«Não Somos Caixote do Lixo», foi a resposta do povo madeirense ao exílio temporário de Américo Tomás e Marcelo Caetano na região, um sentimento passado a palavras na faixa carregada pelo povo madeirense durante a primeira manifestação do 1.º de Maio na Madeira, após o 25 de abril de 1974. É um sentimento que, ao longo de décadas, é manifestado, pelos madeirenses e portossantenses, devido a décadas de governação do PSD, criando-se, ao longo dos anos, face à ausência de respostas aos problemas que se avolumam, uma apatia política, uma desconfiança nas forças governamentais e um comodismo.
No entanto, engana-se quem pensa que é um povo submisso, muito pelo contrário, é um povo com muitas lutas, que durante a longa noite fascista não ficou de braços cruzados, e que construiu a Revolta do Leite, a Revolta da Madeira, a Revolta da Água, a longa luta contra o regime da colónia, e que aos dias de hoje, mesmo enfrentando um regime cinquentenário que condiciona a realidade política, económica e social do povo, luta nas zonas altas pelo acesso e a construção de estradas, pelo saneamento básico no Garachico, contra o encerramento da feira do Santo da Serra, pelos direitos de quem trabalha no CARAM, das trabalhadoras da Casa da Misericórdia de Machico dos pescadores contra as limitações das quotas da pesca e a luta dos estudantes da Universidade da Madeira por mais e melhores condições na sua Universidade e no ensino superior.
Há naturalmente um caminho que nos trouxe até aqui. Muitos desconhecem o passado do PSD-Madeira e da sua proximidade ao movimento terrorista, anticomunista e de extrema-direita paramilitar FLAMA (Frente de Libertação do Arquipélago da Madeira), estando ainda por explicar, nos dias que correm, o papel que o cofundador do PSD e ex-presidente do governo regional Alberto João Jardim e o bispo Francisco Lopes Santana desempenharam nesta organizaçáo. A FLAMA foi um movimento político contra-revolucionário criado pela burguesia regional em resposta ao 25 de abril e às suas conquistas e ao desmonte das estruturas políticas e económicas que sustentavam o fascismo, aproveitando-se do povo e da vontade popular pela autonomia, utilizando discursos separatistas e nacionalistas, instalando o medo do comunismo, perseguindo dirigentes de partidos de esquerda, bombardeando sedes, carros e aviões. Não tinha, verdadeiramente, como objetivo uma autonomia ao serviço do povo, muito pelo contrário, o que pretendiam era uma autonomia ao serviço dos grandes grupos económicos.
Mas conseguiram o que queriam. Com os mesmos discursos, reina o PSD na Madeira e, tal como a FLAMA, utilizavam, e até hoje utilizam, o mesmo discurso: Clamam que a Lisboa comunista e os seus «cubanos» queriam era o dinheiro dos madeirenses e dos portossantenses, criam assim um bode expiatório para conseguirem fazer a cabeça aos milhares de madeirenses e portosantenses que procuravam uma vida melhor: só o PSD é que era bom, só o PSD queria a democracia, só o PSD queria saber da Madeira.
A verdade é que os sociais-democratas, os de nome e os outros, queriam e querem a Madeira e o Porto Santo ao seu dispor para satisfazerem os interesses que servem. Com todos os seus saudosismos à ditadura fascista, continua a reinar a pobreza, desde a exploração até a última gota da identidade cultural madeirense e da ilha, para os interesses dos senhores do dinheiro que muito lucram com o turismo e a especulação imobiliária, o encobrimento da pobreza que se via nas ruas dos vários concelhos da ilha, nos anos 90, como o caso dos «meninos das caixinhas», até às alegadas interferências em resultados eleitorais, a influências de voto com favorecimentos, arraiais, inaugurações feitas à pressa, ameaças e subornos aos trabalhadores, reformados e aos jovens, tudo conta para que o PSD Madeira consiga manter o seu domínio nas ilhas.
E estes quase 50 anos de governação PSD têm consequências na percepção individual e coletiva dos madeirenses. Procuram confirmar o comodismo, o «faz parte», que «é mesmo assim», que, no fundo, é esta a realidade a que a Madeira e as suas gentes estão condenadas. Que é normal os jovens madeirenses e portosantenses sentirem-se apáticos em relação à realidade política, social e cultural que os rodeia.
