Em Peniche há um mar de oportunidades

Conhecer Peniche, no distrito de Leiria, e o trabalho que o município tem vindo a realizar no âmbito do seu maior recurso traz-nos irremediavelmente Sophia e o seu verso: «A minha vida é o mar, o Abril a rua».

Peniche
Créditos / AbrilAbril

Para chegar à dinamização deste mar de projectos e iniciativas em curso, a Câmara partiu de um plano estratégico com um horizonte temporal de 20 anos, designado «Magna Carta para o Desenvolvimento de Peniche». A intenção, revela o presidente António José Correia, foi a de valorizar os compromissos definidos no documento lançado em 2007, através do aprofundamento de uma democracia participativa.

Mas, mais do que o compromisso de uma força política, sublinha que foi o compromisso da comunidade. «Todo o processo foi muito participado, com uma participação competente, designadamente nas áreas sociais e do turismo».

Além do diagnóstico dos eixos estratégicos para alavancar o desenvolvimento do concelho de Peniche, a «Magna Carta Peniche 2025» elenca, simultaneamente, perspectivas de intervenção e diferentes programas de actuação. E, com vários quilómetros de costa, a economia do mar e as energias renováveis ocupam naturalmente um lugar de destaque.

Transversal à intervenção da autarquia, a economia do mar parte das tradições para chegar ao desporto e ao turismo, num caminho alicerçado na sustentabilidade ambiental.

Poucas artes combinarão tão bem a tradição e a sustentabilidade ambiental como a pesca, que foi, durante largos anos, a principal actividade económica do concelho de Peniche. António José Correia sublinha a ligação do município às organizações de produtores e ao Sindicato dos Trabalhadores da Pesca do Centro/CGTP-IN, uma articulação projectada no Dia Nacional do Pescador. Assinalado a 31 de Maio, é organizado com o objectivo de prestigiar a profissão e todas as actividades ligadas ao mar, ou não fossem elas a base da indústria instalada no concelho.

A montante da fileira socioeconómica da pesca estão os estaleiros navais cuja actividade deverá, admite o presidente, ir além da pesca. «Entendemos que a sustentabilidade dos estaleiros navais não pode assentar exclusivamente em trabalhar para a pesca, mas muito em torno das competências que tem, nomeadamente para a náutica de recreio e para um domínio que nós desenvolvemos e estamos a seguir, que tem a ver com as novas tecnologias, particularmente a energia das ondas».

Há 2000 anos a produzir conservas

Do outro lado está a indústria transformadora e uma das actividades a que a autarquia tem dedicado especial atenção: a indústria conserveira, que emprega cerca de 1200 trabalhadores.

«Fizemos muita promoção da indústria conserveira com a edição de duas latas de conservas em que associámos as questões da tradição, modernidade e valorização do pescado, porque os pescadores ganham em função do que pescam, infelizmente é assim. Quanto mais for valorizado o pescado maiores rendimentos os pescadores têm».

A par da valorização da indústria, António José Correia salienta a valorização das espécies, nomeadamente a sardinha e a cavala, protagonistas das edições especiais que a autarquia lançou, em 2009 e 2012, respectivamente.

No compromisso do desenvolvimento não se esquecem os trabalhadores

Em Peniche estão localizadas duas empresas de conservas de pescado, a maior é também a maior empregadora do concelho. Uma começou a laborar no ano passado, depois de reabilitar uma conserveira que estava fechada, e emprega à volta de 60 trabalhadores. Na outra, de maior dimensão, trabalham cerca de 1100 pessoas. «Viabilizámos um aumento da área de trabalho desta maior empresa conserveira com a possibilidade de utilização de um entreposto frigorífico, que foi posto a concurso. Eles acabaram por ganhar e aumentaram a sua capacidade de aprovisionamento da matéria-prima».

A criação de condições para o exercício da actividade implicou a assumpção de compromissos por parte da empresa, que alteraram «qualitativamente» a relação com o pessoal, mediante o acordo firmado com a autarquia. O presidente realça que foram integrados muitos trabalhadores que estavam em trabalho temporário, trabalho precário, e com contratos de trabalho a prazo, e que a estabilidade criada como contrapartida constituiu um «salto qualitativo muito importante para combater as questões do desemprego, precisamente numa altura em que Portugal sofreu muito por via da troika». Importante ainda por «serem pessoas de classes sociais com menos qualificações».

António José Correia aproveita, no entanto, para esclarecer que a «almofada» que a indústria conserveira trouxe «foi muito importante», mas deriva das competências que Peniche tem, a começar pelas suas gentes, que «não se assustam a trabalhar com o peixe, com as espinhas, com os odores».

[A meio da conversa com António José Correia, somos interrompidos por uma chamada telefónica: «Boas notícias!», diz-nos de imediato. «A mais recente fábrica de conservas do concelho precisa de mais espaço para a preparação do pescado, já temos reunião marcada.»]


