Esteve em debate, esta quinta-feira, na Assembleia da República, a reversão das normas gravosas relativas à compensação por despedimento, aprovadas, em 2012, por PSD e CDS-PP, no quadro de intervenção da Troika no País.
As diversas propostas de BE, PCP e PEV pretendiam eliminar as normas que determinam apenas 12 dias de indemnização por cada ano de trabalho em caso despedimento colectivo, e 18 dias em caso caducidade do contrato.
Aqueles partidos queriam ainda que se deixasse de contabilizar apenas 12 anos de trabalho para estas compensações, ignorando-se o restante tempo de trabalho nestes cálculos.
Projectos para acabar com a imposição do trabalho não remunerado, seja através dos bancos de horas ou das intermitências dos horários, foram chumbados hoje pelo PS e pelos partidos à sua direita. Em pleno século XXI, e não obstante as conquistas civilizacionais alcançadas com a Revolução de Abril, os trabalhadores voltam a enfrentar longas jornadas de trabalho no nosso país, sem tempo para viver e com consequências a vários níveis, nomeadamente familiares e de saúde. A ideia foi vincada esta quinta-feira no Parlamento, no debate de iniciativas do PCP, do BE e do PAN. Em 2009, o banco de horas estava enquadrado pela contratação colectiva. Com o governo do PSD e do CDS-PP impôs-se a desvalorização do trabalho e o banco de horas passou a ser possível por contrato de trabalho individual, tendo sido também introduzido o banco de horas grupal. Medidas que, na prática, permitiram aos empregadores a imposição de trabalho extraordinário sem a devida compensação, ou seja, trabalho mais barato. Entretanto, em 2019, o banco de horas individual foi revogado. Não obstante, a IL, advogando que o pagamento de horas extraordinárias pode «aumentar de forma relevante a carga salarial da empresa», e «alterar as condições de viabilidade da mesma», propôs o seu restabelecimento. O projecto foi acompanhado pelo CDS-PP, que votou a favor, e mereceu, curiosamente, a abstenção do PAN, que também tinha a votação um projecto de lei (não passou) com vista a garantir «a conciliação do trabalho com a vida familiar e uma maior estabilidade profissional», tendo sido rejeitado pelos restantes partidos na Assembleia da República. Ontem, na abertura da discussão, a deputada comunista Diana Ferreira deu conta da impunidade trazida pelos mecanismos de adaptabilidade e de bancos de horas, e do impacto que os mesmos acarretam na vida dos trabalhadores, nomeadamente o frágil acompanhamento dos seus filhos. «Na Fnac, o banco de horas pode afastar os trabalhadores 12 horas da família», exemplificou a deputada, concluindo que a empresa «não precisa de contratar mais trabalhadores, não paga horas extraordinárias e ainda fica com 150 horas da vida dos trabalhadores para utilizar a seu bel-prazer». Se, por um lado, o banco de horas «não paga contas ao fim do mês», «nem põe comida na mesa», como realçou Diana Ferreira, a sua revogação, bem como a dos mecanismos de adaptabilidade, «é fundamental para um cumprimento efectivo dos horários de trabalho e para garantir uma articulação entre o trabalho e a vida pessoal e familiar», reforçou, salientando que horários de 12, 14 ou 16 horas diárias privam as crianças do direito de serem acompanhadas pelos pais. Por outro lado, sublinhou que, «se há horas extraordinárias que são continuadas e muitas vezes diárias na vida dos trabalhadores, elas não são extraordinárias, são necessidades permanentes», tendo que haver «contratação de mais trabalhadores para aquela empresa». Pelo BE, o deputado José Soeiro vincou que 75% dos trabalhadores por conta de outrem trabalham com uma modalidade flexível de horário laboral, sublinhando que o banco de horas foi, neste contexto, «um mecanismo de desregulação dos horários e de embaratecimento do valor do traballho». Trazendo uma «dificuldade acrescida» de conciliar trabalho, família e lazer, e, ao mesmo tempo, uma redução da autonomia dos trabalhadores. Tanto os projectos de lei do PCP, pela revogação dos mecanismos de adaptabilidade e de banco de horas, e dos mecanismos de adaptabilidade individual, como o do BE, com vista à eliminação do banco de horas grupal e da adaptabilidade individual e grupal, foram chumbados pelo PS e pelos partidos à direita (CH absteve-se na revogação dos mecanismos de adaptabilidade), com a abstenção do PAN. O sentido de voto do PSD percebeu-se pela intervenção da deputada Lina Lopes, que ontem afirmou que «não podemos estar constantemente a revogar ou a modificar leis laborais, sem dar espaço à estabilidade e à contenção do processo legislativo», e que o País «precisa de gerar confiança». Embora reconhecendo que «foram detectadas fragilidades», tanto no teletrabalho como na conciliação entre a vida pessoal e profissional, Lina Lopes apelou à «paz social» e remeteu as alterações ao Código do Trabalho para a concertação social, que classificou de «pedra angular». A resolução destas matérias através de novo acordo com os patrões na concertação social foi igualmente defendida pela bancada do CDS-PP, que, pela voz do deputado João Almeida, assume que «não faz sentido eliminar o banco de horas», nos termos em que está previsto na lei, e que o PS se orgulha de ter criado. «Sentido», para o CDS-PP, fazia «repor o banco de horas individual». Para Lina Lopes, «este é o tempo de debater o Orçamento do Estado», onde, de acordo com a proposta do Governo, faltam medidas de valorização do trabalho e dos trabalhadores. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Trabalho|
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Discutiu-se ainda a eliminação da presunção de que a aceitação de uma indemnização significa consentir com o despedimento, situação que leva a que muitas vezes os trabalhadores não exijam a sua reintegração.
Este conjunto de medidas que, aquando da sua aprovação, foram fortemente criticadas pelos trabalhadores e seus representantes, vieram a contribuir para um aumento significativo do desemprego e da precariedade.
Para a comunista Diana Ferreira, estas normas do Código do Trabalho asseguram que «despedir é mais fácil e mais barato», tendo sido «oferecidas, de mão beijada, ao patronato indemnizações por despedimento a preço de saldo».
E relembrou que isto se liga com a actual dimensão do desemprego no País, com 70000 jovens nesta situação, num quadro de perto de 432 mil desempregados registados no Instituto de Emprego e Formação Profissional em Fevereiro passado, valores que não consideram aqueles que não têm qualquer registo nos centros de emprego.
A deputada alertou ainda para o facto de que,«em 2020, de acordo com os dados da Direcção-Geral do Emprego e Relações de Trabalho, foram mais de 7500 os trabalhadores despedidos com recurso ao despedimento colectivo», ao que se somam os 88 processos deste tipo iniciados já este ano.
José Soeiro, do BE, evidenciou a indisponibilidade do PS para se juntar às iniciativas em discussão e afirmou que o direito do trabalho deve servir para proteger os trabalhadores, e não o contrário.
Lina Lopes do PSD, que caracterizou os projectos do PCP e do PEV como «vingança» quanto ao período de governação do seu partido, culpou a pandemia pela situação vivida pelos trabalhadores.
Na mesma linha, André Ventura, do Chega, justificou o seu voto contra socorrendo-se dos argumentos de sempre do PSD, nomeadamente a defesa da «estabilidade legislativa». Ao mesmo tempo criticou ainda a «rigidez» da legislação laboral, defendendo, deste modo, que deveria ser ainda mais fácil despedir.
Fernando José, do PS, justificou a não aprovação destas medidas, que classificou de «inoportunas e desadequadas», com o acordo de concertação social de 2018.
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