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Carlotto condena fim da unidade de busca de crianças roubadas na Argentina

Estela de Carlotto, presidente das Avós da Praça de Maio, condenou a decisão do governo argentino de acabar com a Unidade Especial de Investigação (UEI) que averiguava o roubo de menores na ditadura.

Estella de Carlotto em entrevista ao Página 12 CréditosGuadalupe Lombardo / Página 12

Numa entrevista concedida ao diário Página 12, De Carlotto alertou que o executivo de Javier Milei avança «contra tudo o que é direitos humanos», incluindo a Comissão pelo Direito à Identidade (Conadi), em que funcionava a UEI, e destacou os muitos anos de luta pela recuperação de centenas de crianças que foram tiradas às suas famílias durante a ditadura civil-militar (1976-1983).

Na semana passada, Milei eliminou por decreto a UEI – unidade que tinha a seu cargo a investigação do desaparecimento de crianças como resultado das acções do terrorismo de Estado.

Dessa forma, explica o Página 12, a Conadi viu bloqueada a possibilidade conduzir averiguações para dar com o paradeiro dos netos que ainda não foram encontrados e de aceder aos arquivos em poder do Estado.

De Carlotto destacou os 31 anos de existência da Conadi, bem como o facto de o seu trabalho não incidir apenas em desaparecidos por razões políticas, «mas também nas crianças que são roubadas ou tiradas dos hospitais».

«Dedica-se à defesa da infância», disse, acrescentando que Milei está a atacar esse organismo e as Avós da Praça de Maio, que «está sem orçamento».

«É um acto de maldade de um governo que deveria permitir que tenhamos a segurança de saber quem somos quando temos dúvidas e reparar essa injustiça de viver com outro nome, com outra gente e com outra história», declarou.

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Milhares de argentinos honram as vítimas da ditadura e não poupam Milei

A 48 anos do golpe de Estado que deu início à ditadura civil-militar, milhares de argentinos vieram para as ruas denunciar o negacionismo do actual governo e recordar os 30 mil presos desaparecidos na ditadura.

Na Praça de Maio, em Buenos Aires, uma multidão disse «Nunca Mais», a 48 anos do golpe de Estado 
Créditos / Página 12

Neste 24 de Março, Dia Nacional da Memória pela Verdade e Justiça, organizações sociais, sindicais, estudantis, políticas e de defesa dos direitos humanos uniram-se no apelo para honrar as vítimas da última ditadura (1976-1983), afirmar que foram 30 mil os desaparecidos e denunciar as políticas negacionistas do executivo de Milei, bem como os seus ataques contra organismos públicos, os despedimentos que promove e a miséria que faz crescer na Argentina.

Houve praças cheias e grandes manifestações por todo os país austral, a maior das quais na Praça de Maio, em Buenos Aires, que, segundo refere o diário Página 12, foi uma das maiores em tempos de democracia.

Estela de Carlotto, presidente das Avós da Praça de Maio, mostrou-se «muito emocionada» por ver tanta gente a participar na manifestação deste domingo e, em especial, jovens.

Estela de Carlotto a discursar na Praça de Maio // Leandro Teysseire / Página 12

Em declarações à imprensa, afirmou: «Não somos inimigos de ninguém», acrescentando que, «perante um governo que nos ofende, tanto o presidente como a vice-presidente, o povo está mais claro que nunca, sobretudo a juventude, sem violência e sem dar ouvidos a provocações».

«Hoje é um dia histórico»

Ao intervir no acto central da mobilização, em Buenos Aires, Carlotto sublinhou que «a participação das Forças Armadas é contrária aos direitos humanos de todos», em referência à intenção do governo de Javier Milei de alterar a Lei da Segurança Interna, para permitir que os militares possam desempenhar tarefas policiais.

«Hoje é um dia histórico, com grandes mobilizações, uma demostração de que o povo está de pé face a este governo neofascista», disse. «Precisamos de reforçar a unidade e a organização para defender a democracia», acrescentou, recordando que os seus «familiares e colegas lutavam por uma sociedade mais justa, igualitária, solidária e soberana». 

«Foi por isso que os levaram», afirmou, para sublinhar que, hoje, os organismos de defesa dos direitos humanos tomam as suas bandeiras, pois «o governo de Milei vem por tudo: pelos nossos direitos, pela nossa soberania e pela nossa liberdade».

Pérez Esquivel: «Rejeitamos o negacionismo e a apologia do terrorismo de Estado»

Na sua intervenção, Adolfo Pérez Esquivel, prémio Nobel da Paz, fez questão de repudiar o negacionismo do executivo de Milei e, no mesmo sentido, destacou que «são 30 mil, são a afirmação da identidade de um povo em luta».

Adolfo Pérez Esquivel na mobilização de Buenos Aires, no Dia Nacional da Memória pela Verdade e Justiça // Leandro Teysseire / Página 12

Pérez Esquivel reivindicou ainda «a continuidade das políticas de Memória, Verdade e Justiça promovidas pela Secretaria dos Direitos Humanos e a preservação dos Sítios e Espaços de Memória, lugares fundamentais para a educação, arquivo, protecção patrimonial e promoção dos direitos em todo o país».

Outros pontos destacados e condenados por Pérez Esquivel, refere o Página 12, foram a política de ajuste que o governo de Javier Milei está a aplicar na Argentina de «forma brutal e acelerada»; o crescimento dos discursos de ódio e o questionamento das políticas de igualdade e inclusão desde que este governo tomou posse; bem como os despedimentos, a desvalorização dos salários, o aumento da fome nos bairros populares, onde «se vive uma emergência humanitária sem precedentes».

«Lembramos a este governo que deve ter presente que com o ódio, a repressão e o revanchismo não se pode construir uma sociedade mais justa e fraterna», afirmou ainda o prémio Nobel da Paz argentino.

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De Carlotto denunciou que La Libertad Avanza (LLA; coligação que apoia Milei) responde aos repressores da ditadura, e teve palavras de agradecimento para o apoio anunciado, neste contexto, pelo governador da província de Buenos Aires, Axel Kicillof (peronista), que prometeu criar uma unidade de investigação de roubo de menores na região que governa.

No que respeita às afirmações recentes de Milei em defesa do prestígio das Forças Armadas na Argentina e na insistência numa «reconciliação», De Carlotto foi peremptória: «Nada de reconciliação.»

«Aqui é verdade, memória e justiça. Aqui houve um genocídio. Houve mortos, feridos, desaparecidos, crianças roubadas. Tudo isso tem de ser esclarecido», disse.

«É preciso investigar a responsabilidade de cada qual. Quem não fez nada de mal estará tranquilo e os que o fizeram têm de pagar para evitar que no futuro a história se volte a repetir. […] Aqui houve 30 mil desaparecidos, e ainda gozam com este número», frisou.

«Deviam estar fora do Congresso»

Sobre os seis deputados da LLA que, no passado dia 11 de Julho, foram visitar genocidas «condenados por crimes aberrantes» à prisão de Ezeiza, Estela de Carlotto defendeu que deviam ser expulsos do Congresso argentino.

«Foram ver criminosos – que não se arrependem e que, se saíssem, voltariam a fazer o mesmo, como o afirmam. […] Dizem que foram por erro. Não nos façam de parvos. Sabiam quem iam ver. Fizeram fotografias. Estão a gozar com o povo», criticou.

«Há um sector da sociedade que não sofreu o que nós sofremos e que nem sequer ficou a saber pela imprensa ou pelos livros o que se passou e não se deve voltar a passar. Seria bom que nas escolas e nas universidades se continuasse a falar dos direitos humanos e de quando foram violentados», defendeu.

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