|direitos dos trabalhadores

ONU pede diminuição dos horários de trabalho

Os países devem travar a realidade do excesso de trabalho, que constitui um risco laboral e para a saúde dos trabalhadores e que pode «levar à morte prematura».

O alcance das 35 horas tem sido uma das bandeiras de luta dos trabalhadores que ainda não alcançaram a redução do horário
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De acordo com dados de um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), coordenado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e divulgado esta segunda-feira, há registo de 745 mil mortes anuais causadas por problemas cardiovasculares ligados ao trabalho excessivo, havendo um aumento de óbitos na ordem dos 29% entre 2000 e 2016.

Isto significa que os horários excessivos são já o principal factor de risco laboral e causam um terço dos problemas de saúde relacionados com o trabalho.

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O direito a desligar

O chamado «direito a desligar» é uma fraude e, na prática, representa a tentativa de dar aos patrões o direito de nos terem mais tempo ligados e controlados.

Créditos / correiobraziliense.com.br

PS e BE, CDS e UE, PAN e PSD, todos querem dar aos trabalhadores o direito a desligar. Eis o que os próprios e a comunicação social nos repetem sem cessar. Mas esta gente nada está a dar aos trabalhadores. O patrão não pode exigir-nos nada fora do horário de trabalho. O que estão a querer garantir é o dever de estar ligado mais tempo que o nosso tempo de trabalho e de o patrão medir o tempo de trabalho efectivo alargando o horário de trabalho real. E assim se fazem os grandes defensores modernos dos trabalhadores: dando direitos aos patrões!

«PS e BE, CDS e UE, PAN e PSD, todos querem dar aos trabalhadores o direito a desligar. Eis o que os próprios e a comunicação social nos repetem sem cessar. Mas esta gente nada está a dar aos trabalhadores. O patrão não pode exigir-nos nada fora do horário de trabalho»

Comecemos pela União Europeia (UE). Vejamos o que diz a proposta de directiva comunitária, no seu Artigo 3.º:

«Direito a desligar. 1. Os Estados-Membros asseguram que os empregadores tomam as medidas necessárias para fornecer aos trabalhadores os meios para exercerem o seu direito a desligar. 2. Os Estados-Membros devem assegurar que os empregadores criam um sistema objetivo, fiável e acessível que permita medir a duração do tempo de trabalho diário de cada trabalhador, em conformidade com o direito dos trabalhadores à privacidade e à proteção dos seus dados pessoais. Os trabalhadores devem ter a possibilidade de solicitar e obter o registo dos seus tempos de trabalho. 3. Os Estados-Membros asseguram que os empregadores apliquem o direito a desligar de forma justa, legal e transparente.»

Numa leitura muito distraída, está a dar-se direitos aos trabalhadores. Agora façamos uma leitura mais fina:

- Hoje, fora do horário de trabalho estabelecido, o trabalhador não tem que atender chamadas do patrão ou de colegas. Ponto. Só atende se quiser, e se não quiser não atende e ninguém tem nada com o assunto, nem lhe podem fazer qualquer tipo de processo disciplinar. Com o texto proposto, o trabalhador, para passar a ter o que já tinha, terá de dirigir-se à empresa a requerer o direito a desligar. E se não o fizer, passará a estar obrigatoriamente ligado, o que antes não acontecia. E ainda se deixa o espaço para legislar o tempo de desligar separado (logo maior) do tempo de trabalho. Está a dar-se ao patrão o que ele não tem.

«Com o texto proposto, o trabalhador, para passar a ter o que já tinha, terá de dirigir-se à empresa a requerer o direito a desligar. E se não o fizer, passará a estar obrigatoriamente ligado, o que antes não acontecia»

- Hoje, o horário de trabalho é definido entre limites horários concretos e o instrumento de medida é o relógio. Mesmo em teletrabalho. Com esta proposta, o patrão passa a poder medir o tempo de trabalho segundo outros critérios além do intervalo horário (por exemplo, não incluindo no tempo de trabalho o período em que um operador de call center aguarda que lhe chegue uma nova chamada), e a invadir a privacidade do trabalhador, por exemplo ao controlar o que se faz no computador de cada um. Na prática, está-se a intensificar o trabalho e a estender o horário de trabalho. Hoje não se podem instalar câmaras para controlar o trabalhador enquanto trabalha. Nem se pode contar o número de vezes que carrega no teclado. Como foi dito acima, tentam dar ao patrão um conjunto de direitos que ele hoje não tem.

