O acidente na rede elétrica internacional do passado dia 24 de julho, tendo começado com o embate de uma avioneta em linhas de alta tensão em França, levou à interrupção no abastecimento a um significativo número de consumidores domésticos e industriais em Portugal.
Este «quase apagão» vem demonstrar o que se tem vindo a referir: a existência de crescente instabilidade nas redes de transporte e de distribuição de eletricidade, resultante da complexa mudança forçada pelo novo paradigma de aprovisionamento elétrico baseado em miríades de centros de produção suportados em fontes renováveis e dispersos no território nacional. Alguns milhares desses centros de (pequena) produção são, simultaneamente, pontos de consumo.
A transição energético-climática (por vezes designada por transição ecológica), vem sendo concretizada através de uma política energética drasticamente virada para a descarbonização rápida da indústria, da produção de eletricidade e dos diversos consumos.
A referida transição comporta no seu cerne, não tanto objectivos de recuperação económica, de racionalidade técnica, de preocupação ambiental abrangente ou de eficiência energética global, mas de uma voluntariosa e idealista mutação para um portefólio produtivo quase exclusivamente centrado na produção renovável (tipos e dimensões muito variáveis), através do qual se presume vir a conseguir diminuir as concentrações de CO2 na atmosfera terrestre, o que, supostamente, permitiria estancar as alterações climáticas devidas às emissões de CO2 antropogénico.
Não sendo o local e o momento oportuno, importa referir que estes desejos de controlo climático, são, no mínimo, merecedores de uma análise crítica e isenta.
«Os encerramentos extemporâneos de centrais termoelétricas – Sines e Pego (a breve prazo) e as centrais de ciclo combinado que utilizam gás natural, daqui a poucos anos – têm sido conjugados com o exponencial aumento do número de unidades baseadas em renováveis intermitentes»
O sistema de produção e as respetivas redes elétricas (transporte e distribuição), que se baseava, até há alguns anos, em fluxos de eletricidade que iam das grandes e médias centrais hidroelétricas e termoelétricas (5 ou 6 dezenas) para as várias centenas de milhares de pontos consumidores dispersos no território continental português, passou rapidamente para um desenho quase completamente invertido (e híbrido): para além de ainda se manter alguma produção centralizada em aproveitamentos hidroelétricos e em centrais de ciclo combinado, proliferaram dezenas de milhares de núcleos de produção dispersos, que injectam eletricidade renovável em certos pontos das redes. Numa grande quantidade desses pontos – os de autoconsumo – verificam-se situações híbridas. Neles, para além de se injectar eletricidade, existem consumos noutros momentos do dia, ou seja, recebe-se eletricidade da rede. Tudo isto com grande variância, volatilidade e imprevisibilidade.
A designada produção verde, está, e continuará a estar durante alguns anos, alicerçada, em grande parte, na subsidiação suportada pelos consumidores. Simultaneamente, o esquema tem permitido elevadas remunerações de capital aos accionistas de grandes empresas elétricas.
Enquanto muitos estávamos na Festa do Avante!, num exercício de transparência responsável, o mercado eléctrico, escuro como o carvão, movia-se sorrateiramente. O governo tem vindo a desdobrar-se, desde há muitos meses, em declarações no sentido do encerramento antecipado das centrais termoeléctricas a carvão, situadas em Sines e no Pego/Abrantes. A EDP, por seu lado, embora hesitante no início, aderiu à ideia, desde logo porque, conforme revelou publicamente, «até teria prejuízo em manter Sines a funcionar» devido à oneração dos custos pelas taxas de carbono e outros impostos ambientais. «a importação de electricidade através das interligações Portugal-Espanha atingiu, no domingo, dia 6 de Setembro, a potência de 4445 MW, o valor mais alto jamais atingido» A corporação, especializada em meter no bolso vários governos durante muitos anos, está agora empenhada em limpar a sua imagem através de uma operação de charme em que se declara interessada num «Planeta com zero CO2»! Contudo, a produção eléctrica à base de carvão tem vindo a ser muito significativa durante o corrente mês de Setembro. Troquemos isto em miúdos, tentando perceber melhor. Como exemplo, refira-se que a importação de electricidade através das interligações Portugal-Espanha atingiu, no domingo, dia 6 de Setembro, a potência de 4445 MW, o valor mais alto jamais atingido. Entre as 13 e as 19 horas esteve sempre a importar-se acima dos 4000 MW! Um pouco mais de 50% da electricidade consumida durante o dia 6, foi importada. Consumiram-se 118,1 GWh nesse domingo, dia 6, e 140,4 GWh na segunda-feira, dia 7, tendo-se produzido, respectivamente, 61,3 GWH e 132 Gwh. Por que razão acontecem estes saltos, se existe potência eléctrica sobrante montada em Portugal? «Consumiram-se 118,1 GWh nesse domingo, dia 6, e 140,4 GWh na segunda-feira, dia 7, tendo-se produzido, respectivamente, 61,3 GWH e 132 Gwh. Por que razão acontecem estes saltos, se existe potência eléctrica sobrante montada em Portugal?» Da energia importada no dia 6, apenas 20% foi para bombagem hidroeléctrica, porque a maioria foi mesmo para substituir produção portuguesa