Agora que alguns invocam os papões do desequilíbrio externo, do défice e da dívida, sempre que se fala nos passos que lentamente, muito lentamente, vão sendo dados na reposição de rendimentos e direitos dos trabalhadores, vale a pena olharmos para a estrutura de custos das Empresas Portuguesas.
Para tal recorremos à Informação Empresarial Simplificada (IES) recolhida e tratada pela Central de Balanços do Banco de Portugal e que as Empresas Não Financeiras em Portugal têm que entregar até 15 de Julho do ano seguinte ao da referência dos dados. Apenas as Empresas em Nome Individual, as Actividades Financeiras e a Administração Pública estão excluídas deste tratamento estatístico.
Estrutura de custos operacionais em 2016
Ora em 2016 o universo destas Empresas Não Financeiras, constituído por cerca de 418 mil empresas, apresentava uma estrutura de custos operacionais – custos das mercadorias vendidas e matérias consumidas, fornecimentos e serviços externos (custos com energia, transportes e telecomunicações), custos financeiros, amortizações e gastos com pessoal – com a seguinte distribuição, de acordo com a dimensão das empresas:
Nas micro-empresas, empresas com menos de 10 trabalhadores, os custos das mercadorias vendidas e matérias consumidas representavam 45,9% do total dos custos operacionais, os fornecimentos e serviços externos 25,1%, os juros e amortizações 6,0% e os gastos com pessoal 16%;
Nas pequenas empresas, empresas de 10 a 49 trabalhadores, os custos das mercadorias vendidas e matérias consumidas representavam 50,3% do total dos custos operacionais, os fornecimentos e serviços externos 23,9%, os juros e amortizações 5,2% e os gastos com pessoal 17%;
Nas médias empresas, empresas de 50 a 249 trabalhadores, os custos das mercadorias vendidas e matérias consumidas representavam 51,5% do total dos custos operacionais, os fornecimentos e serviços externos 24,2%, os juros e amortizações 5,6% e os gastos com pessoal 14,7%;
Nas grandes empresas, empresas com 250 ou mais trabalhadores, os custos das mercadorias vendidas e matérias consumidas representavam 56,8% do total dos custos operacionais, os fornecimentos e serviços externos 20%, os juros e amortizações 7,95 e os gastos com pessoal 11,5%.
«mesmo num cenário extremo de aumentos salariais significativos num contexto de baixa inflação, ao contrário do que invocam patrões e muitos daqueles que na comunicação social dominante os servem, os acréscimos de custos salariais nos custos operacionais são sempre bem mais reduzidos do que serão aumentos do mesmo nível de outros custos intermédios»
Conclui-se assim, da última informação recolhida pela Central de Balanços do Banco de Portugal, que, em média, 52,5% dos custos operacionais das empresas portuguesas não financeiras são custos com mercadorias vendidas e matérias consumidas, 22,5% são custos com fornecimentos externos, 6,5% custos com juros e amortizações e 14% custos com pessoal.
A parcela dos custos operacionais cujo crescimento tanto parece atormentar as Confederações Patronais – as despesas com pessoal nas nossas empresas – afinal pesa, na pior das hipóteses, 1/6 dos custos operacionais de uma empresa, chegando no caso dos grandes grupos económicos a representar apenas pouco mais de 1/10 desses custos.
Se os acréscimos salariais não são significativos, afinal onde está o problema?
Ou seja, mesmo num cenário extremo de aumentos salariais significativos num contexto de baixa inflação, ao contrário do que invocam patrões e muitos daqueles que na comunicação social dominante os servem, os acréscimos de custos salariais nos custos operacionais são sempre bem mais reduzidos do que serão aumentos do mesmo nível de outros custos intermédios, sejam eles energéticos ou outros.
Assim sendo, são mais profundas as razões que fazem com que os detentores do capital, os patrões e as Confederações Empresariais que os representam, só através de formas avançadas de luta acabem por ceder às justas reivindicações dos trabalhadores de uma melhor distribuição do rendimento produzido nas Empresas, entre o trabalho, através do salários e o capital, através da mais-valia.
Esta é a contradição fundamental do capitalismo, a repartição do rendimento gerado pelos trabalhadores entre trabalho e capital, reflectida na produção da mais-valia e na taxa de exploração do trabalhador pelo capitalista.
Sempre que os trabalhadores vêem os seus salários crescer mais do que o rendimento que geram, eles estão simultaneamente a reduzir o seu tempo de trabalho diário não pago e a reduzir a taxa de mais-valia, pondo em causa a lei económica fundamental do capitalismo a produção de mais-valia.
É esta a principal contradição do sistema capitalista em que vivemos e que coloca em campos opostos os trabalhadores, detentores da força de trabalho, e os capitalistas, donos do capital.
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