«Que melhorias substanciais vimos com a governação do PS no governo da república? Ou nos concelhos onde estão em maioria nas câmaras, em Machico e na Ponta do Sol, onde só se vê estagnação? E que fez durante os 20 anos de governação nos Açores? E, no caso do JPP, quantos munícipes de Santa Cruz ainda esperam por habitação, e os feirantes e mercadores da freguesia do Santo da Serra que se queixam da falta de condições, e a câmara JPP faz ouvidos moucos?»
Que é normal, que, por opção política do governo regional, os jovens tenham que sair da ilha para poderem prosseguir os seus estudos e terem uma vida melhor, que tenham de pagar para estudar, que as suas escolas fechem, que as escolas não tenham condições, que seja normal que os estudantes não tenham voz, que o autocarro venha cheio até ao Funchal ou até casa, que as carreiras sejam poucas e o passe regional muito caro, que as oportunidades de trabalho sejam quase inexistentes e precárias, que a destruição do aparelho produtivo, substituído pela monocultura do turismo seja a regra, que a cultura seja apenas para alguns e ao serviço do turismo e da boa imagem da Madeira, que faltem médicos de família, que haja uma abundância de hotéis, apartamentos de luxo e alojamentos locais, mas que o custo da habitação na Madeira seja insuportável e que seja natural que a costa norte, as zonas altas e o Porto Santo sejam abandonados para depois serem entregues aos especuladores.
Mas não foi o PSD, sozinho, que criou todos estes problemas, foi também graças às suas bengalas no Parlamento regional, a mais antiga delas o CDS-PP, acompanhado mais recentemente pelo PAN, Chega e IL. É também pela suposta «oposição» do PS e do JPP, que, quando é a oportunidade deles de governar, fazem mais do mesmo. Que melhorias substanciais vimos com a governação do PS no governo da república? Ou nos concelhos onde estão em maioria nas câmaras, em Machico e na Ponta do Sol, onde só se vê estagnação? E que fez durante os 20 anos de governação nos Açores? E, no caso do JPP, quantos munícipes de Santa Cruz ainda esperam por habitação, e os feirantes e mercadores da freguesia do Santo da Serra que se queixam da falta de condições, e a câmara JPP faz ouvidos moucos?
A solução não está em apenas derrubar o PSD, está em derrubar também esta política de empobrecimento e de todos os que a praticam, é preciso combater todas as políticas de direita, extremamente danosas para quem vive na Madeira e no Porto Santo. Para defender os interesses dos mais ricos já existem deputados a mais no parlamento regional, o que é necessário neste momento são deputados que realmente defendam os direitos dos jovens e dos trabalhadores.
Se os lucros de milhões de euros da monocultura do turismo batem todos os anos novos recordes, se há dinheiro para construir um teleférico no Curral das Freiras (e contra a vontade da população!), para construir campos de golfe, não nos venham dizer que não há dinheiro de sobra para resolver todos os problemas que as populações, os trabalhadores e os jovens da Madeira e do Porto Santo enfrentam.
Mas, mesmo apesar de todos estes problemas, a verdade é que há sempre alguém que resiste. Apesar dos apelos diários do Presidente do Governo Regional à estabilidade, esta é a hora de dizer que essa estabilidade não interessa ao povo. São 49 anos de uma política de estabilidade para os grandes grupos económicos, de compadrio, de limitação de liberdades e de caciquismo político, de pobreza, sonhos adiados ou perdidos, Está na hora de dar estabilidade à vida da juventude e dos trabalhadores. Não é porque hoje as coisas estão mal que será sempre assim, não estamos condenados a ser governados pelo PSD e pela política de direita para sempre.
A atual situação não dita o futuro, não será eterna, pois está, como sempre esteve, nas mãos do povo madeirense e portosantense, lutar e dizer, tal como está escrito na faixa «não somos caixote do lixo»!
Contribui para uma boa ideia
Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz.
O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.
Contribui aqui