«Hoje, o horário de trabalho é definido entre limites horários concretos e o instrumento de medida é o relógio. Mesmo em teletrabalho. Com esta proposta, o patrão passa a poder medir o tempo de trabalho segundo outros critérios além do intervalo horário (por exemplo, não incluindo no tempo de trabalho o período em que um operador de call center aguarda que lhe chegue uma nova chamada)»

Cá mais perto de nós, nas propostas em discussão sobre o teletrabalho, o PS coloca como uma das questões a regular no contrato de teletrabalho «o horário de trabalho, incluindo horário de desligamento», ou seja, admite explicitamente que um é diferente do outro, e que o trabalhador tem que estar ligado mais tempo que o seu horário de trabalho! E não satisfeito, ainda estende esse limite com base em critérios subjectivos, pois o patrão deve «abster-se de contactar o teletrabalhador no período de desligamento a que se refere o artigo 18.º, ressalvadas as situações de força maior». Ou seja, pode. E se pensarmos que o PS escreve que «entende-se por “período normal de funcionamento da empresa” o que se inicia às 08h00 e termina às 19h00» e abre a possibilidade de o «controlo da prestação do trabalho» não ser através de um horário determinado, na prática alarga o horário de trabalho para as 11 horas diárias, mas sem aumento de remuneração.

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Mais de metade do trabalho extra fica por pagar

Mesmo num ano (2020) em que se regista uma diminuição do trabalho nocturno e aos fins-de-semana, fruto da crise associada à pandemia, os patrões voltam a não pagar a maior parte do trabalho suplementar.

«A probabilidade de, no fim da linha, entrar na pobreza, é grande», admite a coordenadora do estudo
Créditos / Studio FM

Nos dados do Inquérito ao Emprego do Instituto Nacional de Estatística (INE) analisados pelo Dinheiro Vivo/JN, revela-se que apenas 49,4% das horas trabalhadas para além do horário normal foram pagas pelos empregadores.

Pese embora no ano de 2020 ter havido uma diminuição significativa dos trabalhadores a fazer horas extraordinárias, num total de 477 mil (12% de trabalhadores por conta de outrem, no que corresponde ao número mais baixo desde 2013), manteve-se a política empresarial de não pagar mais de metade dessas horas.

Veja-se que, no ano passado, foram menos 86 mil as pessoas que trabalharam à noite, quando se compara com 2019, numa quebra de 16,3%. É o maior decréscimo verificado pela série do INE, que se iniciou em 2011, ainda que se tenha de ter em conta o factor do aumento do desemprego.

Foram também, em comparação com 2019, menos 14% os profissionais que trabalharam ao sábado, e menos 13% ao domingo.

Esta diminuição de trabalho ao fim-de-semana decorre de medidas restritivas de combate à pandemia, como o encerramento de actividades relacionadas com a hotelaria, a restauração e o turismo, mas também com o encerramento de espaços de diversão nocturna, fechados há quase um ano.

Não obstante, a média de horas extraordinárias manteve-se nas oito horas, não tendo sofrido alterações face a 2019. E verificou-se que são menos 124 mil as pessoas que ultrapassam o limite máximo do horário legal de trabalho, isto é, as 41 horas semanais.

Realidade que se repete nos últimos anos

No período da Troika e do governo de PSD/CDS-PP, 60% do trabalho suplementar ficou por pagar, sendo que só em 2012 isso correspondeu a 114,2 milhões de horas de trabalho suplementar sem remuneração.

E, nos últimos anos, a média cifra-se à volta dos 50% de horas a mais trabalhadas sem qualquer pagamento. Em 2018, quando não foram pagas cerca de metade das horas extra, os patrões pouparam cerca de 820 milhões de euros.

Recorde-se que, de acordo com um estudo do Observatório sobre Crises e Alternativas, publicado em 2019, os mecanismos legais que se definiram para desincentivar o recurso ao trabalho extra, não são suficientes.

No documento da autoria de Diogo Martins, Fausto Leite, Filipe Lamelas e João Ramos de Almeida, lia-se que «é possível concluir que o número de horas de trabalho suplementar tem apresentado uma tendência consistente de crescimento ao longo do período analisado (desde 2011)».

