O primeiro-ministro chamou-lhe «ambicioso», a Intersindical admite que o documento assinado hoje pelo Governo, associações patronais e UGT «hipoteca o desenvolvimento do país».
No essencial, «o texto trava a já insuficiente valorização do SMN [salário mínimo nacional] e insiste na falsa ideia de elevação do salário médio mantendo as normas gravosas da legislação laboral», ao mesmo tempo que «responde aos interesses dos grupos económicos e financeiros, também por via da fiscalidade», admite a central sindical num comunicado.
O documento dá continuidade ao denominado «Acordo de Médio Prazo para a melhoria dos rendimentos, dos salários e da competitividade», de 2022, e do seu reforço (em 2023). Isto é, «assenta nas premissas do negociado e assinado» pelo anterior governo do PS, patrões e UGT, «que está em linha e acomoda o Programa do actual Governo, o que não deixa de ser revelador da natureza do acordo e seu reforço e cujas medidas se situam nos antípodas do urgente, possível e necessário aumento geral e significativo dos salários», atenta a CGTP-IN.
A central sindical recorda que, apesar de o resultado ser aquele que hoje se conhece, ao longo deste processo apresentou propostas de valorização do trabalho e dos trabalhadores, «determinantes para a elevação das condições de trabalho e de vida e o desenvolvimento do país». «Fizemos uma análise crítica aos conteúdos e efeitos do Acordo, não só ao nível do SMN, mas também dos restantes salários e denunciámos a forma como na fiscalidade são as grandes empresas aquelas que mais têm beneficiado», acrescenta.
A CGTP-IN considera que é urgente garantir que qualquer trabalhador consiga, através do seu salário, fazer face às despesas do dia-a-dia e ter um nível de vida digno, e insiste que, ao contrário do que fica escrito hoje, de aumentos anuais de 50 euros até 2028 (fixando-se em 774,30 euros líquidos em 2025), é possível atingir os 1000 euros de salário mínimo já no próximo ano. Além de ser também uma necessidade para os trabalhadores portugueses, que têm mais mês do que salário e trabalham mais horas e anos, e com horários desregulados, que os trabalhadores dos países vizinhos.
A desigualdade na distribuição da riqueza é uma das críticas da Inter, que aponta às dificuldades que resultam do aumento do custo de vida para ilustrar a urgência do aumento geral e significativo de todos os salários. Insiste, ao mesmo tempo, que sem a revogação das normas que atacam a contratação colectiva, o salário médio não avança. «A inclusão no acordo de referenciais para a evolução do salário médio é utilizado pelos patrões como tecto salarial na negociação da contratação colectiva, como comprovadamente se verificou em 2023 e 2024, para além de servir como meio para obter significativos benefícios fiscais», critica a central sindical.
No sector privado, «para romper com a compressão das tabelas salariais em torno do SMN (que se verifica e que o acordo estimula), o que é preciso é libertar a contratação colectiva das normas da legislação que a limita e restringe», acrescenta, lembrando que o número de trabalhadores abrangidos pela renovação da contratação colectiva «caiu a pique» com as alterações introduzidas, principalmente depois de 2003, «com efeitos nefastos na desvalorização salarial».
Para melhor ilustrar as consequências sentidas por quem vive apenas do seu salário, a CGTP-IN apresenta uma análise com base no peso médio dos salários e ordenados no PIB, nos dez anos anteriores a 2003 e a evolução posterior, onde se conclui que a perda acumulada para os trabalhadores foi superior a 70 mil milhões de euros desde a entrada em vigor do Código do Trabalho.
«Não vislumbrando no acordo quaisquer medidas no sentido de romper com o modelo assente em baixos salários e na precariedade», a CGTP-IN mantém a reivindicação de um aumento geral e significativo dos salários, em pelo menos 15% e nunca inferior a 150 euros, sem contrapartidas por parte do Estado, ou seja, sem benefícios fiscais. Até porque, atenta a Inter, o incremento geral dos salários tem como efeito uma dinamização da actividade económica, em particular das micro empresas, onde 91% das vendas é feita no mercado nacional.
Dinheiro que vai para grandes empresas falta às funções sociais
O agravamento da injustiça fiscal é outra das críticas apontadas ao documento. «Não só se mantêm os aspectos mais negativos presentes no Acordo (de 2022) e no seu reforço (em 2023), como se introduzem novas e mais negativas reduções para o grande capital, agravando o carácter injusto da política fiscal», censura a CGTP-IN. «É assim com a descida do IRC, com uma redução progressiva até 2028, que beneficia essencialmente as grandes empresas (responsáveis por mais de 50% da receita de IRC)», com prejuízo para o Estado.
«Contas do Governo apontam para uma perda de receita fiscal de 500 milhões de euros ao ano por cada 2pp de redução, que será aproveitada pelas muito grandes empresas, as mesmas que, nos primeiros seis meses deste ano, acumularam 32 milhões de euros de lucros líquidos ao dia», critica. Acrescenta a central sindical que os benefícios fiscais atribuídos, como seja o Regime de Incentivo de Capitalização das Empresas, o Regime Fiscal de Apoio ao Investimento ou o previsto para o aumento do salário, «são aproveitados, de forma expressiva, por estas grandes empresas, prescindindo o Estado de receitas que fazem falta ao SNS, à habitação pública ou, entre tantas outras áreas com carências, ao ensino, para que aqueles que deveriam pagar mais impostos, sejam ainda mais isentados».
«Este é mais um acordo que em nada responde aos problemas dos trabalhadores, antes os mantém e agrava, nem tão pouco responde às alterações necessárias para o desenvolvimento do país, não tendo por isso as condições necessárias para ser subscrito pela CGTP-IN», lê-se na nota.
De 7 de Outubro a 8 de Novembro, a Intersindical promove em todo o país uma acção de mobilização, reivindicação e luta por melhores salários e pela valorização das carreiras, e manifestações nacionais, no dia 9 de Novembro, em Lisboa e no Porto.
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