Emmanuel Macron deu ontem, a vários órgãos de comunicação social europeus, a sua primeira grande entrevista. A partir dos jardins do Palácio do Eliseu, o presidente francês elogiou as «reformas estruturais» que a Alemanha realizou «nos últimos quinze anos», defendendo que é esse o caminho, também, para o seu país.
Para Macron, a União Europeia deve «recuperar a confiança» dos cidadãos sob a batuta da sua França e da Alemanha de Merkel.
A sua eleição para a presidência e a conquista da maioria absoluta dos deputados (com menos de 30% dos votos na primeira volta das legislativas) pelo partido que criou, «A República em Marcha!», foi caracterizado por si como «um renascimento da França, e espero que [também] da Europa».
Macron afirma que os resultados das legislativas (que tiveram a segunda volta no domingo passado) representam o culminar do «colapso dos partidos tradicionais franceses». Os partidos que governaram a França nas últimas décadas (Partido Socialista, PS, e a direita gaullista, hoje «Os Republicanos») foram duramente penalizados: em conjunto, perderam 379 deputados (em 577 parlamentares).
Velhos governantes com nova roupagem cooptados para o executivo
No entanto, nem a aritmética nem o governo ontem nomeado por Macron confirmam as afirmações do ex-banqueiro. A sua «Marcha!» conseguiu 308 lugares, uma das mais curtas maiorias dos últimos 20 anos; um olhar mais cuidado à composição do grupo parlamentar e do governo mostra que o nome pode ter mudado mas as caras não.
Se o próprio Emmanuel Macron não fosse exemplo disso mesmo – enquanto ex-ministro da Economia do último governo do PS, com François Hollande –, o primeiro ministro Édouard Philipe dissipa quaisquer dúvidas, não fosse ele um destacado representante da direita gaullista.
Sintomaticamente, uma das prioridades do novo poder, assumida por Macron na campanha para as presidenciais, é mais uma revisão às leis laborais. Para a tutela do Trabalho, a escolha recaiu sobre Muriel Pénicaud, que, desde 2002, passou pela administração de empresas como a Dassault Systémes, a Danone, a SNCF (caminhos de ferro), a Orange (telecomunicações) ou a Aeroportos de Paris. A partir de Janeiro de 2015, assumiu a direcção-geral da Business France, agência de apoio ao investimento e à internacionalização das empresas.
A máquina que ainda não arrancou mas já perde peças
O governo nomeado ontem conta com várias baixas em relação ao que foi empossado após as presidenciais, nomeadamente a ausência de qualquer membro do MoDem – o segundo partido da «maioria presidencial». No início da semana caíram Sylvie Goulard e Richard Ferrand, ambos sob suspeita de corrupção. Ontem, foram François Bayrou, líder do partido, e Marielle de Sarnez, que assumirá a liderança do grupo parlamentar, a pedir para ficar de fora do novo executivo de Philipe. O MoDem, com apenas 4% na primeira volta, elegeu 42 deputados no domingo, fruto da aliança com o «Em Marcha!» de Macron.
PCF e FI prometem «convergência» e «frente dupla» no combate a Macron
A Assembleia Nacional terá dois grupos parlamentares na oposição ao governo de Macron, à esquerda do PS. O Partido Comunista Francês (PCF), com 11 deputados eleitos, anunciou ontem que vai formar um grupo com quatro deputados oriundos dos territórios ultramarinos. A França Insubmissa (FI), do candidato presidencial Jean-Luc Mélenchon, formará o outro grupo parlamentar, com 16 deputados.
Em conferência de imprensa, ontem, o deputado comunista André Chassaigne afirmou que entre as duas formações parlamentares haverá «não divergência, mas convergência». A ideia foi partilhada por Mélenchon à entrada no Palácio Bourbon, onde está instalada a Assembleia Nacional, informava ontem o L’Humanité.
A decisão foi saudada pela presidente do grupo «Comunistas, Republicanos e Cidadãos» no Senado, Eliane Assassi. A formação dos dois grupos vai permitir «duplicar» a frente de combate às políticas de Macron, defendem várias figuras da esquerda francesa.
Macron admite ataque na Síria, «mesmo que a França actue sozinha»
Em matéria de política externa, o presidente francês decidiu ontem transmitir uma mensagem de força. Não para com a União Europeia (UE), que deseja aprofundar; nem para com o Reino Unido, cuja decisão de saída da UE quer ajudar a reverter; tampouco para com os EUA e Donald Trump, apesar das críticas à saída do Acordo de Paris sobre alterações climáticas, anunciada pelo presidente norte-americano.
A grande promessa da «nova» política externa francesa foi anunciada por Macron com firmeza: está disposto a bombardear a Síria, sozinho se preciso, caso sejam ultrapassadas as «linhas vermelhas» que o próprio traçou. A saber, a utilização de armas químicas ou o desrespeito dos corredores humanitários, sem que diga por quem nem que alvos irá atacar.
A entrevista ao presidente francês foi conduzida por jornalistas de oito jornais europeus: Le Figaro, Le Temps, Le Soir (França), El País (Espanha), The Guardian (Reino Unido), Corriere della Serra (Itália), Süddeutsche Zeitung (Alemanha) e Gazeta Wyborcza (Polónia).
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