O conhecimento marítimo potencia novos investimentos

A fileira da preparação do pescado tem sido igualmente alvo de investimentos, não apenas para exportação mas, e sobretudo, para dar ao pescado novas formas de uso. É o caso dos hambúrgueres de peixe e das almôndegas de cavala, «novos produtos que resultaram de uma articulação virtuosa entre as empresas e a Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar, e o Instituto Politécnico de Leiria (IPL), através do centro de investigação Cetemares - Centro de I&D, Formação e Divulgação do Conhecimento Marítimo.

O presidente da Câmara de Peniche frisa que este foi um dos grandes investimentos realizado na região, e o motor para a criação de novas áreas de negócio.

Mas estão longe de ficar por aqui os investimentos em ciência e tecnologia, que envolvam o mar e as actividades que ele permite. «Smart Ocean» é a designação daquele que será o Parque de Ciência e Tecnologia de Peniche, através de uma parceria entre a Câmara Municipal, o IPL e o Biocant – primeiro parque de biotecnologia em Portugal. Na prática, tem como objectivos criar condições para a diversificação de actividades e dar guarida a startups (empresas emergentes em fase de desenvolvimento e pesquisa de mercados) que se vão desenvolvendo neste domínio.

«É um projecto em que o IPL está altamente empenhado, mas temos também a participação de startups – empresas que estão instaladas em Peniche e que derivaram de ideias desenvolvidas na própria Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar, particularmente na área da biologia marinha», afirma António José Correia.

Entre essas ideias e projectos, contam-se a produção de rações para a aquacultura, a produção de medusas em termos de aquariofilia, e a colocação e fornecimento de espécies portuguesas a aquários internacionais.  

A Assembleia Municipal de Peniche já aprovou os estatutos, e está-se agora a tratar do processo constitutivo de modo a seguir para o Tribunal de Contas com todos os elementos necessários.

Concatenado com este «Smart Ocean», está aquele que será o primeiro Centro Ciência Viva, orientado, em exclusivo, para as questões do mar. O conceito já está definido, tal como os equipamentos, e a autarquia conta com o apoio comunitário do Portugal 2020 para a produção dos conteúdos. O projecto tem simultaneamente a vantagem de reabilitar um edifício antigo no centro histórico da cidade, perto da Câmara Municipal de Peniche, que foi outrora uma cadeia (não uma prisão política), e que vai albergar o novo espaço.

A energia que vem do mar

Num caminho que não abandona as tradições, a modernidade vem com o selo da sustentabilidade ambiental. Um dos exemplos é o WaveRoller. Já em fase pré-comercial, o projecto consiste no desenvolvimento de um dispositivo que converte as ondas do mar em energia eléctrica.

António José Correia salvaguarda que esta tecnologia foi desenvolvida por finlandeses mas com o envolvimento dos estaleiros de Peniche, do Instituto Hidrográfico e da associação WavEc – «é o centro de referência das energias oceânicas em Portugal e tem sido o nosso parceiro».

Peniche Capital da Onda

No centro de toda a actividade, o mar impulsiona duas áreas de aposta da Câmara de Peniche: o desporto e o turismo. Na primeira delas, o surf foi, no âmbito dos desportos de deslize nas ondas, aquele que permitiu catapultar Peniche a nível nacional, mas também lá fora. Por outro lado, António José Correia observa que Peniche influenciou a prática de surf em Portugal, nomeadamente na Nazaré, em Torres Vedras, Cascais e em São Miguel, nos Açores.

«O surf em Portugal teve esta grande reactivação a partir daquilo que foi o desempenho que Peniche teve, de que eu pessoalmente me orgulho muito, nomeadamente do Centro de Alto Rendimento do Surf.»

Outra das coisas de que o presidente se orgulha e que, confessa, «muita gente não acreditava», foi a consolidação da marca «Peniche Capital da Onda». Lançada em 2006, teve logo a sua primeira expressão no campeonato da Europa. José Correia frisa que «há muitos países que organizam o campeonato do mundo, mas a elite, a Fórmula 1 do surf é em Peniche».

«Há um antes e um depois de 2009»

O Circuito Mundial de Surf começou em 2009 e vai agora para a 9.ª edição, de 20 a 31 de Outubro. Mas António José Correia anuncia que também já há garantias para 2018. Apesar de estar prestes a cessar as funções de presidente da Câmara, revela que não só tratou de salvaguardar durante o seu mandato, mas também para 2018. «Quem vier avalia se vale a pena», afirma.

«O que posso dizer é que o Município de Peniche ficou marcado pelo campeonato do mundo e há um antes de 2009 e um depois de 2009. Pela promoção, Peniche ficou definitivamente no mapa, é incontornável», assume.

Incontornável também foi o impulso que a prova trouxe aos sectores da hotelaria e do turismo. A par das novas formas sustentáveis de alojamento, António José Correia destaca o impulso que o alojamento local (AL) trouxe à economia das famílias.

«Só em AL temos cerca de 500 unidades com capacidade para 3800 clientes». Acrescenta que cerca de 45% desta capacidade está instalada na freguesia de Ferrel. «Tem um impacto na freguesia incomensurável», conclui.

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