Sendo que, a tendência de crescimento do número de horas extraordinárias realizadas tem início no período, em que com a intervenção da Troika, e pelas mãos do governo PSD/CDS-PP, foi aprovado em 2012 um «pacote de medidas que alteraram significativamente a contabilização e a remuneração das horas de trabalho suplementar», que embarateceram o trabalho, com o corte «para metade das majorações de remuneração por trabalho suplementar e a eliminação do mesmo o período de descanso compensatório por trabalho suplementar (25% do tempo realizado)», explicavam então os autores.

Esta prática tem levado à concentração nos bolsos dos empregadores de uma grande parte da riqueza produzida, sendo que o referido estudo revelava que só entre 2011 e 2018, «ficaram por pagar – segundo os trabalhadores – mais de 6,6 mil milhões de euros» em horas extra.

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Aliás, à boleia do direito a desligar, o próprio CDS tem uma proposta: «Direito ao desligamento: Os trabalhadores que utilizam ferramentas digitais, incluindo as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), para fins profissionais, têm direito a desligar durante o seu período de descanso diário; O direito previsto no número anterior não obsta que, em caso de força maior e de urgência, devidamente justificável, o empregador possa contactar o trabalhador». Mais uma vez, o que se está a dar é o direito aos patrões (todos) ligarem ao trabalhador sempre que lhes apetecer, e aos das TIC de o fazerem «em caso de urgência», ou seja, sempre que quiserem.

«nas propostas em discussão sobre o teletrabalho, o PS coloca como uma das questões a regular no contrato de teletrabalho «o horário de trabalho, incluindo horário de desligamento», ou seja, admite explicitamente que um é diferente do outro, e que o trabalhador tem que estar ligado mais tempo que o seu horário de trabalho!»

O que o BE propõe é nada. Mas na sua demagogia e necessidade de andar na crista das ondas criadas por quem tem o poder para criar ondas mediáticas, acaba a facilitar o trabalho da direita! Vejamos a proposta do Bloco: «O empregador abstém-se de estabelecer comunicações com o trabalhador fora do tempo de trabalho através de ferramentas digitais, como telefonemas, mensagens de correio eletrónico e outras.» É uma mera clarificação de algo que está implícito na definição de horário de trabalho. Mas ao alinhar na campanha de que se está a legislar sobre «o direito a desligar» acaba por ajudar a distrair do essencial: a direita e o patronato estão a preparar-se para legislarem o nosso dever de estar ligado fora do horário de trabalho.

As propostas da área do PAN têm um efeito similar. Tal como as do BE, ainda afirmam que a tentativa de contacto por parte do patrão fora do horário de trabalho «pode» ser considerada assédio, mas na prática propõe o que existe hoje – esse contacto já «pode» ser considerado assédio – com a agravante de assumirem que se a lei não for alterada os patrões hoje têm o direito de contactar e ser atendidos. E não têm!

Concluindo: O direito a desligar é uma fraude! E na prática representa a tentativa de dar o direito dos patrões de nos terem mais tempo ligados e controlados.

O que é justo reivindicar é o direito ao respeito pelo horário de trabalho. Ponto. Nesta questão, não é preciso mudar o código, é preciso fazê-lo cumprir.

E aos milhares de trabalhadores – em teletrabalho e não só – que são vítimas de assédio patronal é preciso dizer-lhes três coisas:

1. Tens um horário de trabalho, organiza-te para o defender e impedir o abuso patronal.

2. Se o patrão, o chefe, o supervisor, liga fora do horário de trabalho, não atendas.

Não permitas que PS, PSD e CDS, com o apoio da UGT e dos patrões, e a cumplicidade de BE e PAN, criem a obrigação, que hoje não existe, de estares ligado além do teu horário de trabalho.


O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Esta investigação é a primeira realizada a nível mundial sobre os efeitos dos horários excessivos na saúde dos trabalhadores. Revela-se que, em 2016, ocorreram até 398 mil mortes por doenças cardíacas (mais 42% do que no início do século) e 347 mil por ataque cardíaco (um aumento de 19%). Constata-se ainda que trabalhar mais de 55 horas por semana aumenta o risco de morrer de doenças cardíacas em 35% em comparação com aqueles que trabalham entre 35 e 40 horas semanais.

Segundo um dos autores do estudo, Jian Li, professor da Universidade da Califórnia (UCLA), quem trabalha em excesso tem até mais 17% de risco de morrer de ataque cardíaco e fica com a sua saúde mais prejudicada, nomeadamente com o aumento de stress.

