Comunistas defendem libertação do euro, da dívida e da banca privada

Com o euro, Portugal foi dos países que menos cresceram e mais se endividaram

O PCP apresentou esta tarde o livro «Euro, Dívida, Banca. Romper com os constrangimentos, desenvolver o País». A iniciativa contribui para a discussão sobre o impacto da submissão à moeda única que os comunistas vão promover nos próximos meses.

Jerónimo de Sousa participou na apresentação do livro do PCP sobre o euro, a dívida e a banca
CréditosJosé Coelho / Agência LUSA

Os constrangimentos ao desenvolvimento do País decorrem da submissão ao euro, do peso da dívida crescente e da alienação do controlo nacional sobre o sector financeiro. É partindo desta avaliação que surge o livro que os comunistas apresentaram hoje, avançando com o diagnóstico e propostas para a ruptura com os bloqueios que incidem sobre a economia portuguesa.

A apresentação coube a Vasco Cardoso, dirigente do PCP, que afirmou que, «se o País está sujeito a condicionamentos estruturais, então as soluções também têm que ser estruturais». A produção de riqueza em 2015 estava abaixo dos níveis de 2002, quando o euro começou a circular; «uma década perdida», afirmou.

Os níveis de investimento, «no nível mais baixo, pelo menos, desde a década de 50», não cobre «sequer o desgaste e a desactualização das maquinarias e equipamentos». Os comunistas vão à origem da degradação da capacidade produtiva para concluírem: Portugal «tem de libertar-se da submissão ao euro, tem de renegociar a dívida e tem de controlar publicamente a banca». Só assim é possível garantir «a moeda, os recursos e os créditos» que sustentem o crescimento económico e o desenvolvimento.

«Três resultados inseparáveis dos objectivos, da orientação, da política, das imposições e das pressões da União Europeia», sublinhou Vasco Cardoso.

Euro: «Austeridade e empobrecimento perpétuos»

O PCP defende que Portugal «precisa da sua própria moeda», de forma a recuperar a soberania para decidir a sua política monetária, financeira, cambial e orçamental. Só assim, assinalou o dirigente comunista, o País pode enfrentar «as chantagens dos "mercados" e da troika», assim como as consequências do cumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento e do Tratado Orçamental: «Austeridade e empobrecimento perpétuos, perdas de competitividade, estímulo ao endividamento externo e à saída de capitais.»

Os comunistas consideram necessário «um processo participado, com uma cuidadosa preparação e a defesa dos rendimentos, poupanças e níveis de vida da generalidade da população» que abra caminho à «libertação da submissão ao euro». Isto, por considerarem que não se deve contar, até porque «não se vai nessa direcção», com uma dissolução «programada e organizada» da União Económica e Monetária (UEM).

«Não podemos pagar em juros o dobro do que recebemos em fundos europeus»

A ruptura com a UEM deve ser articulada com a renegociação da dívida, de forma a libertar recursos «para o investimento e a acção social». Os níveis das dívidas pública, cerca de 130% do Produto Interno Bruto (PIB), e externa, cerca de 105%, «são das maiores do mundo» e impõem juros ao Estado que representam «bem mais do dobro do que recebe em fundos estruturais da União Europeia».

Vasco Cardoso lembrou que existem processos de reestruturação da dívida que «mostram que é possível», lembrando a proposta de «renegociação nos prazos, juros e montantes» que o PCP fez entrar no debate público há cinco anos.

«A banca ou é pública ou é estrangeira»

O processo que os comunistas defendem deve integrar, igualmente, a obtenção do controlo público sobre o sector financeiro, de maneira a «racionalizar e reorientar o crédito para a actividade produtiva em vez de especulativa, auxiliar os pequenos e médios empresários e as famílias».

O dirigente comunista lembrou o exemplo do Novo Banco para afirmar que «não se devem desperdiçar oportunidades» nesse processo, considerando que a solução para o banco surgido da falência do BES deve passar pela nacionalização definitiva, já que actualmente é detido pelo Fundo de Resolução, uma entidade pública.

Para tal, é necessário combater as imposições resultantes da União Bancária e «enfrentar a União Europeia, que condiciona a nossa capacidade de produzir riqueza, a nossa liberdade de distribuir a riqueza, a nossa capacidade e a nossa liberdade de escolhermos o caminho que, enquanto povo, queremos seguir», concluiu.

Jerónimo de Sousa: «Portugal não está condenado ao declínio e a uma posição cada vez mais subalterna»

O secretário-geral do PCP, que também interveio na sessão, lembrou que «o mundo é hoje não só mais perigoso e inseguro, mas também um lugar mais injusto». «Estima-se que os 1% mais ricos têm mais riqueza do que todo o resto do mundo, os restantes 99% da população mundial», lembrou.

Jerónimo de Sousa criticou as «intenções ditas "proteccionistas" do novo governo dos Estados Unidos», já que visam combater o seu «declínio económico relativo no mundo» e não a defesa dos interesses dos trabalhadores e dos povos.

Para o PCP, os acordos de livre comércio, como o TTIP ou o CETA, são exemplo de instrumentos que «colidem directamente com os ordenamentos jurídicos, o bem-estar e o desenvolvimento dos povos». A União Europeia, enquanto promotora destes instrumentos, como fez com a União Bancário e o euro, defende os grandes grupos económicos e financeiros europeus, assinalou o secretário-geral comunista.

Os indicadores justificam a proposta do PCP, apontou Jerónimo de Sousa: desde a adesão à moeda única, saíram 87 mil milhões de euros do País em juros, lucros e dividendos; agravou-se a exploração, o desemprego e a precariedade; a riqueza poduzida continua abaixo da média europeia; a pobreza, antes de transferências sociais, afecta 46% da população portuguesa.

Problemas estruturais só se resolvem com soluções estruturais

A política de recuperação de direitos e rendimentos colide com os constrangimentos impostos pela União Europeia, sublinhou Jerónimo de Sousa. «O governo minoritário do PS vive uma contradição insanável», assinalou.

Para os comunistas, são os «défices energético, alimentar, tecnológico e demográfico» que têm de ser combatidos, o que implica a libertação do euro, enfrentar o problema das dívidas pública e externa e travar a «dominação monopolista sobre a banca». São três medidas «interdependentes», afirmou o secretário-geral do PCP, ainda que «aproveitando conjunturas particulares, progressos parciais em cada área». No entanto, sublinhou, «necessitam, a dado passo, da libertação dos condicionamentos económicos e políticos do euro».

«Portugal foi um dos países que menos cresceram no mundo e um dos países que mais se endividaram» desde a adesão ao euro, concretizou Jerónimo de Sousa. «Sem atacar os constrangimentos externos e enfrentar o capital monopolista não será possível avançar muito e será sempre possível recuar muito. A história recente do País mostrou-o», concluiu.

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