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A reforma das regras orçamentais da União Europeia ao serviço da guerra!

Tudo na mesma relativamente aos verdadeiros objetivos do euro e das suas regras. A novidade está na inclusão da despesa em armamento no quadro das prioridades da União Europeia. Quanto ao resto, podemos continuar a apertar o cinto.

Créditos / Euro Dicas

Criado em 1997, o Pacto de Estabilidade e Crescimento representa o colete de forças orçamental usado pela União Europeia para impor aos Estados Membros a sua agenda neoliberal. Tal como aconteceu em 2003, quando a França e Alemanha não tiveram condições para poder cumprir com as suas regras, o Pacto de Estabilidade e Crescimento foi novamente suspenso em março de 2020, desta vez por causa da crise provocada pelo Covid, com efeitos até ao final de 2023. Entretanto, a atual situação débil das economias europeias não aconselha um regresso à austeridade, pelo que decorrem, desde início de 2021 negociações intensas para mais uma vez reformar as regras orçamentais, num exercício recorrente de recauchutagem de um Pacto de Estabilidade e Crescimento que deveria estar já há muito tempo no caixote do lixo da história.

Figura 1: Evolução da Dívida Pública dos países da UE (27). Fonte: Eurostat, 2023

O Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) foi criado em 1997. O seu objetivo era criar um quadro vinculativo para forçar o cumprimento das regras estabelecidas no Tratado de Maastricht que abriu caminho à criação da moeda única. O PEC incluiu uma componente preventiva e outra corretiva, com sanções aplicadas caso o défice público de um Estado fique acima dos 3% do PIB. Posteriormente, foram realizadas várias reformas em função das sucessivas crises que demonstraram não só a inoperância das regras orçamentais, mas também o seu caráter contraprodutivo. Criou-se um «semestre europeu» em 2011, através do «Six-Pack» em 2011, do «Two-Pack» em 2013 e entrou em vigor, também em 2013 o Tratado intergovernamental sobre Estabilidade, Coordenação e Governação na União Económica e Monetária (TECG), que inclui o Pacto Orçamental.

Com a crise pandémica provocada pelo Covid-19, as regras foram mais uma vez suspensas. E, mais uma vez, estão em cursos intensas negociações para tentar reformar o irreformável, dado que, não havendo decisão em contrário, as regras voltam a aplicar-se em janeiro de 2024, num momento em que as grandes economias enfrentam dificuldades e as finanças públicas estão em total incumprimento das regras. A dívida pública da EU-27 em percentagem do PIB (ver gráfico) está nos 83% em 2023 quando as regras estabelecem um limite de 60%. Uma média que revela fortes disparidades, com economias como a França ou a Bélgica bem acima dos 100%.

Nesta discussão, o grande consenso reside no facto de as atuais regras do PEC serem atualmente inviáveis, impondo políticas orçamentais restritivas em período de crise, ao contrário das mais elementares regras macroeconómicas. Não espanta, portanto, a resistência da França, hoje sob forte pressão da sua dívida, perante a proposta alemã de impor uma redução forçada de meio ponto percentual no défice para os países incumpridores. Não podemos antecipar o resultado das negociações.

«A dívida pública da EU-27 em percentagem do PIB (ver gráfico) está nos 83% em 2023 quando as regras estabelecem um limite de 60%. Uma média que revela fortes disparidades, com economias com a França ou a Bélgica bem acima dos 100%.»

Perante a intransigência alemã que não pretende abdicar da imposição de uma redução forçada do défice para os países que estejam acima da regra dos 3%, surge no horizonte a possibilidade de ser negociada entre o estado-membro em incumprimento e a Comissão Europeia uma «trajetória técnica» eventualmente prolongada por mais de quatro anos e flexibilizada se incluir investimentos alinhados com os objetivos prioritários da União Europeia.

Tudo na mesma, portanto, relativamente aos verdadeiros objetivos do euro e das suas regras. A novidade está na inclusão da despesa em armamento no quadro das prioridades da União Europeia (anexo VI relativo ao artigo 13.º da proposta de regulamento da Comissão Europeia). Ou seja, a partir de 2024, haverá alguma flexibilidade na aplicação das regras orçamentais para poder acomodar a produção de mais armas para a Ucrânia e aumentar os orçamentos da defesa de acordo com as orientações da NATO. Quanto ao resto, podemos continuar a apertar o cinto...


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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