Os efeitos negativos na saúde de longas horas de trabalho tendem a surgir dez anos após o início do trabalho excessivo, pelo que as principais vítimas são pessoas entre os 60 e 80 anos de idade que tiveram de trabalhar desta forma pelo menos a partir dos 45 anos de idade.

Outro estudo mostra que 72% das mortes causadas são homens e que a Ásia Oriental e do Sul é uma das regiões mais atingida. Segundo a OMS, as regiões onde predomina o trabalho informal, como o continente asiático e a América Latina, são as que mais sofrem com este tipo de problemas de saúde.

Estudo com médicos demonstra que é um problema frequente

Horário de trabalho é factor de «burnout»

Estudo revela que dimensões da síndrome burnout estão presentes em médicos que trabalham mais horas. Problemas de funcionamento do Serviço Nacional de Saúde também podem estar relacionados.

Presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos chama atenção de tutela sobre «burnout» dos médicos
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O psicanalista nova-iorquino Herbert J. Freudenberger denominou de síndrome de burnout «(…) um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional».

Um estudo da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM) centrado na problemática da síndrome, que decorreu entre Janeiro e Dezembro de 2015, concluiu que 18,7% dos médicos trabalha mais de 60 horas por semana.

O estudo, que abrangeu 1577 médicos (20% do total de médicos inscritos na secção), refere que 15,9% dos inquiridos trabalha 60 a 80 horas por semana, 2,8% mais de 80 horas e 53,2% entre 40 a 60 horas, sendo que mais de metade dos profissionais que participou no estudo faz serviço de urgência.

Os médicos que trabalham mais de 40 horas e os profissionais que realizam trabalho nocturno e serviço de urgência apresentaram níveis mais elevados de exaustão emocional, uma das dimensões da síndrome de burnout.

A pressão para uma «produção desenfreada de dados médicos», o «excesso de burocratização do Serviço Nacional de Saúde», a sua desorganização, a falta de «meios complementares de diagnóstico, de meios farmacológicos e de recursos humanos», bem como as «disfuncionalidades dos sistemas informáticos» vêm dificultar o trabalho dos médicos e potenciar situações de burnout, sublinhou o presidente da SRCOM, Carlos Cortes.

Segundo Carlos Cortes, a carga horária e de trabalho a que os médicos estão sujeitos têm uma «implicação imediata», considerando que o facto de haver quase 20% dos médicos a trabalhar mais de 60 horas é «um dado que tem de obrigar o Ministério da Saúde a reflectir», e alertando que o estudo vem «mostrar à tutela que tem responsabilidade».

Para o responsável da SRCOM, o fenómeno do burnout foi amplificado com a crise económica.

O estudo alerta para o facto de 40,5% dos médicos apresentarem sinais de exaustão emocional. Um quarto dos médicos atingiram pontuação elevada na escala de depressão, 17,1% apresentaram despersonalização (atitudes negativas, cinismo, insensibilidade e irritação), 16,5% revelaram níveis elevados na escala de ansiedade, 16,4% na escala stress e 25,4% na de «não realização profissional».

Carlos Cortes considerou que, «se não houver uma reversão muito rápida», promovida pela própria tutela, poderão surgir «situações muito gravosas», que afectam a própria qualidade e eficiência do serviço prestado nos hospitais e centros de saúde do país.

Este estudo é divulgado num contexto em que está muito presente a discussão do horário de trabalho, nomeadamente das 35 horas de trabalho semanal.

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Pelo contrário, nas regiões com mais regulamentação e com limitação de horas de trabalho, como a Europa ou a América do Norte, a incidência de mortes por problemas cardiovasculares é menor.

A OMS e a OIT estimam que quase um em cada dez trabalhadores em todo o mundo (cerca de 480 milhões) tem de trabalhar mais de 55 horas por semana. Todavia o relatório não conclui existir grande diferença no custo da saúde cardiovascular causado por diferentes tipos de trabalho.

A pandemia, que mudou profundamente o mundo laboral devido ao aumento do trabalho à distância, pode, no futuro, aumentar os efeitos nocivos de longas horas de trabalho na saúde, acrescenta a OMS.

«O teletrabalho, que se tornou a norma em muitos sectores, esbateu as fronteiras entre a casa e o emprego, e muitos negócios reduziram a sua escala para poupar dinheiro, pelo que aqueles que permanecem empregados acabam por trabalhar mais horas», aponta o director-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.


Com agência Lusa

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