78.º Aniversário das greves de 8 e 9 de Maio de 1944

Há 78 anos, nos dias 8 e 9 de Maio, na região de Lisboa e do Baixo Ribatejo, o País foi abalado por greves, manifestações e marchas da fome, nas quais participaram dezenas de milhares de operários e camponeses, «Pelo pão e pelos géneros», que constituíram uma grandiosa e significativa jornada de luta contra o fascismo.

Assinalamos este acontecimento, porque, embora num contexto diferente, vivemos um momento em que assistimos a uma intensa exploração dos trabalhadores por parte do capital, que usa como pretexto a guerra e as sanções, que especula descaradamente, concentrando fabulosos lucros, provocando o aumento brutal do custo de vida e fazendo crescer as desigualdades e as injustiças sociais. Ao mesmo tempo que, através do domínio dos principais órgãos de comunicação social, promove uma violenta ofensiva ideológica e anti-democrática contra quem, no plano político e social, se lhes opõe.

Lembrar o que foi esta heróica luta e muitas outras desenvolvidas pelo movimento operário tem como objectivo, não só dá-las a conhecer, mas também transmitir experiências que possam contribuir para melhor podermos prosseguir essas lutas, com igual determinação e confiança, em defesa dos direitos e interesses de quem trabalha e produz.  

Entretanto, ao evocarmos as greves de 8 e 9 de Maio de 1944 precisamos de ter presente que elas são inseparáveis das muitas outras lutas que as antecederam, nomeadamente desde a instauração da ditadura fascista, em 1926, de que é exemplo o 18 de Janeiro de 1934, na Marinha Grande, contra a fascização dos sindicatos.

«(...) embora num contexto diferente, vivemos um momento em que assistimos a uma intensa exploração dos trabalhadores por parte do capital, que usa como pretexto a guerra e as sanções, que especula descaradamente, concentrando fabulosos lucros, provocando o aumento brutal do custo de vida e fazendo crescer as desigualdades e as injustiças sociais.»

Precisamos também de registar que foram as grandiosas greves de 8 e 9 de Maio que estimularam e impulsionaram as inúmeras lutas que se seguiram nas décadas de 50 e 60, com destaque para a luta pela conquista das oito horas de trabalho nos campos do Alentejo e do Ribatejo, em Maio de 1962, as movimentações que estiveram na base da criação da Intersindical, em 1970, que por sua vez impulsionaram as grandes lutas operárias que se desenvolveram de Outubro de 1973 até Abril de 1974 e que envolveram mais de 100 000 trabalhadores.

Todas estas e muitas outras lutas, desenvolvidas sob a mais feroz repressão, tiveram um papel fundamental no agudizar das contradições do regime fascista e criaram as condições para o êxito do levantamento militar, logo seguido do levantamento popular, que, no dia 25 de Abril de 1974, pôs fim a 48 anos de ditadura.  

Centrando-nos agora nas greves de 8 e 9 de Maio de 1944, importa assinalar que, há época, em plena Segunda Guerra Mundial, o descontentamento dos operários e dos camponeses era muito grande. 

Os salários de miséria, o racionamento do pão, assim como o açambarcamento de géneros e o mercado negro, possibilitaram o rápido e escandaloso enriquecimento de uns poucos à custa da fome dos trabalhadores e das suas famílias. Enquanto isto se passava no nosso país, Salazar enviava para a Alemanha nazi os géneros alimentícios que negava aos portugueses. 

A crise económica, acompanhada de uma brutal exploração, levara já a classe operária e muitos trabalhadores de diversos sectores à realização de várias greves em 1942 e 1943, dirigidas e dinamizadas pelo PCP na clandestinidade, que, na sequência da «reorganização de 1940/41», se transformou num grande partido nacional, organizador da luta popular e impulsionador da unidade antifascista.  

Respondendo ao apelo do Partido para a concretização de dois dias de greve, nos dias 8 e 9 de Maio de 1944, «Pelo pão e pelos géneros», dezenas de milhares de operários e camponeses da região de Lisboa e do Baixo Ribatejo aderiram à greve e transformaram-na numa poderosa jornada de luta contra o fascismo.