que esteve parada. Essa electricidade importada incluiu electrões provenientes de Espanha e Marrocos, e entre eles estavam electrões provenientes de centrais nucleares e térmicas convencionais. Os electrões não têm cor. De facto, a EDP tem vindo a atribuir um valor/preço à produção hidroeléctrica (albufeira) superior à produção de base a carvão (já com os custos de CO2 e outros impostos!). Por essa razão, que é inteiramente «de mercado», a produção a carvão (Sines Grupo 3) tem entrado em primeiro lugar na ordem de mérito no Despacho de Rede/Mercado Grossista. Assim, a EDP, poupa a água das albufeiras ao fim de semana para a vender, com maior lucro, durante as pontas verificadas na semana de trabalho. Nessa perspectiva o carvão, e eventualmente o gás natural, entram conforme os preços no mercado grossista. É que se não houver vento, como foi o caso, resta o gás natural, a biomassa e alguma fotovoltaica. Durante os primeiros dezasseis dias de Setembro do corrente ano a produção, por fonte de energia primária, foi, em GWh: Portanto, as principais fontes foram o gás natural e o carvão, tendo-se produzido um total de 2283,3 GWh, para um consumo de cerca de 2150 Gwh. Muito diferente daquilo que apregoam, de braço dado, o governo e a EDP. «as principais fontes foram o gás natural e o carvão, tendo-se produzido um total de 2283,3 GWh, para um consumo de cerca de 2150 Gwh. Muito diferente daquilo que apregoam, de braço dado, o governo e a EDP» O que aqui se crítica não é a utilização das fontes convencionais, porque, à parte a optimização que as poucas dezenas empresas eléctricas, designadamente das três ou quatro grandes, fazem do mercado grossista por elas dominado, essa utilização é incontornável e sê-lo-á por muito tempo, até que haja uma fonte limpa alternativa credível, socioeconomicamente sustentável e segura. Até lá, enquanto muitos estávamos na Festa do Avante!, num exercício de transparência responsável, o mercado eléctrico, escuro como o carvão, movia-se sorrateiramente. O problema é que, com papas azuis e bolos verdes, eles, os senhores da transição descarbonatada, continuam a enganar muita gente. Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. O teu contributo vem reforçar o nosso projecto e consolidar a nossa presença.Opinião|
Electricidade, escura como o carvão
Hidroeléctrica Bombagem hidro Eólica Biomassa Fotovoltaica Carvão Gás natural Outras 300,7 (45,9) 321,8 143,9 70,4 402,6 886,8 202,9 Contribui para uma boa ideia
Os encerramentos extemporâneos de centrais termoelétricas – Sines e Pego (a breve prazo) e as centrais de ciclo combinado que utilizam gás natural, daqui a poucos anos – têm sido conjugados com o exponencial aumento do número de unidades baseadas em renováveis intermitentes. Ora, esta alteração implicou que a inércia da rede elétrica se tornou cada vez menor: ou seja, verifica-se uma cada vez menor capacidade para reagir com flexibilidade e rapidez às súbitas falhas no abastecimento (e a outras perturbações).
O incidente do passado dia 24, verificado ao nível da rede de transporte internacional de Muito Alta Tensão (MAT), foi, em Portugal, corrigido com o corte rápido e automático (até, no máximo, 10 segundos) do fornecimento de eletricidade a determinados tipo de consumos pré-selecionados: bombagem, grandes consumidores industriais e diminuição de consumos gerais a nível da E-Redes (rede de distribuição). É o chamado deslastre automático que está previsto exactamente para estas situações, e que é accionado quando a frequência elétrica baixa 1 a 2 Hz devido à falta de potência na rede.
No entanto, e é aqui que tem impacto a questão do tipo de produção, a necessidade de deslastre – desligar consumos – será tanto menor quanto maior for a capacidade de resposta do parque produtivo, aumentando, também em poucos segundos, a produção de eletricidade para compensar aquela que faltou subitamente. No caso presente tratava-se de compensar a grande quantidade de energia que estava a ser importada através da rede espanhola e, de repente, falhou. A eletricidade, proveniente de França, também tinha origem nuclear. A compensação, para ser eficaz, deveria passar pelo contributo de grandes unidades de produção convencional, sejam elas baseadas em combustíveis (gás natural e carvão), sejam hidroelétricas de albufeira. Têm é que entrar rapidamente na rede com potências significativas.
«O incidente do passado dia 24, verificado ao nível da rede de transporte internacional de Muito Alta Tensão (MAT), foi, em Portugal, corrigido com o corte rápido e automático (até, no máximo, 10 segundos) do fornecimento de eletricidade a determinados tipo de consumos pré-selecionados»
As pequenas e médias unidades baseadas no vento e no sol não têm possibilidade de responder a este tipo de necessidade, até porque estão sempre no máximo das suas capacidades (têm essa garantia contratual, ou, como têm preços marginais zero, entram sempre na rede). No caso dos milhares de microunidades existentes em moradias, condomínios e unidades económicas, a situação é similar, para pior. Nesses casos não é de esperar qualquer ganho no domínio da inércia. Quer isto dizer que, com esse tipo de unidades, não se conseguirá aumentar instantaneamente a potência, até porque, como sabemos, os fluxos de radiação solar e de vento não são controláveis pelo Homem.
