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Novo Banco: Dirigente sindical despedido leva caso a tribunal

O banco «esvaziou» a recuperação de crédito de trabalhadores e Nuno Matos foi o único que ficou para trás. Agora, o Novo Banco avançou para a extinção da empresa, despedindo o dirigente sindical.

Dois meses e meio depois da «saída limpa», a falência do BES impõe a injecção de 4 mil milhões de euros pelo Estado na instituição, que é transformada em Novo Banco. Por esses dias o governo garantia que não haveria custos para os contribuintes
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Em causa está a violação do Código do Trabalho no que concerne à transmissão de estabelecimento. O Novo Banco decidiu extinguir o ACE [Agrupamento Complementar de Empresas] que estava dedicado à recuperação de crédito e, para esse efeito, iniciou um processo de rescisões e de transmissão de trabalhadores.

Nuno Matos, dirigente e delegado sindical, foi o único que não viu a sua situação resolvida e que foi notificado de despedimento com a extinção da empresa que agora tem lugar.

Em causa está a «total desprotecção de todos os representantes dos trabalhadores», afirma, em declarações ao AbrilAbril, António Freitas, dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Actividade Financeira (Sintaf/CGTP-IN) e responsável pelo contencioso, que sublinha o facto de este processo «pôr a nu» as fragilidades que revestem o direito à actividade sindical.

«Qual é a representatividade dos trabalhadores, numa sociedade que dizemos que é democrática, quando a voz sindical deixar de existir porque é eliminada?», pergunta o dirigente sindical, considerando que é uma ameaça à própria democracia.

Tratando-se de um banco intervenciondo pelo Estado e «pago por todos nós», o Governo e o Parlamento «não podem virar costas perante assunto com esta gravidade». «Com a mesma facilidade, um administrador pede 900 milhões para reforço das contas porque vendeu crédito mal parado, que a empresa em que o Nuno estava deixou de cobrar, como agora vem despedir este trabalhador», refere.

«Posso ir contar moedinhas, mas não desisto do meu posto de trabalho»

Nuno Matos trabalha na recuperação de crédito desde 1995 e no BES desde 1998. Em 2006, esta secção passa a constituir um ACE para «aproveitar os benefícios fiscais» e deu-se uma transmissão de estabelecimento que correu dentro da lei.

Em 2009, Nuno começa a envolver-se na actividade sindical, no âmbito da luta pela assinatura de um Acordo de Empresa que melhorasse as condições de trabalho praticandas na banca em geral, que foi conseguida em 2011.

As condições de trabalho e os problemas com a recuperação de crédito ganham expressão em 2014 quando se dá a implosão do BES.

«Este sector trabalhava bem e dava bons resultados ao banco: conseguíamos recuperar 40% de crédito mal parado nos primeiros dois meses de dívida do crédito, o que é muito bom», explica Nuno Matos. E nessa altura o Sintaf fez uma proposta que entregou à administração para aproveitar essa capacidade de trabalho e passá-la a outras áreas. Mas, pelo contrário, o banco decidiu mesmo destruir esta secção, com a desculpa da redução de custos a nível salarial.

«É mentira, claro, porque reduz nos custos salariais mas vai ter que pagar às empresas a quem externalizou este serviço. É uma engenharia financeira», afirma Nuno, acrescentando que, para além disto, o banco tem a consciência que despede pessoas com acordos colectivos e passa o trabalho para empresas onde impera a precariedade e os baixos salários.

Foi o clima de «pressão e assédio» que levou muitos trabalhadores a aceitar as ditas «rescisões amigáveis», que se trataram de despedimentos «encapotados», afirma o bancário.

Em 2020, António Ramalho, presidente do Conselho de Administração, anunciou que todos os ACE iam ser integrados no Novo Banco, o que vinha sendo uma reivindicação do Sintaf, uma vez que estes trabalhadores de diversas áreas trabalham efectivamente para o banco. Na recuperação de crédito começaram a contactar os trabalhadores em Novembro, 45 foram integrados e dois aceitaram a rescisão.

Para Nuno Matos, não estava em cima da mesa aceitar o despedimento. «Em 2019 já tinham despedido a minha mulher, também era dirigente sindical. Por isso, não havia maneira de eu aceitar ir para casa e ficarmos dois desempregados com duas crianças», explicou.

«Quero o meu posto de trabalho e disponibilizei-me logo para trabalhar. Se não me querem na recuperação de crédito, posso trabalhar em qualquer sector, até a contar moedinhas», afirmou o trabalhador, que tinha tarefas sindicais a tempo inteiro desde 2015 mas estava disponóvel para deixar essas funções.

A 15 de Feveiro recebeu a notificação de que a empresa iria ser extinta e que seria levado a cabo o «despedimento colectivo» deste único trabalhador que entretanto ainda pertencia à estrutura. «Na reunião que tivemos com o banco, a representante da DGERT perguntou mesmo se a minha situação não tinha sido ponderada, se não poderia ser integrado uma vez que era só um. O advogado do banco disse simplesmente: "o banco não quer"», contou Nuno Matos.

Para o trabalhador, estes termos são reveladores de uma verdadeira «perseguição», pelo que irá até às últimas consequências e levará o caso à justiça.

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