córrego do Feijão, localizada em Brumadinho (estado brasileiro de Minas Gerais) e administrada pela empresa Vale desde 2003, cedeu, libertando 12 milhões de metros cúbicos de resíduos da exploração mineira. Os corpos de 248 pessoas já foram identificados. Outros 22 continuam soterrados pela lama tóxica.

A propósito destes seis meses passados sobre a ruptura da barragem da Vale em Brumadinho, o Brasil de Fato publicou uma peça – a primeira de uma série especial de reportagens – sobre o modo como alguns dos 944 mil atingidos foram afectados e tentam retomar as suas vidas, sobre a luta com a empresa mineira por uma «reparação adeaquada» e os acordos alcançados (alguns dos quais estão em risco), assim como sobre a questão da exploração da Vale no estado de Minas Gerais e o potencial de dano das suas barragens de resíduos.

944 mil atingidos em 18 municípios

As 944 mil pessoas afectadas pela ruptura da Barragem de Brumadinho vivem nos 18 municípios atravessados pelo rio Paraopeba e por onde a lama correu, ao longo de 305 quilómetros.

Em Córrego do Feijão, Sara de Souza Silva é dona da única papelaria da terra, mas a loja não abre desde a ruptura da barragem. Lamenta que a empresa de exploração mineira não tenha agido de forma correcta nem para evitar a avalanche de lama, nem para reparar os danos que causou na localidade, que tem cerca de 400 habitantes e onde 27 morreram na tragédia da barragem.

O Parque da Cachoeira, um bairro que antes era conhecido pela produção de legumes, seis hortas foram engolidas pela lama. Em cada uma delas, com uma dimensão média de 15 hectares, trabalhavam cerca de dez famílias.

A de Adriana Leal, com 18 hectares, produzia hortaliças que abasteciam a capital do estado, Belo Horizonte (a 60 quilómetros), envolvendo 11 famílias. Todos ficaram sem rendimentos, sem terra para plantar e sem água para irrigar. Ao invés, ficaram com as dívidas dos financiamentos e dos fornecedores, revela o Brasil de Fato.

Críticas à Vale

Eloá Magalhães, do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) na região de Brumadinho, fala do esforço feito para que o levantamento dos prejuízos fosse realizado por instituições públicas, sem ligação à Vale, considerando que assim haveria maiores hipóteses de garantir os direitos das vítimas do ruptura da Barragem I da Mina Córrego do Feijão.


«Construímos comissões de atingidos dentro das comunidades para poder participar nas negociações do acordo preliminar com a Vale junto ao Ministério Público e à Defensoria Pública. Esse esforço resultou na conquista do auxílio de emergência para uma parte dos atingidos», disse Magalhães ao Brasil de Fato.

De acordo com a Defensoria Pública Estadual de Minas Gerais (DPE), que tem prestado atendimento individual às famílias atingidas desde o dia 28 de Janeiro e constatado a ocorrência de vários danos como consequência da ruptura, 98 146 pessoas recebem da Vale um salário mínimo mensal.

O pagamento está previsto no Termo de Acordo Preliminar firmado entre a empresa mineira e a DPE em 20 de Fevereiro último. No entanto, de acordo com o levantamento feito pelo MAB, o número de beneficiados não abrange sequer 10% do total de atingidos.

Além disso, existem «várias dificuldades com a Vale», como explicou a defensora Carolina Morishita: «Há relatos de funcionários muito educados, mas que não cumprem prazos. Não há respostas, as informações são confusas. Há relatos de violência nas comunidades por parte de funcionários da Vale. Também constatamos a dificuldade de acesso aos direitos já conquistados, como o pagamento de emergência. As pessoas chegam aos pontos de apoio na Vale e recebem a resposta que ela não têm direitos, quando elas têm.»

Acordo em risco

No passado dia 15 de Julho, a Vale aceitou assinar com o Ministério Público do Trabalho (MPT) um acordo de indemnização por danos morais às famílias de 242 vítimas mortais. Pais, filhos e cônjuges dos mortos irão receber 700 mil reais cada (mais de 166 mil euros), enquanto os irmãos terão direito a 150 mil reais (cerca de 35 500 euros).

No entanto, o acordo poderá não entrar em vigor, uma vez que entra em conflito com a reforma trabalhista aprovada durante o governo de Michel Temer, que limita este tipo de pagamento a 50 salários mínimos. O Supremo Tribunal Federal deverá deliberar sobre o tema no dia 3 de Outubro.

Problemas de segurança

Estima-se que existam no Brasil cerca de 24 mil barragens – de resíduos, de geração de energia e para abastecimento de água. Destas, apenas 4500 estão submetidas à Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) e apenas 3% foram vistoriadas. O Brasil de Fato revela ainda que o sector da fiscalização da Agência Nacional de Águas sofre de défice de funcionários.

A Vale extrai minério de ferro em três estados brasileiros: Minas Gerais, Pará e Mato Grosso do Sul, sendo que Minas Gerais corresponde a 53% da sua produção.

De acordo com os dados da PNSB, existem 114 barragens de resíduos de minério em todo o Quadrilátero Ferrífero, no Centro-Sul de Minas, a que acrescem outra 104 estruturas não cadastradas no plano, entre diques, gabiões e barragens. Deste total, 70 têm alto dano potencial no caso de ocorrência de uma ruptura.

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«Com as fortes chuvas que caíram em toda essa região do quadrilátero, onde nós temos, pelo menos, cerca de umas dez barragens, o risco de rompimento aumentou e não temos nenhuma garantia da estrutura desses barramentos», disse ao Brasil de Fato.

A ruptura da Barragem I da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, teve grande impacto social e deixou um rasto de destruição ambiental. Um estudo realizado pelo Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab) revela que, após as cheias do rio Paraopeba, em 2020, foram identificadas alterações químicas em 119 amostras recolhidas em áreas afectadas.

Na análise do material, foi observada a presença de metais pesados, que excediam os limites previstos na legislação. Além disso, foram percebidos materiais característicos dos detritos da mineração.

«As consequências vão-se propagando, e isso vai gerando processos também de adoecimento da população, porque são histórias de vida, são perdas não só económicas, mas de projectos de vida», afirmou Marcos Polignano.

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