Com a saída da central de Sines ainda sem estarem garantidas todas as condições que, aliás, o Operador da Rede de Transporte (REN) tinha alertado serem necessárias, a rede ficou desequilibrada e exposta a casos como o que agora se verificou. Essas condições passavam por estarem concluídas, pelo menos, a linha de 400 kV que atravessa o Alentejo (de Ferreira até Tunes) e o aproveitamento hidroelétrico da Iberdrola do Tâmega. Estes empreendimentos só estarão prontos em 2023.
No actual contexto a central de ciclo combinado a gás natural situada no Carregado (Central Termoelétrica do Ribatejo) passou a ter um papel fundamental para garantir a estabilidade da rede a norte de Lisboa, bem como para garantir alguma compensação daquela que se desenvolve para sul. Mas, nesta central, apenas estão disponíveis 1169 MW.
Se Sines ainda estivesse interligada teria, provavelmente, um ou dois grupos a funcionar nos níveis mínimos, o que possibilitaria, em poucos segundos, escalar a potência de modo a compensar aquela que deixou de estar disponível a partir da importação. A necessidade de deslastre seria muito menor.
Não obstante o brutal aumento do custo da energia produzida nas centrais de Sines e do Pego devido à inflação artificial do «preço» do carbono, estas unidades continuam (ou continuariam) a ter um papel relevante.
O já referido deslastre da rede passa por cortes automáticos em diversos tipos de consumos.
Desde logo há os desligamentos em alguns dos aproveitamentos hidroelétricos, com grupos geradores (turbina/alternador) reversíveis que estejam em modo de «bombagem» levando a água de regresso à albufeira. Esses consumos são os primeiros a serem desligados – no dia 24 foram interrompidos automaticamente 300 MW (ocorreu uma situação anómala em Alqueva, onde o grupo que estava a bombar água se manteve indevidamente nesse regime, e que deverá ser averiguada por entidades competentes).
«Com a saída da central de Sines ainda sem estarem garantidas todas as condições que, aliás, o Operador da Rede de Transporte (REN) tinha alertado serem necessárias, a rede ficou desequilibrada e exposta a casos como o que agora se verificou»
Há, depois, um conjunto de grandes consumidores de eletricidade (geralmente empresas industriais) que têm contratualizado o chamado regime de interruptibilidade. Em situações anormais do tipo da presente ocorrência são automaticamente desligados. Por essa razão beneficiam de preços especiais de eletricidade, situação que leva a que, anualmente, possam encaixar alguns milhões de euros (mais de 100 milhões), mesmo que não haja qualquer problema. Neste regime, que irá terminar em outubro próximo, terão sido desligados consumos de apenas cerca de 300 a 400 MW. Como está actualmente contratualizada a interruptibilidade com nove empresas1 num montante de 693 MW de potência desligável automaticamente, será interessante perguntar por que razão não se desligaram mais consumos neste regime. Estes contratos valem muitas dezenas de milhões de euros por ano para estas nove empresas (48 unidades operacionais em diferentes pontos do país), facto que faz acrescer a fatura endossada à generalidade dos outros consumidores.
Como os cortes já referidos não foram suficientes, e porque, como já foi visto, a produção de compensação já não existe em quantidade suficiente, houve necessidade de aprofundar o deslastre, o que levou ao corte de mais 550 MW na rede de distribuição, coisa que acabou por afectar muitos milhares de consumidores. No total, com estes mecanismos automáticos desligaram-se mais de 1 000 MW dos cerca de 5 500 MW que Portugal consumia na altura. Isto é, em Portugal cortaram-se 20% dos consumos enquanto em Espanha apenas foram deslastrados 7,5% (estavam nos 30 000 MW). É fundamental pedir explicações ao governo, à ERSE, à REN e à EDP sobre o sucedido e suas razões.
