Tese confirmada por relatório oficial

Tony Blair enganou britânicos para invadir Iraque

A invasão do Iraque, em 2003, foi sustentada em informações falsas e em voluntarismo de Tony Blair, confirma «relatório Chilcot» apresentado hoje em Londres.

A decisão de invadir o Iraque foi tomada nas Lajes (Açores), numa cimeira em que participaram (da esquerda para a direita) Durão Barroso, Tony Blair, George W. Bush e José María Aznar
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O relatório encomendado em 2009 pelo governo britânico para avaliar as decisões que levaram à invasão do Iraque, em 2003, foi conhecido hoje e é destrutivo para o primeiro-ministro na época, Tony Blair.

O «relatório Chilcot» concluiu que o Iraque não constituía uma «ameaça imediata» em 2003 no que diz respeito ao desenvolvimento de «armas de destruição massiva». Este foi o principal argumento utilizado para justificar a invasão em Março de 2003.

As informações dos serviços de inteligência tinham falhas e o governo liderado por Blair nunca as questionou. Pelo contrário, o relatório afirma que o ex-primeiro-ministro britânico «exagerou o nível de ameaça» do Iraque de Saddam Hussein e ignorou o risco de desestabilização do país e da região, apesar dos alertas da época que se vieram a confirmar.

«Estou contigo, venha o que vier»

Tony Blair, carta a George W. Bush no Verão de 2012

São muitos os elementos citados no relatório, nomeadamente do período entre os atentados de 11 de Setembro de 2001, nos Estados Unidos da América (EUA), e a decisão tomada em meados de Março pelas autoridades britânicas de avançar para a guerra. No Verão de 2002, depois de o presidente norte-americano fazer a defesa da guerra na Assembleia Geral das Nações Unidas, Blair envia-lhe uma mensagem em que assume o apoio incondicional: «Estou contigo, venha o que vier.»

O governo britânico acusou a França de bloquear uma decisão que legitimasse a guerra do Iraque no Conselho de Segurança das Nações Unidas, justificando o avanço à revelia da organização, apontam as conclusões.

Se em relação ao respeito pelo direito internacional o relatório opta por não se pronunciar, apesar de ser clara a violação, já quanto aos requisitos legais britânicos para a acção militar se diz que não foram cumpridos «de forma satisfatória». Os elementos de suporte que foram enviados para o governo e para o Parlamento eram incompletos, tendenciosos e continham falhas graves.

O relatório concluiu que a decisão de Blair foi tomada com base «na sua certeza», apesar das deficiências dos dados sobre o suposto desenvolvimento de «armas de destruição massiva» pelas autoridades iraquianas, elementos que nunca foram por si questionados.

Blair: «Arrependo-me dos erros, mas o Iraque está melhor»

Numa declaração durante a tarde, Tony Blair afirmou estar «arrependido dos erros cometidos», mas continua a considerar que a decisão de derrubar Saddam foi correcta. Respondendo a uma questão directa sobre a gestão do pós-invasão e dos erros apontados pelo relatório, Blair desenvolveu a tese de que tudo estava a melhorar até ao conflito na Síria.

«Em 2010 o Iraque estava estabilizado», afirmou. No dia das eleições legislativas desse ano, foi proibida a circulação de veículos automóveis, o que não impediu a concretização de vários atentados, que fizeram dezenas de mortos e mais de uma centena de feridos.

«Decisão de não intervir na Síria foi erro crasso»

Tony Blair

Para Blair, a situação no Iraque hoje podia ser melhor caso o Reino Unido tivesse decidido bombardear a Síria em 2013. «Foi um erro», afirmou em resposta aos jornalistas que o questionavam no fim da declaração em que reagiu ao relatório.

Para hoje estava convocado um protesto junto ao Parlamento britânico, por iniciativa da coligação de movimentos pela paz Stop the War. Por outro lado, um conjunto de deputados, encabeçado por Alex Salmond (Partido Nacional Escocês), pretende julgar Blair por «quebra de deveres constitucionais e levar o País para uma guerra ilegal». O Tribunal Penal Internacional excluiu julgar Tony Blair por crimes de guerra antes de ser conhecido o relatório.

Inquérito foi adiado por pressões norte-americanas

O inquérito à decisão de invadir o Iraque foi pedido em 2009 pelo governo de Gordon Brown, que sucedeu a Tony Blair na liderança do governo britânico. O relatório tem 12 volumes e foi conduzido por John Chilcot, um alto diplomata britânico. As conclusões deviam ter sido conhecidos em 2014, mas foi adiado por pressões internas e dos EUA. Os norte-americanos queriam evitar que fossem tornados públicos elementos comprometedores para a administração dos EUA.

A invasão do Iraque em 2003 foi a primeira ocupação militar de um país soberano por parte do Reino Unido desde a Segunda Guerra Mundial. A decisão foi tomada após os atentados de 11 de Setembro de 2001 e do ataque ao Afeganistão, e concretizada por uma coligação liderada pelos EUA.

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