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Cristina Torres: «56 euros não resolvem a nossa vida»

Empobrecimento é palavra entranhada nos milhares de trabalhadores da Administração Local e empresas municipais, que esta sexta-feira estão em luta. O AbrilAbril falou com a presidente do STAL sobre a insatisfação e as reivindicações que os levam à rua.

Cristina Torres, presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL/CGTP-IN), participou numa acção de protesto realizada hoje, 1 de Abril de 2024, para exigir a aplicação do suplemento de penosidade e insalubridade a todos os que têm direito, junto à sede da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), em Coimbra. 
CréditosPaulo Novais / Agência Lusa

Cristina Torres cumpriu recentemente o primeiro ano à frente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, Empresas Públicas, Concessionárias e Afins (STAL/CGTP-IN). Um ano com «muita presença nos locais de trabalho, muita luta e muitos trabalhadores a aderir ao sindicato», conta-nos a dirigente. O saldo é de mais de três mil novas sindicalizações em 2024, número que reforça a confiança na luta que travam para melhorar as condições de vida. A greve desta sexta-feira, para que os trabalhadores da Administração Local, de empresas municipais e concessionárias, e de associações humanitárias de bombeiros voluntários possam participar na manifestação nacional, que parte às 14h30 da Praça da Figueira, em Lisboa, em direcção ao Ministério das Finanças, afecta, sobretudo, escolas e recolha do lixo. São trabalhadores imprescindíveis para o funcionamento destes serviços, que no final do mês não levam para casa o suficiente para viver. Alguns, denuncia Cristina Torres, são obrigados a procurar um segundo emprego ou o «biscate», mas também já há «os que vivem sem tecto».  

A dirigente sublinha a importância de dar visibilidade ao protesto e às justas reivindicações, que em Setembro do ano passado fizeram chegar ao Governo, na forma de abaixo-assinado. «Este Executivo é governo, mas apenas para os grandes grupos económicos, para os que pretendem abocanhar tudo o que lhes satisfaça a ganância do lucro. Para os trabalhadores, este executivo é um desgoverno. Propaganda e mais propaganda e empobrecimento de quem trabalha e produz a riqueza deste país», critica a presidente do STAL. Os 56 euros de actualização salarial para 2025 ajudam a perceber a revolta. «Rapidamente concluímos que não dá! Não são 56 euros que me permitem respirar de alívio – pagar as contas, a casa, alimentar a família e… poder ter aquelas férias que mereço». 

Desigualdade exige outra política

Com a actualização deste ano, os trabalhadores das carreiras gerais de Assistente Operacional e de Assistente Técnico passaram a ter como salário base 878 e 979 euros, respectivamente. Valores insuportavelmente baixos, quando se olha para os preços da habitação e dos bens essenciais. «Todos nós perdemos, em média, três salários desde 2010, e os preços não param de aumentar!», frisa Cristina Torres. Entretanto, os lucros dos grandes grupos económicos que vêm sendo divulgados fazem sobressair a desigualdade na distribuição da riqueza. «É escandaloso», admite a dirigente, salientando que, ao contrário dos salários, «os preços não param de aumentar e os lucros também não».

A Empresa Geral do Fomento (EGF) é «um exemplo que ajuda a perceber a nossa razão», diz Cristina. Privatizada em 2014 e a intervir no tratamento e valorização de resíduos, com a Mota-Engil como accionista maioritário, anunciou ontem que os seus lucros cresceram 8% em 2024, para 123 milhões de euros. «No entanto, aos trabalhadores do grupo EGF foram anunciados aumentos salariais entre 15 e 21,50 euros», critica a dirigente.

Olhando para os lucros acumulados pelos 19 maiores grupos económicos no primeiro semestre de 2024, de 32 millhões de euros por dia, Cristina Torres rapidamente conclui que, repartido pelos assalariados, esse valor permitia um aumento de 176 euros no salário mensal. «Ora, nós reivindicamos 150 euros como o aumento salarial mínimo e necessário e um salário mínimo nacional de mil euros», possível, defende, «se for essa a opção política». 

Portanto, conclui, «precisamos de outras políticas, o que equivale a dizer que precisamos de outro governo». Acrescenta que «PS, PSD e CDS já provaram que não resolvem» e que «o CH e a IL demonstram estar alinhados com os que não resolvem», frisando que «o caminho só pode ser o da mudança de política». 

Penosidade e risco... também para os serviços públicos

A actualização do suplemento de penosidade e insalubridade, devido por lei a trabalhadores que exercem profissões especialmente penosas, e a inclusão do risco é outra das lutas travadas pelo STAL. Em Setembro de 2024, o sindicato denunciou que um quarto dos municípios ainda não pagava a penosidade. O tema remonta a Março de 1998, data do decreto de lei que previa um suplemento de penosidade, insalubridade e risco, segundo o qual: «na Administração Pública existem determinados grupos ou sectores de pessoal que, por razões inerentes ao respectivo conteúdo funcional, nomeadamente a sua natureza, meios utilizados ou factores ambientais, ou por razões resultantes de factores externos, exercem a sua actividade profissional em situações susceptíveis de provocar um dano excepcional na sua saúde que deve ser adequadamente compensado». 

Cristina Torres regista que este diploma não limitava o suplemento a uma determinada categoria, até porque em 1998 existiam carreiras, e que, além da atribuição do suplemento, previa também a redução do tempo de serviço para efeito de aposentação, a redução do horário de trabalho, ou o acréscimo dos dias de férias, que não chegou a ser regulamentado para a Administração Local. 

A luta do STAL, que em Março de 2019 chegou a apresentar uma petição, resultou no suplemento de penosidade e insalubridade. Portanto, salienta Cristina Torres, «a luta continua pela actualização do actual suplemento e a sua aplicação a todos os trabalhadores que a ele têm direito», e pelo «pleno direito ao suplemento de penosidade, insalubridade e risco». 

Até porque, tal como os trabalhadores, também os serviços públicos acabam afectados pela desvalorização das carreiras dos seus funcionários. «O serviço público garante-se com base na consciência que os trabalhadores têm do seu imprescindível papel na vida do nosso país e das populações», defende a presidente do STAL. Mas quando os salários são baixos, o que dificulta a vida e a contratação de novos trabalhadores; quando a evolução na carreira depende de um sistema de avaliação (SIADAP), «que é injusto porque impõe quotas que limitam a progressão salarial e na carreira»; quando as condições de segurança e saúde no trabalho «são más» ou «enquanto os trabalhadores da Administração Local não virem reposto o pleno direito às indemnizações por acidente de trabalho ou doença profissional», fica também ameaçada a qualidade dos serviços públicos e os direitos que garantem, bem como a satisfação das necessidades das populações. 

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