O que dizer dos negócios que têm vindo a ser realizados em diversas partes do mundo, centrados na exploração das energias renováveis para produção de electricidade, em particular da fotovoltaica portuguesa? Na vida real, a economia afunda-se, as condições sociais pioram, a tensão político-económica entre grandes países e regiões mundiais agrava-se, e as expectativas sobre a evolução da pandemia são incertas e preocupantes, mas existem, pelo menos, duas ilhas de felicidade utópica: as bolsas de valores e o investimento no mercado das fotovoltaicas. Parte da exuberância poderá estar ligada a dois factores: a visão que se tem, ou não tem, relativamente ao potencial de novas tecnologias e, noutra vertente, o baixo custo do dinheiro. Neste contexto, o que dizer dos negócios que têm vindo a ser realizados em diversas partes do mundo, centrados na exploração das energias renováveis para produção de eletricidade, em particular da fotovoltaica portuguesa? Portugal, por muito que custe a alguns aficionados, é um pequeno parceiro europeu neste domínio. Contudo, apesar de só ter entrado na via dos leilões em 2019, já bateu duas vezes o «record mundial» de baixo «preço», o que parece sustentar a tese governamental, criada durante o governo de Sócrates, e retomada pela actual equipa, de que se estaria na vanguarda ou, até, na liderança da revolução energética europeia! O que significa esta hipérbole de entusiasmo? É fundamental proceder a um ponto de situação acerca de tão importante matéria – estamos, de facto, a falar da política energética –, e fazê-lo com o máximo de rigor e distanciamento racional perante a parafernália discursiva. Trata-se de política energética, coisa que não é avaliável no curto prazo. Mais exactamente, aliás, trata-se de política climático-energética-industrial, que se quer impor como determinante da vida social e económica presente e futura. Os leilões relacionados com energias renováveis têm vindo a consolidar-se como ferramenta propícia à entrada de novas capacidades de produção e injecção de eletricidade nas redes, e consequente disponibilização no mercado de eletricidade. Existem diversos estudos publicados1 nos quais se analisam com profundidade a teoria e a concepção de leilões de energias renováveis. «É fundamental proceder a um ponto de situação acerca de tão importante matéria – estamos, de facto, a falar da política energética –, e fazê-lo com o máximo de rigor e distanciamento racional perante a parafernália discursiva» Os leilões, é necessário esclarecer desde logo, partem de uma opção político-ideológica no domínio da economia energética: são instrumentos de mercado que intervêm num sector com interesse público fundamental e com grande proporção de monopólio natural, ou seja, um mercado com muitas falhas e obscuridades intransponíveis. Mas são, também, uma técnica com vantagens e inconvenientes, designadamente aumentarem a capacidade de produção elétrica a partir de Fontes de Energia Renováveis (FER), em particular, no caso português, de fotovoltaica; controlarem os preços e as quantidades produzidas/leiloadas, promoverem a transparência e aumentarem o grau de proteção contra a corrupção. Com a efervescência competitiva, em particular a partir de 2012, aumentou a probabilidade de erro durante a análise prospectiva, alavancada, aliás, por políticas públicas muito voluntariosas que têm como alvo a descarbonização e, não, a optimização energética sustentável e o conforto ou competitividade do consumidor final. Apesar disso, se o procedimento fosse utilizado com rigor e parcimónia, poderia constituir um contributo positivo face ao período das tarifas garantidas a alto valor e por longo prazo, que determinaram uma situação insustentável, propiciando rendas e lucros elevadíssimos aos investidores beneficiados com as decisões político-administrativas e, por outro lado, gravosos custos para os consumidores finais, em particular no sector doméstico2. O problema estará no vício gerado pelo sucesso, que pode conduzir ao excesso e, portanto, a novos desequilíbrios. Existem diversos tipos e possibilidades de leilões tanto no respeita à tecnologia como quanto às formas como decorre a licitação. Os leilões realizados em Portugal, em 2019 e 2020, têm sido de tecnologia específica (fotovoltaica), através de procedimento Top-Down (Descending Clock Auction) e híbrido. Como refere o Programa de Concurso o leilão é «do tipo relógio ascendente, composto por um conjunto sucessivo de Rondas, sendo o seu termo, e por consequência o número de Rondas, determinado pelas Ofertas introduzidas pelos Concorrentes». No leilão de 2019, com dois tipos de remuneração possível – Remuneração Garantida e Remuneração Geral –, foram adjudicados 24 lotes com um total de 1150 MW, respectivamente 862 e 288 MW para cada um dos dois tipos de remuneração registados, sendo a francesa Akuo (com 370 MW, em Remuneração Garantida) e a britânica Aura (168 MW, em Remuneração Garantida) as empresas com maiores potências adjudicadas. Diversas empresas espanholas adquiriram lotes: Iberdrola (119 MW, Remuneração Geral), Prodigy (49 MW, Remuneração Garantida), Prosolia (29 MW, Remuneração Garantida) e Enerland 2007 (15 MW, Remuneração Garantida). A francesa Akuo destacou-se no leilão de 2019, no lote 3, de 150 MW, onde apresentou o preço mais baixo para centrais fotovoltaicas: 14,76 euros por MWh. Ou seja, fez um desconto de 67,12% sobre o preço/valor base de licitação, que foi estabelecido em 44,9 €/MWh. «Os leilões, é necessário esclarecer desde logo, partem de uma opção político-ideológica no domínio da economia energética: são instrumentos de