|Orçamento do Estado

«Contas certas» do Governo alimentam o empobrecimento

Uma actualização da função pública incapaz de interromper a perda de poder de compra, corte nas pensões e mais benefícios fiscais para as empresas são algumas medidas propostas no Orçamento para 2023. 

CréditosAntónio Cotrim / EPA

A proposta de Orçamento do Estado, detalhada esta tarde pelo ministro das Finanças, Fernando Medina, confirma a opção política do Governo de manter o papel de bom aluno de Bruxelas, sob pena de, por cá, aumentar a percentagem de trabalhadores e pensionistas com um poder de compra cada vez mais depauperado. 

Exemplo disso são as actualizações que o Governo propõe para os funcionários públicos e que, advogou recentemente a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública (CGTP-IN), empurram os trabalhadores para a luta.

Ao contrário do que exige a estrutura sindical, de aumentos salariais de 10% em 2023, no mínimo de 100 euros por trabalhador, o Executivo de António Costa aponta para actualizações entre os 8% e os 2%, resultando numa subida média de 3,6% no próximo ano. Acontece que os trabalhadores da Administração Pública chegaram a Janeiro deste ano com uma perda acumulada de 15%, desde 2009. Tendo em conta a inflação que se perspectiva para 2022, de cerca de 7,7%, a percentagem sobe para cerca de 22%. 

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Função Pública. Corrigir perda de compra só depende da vontade do Governo

O Executivo pode aumentar os salários da Administração Pública no próximo ano, em linha com a inflação esperada, e ainda assim alcançar um défice orçamental abaixo do que definiu.

António Costa. Foto de arquivo.
CréditosManuel de Almeida / Agência Lusa

A confirmação partiu do Conselho das Finanças Públicas (CFP) após verificar a possibilidade de um défice inferior em 650 milhões de euros relativamente à meta definida pelo Governo para 2023, aumentando os salários dos funcionários públicos em linha com a inflação esperada e mantendo os apoios às famílias. 

No relatório «Perspectivas Económicas e Orçamentais 2022-2026», citado esta sexta-feira pelo Jornal de Negócios, o CFP incluiu o impacto da subida dos salários da Administração Pública de acordo com a inflação esperada (5,1 %) para 2023 e concluiu que o saldo orçamental pode ser inclusivamente «melhor do que o esperado».

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Sebastião Santana: Proposta do Governo é «inaceitável»

O coordenador da Frente Comum critica a proposta avançada pelo primeiro-ministro de 2% de aumento na função pública. «Não nos passa pela cabeça qualquer proposta que leve ao empobrecimento dos trabalhadores».

CréditosAntónio Cotrim / Agência Lusa

«Inaceitável», é desta forma que Sebastião Santana, coordenador da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública (CGTP-IN), reage, em declarações ao AbrilAbril, à entrevista dada esta segunda-feira pelo primeiro-ministro à TVI e à CNN Portugal

Apesar da inflação galopante, num ano a somar aos muitos em que os funcionários da Administração Pública vêm perdendo poder de compra, o primeiro-ministro, que em 2022 não quis ir além de 0,9% de actualização, aponta um referencial de 2%, numa altura em que o Executivo já trabalha com uma previsão da inflação de 7,4% em 2022. «Não vão com certeza ser aumentados 7,4%», frisou António Costa.  

«Não nos passa pela cabeça qualquer proposta que leve ao empobrecimento dos trabalhadores», reage Sebastião Santana. O dirigente afirma que, ao levar esta informação para a comunicação social, o Governo «não tem respeito nenhum pelo processo negocial», que se iniciará no próximo mês, e que daqui até lá ainda tem tempo para rever a formulação apresentada esta segunda-feira, já que os trabalhadores não aceitam continuar a perder dinheiro e poder de compra.  

Costa admitiu que o referencial de 2% está alinhado com o que a União Europeia defende, invocando o estafado argumento de assim conseguir evitar a «espiral inflacionista». Mas, para Sebastião Santana, trata-se apenas de «desculpas de mau pagador».

«Quando a inflação é zero, não há aumentos; quando está em 7,4% também não há e se estivéssemos com uma deflação diriam que estávamos a ganhar dinheiro», regista Sebastião Santana. O que adiantou ontem António Costa é tão mais «inaceitável», admite o dirigente sindical, pelo facto de o Governo ter recursos  – «é uma questão de opção» – e de os grupos económicos estarem a arrecadar lucros milionários que o executivo tem recusado taxar

No dia 29 de Setembro, a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública apresenta ao Governo a proposta reivindicativa para 2023, seguindo-se a partir daí o processo negocial.  

