Bolsonaro voltou a negar que existem 33 milhões de pessoas com fome no país e manipulou dados para indicar que o plano social actual é maior do que o pago pelos governos do Partido dos Trabalhadores (PT). O ex-presidente Lula da Silva, por seu lado, afirmou que o Brasil está destruído e prometeu reconstruí-lo como estava durante o seu governo, em que havia uma política de combate às desigualdades sociais e os trabalhadores viviam dignamente.
Lula disse que sob o seu mandato os pobres «serão novamente respeitados». O actual presidente Bolsonaro escolheu atacar o seu principal rival para as eleições de 2 de Outubro, acusando-o de dirigir o governo mais corrupto da história do Brasil.
O debate, que teve lugar no estúdio Bandeirantes em São Paulo, contou também com a presença dos candidatos Ciro Gomes do Partido do Trabalho Democrático (PDT); Soraya Thronicke do partido União Brasil do ex-juiz Sergio Moro; Felipe D'Avila do Partido Novo libertário; e Simone Tebet do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) do ex-presidente Michel Temer.
Na sua primeira intervenção, a senadora SimoneTebet disse que Bolsonaro ataca a democracia e não respeita a liberdade de imprensa ou a divisão de poderes. A senadora concluiu que para o Brasil ser pacificado e voltar a crescer era preciso «trocar o presidente da República».O presidente garantiu que escolheu os seus ministros «com base em critérios técnicos» e afirmou que o poder judicial interfere com o seu mandato presidencial. Bolsonaro criticou a decisão do juiz do Supremo Tribunal Alexandre de Moraes, que pediu à polícia federal que autorizasse uma investigação aos empresários suspeitos de partilharem mensagens a favor dos golpes nas suas redes sociais privadas.
No primeiro confronto directo entre os principais candidatos presidenciais, Bolsonaro perguntou se o PT queria regressar ao poder para continuar a corrupção na Petrobras. «Tinha de ser ele a perguntar-me e eu sabia que essa pergunta estava para vir», respondeu Lula, que citou várias medidas anti-corrupção e de transparência decretadas durante o seu governo.
«As pessoas precisam de saber que as mentiras não valem a pena na televisão», disse o antigo líder dos metalúrgicos. Bolsonaro disse, citando umas declarações tiradas de um delatores premiados da Lava Jato (acusados que se livravam das acusações denunciando outras pessoas) que o governo de Lula era «baseado no roubo» e que «o seu governo era o mais corrupto da história do Brasil».
O antigo presidente contra-argumentou que foi durante os seus mandados que mais se gerou empregos, fez-se investimento na educação e aumentaram os lucros na Petrobras. «O país que deixei para trás é um país que as pessoas sentem falta», disse Lula, acusando Bolsonaro de «destruir o país» e «inventar números».
Ciro Gomes interrogou Bolsonaro sobre as suas declarações, na sexta-feira passada, em que o chefe do executivo negava a existência de fome generalizada no país: «Tem uma pedra no seu coração». Fiel ao seu estilo, Bolsonaro voltou a negar a existência de fome no Brasil: «Todos interpretam a informação como bem entendem».
O presidente afirmou que a inflação no Brasil é uma das mais baixas do mundo e que estão a ser criados novos empregos. «O nosso PIB está a crescer. Realizámos um milagre durante a pandemia», justificou ele. No entanto, Bolsonaro ignorou que o Brasil continua, segundo um relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico), no topo do ranking dos países com as mais altas taxas de inflação entre as principais economias mundiais.
«O meu governo cuida dos mais necessitados», disse Bolsonaro, que admitiu que «alguns passam fome» embora o programa Auxilio Brasil pague mais do que o suficiente para tirar os mais pobres da linha da pobreza. O líder da extrema-direita enganou-se novamente ao afirmar que o seu governo aprovou o primeiro lote do programa de ajuda social, um substituto para o bem sucedido plano Bolsa Família implementado por Lula, no Congresso com o voto contra do PT. O Partido dos Trabalhadores votou sempre no Congresso brasileiro a favor dos apoios sociais.
Em relação à educação, Lula lamentou que o governo de Bolsonaro tenha deixado de divulgar os indicadores e que o desempenho da educação pública se tenha degradado a todos os níveis. «A primeira coisa que vou fazer é convocar uma reunião com todos os governadores e presidentes de câmara para travar uma verdadeira guerra contra o atraso da educação. Dupliquei o orçamento da educação e sei que preciso de o melhorar.»
Tebet, candidato presidencial do MDB, tornou-se um dos principais críticos de Bolsonaro durante o debate. "Não vi o Presidente da República entrar na sua mota e ir a um hospital para abraçar uma mãe", disse, recordando a sua participação na comissão parlamentar que investigou, entre outras questões, as suspeitas de corrupção na compra de vacinas. O Brasil é o país com o segundo maior número de vacinas do mundo.
As mulheres que se «vitimizam»
Num dos momentos mais tensos da noite, Bolsonaro atacou a jornalista da TV Cultura Vera Magalhães, que lhe fez uma pergunta sobre a campanha de vacinação da covid-19. «Penso que vai dorme a pensar em mim, não pode tomar partido num debate como este. É uma vergonha para o jornalismo», disse Bolsonaro visivelmente encolerizado.
Simone Tebet veio em defesa do jornalista e acusou o presidente de misoginia. Bolsonaro virou então as suas armas contra Tebet. «Sois uma vergonha para o Senado, não venha com esta história de que eu ataco as mulheres para se vitimizar», atacou a senadora.
As hostes de Bolsonaro têm tentado colocar a mulher do presidente na campanha para conseguirem diminuir a antipatia que a maioria das mulheres manifesta pelo actual ocupante do Palácio do Planalto. Um esforço que ficou dificultado neste debate.
Em 2018, quando ganhou as eleições, Bolsonaro participou apenas nos dois primeiros debates presidenciais. Um mês antes da primeira ronda, foi esfaqueado durante um comício de campanha e, após ter sido operado, não voltou ao debate. Lula, que governou o Brasil entre 2003 e 2010, lidera a corrida com 47% dos votos contra os 32% de Bolsonaro, de acordo com uma sondagem do Instituto Datafolha publicada a 18 de Agosto.
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