O Espaço das Artes Plásticas da Festa do «Avante!»1 na Atalaia, Seixal, nos dias 6, 7 e 8 de setembro de 2024, ano em que não se organiza a Bienal do Avante, vai apresentar dois projetos artísticos: a instalação «Em Cada Rosto Igualdade» e a exposição de fotografia «Os Valores de Abril na Arte Pública Portuguesa».
«Em Cada Rosto Igualdade» é uma instalação artística participativa de retratos, realizados com câmara obscura ótica, com a coordenação de Mário Rainha Campos. O título deste projeto artístico remete-nos para a canção «Grândola Vila Morena», de José Afonso, mas também para temas muito atuais nos dias de hoje e que merecem a nossa atenção e reflexão, como sejam a igualdade, a fraternidade, a solidariedade e a importância de olharmos para o «Outro», obrigando a um olhar participativo do espectador, quando desenha, quando se deixa desenhar e expor para todos os outros no mural, num contínuo de olhares, que nos aproxima uns aos outros numa permanente «reinvenção das práticas sociais», como nos propõe Félix Guatarri. Acerca de mobilizar forças para a criação de «um outro mundo possível», fala-nos José Gil2 e, quanto a este «outro mundo», cita o que nos diz Isabel Stengers: «Não haverá resposta se não aprendermos a articular luta e engajamento nesse processo de criação, por mais hesitante e balbuciante que seja»3.
Mário Rainha, o coordenador deste projeto, revela-nos que «numa esquina do Espaço das Artes construímos uma exposição-ateliê, com três cabines de desenho que funcionam a luz e sombra, para que cada camarada consiga fazer um retrato reconhecível de um amigo… Durante esta Festa do Avante dos 50 anos do 25 de Abril, faremos centenas de retratos para integrar num mural coletivo em progresso que estará em construção até ao último minuto desta edição. Junta o teu Retrato Avante a esta manifestação para pôr direito o mundo ao contrário. Por muitos que sejamos, somos precisos muitos mais…», segundo a sinopse apresentada.
Quanto à exposição de fotografia de Pedro Soares que tem como título «Os Valores de Abril na Arte Pública Portuguesa», será apresentada uma seleção de registos de obras no espaço público, dando maior enfase aos anos após o 25 de abril, período que permitiu transformar e revitalizar significativamente diversos espaços urbanos, seja nos grandes centros urbanos, seja no interior do nosso País, tendo aqui as autarquias desempenhado um importante papel.
As fotografias aqui apresentados, sobre arte pública, constituem apenas uma pequena parte do olhar do fotógrafo Pedro Soares, que apaixonadamente dedicou grande parte da sua vida artística a registar exposições e obras de arte no espaço público, diversos eventos e festivais artísticos, principalmente do teatro e da dança contemporânea, intervenções artísticas, mas também da vida das pessoas simples que foram protagonistas de importantes acontecimentos da nossa história e que ainda hoje preenchem e valorizam o quotidiano do nosso espaço público, deixando para a memória um importante retrato da época em que vivemos.
O projeto artístico «formas dos futuros ao redor», que ocupa atualmente os dois pisos da Galeria Municipal do Porto4, é uma extensão da exposição apresentada na 12.ª Bienal Internacional de Arte Contemporânea de Gotemburgo (2023) e pode ser visitada até 15 de setembro.
Esta versão do projeto, apresentada agora no Porto, é constituída por uma exposição coletiva apresentada no Piso o, onde podemos ver obras de Rodrigo Hernández, María Jerez, Kem, Sandra Mujinga, Luiz Roque, Outi Pieski, Ana Vaz, P. Staff e Osías Yanov, e a exposição individual «Nave Geo-Celestial», da artista Joana da Conceição, no Piso 1. João Laia, curador, no texto da exposição «formas dos futuros ao redor», parte da premissa que, tal como no passado, em que muitos movimentos se apresentaram como uma «inspiração de cenários alternativos» com gestos simbólicos de resistência e promoveram o «desmantelamento de estruturas de desigualdade», também agora estes artistas, através das posições apresentadas, pretendem adotar «atitudes abertas ao mundo, que desafiam as narrativas catastróficas que dominam o presente e, dessa forma, promovem o aparecimento de futuros múltiplos».
Um dos projetos apresentados que destacamos é uma instalação constituída por duas peças Guržot ja guovssat / Feitiço em Ti! (2020) e Skábmavuođđu / Feitiço em Mim! (2024), da artista da Finlândia Outi Pieski, que foram elaboradas por várias mulheres da Lapónia finlandesa, norueguesa e sueca. Segundo a folha de sala, «Outi Pieski (FI/Sápmi) trabalha com pinturas e instalações que se debruçam sobre a região do Ártico e a interdependência da natureza e da cultura. O seu trabalho combina tradições artesanais, nomeadamente vocabulários somáticos e familiares chamados Duodji para reabrir conversas sobre o povo sami no âmbito de discursos transnacionais», acrescentando ainda que, apesar das «tentativas colonialistas para desacreditar as tradições Duodji, elas conservam ainda hoje o seu poder e a sua vitalidade».
