No mundo do futebol onde são os assessores de imprensa a definir o que os jogadores devem dizer, onde o discurso dentro e fora das quatro linhas é cada vez mais padronizado e onde as opiniões nunca o são, cada vez que algo foge da norma ganha imediatamente relevo noticioso, especialmente quando tem contornos políticos.
Num dos maiores palcos do futebol, onde cada frase proferida numa conferência de imprensa pode ter um efeito borboleta, os jogadores da selecção francesa têm estado debaixo dos holofotes porque não têm ignorado a situação política do seu país e têm sido vocais sobre a mesma.
Com as eleições precipitadas por Emmanuel Macron, marcadas para o próximo dia 30 de Junho, e com o crescimento da extrema-direita em terras gaulesas, existe um perigo real que coloca em causa os direitos e liberdades democráticas. Como tal, os jogadores têm escapado ao discurso padronizado e, furando a bolha narrativa que lhes é imposta, não passaram ao lado da situação política e social do seu país.
Ousmane Dembélé e Olivier Giroud foram os primeiros a quebrar o protocolo e a apelar ao voto. Para muitos isso seria pouco, mas não é porque é a própria UEFA a proibir manifestações políticas, o que pode levar a penalizações dos jogadores.
Mais longe foi Marcus Thuram, filho do ex-jogador Lilian Thuram, campeão mundial em 1998 e conhecido pela luta contra o racismo. O avançado do Inter de Milão não poupou nas palavras e quando questionado sobre a dissolução da Assembleia da República e a convocação de eleições legislativas antecipadas, disse: «A situação é muito, muito grave. Ficámos todos um pouco chocados no balneário. Esta é a triste realidade da nossa sociedade hoje. Há mensagens transmitidas todos os dias na televisão para ajudar esta festa [a extrema-direita] a passar. Como disse o Ousmane [Dembélé], devemos dizer a todos para irem votar. Como cidadãos, sejam vocês ou eu, devemos lutar diariamente para que isto não volte a acontecer e que o Rassemblement National não passe».
Mas Marcus Thuram não se ficou por aqui: «Devemos também dizer como chegámos aqui e a gravidade da situação. Na selecção francesa, não tenho dúvidas de que todos partilham a minha visão sobre as coisas. Estamos num país livre e todos deveriam fazer o que acham certo. Eu chego aqui e digo certas coisas. Outras pessoas podem não dizer isso, mas, repito, não tenho dúvidas de que todos pensam como eu».
Quem reagiu rapidamente foi a Federação Francesa de Futebol que, em comunicado, pediu para que se evitasse «qualquer forma de pressão e uso político da seleção da França» e pediu aos jogadores «neutralidade», mesmo reconhecendo o direito à «liberdade de expressão».
Já a estrela da selecção francesa, Kylian Mbappé, acompanhou os seus colegas e, tendo a noção do seu alcance, disse: «Quero me dirigir a todos os franceses e, em particular, à geração jovem. Vemos que os extremos estão às portas do poder. Temos a possibilidade de mudar tudo».
Desta forma, os campeões do mundo de futebol masculino, provam assim que também se pode ser campeão fora das quatro linhas e que os jogadores podem e devem ter um papel activo contra todas as formas de descriminação e opressão e quem as incorpora.
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