mercado que intervêm num sector com interesse público fundamental e com grande proporção de monopólio natural, ou seja, um mercado com muitas falhas e obscuridades intransponíveis» Um aspecto importante, é saber como o Sistema Elétrico Nacional (SEN) se situa no processo em termos de receitas e encargos. Recordar que as despesas sobrecarregam os consumidores finais, e as receitas podem significar a diminuição do peso dos custos de política energética, de sustentabilidade e de interesse económico geral (CIEG) e, por essa via, aliviar os consumidores3. Para os centros produtores em vias de adjudicação através do leilão de 2020, pode haver um dos seguintes tipos de remuneração diferentes, tendo as seguintes condições em cada caso: 1) Centros produtores sem armazenagem: Remuneração Garantida (Prémio Variável por Diferenças) - A licitação é feita por desconto a uma tarifa de referência4 (ver Quadro 1, no documento anexo); - A produção é vendida a um preço fixo aos Comercializadores de Último Recurso (CUR)5 através de contrato, devendo vender-lhe a totalidade da electricidade tendo como contrapartida a tarifa adjudicada. - Não permite transação de garantias de origem, embora seja obrigatória (e paga) a sua emissão; 2) Centros produtores sem armazenagem: Remuneração Geral (Compensação Fixa ao SEN) - Através da licitação em leilão é fixada a contribuição ao SEN em €/MW; - A produção é vendida no mercado grossista de electricidade a preços de mercado, pagando a compensação ao SEN no valor estabelecido no procedimento concorrencial». 3) Centros produtores com armazenagem de electricidade, só existe um tipo de remuneração, uma Remuneração Geral (Prémio Fixo por Flexibilidade), e têm as seguintes condições: - A licitação faz-se por desconto, em percentagem, ao preço de referência expresso nas peças do leilão em €/MWA/ano (Ver Quadro 1); - Recebe como pagamento o preço de capacidade de produção no valor definido no leilão em €/MVA/ano; - É responsável pelos pagamentos de ativação do seguro contra picos de preço do MIBEL; - Permite transação de garantias de origem; - Vende a produção no mercado grossista a preço de mercado; - Assina um contrato de disponibilidade com a Entidade Nacional da RNT (a REN). A exploração comercial do centro eletroprodutor fotovoltaico com sistema de armazenamento integrado é totalmente livre e não condicionada, podendo o operador participar em todos os mercados de energia elétrica existentes incluindo o mercado de serviços de sistema6. Ao contrário do que acontece num leilão tradicional, onde ganha quem dá mais por um bem, nos leilões para atribuir licenças de produção de eletricidade fotovoltaica vencem os investidores que se propõem receber o menor prémio7 para poderem vender a eletricidade no mercado depois de injetada nas redes. No caso tradicional o vencedor do leilão paga à cabeça o total do montante requerido pela entidade vendedora e fica com a posse plena do bem ou direito adquirido. Na situação em análise adquire-se uma licença perpétua (não é, portanto, uma concessão temporária) para produzir e injetar eletricidade num determinado ponto da rede, ficando a pagar uma determinada importância mensal variável ao SEN apenas durante 15 anos. A fórmula, que constitui uma das chaves do sucesso financeiro, parece necessitar de uma revisitação porque levanta algumas dúvidas de natureza legal/constitucional. As contas quanto à remuneração final de um produtor que acedeu a um Título de Reserva de Capacidade (TRC) que lhe dá o direito a injetar eletricidade num determinado ponto da Rede Elétrica de Serviço Público (RESP), devem considerar, consoante a tipologia de remuneração em concreto, duas vias possíveis: A) Uma, que é fundamental, é constituída pelo total das vendas em mercado grossista (ou ao CUR, no caso "i", e já se referiram as dúvidas sobre esta hipótese). O produtor poderá colocar a eletricidade que está autorizado a injectar na RESP, directa ou indirectamente. Na forma directa pode vender, tanto no mercado organizado, como através de um contrato bilateral, e, na indirecta, deve fazê-lo através de participante agregador autorizado. B) A outra via, diferente em cada um dos três casos possíveis de remuneração, é constituída por: i) Um prémio variável, positivo ou negativo, sobre o preço de fecho do mercado diário de tal forma que permita igualar o preço fixado no leilão, expresso em €/MWh (sistema de remuneração de Prémio Variável por Diferenças); este mecanismo permite, em princípio, que o produtor não perca nem ganhe relativamente ao preço fixado no leilão. Nesta gama de «contratos por diferença» foram atribuídos apenas 10 MW. Os produtores escolheram a remuneração de preço garantido por 15 anos e, na prática, toda a energia será vendida à SEN a um preço fixo semelhante ao de um contrato de compra de energia. É nesta categoria de concurso que o leilão que registou o «recorde» de 11,14 euros / MWh. ii) Uma Compensação devida ao SEN (sistema de Remuneração por Compensação Fixa ao SEN): o adjudicatário paga o preço de fecho do leilão, expresso em €/MW/ano, e recebe por contrapartida o preço resultante da colocação da produção em mercado. Os investidores selecionados concordaram em pagar um valor fixo de 73 700 euros/ano/MW, durante 15 anos. O produtor venderá a eletricidade no mercado livre, ao preço do mercado spot ou por meio de PPA, esperando que o preço de mercado nos próximos 15 anos permanecerá alto o suficiente para garantir compensação no seu modelo financeiro. Cerca de 157 MW da capacidade atribuída neste módulo foram ganhos por um produtor que, simultaneamente, é comercializador, podendo, assim, aceder