«Cerca de 73 mil estudantes receberam já, este ano letivo, uma bolsa de estudo no âmbito do ensino superior. Cada estudante bolseiro já recebeu, até ao momento, um financiamento no valor de 1230 euros, o que representa um aumento de 24% face ao mesmo momento do ano letivo anterior (990 euros/estudante) e 49% face ao ano letivo 2020-2021 (828 euros/estudante)». Foi assim que Elvira Fortunato optou por começar a carta dirigida aos estudantes do Ensino Superior.
Dado a afluência às ruas nas diversas manifestações pelo país, nomeadamente a manifestação em Lisboa, a Ministra da Educação parece ter optado por prestar contas, por tentar acalmar as hostes e a indignação estudantil. A carta dirigida aos estudantes, «destacando os apoios sociais», procurou puxar pelos galões no que toca às bolsas de ação social, bem como ao Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior (PNAES).
Se relativamente ao PNAES os estudantes têm todas as razões para duvidar, uma vez que os primeiros planos e promessas remontam a um passado distante e do papel pouco ou nada saiu, no caso das bolsas, o caso é outro.
Tabela 1- Dados da DGES relativos à atribuição de bolsas
A verdade é que a ministra até pode ter razão nos números dos valores das bolsas atribuídas, mas a sua carta omite aspectos que devem ser considerados. Como se pode ver na tabela 1 elaborada com dados da própria Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES), o presente ano lectivo é o ano com o maior número de requerimentos desde o ano lectivo de 2016-2017. Face a esse primeiro ano que consta na tabela, verificamos que houve um aumento de 11,95% de requerimentos, mas este, para já, não corresponde aos deferidos uma vez que o aumento é de apenas 1,68%. Mesmo face ao ano lectivo anterior, verifica-se um aumento de 2,36% de requerimentos, e para já registam-se menos de 7,61% de bolsas atribuídas, ou seja, pedidos deferidos.
Os números relativamente ao presente ano lectivo ainda se encontram por fechar, uma vez que são os dados fornecidos a 27 de Março. Algo preocupante uma vez que no segundo semestre ainda se encontram 6731 estudantes sem respostas face ao seu requerimento, estando apenas 470 resultados reapreciação.
A grande preocupação, além do dos requerimentos deferidos, é naturalmente os requerimentos indeferidos. Se relativamente aos primeiros, atendendo ao facto de ainda faltarem 6731 bolsas por atribuir e bastar-se atribuir 6023 deferimentos para igualar o número do ano lectivo 2021-2022, no caso dos requerimentos indeferidos o caso não é igual.
Tabela 2 - Percentagem de bolsas deferidas e indeferidas
Como se pode ver na tabela 1, do ano lectivo 2016-2017 para o presente ano lectivo encontra-se já um aumento de 18,1% de requerimentos indeferidos, ou seja, de estudantes que viram a sua bolsa recusada. Face ao ano anterior verifica-se um aumento de 9,01% de indeferimentos. Isto numa altura em que a situação financeira das famílias se agravou.
Na tabela 2, apesar dos dados ainda não estarem fechados, podemos também afirmar que, para já, quase um quarto dos estudantes que se candidataram à bolsa de estudo viram o seu pedido recusado.
Em suma, pode-se dizer que, com cosmética, a ministra procurou iludir os estudantes. Os dados da carta, parcialmente correctos, escondem que as bolsas são atribuídas com os rendimentos nominais das famílias. A questão é que o que a realidade traduz é uma perda real dos salários, ou seja, apesar dos salários terem aumentado este ano, os mesmo não conseguem comprar o mesmo, dada a inflação. Isto poderá ter tradução em mais um aumento verificado nos requerimentos de bolsas, mas tem certamente tradução num aumento de dificuldades generalizadas.
A ministra, deliberadamente procurou promover o melhor indicador, mas esqueceu-se de outros dois: um primeiro é que os dados actualizados a 27 de Março indicavam que ainda faltavam atribuir mais de seis mil bolsas; um segundo indicador revelava que nos últimos sete anos nunca tantos estudantes a verem as bolsas a serem recusadas. Este é, neste momento, o marco da maioria absoluta do PS no que toca ao Ensino Superior. Os estudantes têm toda a razão para lutar.
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