As greves iniciaram-se no dia 8 de Maio ao fim da manhã em importantes empresas de Alhandra, como a Cimentos Tejo; em Santa Iria da Azóia, Covina; na Póvoa, Soda Póvoa; em Sacavém, Fábrica da Loiça, e tiveram enorme impacto e projecção em muitas outras pequenas empresas, destas e de outras localidades. Em Sacavém e Alhandra praticamente ninguém trabalhou.

Duas grandes manifestações «Pelo pão e pelos géneros» tiveram lugar durante estas jornadas: a manifestação de 2000 a 3000 pessoas sobre Vila Franca de Xira e outra de cerca de 3000, da região de Sacavém, sobre Loures.

Nas regiões de Vila Franca, A-dos-Loucos, São João dos Montes, Rondulha, A-dos-Bispos, Cotovios, Cardosas, Apelação, Loures, Lousa e Queluz milhares de camponeses largaram o trabalho e juntaram-se aos operários das fábricas. Os sinos tocaram a rebate e os trabalhadores e a população destas regiões organizaram marchas da fome, com homens, mulheres e crianças empunhando bandeiras negras e gritando: «Temos fome», «Queremos pão, Queremos comer». 

Durante as greves e as marchas da fome os trabalhadores tiveram que enfrentar fortes contingentes da GNR e as ameaças e provocações dos agentes da PVDE (Polícia de Vigilância e Defesa do Estado, que a partir da derrota do nazi-fascismo passou a designar-se PIDE – Polícia de Investigação e Defesa do Estado). 

No dia 8 à tarde, a GNR carrega sobre os manifestantes que a partir de Alhandra se dirigiam para Vila Franca. As forças repressivas forçam cerca de 300 trabalhadores a entrarem para a Praça de Touros, onde ficam presos.

No dia seguinte fazem uma selecção e levam para a Praça do Campo Pequeno os que eles pensavam ser os mais responsáveis, alguns dos quais foram transferidos para Caxias, onde são sujeitos a torturas e lá ficam durante largos meses. Muitos outros são despedidos, ficam sem trabalho e as famílias sem sustento.

A perseguição e a intimidação sobre vários activistas é enorme e muitos destes são obrigados a passar à clandestinidade. Mas, apesar da repressão, o fascismo viu-se obrigado a ceder.

Duas semanas após a grandiosa jornada de 8 e 9 de Maio, o governo foi obrigado a aumentar a quantidade de pão racionado e vários patrões viram-se forçados a aumentarem os salários.

«A perseguição e a intimidação sobre vários activistas é enorme e muitos destes são obrigados a passar à clandestinidade. Mas, apesar da repressão, o fascismo viu-se obrigado a ceder.»

Com o êxito destas greves, «o fascismo tremeu», como considerou o dirigente do PCP, Alfredo Dinis (Alex), que esteve no centro de toda a acção desta histórica jornada de luta, e que viria a ser assassinado pela PIDE um ano mais tarde, quando, na estrada de Bucelas, se dirigia de bicicleta para um encontro.

Assim foi. O fascismo tremeu face à unidade, à organização e à combatividade das massas trabalhadoras e do povo, sob a direcção do PCP que foi o único partido que, na clandestinidade, fez frente ao terror fascista.

As greves de 8 e 9 de Maio puseram em evidência que, mesmo sob uma ditadura fascista, os trabalhadores unidos, organizados e lutando com determinação e confiança podem obter conquistas importantes para a melhoria das suas condições de vida e de trabalho. 

É por isso que faz todo o sentido uma palavra de reconhecimento e homenagem aos heróicos homens e mulheres que, por amor aos seus filhos, não olhando a sacrifícios nem a privações, lutaram com honra, dando uma grande lição de dignidade e entrega à nobre causa dos explorados e oprimidos. 

Ao mesmo tempo que honramos o seu heroísmo, é nosso dever prosseguirmos a sua abnegada luta, lembrando-nos e nunca perdendo de vista que a liberdade e a democracia, alcançadas em 25 de Abril, e as conquistas da Revolução, consagradas na Constituição da República Portuguesa, são inseparáveis da longa e histórica luta dos trabalhadores, do povo português contra o fascismo e pelos valores de Abril no futuro de Portugal.