a uma classe específica de clientes que podem pagar tarifas mais elevadas pela electricidade durante as horas de ponta do dia. iii) Um Prémio Fixo por Flexibilidade, anual, por cada MVA de capacidade de injeção na RESP, a que se deverá subtrair o valor que resulta da multiplicação entre a diferença (se positiva), entre o preço de fecho do mercado diário e o custo marginal de uma central de ciclo combinado a gás natural8, e 90% da capacidade de injeção na RESP adjudicada (caso dos Centros Electroprodutores com sistema de armazenamento). «será legal/constitucional, justo e transparente, atribuir-se um direito perpétuo à exploração de um recurso natural, usando solo e uma rede pública, para negociar electricidade? É óbvio que o ponto de injecção na rede passou a ter um valor incalculável num futuro sem prazo, facto que, acrescente-se, não foi devidamente valorizado do ponto de vista dos interesses públicos» Os promotores vencedores desta categoria (483 MW de electricidade fotovoltaica com armazenamento), concordaram em não aceitar um prémio de capacidade anual fixado inicialmente em 33 500 euros/MW por ano. Em vez disso, ofereceram-se para pagar um prémio de capacidade ao sistema de cerca de 37 100 euros/MW por ano, em média, ou seja, sempre que o preço spot for superior a um preço definido no leilão, o produtor adjudicatário terá de pagar a diferença entre o preço de ponta e o preço de exercício no SEN por um valor que corresponde a 90% da capacidade total atribuída para a central fotovoltaica. O leilão terá sido tão competitivo que os vencedores tiveram que reduzir sua remuneração a valores negativos, e assim, o preço pago pelos produtores parece alto ou, mesmo, insustentável se a contrapartida se ficasse pelos primeiros 15 anos em que terá que haver compensação ao sistema!? Contudo, os titulares da licença garantiram a capacidade da rede além do prazo de 15 anos, mais exactamente… para sempre, e assim, «terão a possibilidade de hibridizar a central solar fotovoltaica com outras tecnologias que poderão permitir ao investidor no futuro modificar completamente o modelo financeiro do projeto9». Notar que, até ao presente, não há conhecimento da globalidade dos valores concretos do procedimento realizado em 2020, o que só acontecerá quando forem publicados os resultados oficiais na plataforma específica para o efeito. Para além da conferência de imprensa e de um comunicado inserto no Portal do Governo a 26 de agosto, existem alguns números e outras informações diversas, que chegaram ao conhecimento público, filtradas pelo governo, através de canais privilegiados na comunicação social, o que vem acontecendo desde março 2020. Na comunicação governamental começou por se destacar que o «novo leilão solar garante poupança anual de 37,2 milhões aos consumidores». Percebe-se, desde logo, qual é o alvo político essencial do Ministro do Ambiente e da Ação Climática, e Secretário de Estado Adjunto e da Energia: trazer a opinião para uma posição aderente ao processo. Acrescentaram, aliás, que os consumidores iriam «garantir uma poupança na ordem dos 559 milhões de euros a 15 anos de acordo com os resultados do novo leilão solar de 700 megawatts», o que seria equivalente a «uma poupança anual de 37,2 milhões de euros, este valor corresponde a um ganho unitário de cerca de 833 mil euros por cada megawatt adjudicado». Como prémio extra, o governo disse, orgulhosamente, que «foi atingida a tarifa mais baixa do mundo no único lote adjudicado com preço fixo, no valor de 11,14 euros por megawatt/hora», e que esta nova tarifa era cerca de 25% inferior à tarifa mais baixa obtida no leilão de 2019, considerada à data a mais baixa do mundo 14,76 €/MWh. Trata-se do preço relacionado com o mais pequeno dos lotes leiloados, com 10MW. Informou-se, ainda, que foram adjudicados 670 MW (dos 700 megawatts iniciais). O SEN iria passar a contar com uma capacidade mínima de armazenamento de quase 100 megawatts, o que segundo governo contribuiria para «absorver excessos de renováveis na rede e para garantir a flexibilidade necessária do sistema durante estes períodos». Desde logo, confirmar o estado de felicidade, provavelmente utópica, evidenciado pela equipa governamental. Parece que ganham asas sempre que falam no tema. Mas, e há muitos mas nesta matéria, dando como garantido que em quatro anos (até 2024/2025) se inicia a concretização da poupança de 1159 milhões de euros, ou seja, de uma entrada positiva de cerca 77 milhões de euros anuais no SEN, tendo em conta o conjunto dos dois leilões já realizados, haverá que avaliar o impacto objetivo deste fluxo nas contas que acabam por incidir no consumidor final. Feitas as contas, a «fabulosa» poupança a que o governo se refere quando fala nos 77 milhões de euros anuais libertados pelos leilões, correspondem a 3,9 % dos CIEG! Isto se, entretanto, em 2024, não estiver a acontecer uma nova onda de subsidiação a investidores privados no hidrogénio, usando, exactamente, as folgas que poderia haver no SEN. E é isso que o governo afirma explicitamente na EN-H2! Pior ainda seria a comparação com os custos totais do sistema elétrico, cerca de 5700 milhões/ano. Apesar dos leilões afastarem a antiga metodologia das tarifas garantidas de forma político-administrativa num alto valor e longo período, e de os preços conseguidos (+/- 20 euros/MWh no primeiro leilão), estarem num nível substancialmente abaixo do atual preço médio no mercado grossista da eletricidade, quando existe uma de tarifa garantida ao longo de 15 anos estamos, embora de forma atenuada, na presença de uma renda económica. Como já antes foi