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Livre e apoiantes de Israel pedem a Jill Stein que desista em prol de Kamala

Jill Stein, candidata presidencial do Partido Verde Americano, é das poucas vozes que critica o genocídio palestiniano. O Livre, partido de Rui Tavares, juntou-se a vários partidos supostamente «verdes» para pedir a Stein que se afaste da corrida eleitoral em detrimento de Kamala Harris, a mulher que apoia a política de limpeza étnica em Gaza.

A 21 de Março de 2024, no Bundestag, Deborah Düring, deputada da Aliança 90/Os Verdes, partido que se assume como ecologista, realizou uma intervenção na qual disse:«Israel tem direito à legítima defesa. Esta solidariedade surge também da nossa especial  responsabilidade histórica. As lições da Shoah dão origem a outra responsabilidade histórica para a Alemanha: a obrigação universal de cumprir o direito humanitário internacional.Israel está a combater um inimigo que usa os civis inocentes em Gaza como escudo. O Hamas não tem qualquer respeito pelo direito internacional ou pelos direitos humanos».

Este pequeno trecho da intervenção de Deborah Düring marca a tónica de todo um discurso que vinca toda a narrativa de complicidade e patrocínio do Ocidente ante o genocídio perpetrado por Israel. O discurso foi de tal forma inflamatório que, no próprio site da Aliança 90/Os Verdes está inscrito que houve aplausos das bancadas da CDU/CSU, a aliança política formada por dois partidos democratas cristãos alemães: a União Democrata-Cristã (CDU) e a União Social-Cristã (CSU), partido de direita.

Foi com este tipo de partido que o Livre, projecto unipessoal de Rui Tavares, decidiu assinar uma carta conjunta, com alguns «Verdes Europeus», na qual pede a Jill Stein para desistir da sua candidatura à Casa Branca de modo a favorecer a candidatura de Kamala Harris. Intitulada «Eleições nos EUA: Verdes europeus pedem a retirada de Jill Stein», a carta conjunta, além de uma clara ingerência nos assuntos internos de outro país, vende também Donald Trump como todo o mal que existe na terra e, por sua vez, afirma que Kamala é a única pessoa que pode acabar com esta ameaça - nunca dizendo que a vice de Biden é exactamente o outro lado da moeda que o candidato Republicano também representa. 

A carta pega em tudo. Vai dos direitos humanos à paz no Médio Oriente, vai da guerra na Ucrânia às alterações climáticas, instrumentaliza todos os medos dos trabalhadores norte-americanos para vender uma imagem de Kamala, por contraposição, que não é verdadeira, numa clara táctica de chantagem emocional. 

A tática não é, no entanto, nova. Ainda hoje, dia 2 de Novembro, o Times publicou um artigo assinado por Charlotte Alter com o título «Como é que os democratas planeiam impedir Jill Stein». Diz o artigo que «E em 2016, a candidata do Partido Verde, Jill Stein, obteve mais de 132 000 votos nos Estados decisivos de Wisconsin, Michigan e Pensilvânia, ajudando Donald Trump a obter vitórias nesses campos de batalha - e com eles a eleição - por uma margem de cerca de 77.000 votos».

Tendo em conta este aspecto, o artigo dá conta que «pela primeira vez, o partido [Democrata] construiu uma sala de guerra dedicada a seguir e a tentar desacreditar os candidatos de terceiros. A operação tem mais de 30 funcionários dedicados, com um orçamento operacional na casa dos sete dígitos, de acordo com um funcionário envolvido».

À jornalista do Times, Liz Smith, a responsável pela tal «sala de guerra», disse: «tratamos os candidatos de terceiros com o mesmo rigor com que as campanhas tratam os candidatos dos principais partidos» e que têm «uma equipa de conteúdos completa, uma equipa de imprensa completa, uma equipa de investigação completa».

Jill Stein encaixa no que se pode considerar uma ameaça aos Democratas. A candidata dos Verdes americanos assume a diferença para Kamala Harris não pela espuma das agências de comunicação, mas pelos posicionamentos políticos efectivos. No site oficial da sua campanha, Stein lançou um «compromisso para acabar com o genocídio» e faz um apelo a todos os eleitores para apoiarem candidatos «anti-genocídio». 

Pode ler-se na sua página: «Nós, abaixo assinados, exigimos que o governo dos EUA deixe de apoiar o genocídio israelita em curso aos palestinianos em Gaza. Por isso, comprometemo-nos a recusar todo o apoio a candidatos que apoiem a guerra genocida contra Gaza. Em vez disso, apoiaremos apenas os candidatos que: apoiem a paz, a liberdade, a dignidade, a igualdade e a segurança para todas as pessoas na Palestina e em Israel; não aceitem dinheiro da American Israel Public Affairs Committee e dos Political Action Committees e lobistas que lucram com a guerra; que apoiem especificamente: um cessar-fogo imediato, o fim do bloqueio e a autorização de entrada em Gaza de alimentos, água, medicamentos, energia e abrigos de emergência, o regresso de todos os reféns e prisioneiros políticos, o fim da ocupação israelita e do apartheid (...)».

Surge, como é natural, uma necessidade de Kamala Harris em mandar abaixo a candidatura de Jill Stein. Esta semana, a Associated Press noticiou que «os democratas estão a gastar cerca de 500 mil dólares num esforço de última hora para persuadir os eleitores dos estados do campo de batalha a rejeitarem os candidatos de terceiros Jill Stein e Cornel West, alertando que um voto neles ajudará o republicano Donald Trump».

Segundo a mesma agência de notícias «o Comité Nacional Democrata disse na segunda-feira que os anúncios digitais serão veiculados no Instagram e no YouTube, visando os eleitores mais jovens e os campi universitários. Os anúncios usam um vídeo de Trump de um comício em Junho em Filadélfia, quando ele disse: “Cornel West. Ele é um dos meus candidatos favoritos, Cornel West. E também gosto dela, Jill Stein, gosto muito dela. Sabem porquê? Ela aceita 100% deles. Ele aceita 100%».

No meio de toda esta guerra está o Livre de Rui Tavares, a seguir as orientações definidas pela direcção de campanha de Kamala Harris, com um sentido de oportunidade, no mínimo, caricato. Se nas última primárias democratas, Rui Tavares andou por New Hampshire a fazer campanha pelo Bernie Sander, enquanto também andava a dar aulas pelas terras do Uncle Sam (mais um grande sentido de oportunidade), agora decidiu meter o seu partido na linha da frente do apoio a um projecto imperialista e de ataque ao que pode, um dia, vir a ser encarado como uma tímida oposição. 
 

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