Orlando Gonçalves, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços (CESP/CGTP-IN), é assertivo: «Para os grandes grupos económicos a Covid-19 podia continuar a existir durante muito tempo, porque lhes tem servido muito bem». O dirigente, que falava ao AbrilAbril antes do arrancar da manifestação da CGTP-IN, referia-se ao avanço que, na grande distribuição, se pretende dar em relação à retirada de direitos dos trabalhadores com a imposição do banco de horas grupal. Os vencimentos já baixos levaram um corte com o lay-off e agravaram-se os horários dos que nunca puderam ficar em casa, afirma, garantindo que «há outra maneira de resolver os problemas do País» e que ela passa por «valorizar os salários».
Também Sebastião Santana, dirigente da Frente Comum dos Sindicatos da Administração Pública (CGTP-IN), não tem dúvidas que «a pandemia não é culpa de ninguém» mas que «a resposta é da responsabilidade do Governo», que não tem dado mostras de estar do lado dos trabalhadores. «A resposta dada até agora foi de favorecimento do grande capital», referiu, dando o exemplo do golpe na Segurança Social através do lay-off simplificado que serviu para passar dinheiro dos trabalhadores para as empresas. Pelo contrário, «quanto mais altos forem os salários mais sustentável será» a Segurança Social.
O regresso ao trabalho presencial em condições de segurança também é fundamental para os trabalhadores da Administração Pública. «Temos defendido sempre que o serviço às populações não se faz por tele-conferência», mas é preciso um reforço de trabalhadores, que são menos 30 000 desde 2011.
Desde a desvalorização salarial, aos obstáculos nas progressões, à sobrecarga de trabalho e aos atropelos nos direitos, há muitas razões para os enfermeiros estarem presentes nesta acção de luta convergente da CGTP-IN. Célia Matos do Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP/CGTP-IN) afirma que os problemas não surgiam em Março mas que houve um agravamento. Para além disso, «ficou demonstrado que foi o SNS que deu resposta à Covid-19», afirma. A preocupação, no entanto, prende-se também com os utentes «não-Covid» que não podem ficar esquecidos, pelo que é necessário um reforço d e recursos humanos e materiais.
Também para os professores os problemas são anteriores à crise sanitária. Mas o ano lectivo precisava de ser preparado de outra forma e exigiam-se outras medidas. «Os problemas da Escola Pública são transversais a todos os trabalhadores, por isso estamos aqui», afirma Manuel Guerra, que se manifestava com o Sindicato dos Professores da Grande Lisboa (SPGL/CGTP-IN) e é professor na Escola Secundária António Arroio, em Lisboa.
Deixando claro que os professores defendem o regresso ao ensino presencial, insiste que os números de contratações de profissionais em falta são irrisórios. «Qualquer professor percebe bem os problemas que as crianças e os jovens sentiram estes meses em casa, tendo em muitos casos ficado comprometido o seu desenvolvimento escolar e com consequências também a nível psicológico», afirma o professor, mas o facto de não existir investimento suficiente na Escola Pública ao longo de vários anos dificulta agora a resposta necessária à crise sanitária.
Segundo Manuel Guerra, é impossível respeitar as normas da Direcção-Geral da Saúde (DGS) sem a redução de alunos por turma, em escolas como a secundária João de Barros, em Corroios, que conhece bem, onde continua a haver aulas em contentores devido aos atrasos nas obras.
Os trabalhadores dos CTT também marcaram presença, em defesa de um serviço público universal de correios. Carlos Prazeres, do Sindicato Nacional dos Trabalhadores dos Correios e Telecomunicações ( SNTCT/CGTP-IN), afirma que os direitos das populações vão a par dos direitos dos trabalhadores, e que o aumento dos salários é fundamental. «É duvidoso o conceito de serviço público quando a empresa agora é privada», lembra Carlos Prazeres, acrescentando que o serviço está degradado intencionalmente e que os trabalhadores vêem os seus direitos atacados, exemplo disso é a imposição do cartão de refeição e a pressão exercida sobre os trabalhadores para irem para além do seu horário de trabalho.
Qual a razão da precariedade antes da Covid-19?
Sara Lima Alves, que encontrámos no quadrado da Interjovem, trabalha numa escola vai fazer três anos e continua a recibos verdes. «Os meus problemas são anteriores à pandemia e isto não é vida para ninguém», admite, explicando que veio à manifestação para denunciar a precariedade que está associada à vida de milhares de jovens que, como ela, trabalham a recibos. «Pago as minhas contribuições e há meses em que trabalho menos e que não é fácil», disse, lembrando que os jovens têm outras perspectivas, querem constituir uma família e que não podem fazê-lo com este nível de instabilidade.
Milena Barbosa não tem dúvidas que «apesar do distanciamento físico» é importante que os jovens «continuem juntos na luta». «Não nos vão desmobilizar, sobretudo agora que vemos como podia ter sido feito de outra forma e como os direitos dos jovens podiam ter sido protegidos».
Para Lídia Silva, delegada sindical no El Corte Inglés, todos os problemas existiam antes do surto de Covid-19, que agora é desculpa para tudo. «Aumentar horários, reduzir salários, não dar contrato efectivo, tudo agora é por causa da pandemia. E antes da pandemia? Todos estes problemas já eram a realidade de muitos jovens», afirma a jovem, que defende que a crise sanitária veio «beneficiar os patrões» e que os jovens estão a ganhar consciência disso.
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