referido, uma das condições facultadas nos concursos, a de o adjudicatário passar a aceder perpetuamente ao direito de produzir num determinado sítio correlacionado com um ponto de ligação à rede reservado é, adicionada da possibilidade de hibridizar tecnologias no futuro, o nó górdio financeiro que, adicionado à baixa de custo específico das tecnologias fotovoltaicas e da acumulação, tornam tão atractivo o negócio financeiro. E o governo tem consciência disso porque diz que o evento «não foi um leilão de tarifas», mas sim um leilão para assegurar «um bem escasso, que são os pontos de ligação à rede eléctrica», acrescentando que o «acesso à rede é um bem escasso e é uma perpetuidade». Já ficou colocada a questão, e repete-se, será legal/constitucional, justo e transparente, atribuir-se um direito perpétuo à exploração de um recurso natural, usando solo e uma rede pública, para negociar electricidade? É óbvio que o ponto de injecção na rede passou a ter um valor incalculável num futuro sem prazo, facto que, acrescente-se, não foi devidamente valorizado do ponto de vista dos interesses públicos. A baixa no custo específico das tecnologias fotovoltaicas experimentada nos últimos anos, adicionada à expectável subida na densidade energética e rendimento nas baterias de acumuladores, é muito promissora. Mas, atenção: os materiais, em particular os metais e ligas necessários, são provenientes do processamento de minérios que, como outros recursos, são finitos a prazo mais ou menos longo. À medida que o mercado exigir mais drenagem de recursos as pressões de todo o tipo irão aumentar, pelo que as curvas de preço das tecnologias não terão, para sempre, tendência de queda. Em 27 junho de 2020 o DGEG dizia publicamente que já tinham chegado «3 mil projetos para novas centrais, na sua grande maioria fotovoltaicas, com uma potência somada que ultrapassa os 253 GW, mais de 12 vezes toda a potência hoje instalada para a produção de eletricidade em Portugal». A potência total instalada situa-se nos 20,34 GW (6,78 GW de Hidroléctrica,5,59 GW de termoeléctrica e 7,97 de PER (cerca de 600 MW de fotovoltaica), sem contar com a cogeração. Os números referidos pelo DGEG correspondem a 36 vezes a potência máxima (referida à Produção Líquida) em agosto 2020, que está nos 7 GW! Trata-se, de facto, de uma loucura, como terá reconhecido o diretor-geral. Mas, seria interessante tentar compreender qual é a mãe de todas estes desvarios, e, sobretudo, se o poder político os vai acompanhar. Embalado com o sucesso mediático, o governo poderá querer, e quer, lançar leilões para cerca de mais 6 ou 7 GW nos próximos anos, sem contar com as necessidades projectadas para o hidrogénio, porque, para isso, seriam necessários mais 10 GW até 2050. Antecipam-se muitos problemas de diversos tipos: técnicos, socioeconómicos, ambientais e no próprio sistema elétrico, se houvesse esta massificação fotovoltaica. Para além de ser muitíssimo incerto que isto traria um significativo abaixamento nos preços da electricidade daqui a alguns anos. Um dos problemas, não despiciendo, é a enorme pressão sobre o território. De facto, cada MW fotovoltaico com tecnologias semelhantes às que estão a ser previstas nos dois leilões necessita de 2 a 2,5 ha de solo, o que significaria que 10 GW ocupariam à volta de 20 a 25 mil hectares, situados principalmente no Alentejo e Algarve. Sem a potência necessária para o projecto hidrogénio, porque nesse caso a área necessária duplicaria. Ou seja, descontando-se o empolado discurso político governamental, que exalta recordes pouco significativos e «grandes vantagens para os consumidores» que são incertas e só possíveis a médio prazo, ficando-se pelos dois leilões realizados estaríamos em presença de um contributo para a diversificação do mix energético, embora havendo muitos riscos assumidos pelos investidores que causam perplexidade, dado o risco que correm se não tiverem direito à perpetuidade. Contudo, o grande problema, de acordo com o registo deixado, é o do expectável desvario que aí vem, isto de acordo com as intenções expressas pelo governo. Vê-se pela agressividade demonstrada perante quem tem dúvidas e faz críticas, que a equipa governamental demonstra uma fé cega na sua cruzada. Mas, estarão ao serviço de São Jorge ou do Dragão? Desde há vários anos, o AbrilAbril assume diariamente o seu compromisso com a verdade, a justiça social, a solidariedade e a paz. 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Leilões de fotovoltaicas: pedir menos e ganhar mais
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O Prof. João Peças Lopes, um grande entusiasta das renováveis e da transição, disse que, no dia 24, «estivemos muito próximo de uma situação de black-out»2, acrescentando que a grande questão será a de saber se o sistema ibérico, numa tarde de verão, daqui a dez/quinze anos, «será capaz de sobreviver a uma perturbação deste tipo»?
O especialista referido, embora defendendo que o incidente «requer uma autópsia cuidadosa, pois é difícil de entender como, com todos os procedimentos de segurança que são normalmente adotados na exploração das redes de transmissão, uma situação destas pôde ter lugar. Algo correu muito mal», acrescenta que se deverá «estudar cuidadosamente este tipo de problemas nos próximos anos, mas atrevo-me a responder dizendo que certamente que sim, o sistema sobreviverá», adiantando desde já a necessidade de mobilizar «mecanismos de disponibilização de inércia síncrona, de emulação de inércia sintética e regulação rápida de frequência, com volumes a definir, associados a novos produtos a colocar em mercado ...»