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Em Abril, o Governo previa um défice orçamental de 0,7% do Produto Interno Bruto (PIB), mas a entidade liderada por Nazaré da Costa Cabral antecipa um excedente de 0,1% do PIB, diferença que equivale a cerca de 1,8 mil milhões de euros. 

O económico adianta que o Conselho testou outras possibilidades de aumento dos salários na Administração Pública. Neste sentido, e tomando em consideração o acréscimo de receita em IRS e obrigações, uma subida de 5,1% teria um custo de 1141 milhões de euros, mas um impacto líquido de apenas 491 milhões, o que equivale a 0,3% do PIB. 

O CFP estima que aumentos de 3% custariam 383 milhões de euros e teriam um peso de 0,2 pontos percentuais do PIB no saldo orçamental, ao passo que a proposta de 2% avançada na semana passada por António Costa, que a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública (CGTP-IN) considera inaceitável, custaria apenas 0,1% do PIB (cerca de 255 milhões de euros). 

A inflação elevada é o factor que sustenta a estimativa do Conselho para o saldo orçamental e a margem que o Governo deve obter. 

Há 13 anos que os trabalhadores da Administração Pública vêm perdendo poder de compra. A actualização salarial de 2022, que o Executivo de António Costa não deixou ir além de 0,9%, não permitindo inverter este cenário, foi engolida de imediato pelo cavalgar da inflação. 

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Outro aspecto em que a proposta do Governo, depois de concertada com UGT e patrões, deixa muito a desejar prende-se com a actualização do salário mínimo nacional para 760 euros, em 2023. Na prática, são pouco mais de 670 euros que se propõem a cerca de um milhão de trabalhadores (que auferem o salário mínimo), numa altura de brutal aumento do custo de vida. Dados do Gabinete de Estratégia e Planeamento do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, de Junho de 2021, mostravam que a incidência do salário mínimo nacional é maior entre as mulheres e os jovens com menos de 25 anos, bem como nas pessoas com habilitações até ao 3.º ciclo do Ensino Básico. Neste sentido, a proposta do Governo só contribuirá para agravar desigualdades. 

O tema da actualização das pensões é outro ponto crítico deste orçamento, depois de o Executivo ter assumido que violaria a fórmula legal, gerando descontentamento entre reformados e pensionistas. A partir de Janeiro do próximo ano, em vez do mecanismo de actualização automática previsto na lei, que, a ser aplicado, ditaria aumentos entre os 7,1% e os 8%, o Executivo propõe incrementos entre 4,43%, para quem recebe pensões até 886 euros, e 4,07% para as pensões entre 866 e 2659 euros, com 3,53% para as restantes sujeitas a actualizações. 

«Contas certas» e bónus vão para as empresas

Ao apresentar a proposta a Santos Silva, que será debatida na generalidade, na Assembleia da República, dias 26 e 27 de Outubro, Fernando Medina regojizou-se afirmando que este é um orçamento de «contas certas», através da redução da dívida pública e do défice.

Apesar da realidade com que os portugueses estão confrontados, e de o documento alimentar a dinâmica de fazer muitas contas à vida para tentar chegar ao fim do mês, o Governo reserva a capacidade existente para os grandes grupos económicos, desde logo atribuindo mais benefícios fiscais aos que cumpram com o dever de aumentar salários, entre outras condições. Neste sentido, o documento apresentado hoje pelo ministro das Finanças prevê uma majoração em 50% dos custos com a valorização remuneratória em sede de IRC e que alegadamente reduzam o leque salarial na empresa.

Apesar de, em resposta aos jornalistas, esta tarde, Medina ter argumentado que o Executivo estudará «todas as possibilidades», a verdade é que continua a fugir à taxação dos lucros dos grandes grupos económicos, em particular do sector da energia, e que estão a aproveitar os efeitos da guerra e da crise inflacionista, tal como não avança com medidas com vista ao controlo e fixação dos preços, de forma a aliviar a conta das famílias. 

Em matéria de IRS, o Executivo propõe uma actualização dos nove escalões em 5,1%, com o segundo a descer dos actuais 23% para 21%, impactando os rendimentos acima. 

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