Passaram sensivelmente duas semanas desde a eleição para secretária-geral da CGTP-IN. Que importância dá ao facto de ser a primeira mulher a liderar uma central sindical nacional?
É uma grande honra o colectivo ter considerado, no quadro da distribuição das muitas responsabilidades na direcção da CGTP-IN, que deveria ser eu a assumir esta função. Naturalmente que ser a primeira mulher a assumi-la tem ainda maior significado.
A sua eleição traduz uma dinâmica presente nos sindicatos da CGTP-IN, com mais mulheres a assumirem responsabilidades?
O que verificamos com grande satisfação é que, com a acção e intervenção da CGTP-IN, tem vindo a aumentar a sindicalização das mulheres trabalhadoras e a eleição de delegadas sindicais, fruto da sua maior participação na luta por melhores condições de vida e de trabalho. Entretanto, isso tem-se reflectido também no número de mulheres nos órgãos da CGTP-IN, a todos os níveis da estrutura sindical, nomeadamente nos sindicatos, uniões de sindicatos e federações.
Um relatório da Comissão Europeia confirmou recentemente que, apesar do crescimento potencial de Portugal estar acima da média da zona euro, não se verifica uma convergência salarial. A política de baixos salários é o principal flagelo do mundo laboral?
Sim. É o resultado da opção dos sucessivos governos a favor do grande capital e de submissão às imposições da União Europeia. Mesmo na anterior legislatura, o PS não permitiu aproveitar a nova correlação de forças na Assembleia da República, limitando os avanços na melhoria das condições de vida e direitos dos trabalhadores.
Continuamos a ter um modelo de baixos salários, a par da precariedade e desregulação dos horários de trabalho, que constituem grandes prioridades da nossa acção e intervenção reafirmadas no XIV Congresso: o aumento significativo dos salários, de 90 euros em 2020 para todos os trabalhadores dos sectores privado e público; 850 euros para o salário mínimo nacional, a curto prazo; a valorização das carreiras e qualificações adquiridas, no sentido de melhorar a vida dos trabalhadores e das suas famílias, e também para o desenvolvimento da economia e o aumento da produção nacional.
«Os trabalhadores têm direito a ter vida pessoal e familiar, a ter vida para além do trabalho»
Consideramos que os trabalhadores têm direito a ter vida pessoal e familiar, a ter vida para além do trabalho. A ter direito, nomeadamente, a um salário digno, a trabalho com direitos, a que um posto de trabalho permanente corresponda um vínculo efectivo, à redução do horário de trabalho para as 35 horas e à revogação dos regimes de desregulação dos horários, como os bancos de horas e adaptabilidades, e impedir a laboração contínua e o trabalho por turnos nas situações em que não são mesmo necessários.
Estas são as reivindicações que estão a ser exigidas pelos trabalhadores em todos os sectores, com uma grande dinâmica de luta que tem vindo a ser desenvolvida e que continua com greves, plenários, concentrações e acções muito diversificadas nos próximos dias e meses, que têm também grandes momentos de convergência: a Semana da Igualdade que está a decorrer, a greve dos trabalhadores da Administração Pública de 20 de Março, a manifestação da Juventude Trabalhadora dia 26 de Março e a confluência de todas as lutas num grandioso 1.º de Maio.
Como se explica, por outro lado, que ainda subsistam discriminações salariais, com as mulheres a auferir salários-base, em média, 14,5% mais baixos do que os homens em trabalho igual? Diferença que sobe para cerca de 26% nos quadros superiores, conforme estudo recente da CGTP-IN.
É de facto profunda a discriminação salarial entre mulheres e homens no nosso país. Essa é mais uma forma de aumentar a exploração, com a discriminação em função do sexo, aumentando assim os lucros do capital.
Além de os salários das mulheres serem, em média, mais baixos que os dos homens, elas ocupam com maior frequência postos de trabalho onde apenas se recebe o salário mínimo nacional. Acresce que, como as mulheres continuam a ser quem predominantemente assegura as responsabilidades familiares, fazem menos trabalho extraordinário e são penalizadas nos prémios e no acesso à carreira e a categorias profissionais de níveis mais elevados nas tabelas salariais.
Estamos à beira do Dia Internacional da Mulher Trabalhadora (8 de Março). Como tem sido a evolução da realidade laboral das mulheres portuguesas?
Com o modelo de baixos salários, precariedade, horários longos e desregulados, a realidade laboral dos trabalhadores é de grandes dificuldades, muitos trabalhadores empobrecem a trabalhar. Com as desigualdades e discriminações em função do sexo, as mulheres têm salários mais baixos, são o maior número entre os trabalhadores com vínculos precários e são quem tem mais contratos a tempo parcial. É fundamental a organização e luta das mulheres trabalhadoras e de todos os trabalhadores para inverter esta situação.
Quais são os objectivos da Semana da Igualdade promovida pela CGTP-IN?
Com o lema «Emprego de qualidade, Viver e lutar pela Igualdade», estamos durante toda esta semana, nos locais de trabalho e na rua, a contactar as trabalhadoras e os trabalhadores, a realizar plenários, tribunas públicas, cordões humanos, desfiles, acções de denúncia das ilegalidades, pressões e assédio, comemorando o Dia Internacional da Mulher e a luta de gerações de trabalhadoras.
«Além de os salários das mulheres serem, em média, mais baixos que os dos homens, elas ocupam com maior frequência postos de trabalho em que apenas se recebe o salário mínimo nacional.»
Mas, para além da informação, do esclarecimento, da sindicalização e mobilização das mulheres trabalhadoras para a defesa dos seus direitos específicos, são imprescindíveis medidas que combatam de facto as discriminações, com efectiva fiscalização do cumprimento dos direitos consagrados na Constituição, na lei e na contratação colectiva, revogando as normas da caducidade das convenções e repondo o princípio do tratamento mais favorável, de forma a acabar com o bloqueio patronal à negociação colectiva.
É isso que reivindicamos e exigimos da Assembleia da República, do Governo, da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), das empresas e associações patronais. Essa é a luta que vamos continuar.
Num folheto publicado na página da ACT, lê-se: «Sabia que, para conseguirem ganhar o mesmo que os homens ganharam num ano, as mulheres teriam de trabalhar mais cerca 65 dias?» Este reconhecimento, por parte de quem deve controlar o cumprimento da legislação laboral, não revela demasiada condescendência para com a desigualdade?
O que exigimos da ACT é que cumpra o seu papel de fiscalização e exigência do cumprimento dos direitos dos trabalhadores. Em vez de constatar as desigualdades, a ACT tem de intervir junto das empresas para que cumpram a lei e as convenções colectivas de trabalho, mas também pode ter um importante papel na informação e sensibilização para o desaparecimento das desigualdades. A CGTP-IN exige que o Governo tome medidas para que haja de facto uma intervenção activa da ACT e esta seja reforçada com meios para poder intervir.
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