Para tentar «aguentar» o sistema que o regime político-económico dominante e sua entourage tecnocrática dizem pretender instalar (em 2050, teoricamente, já não haverá um único eletrão produzido que não seja «verde»3), existem ideias e propostas com «soluções» técnicas (grande extensão/densificação das redes, sistemas inteligentes, baterias de acumuladores, compensadores síncronos, etc.,). Conhecem-se, contudo os elevadíssimos custos acrescidos que isto acarreta, e que, como também se sabe, serão totalmente imputados nas Tarifas de Acesso às Redes e Custos Globais de Sistema (CGS), repassados, portanto, através das Tarifas Finais, aos consumidores.
Também se sabe que muitos dos vectores da transição energético-climática passam pela introdução de «novas tecnologias» que, sendo conhecidas há muitas décadas, aparecem agora como tábua de salvação no contexto de «emergência climática»: as baterias de acumuladores, o hidrogénio e a mobilidade elétrica, esta centrada na continuação dos veículos individuais. Ora, é necessário ter presente que, grande parte destas «soluções», estando pouco amadurecidas do ponto de vista técnico-económico, impõem enormes elevações nos preços finais, bem como um significativo volume de subvenções públicas não reembolsáveis e/ou créditos em condições especiais colocados à disposição das empresas privadas (e da banca comercial) que, agora, se tornaram fervorosos defensores da sustentabilidade verde.
«Para tentar “aguentar” o sistema que o regime político-económico dominante e sua entourage tecnocrática dizem pretender instalar [...] existem ideias e propostas com “soluções” técnicas (grande extensão/densificação das redes, sistemas inteligentes, baterias de acumuladores, compensadores síncronos, etc.,). Conhecem-se, contudo os elevadíssimos custos acrescidos que isto acarreta»
A complexidade irracional do sistema elétrico que vem sendo materializado, bem como a necessidade de contínuos e crescentes investimentos que mitiguem os seus efeitos negativos, determinarão custos e preços crescentes de uma eletricidade já de si muito marcada por alcavalas de todo o tipo, entre as quais o peso da precificação artificial do carbono que vem sendo imposta numa cavalgada insustentável4.
Para um país como Portugal a situação terá grande impacto negativo.
Neste contexto de contínuo aumento do custo da eletricidade para as populações e para a economia, justificado com o valor supremo do «combate às alterações climáticas», há, contudo, uma coisa intocável: os monstruosos lucros, alguns propiciados por rendas e subvenções públicas não reembolsáveis, arrebanhados anualmente pelas grandes empresas energéticas que operam em regime de monopólio e/ou de oligopólio consoante o sector e a perspectiva.
Além de muitas outras questões, caberá questionar como será possível perspectivar a recuperação económica e a resiliência social numa transição marcada por preços e custos crescentes de um factor de produção tão relevante como é a energia (não apenas da eletricidade), a que se acrescentarão as convulsões sociolaborais motivadas por encerramentos precoces de várias unidades de conversão energética, de processamento petroquímico e, talvez, de fabrico de aço e de cimento?
A questão de fundo passa, contudo, pelos elevados Custos de Interesse Geral Económico (CIEG) que, não sendo impostos, incidem nas tarifas conduzindo a altos preços finais, pelo IVA muito elevado, e, também, pelo peso da componente energia resultante do mercado grossista que funciona em oligopólio especulativo, com tendência crescente para a volatilidade oportunista.
No reino da energia, com um ministro que recusa actuar no sentido de descer o preço dos combustíveis, argumentando que «não faz sentido estimular a emissão de CO2», e, simultaneamente, se desloca numa bomba de alta cilindrada a 200 km/h, está tudo cada vez mais escuro.
- 1. Siderurgia (Megasa), Cimpor, Secil, Soporcel, Solvay, CUF Sakthi Portugal, Ar Líquido e Somincor.
- 2. Jornal online Água & Ambiente, 26/7.
- 3. Imaginemos que, em 2050, quando já não existirem centrais convencionais, nem sequer centrais nucleares (também essas condenadas ideologicamente ao desaparecimento), não há sol durante várias horas (ou dias) e o vento intermitente não seja muito! Como não se sobreviveria à base das hidroelétricas, ter-se-ia que recorrer maciçamente à importação (não se sabe bem donde) e, à eletricidade acumulada em caríssimos sistemas de baterias e de hidrogénio (para gerar eletricidade em dispendiosas pilhas de combustível).
- 4. Ver recentes artigos de actores políticos como a deputada europeia Maria da Graça Carvalho (in DN, 21/7, A descarbonização inteligente) e do ex-ministro e ex-deputado europeu Jorge Moreira da Silva (in DN, 29/7, Coerência e coragem na ação climática) onde defendem, a propósito do combate às alterações climáticas, a “veracidade nos preços”. Aliás, lendo bem tais artigos, percebe-se o “receio” que perpassa nos espíritos destes influentes membros do PSD, sobre um eventual fracasso da luta climática da União Europeia.
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