O escritor, jornalista e editor Orlando Bernardino Gonçalves, resistente antifascista e construtor da democracia após o 25 de Abril, nasceu no popular bairro da Ajuda, em Lisboa, a 15 de Agosto de 1921.
Desde jovem participou em tertúlias culturais e foi opositor do regime fascista.
Foi preso pela primeira vez em 1943. Libertado no ano seguinte, aderiu ao Movimento de Unidade Democrática (MUD) em 1945. Desenvolveu actividade na oposição democrática, tendo participado nas campanhas eleitorais de Norton de Matos (1948), Ruy Luís Gomes (1953), Arlindo Vicente e Humberto Delgado (ambas em 1958), e nas da Comissão Democrática Eleitoral (CDE), em 1969 e 1973. A 18 de Abril de 1974 voltou a ser detido pela PIDE-DGS e encontrava-se na prisão de Caxias quando se deu o 25 de Abril, tendo sido libertado dois dias depois.
Depois do 25 de Abril exerceu, entre 1974 e 1994, diversos cargos autárquicos em Oeiras e na Amadora, tendo contribuído significativamente para a autonomia administrativa deste município.
Como escritor estreou-se com o romance Tormenta (1948), apreendido pela polícia política. As dificuldades de publicação levaram-no a participar em projectos editoriais alternativos, sendo o mais significativo o da editora Orion, onde publicou o livro de contos Este mundo dos homens (1954), que abriu as portas a escritores como Alexandre Cabral, Manuel Ferreira e Romeu Correia, e a ilustradores como Manuel Ribeiro Pavia, Cipriano Dourado e Rogério Ribeiro.
Na Rádio Peninsular assegurou o programa radiofónico «Literatura e Artes», encerrado por pressão da PIDE, e colaborou em diversos periódicos, mas foi em Junho de 1963 que iniciou funções no Notícias da Amadora, iniciando uma batalha editorial permanente contra a censura, que só terminou com a queda do fascismo.
Uma espinha na garganta do regime
Orlando Gonçalves foi desde então o proprietário, editor e director de facto do Notícias de Amadora, apesar de os Serviços de Censura de Salazar e Caetano negarem sempre que tal constasse na ficha técnica do semanário. No entanto, era com ele que, semanalmente, os censores discutiam as peças a cortar.
No seu primeiro editorial, em 1963, anunciou um órgão de imprensa que servisse o público a que se destinava, comprometido com a verdade, a razão e a justiça. O jornal constituiu, a partir de então, a sua principal forma de intervenção política.
Explorando todas as possibilidades na luta contra a censura, o Notícias da Amadora chegou a publicar textos proibidos e a fazer primeiras impressões para os censores, imprimindo o resto da edição sem cortes.
De um jornal com implantação local, com cerca de 400 assinaturas, fez um semanário de circulação nacional, com largos milhares de assinantes, com um significativo leque de colaboradores em áreas económico-sociais e literário-artísticas, e que se tornou uma das principais vozes legais contra o fascismo.
Quando, em 1970, o jornal passou a ter oficinas gráficas próprias, passou a imprimir na sua tipografia obras de editores oposicionistas e do movimento sindical, incluindo de vários sindicatos fundadores da Intersindical. Várias destas edições foram apreendidas pela PIDE.
Em Abril de 1974 o encerramento do semanário e da sua tipografia estavam iminentes, e pode bem dizer-se que foram salvos pela Revolução para a qual o Notícias da Amadora e Orlando Gonçalves tanto contribuíram.
Um cidadão na Amadora
Depois do 25 de Abril Orlando Gonçalves publicou um testemunho da sua última prisão, Caxias – Últimos dias do fascimo (1974, 1977), e os romances Os Melros Cantam na Primavera (1986) e Enredos da Memória (1993), este último distinguido com o Prémio Literário Cidade da Amadora.
Orlando Gonçalves continuou a colaborar no Notícias da Amadora até ao seu falecimento, em 1994.
Foi agraciado com a Medalha de Ouro da Cidade da Amadora (1989) e desde 1998 que a Câmara Municipal da Amadora instituiu, em sua homenagem, o Prémio Literário Orlando Gonçalves, com o intuito de «incentivar a produção literária, contribuindo para a defesa e enriquecimento da língua portuguesa».
O prémio galardoa anualmente, e de forma alternada, uma obra de ficção narrativa e um trabalho jornalístico de investigação, e em 2021 tem a sua 24.ª edição.
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