O Museu Municipal de Estremoz Prof. Joaquim Vermelho5 apresenta a exposição de artes plásticas «Neo-Realismo / Memórias Guardadas / Colecção Hernâni Matos». A exposição ficará aberta ao público até ao próximo dia 15 de setembro. Integrada no Programa do 50.º aniversário da Revolução de Abril de 1974, esta exposição expõe 40 trabalhos de artistas plásticos neo-realistas, pertencentes ao acervo pessoal de artes plásticas do Professor Hernâni Matos.
As obras expostas apresentam diferentes técnicas artísticas, como desenho a grafite, desenho a tinta-da-china, guache, aguarela, técnica mista, serigrafia, linogravura, xilogravura, litografia, água forte e água tinta e colagem, e são da autoria de 12 artistas: António Cunhal (1910-1932), Jorge de Almeida Monteiro (1908-1983), Alice Jorge (1924-2008), Júlio Pomar (1926-2018), Querubim Lapa (1925-2016), Rogério Ribeiro (1930-2008), Lima de Freitas (1927–1998), Júlio Resende (1917-2011), Manuel Ribeiro de Pavia (1907-1957), Cipriano Dourado (1921-1981), Aníbal Falcato Alves (1921-1994) e Espiga Pinto (1940-2014).
Após a Segunda Guerra Mundial, numerosos jovens artistas e críticos procuraram dinamizar o meio cultural português, instaurando «uma consciência critica mais aguda, no que se refere à função social da arte, revalorizando a modernidade…»6, surgindo como «uma frente cultural de escritores e artistas plásticos, descontentes com a política cultural do regime totalitário e fascista de Salazar… retratando a realidade social e económica do País e empenhando-se na transformação das condições sociais do mesmo. Nesse sentido, foca-se no homem comum, procurando saber como vivem operários e camponeses. Aborda e aprofunda temas como as desigualdades sociais … as injustiças e analisa o modelo social vigente… É claro que a defesa de todos estes valores se processa nas condições mais duras de repressão, que incluem no mínimo a censura e a apreensão de obras de arte e publicações e, no limite, a prisão, a tortura e a interdição do desempenho de cargos públicos», segundo uma entrevista ao colecionador e professor Hernâni Matos, realizada por Ivone Carapeto.
A exposição «Interseccionismo», que reúne obras de pintura de Joana Antunes e escultura de Fernando Barros, ambos nascidos em Amarante, decorre no Centro Cultural Solar dos Condes Vinhais7 e poderá ser visitada até 29 de setembro.
Acerca do trabalho da artista Joana Antunes Plástica, os textos da exposição remetem-nos para uma reflexão de «imaginários fantásticos, onde a narrativa suporta um conjunto de metáforas e personificações» materializadas com cores intensas e expressão fortes num esforço visual de descoberta do seu universo plástico; já quanto às esculturas de Fernando Barros, são apresentadas como «um conjunto de obras do seu imaginário, que cruza mitologias locais, que tanta importância têm para entender a geografia da sociedade, com a genuinidade do puro ato e vontade de materializar uma vontade interior, que se traduz sempre através de pedaços ou troncos de madeira».
- 1. Festa do «Avante!» – Quinta da Atalaia, Av. Baía do Seixal 2845-415 Amora-Seixal. Horário: sexta-feira: 19h-1h30; sábado: 10h-1h30 e domingo: 10h-23h.
- 2. José Gil, O tempo indomado, Relógio d´Água Editores, Lisboa, 2020, p. 140 e 141.
- 3. Isabelle Stengers, No Tempo das Catástrofes, Editora Cosac Naify, São Paulo, 2015, p. 58.
- 4. Galeria Municipal do Porto – Rua D. Manuel II (Jardins do Palácio de Cristal) 4050-346 Porto. Horário: terça a domingo: 10h-18h.
- 5. Museu Municipal de Estremoz – Largo Dom Dinis, 7100-509 Estremoz. Horário: terça a domingo: 9h-12h30 e 14h-17h30.
- 6. Rui Mário Gonçalves, A Arte Portuguesa do Século XX, Editora Círculo de Leitores, Lisboa, 1998, p. 64 e 65.
- 7. Centro Cultural Solar dos Condes Vinhais – R. Simão Costa Pessoa (à Rua dos Frades) 5320 Vinhais. Horário: segunda a sexta: 9h-12h30 e 14h-17h30; sábado e domingo: 10h-12h30 e 14h-17h.
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