O Acordo Económico e de Livre Comércio entre a União Europeia (UE) e o Canadá (EU-Canada Comprehensive Economic and Trade Agreement), mais conhecido pela sua sigla inglesa, CETA, foi hoje aprovado no plenário do Parlamento Europeu. Segue-se o processo de ratificação em cada Estado-membro da UE.
Em Portugal, PS, PSD e CDS-PP têm-se manifestado claramente a favor da aprovação do acordo. Por seu lado, BE, PCP e «Os Verdes» têm não só assumido um posicionamento contrário a essa aprovação, como denunciado a natureza do acordo, os reais objectivos que a ele presidem e o modo como decorreram as negociações entre as partes.
Este é, precisamente, um dos aspectos sublinhados pelos partidos políticos e as diversas organizações que, nosso País, se opõem ao CETA: a forma secreta e antidemocrática como decorreram as negociações com vista à celebração do acordo. Em 2009, UE e Canadá começaram a negociar um acordo de comércio livre, no mais absoluto segredo; em 2014, as partes deram como concluído o texto final; e, em 2016, a Comissão Europeia apresentou ao Conselho da UE uma proposta de versão definitiva do acordo, que UE e Canadá assinaram em Outubro último.
Arredadas da negociação e postas à parte do conteúdo do acordo, foi já numa fase recente que diversas plataformas, sindicatos, organizações de diverso cariz se envolveram a fundo na denúncia do CETA, multiplicando as manifestações, acções de sensibilização e petições, entre outras iniciativas, contra este acordo de livre comércio, por entenderem que constitui uma ameaça à democracia, aos direitos dos povos e à soberania dos estados, pondo em causa áreas e sectores como os serviços públicos, o ambiente, a segurança alimentar, a saúde pública, o ambiente ou os direitos dos trabalhadores.
Igualmente salientada pelos opositores ao acordo tem sido a forma como a Comissão Europeia (CE) pretende «forçar» a implementação do CETA sem que esteja concluído o seu processo de ratificação pelos parlamentos dos diversos estados – deixando a nu o entendimento que a CE faz de «soberania» e «democracia» –, bem como as pressões exercidas pela UE sobre aqueles que se atrevem a resistir – nem que se seja por um breve período, como aconteceu com o Governo regional da Valónia (Bélgica) – ao acordo de livre comércio.
Tratado à medida das transnacionais
Negociado à revelia dos povos, o CETA foi apresentado pela CE, na sua versão definitiva, de 1600 páginas, no início de 2016. Para os seus detractores, o acordo de livre comércio entre a UE e o Canadá reveste-se de um grande significado, na medida em que responde aos interesses das transnacionais das potências capitalistas, criando estruturas supra-nacionais que ajudam a vergar quaisquer resistências de âmbito nacional e a impor e a consolidar o seu domínio. A questão é, pois, a da prevalência da concentração capitalista e a da defesa dos interesses das transnacionais sobre os direitos dos trabalhadores e dos povos, e a soberania dos estados.
A eliminação das tarifas aduaneiras e o desbaste das barreiras regulamentares são duas grandes preocupações plasmadas no preâmbulo do CETA. O propósito é eliminar encargos administrativos que encarecem os produtos e criam entraves ao comércio internacional, passando por cima, de forma deliberada, da razão das ditas barreiras regulamentares.
A oposição ao CETA sublinha que este não se limita ao âmbito de um simples acordo comercial, mas procura estabelecer normas e mecanismos que prevaleçam sobre a ordem jurídica e as instituições soberanas dos estados, impondo, a nível internacional, a defesa dos interesses das transnacionais.
Neste sentido, o acordo contempla a criação da chamada cooperação regulamentar e de um tribunal para resolução de litígios. Na cooperação regulamentar, inscrevem-se diversos organismos – em que terão voz os representantes dos interesses das transnacionais dos dois lados do Atlântico – cuja função é a de forçar a harmonização legislativa, e revendo em baixa a regulamentação existente (a nível laboral, social, ambiental e outros).
O mecanismo de resolução de litígios, conhecido pela sigla inglesa de ISDS (Investor to State Dispute Settlement) será um órgão arbitral (um tribunal) acima dos estados nacionais, e tem sido alvo de fortes críticas e protestos, na medida em que, acusam os detractores do acordo, o seu poder se institui para proteger os interesses das transnacionais, os seus lucros, obedecendo ao princípio da prevalência sobre a soberania e os direitos dos trabalhadores e dos povos.
Ameaças diversas
A plataforma Não ao TTIP destaca, na sua abordagem ao CETA, o modo como este representa uma ameaça ao regime democrático, aos direitos consagrados dos trabalhadores ou aos serviços públicos, afectando domínios como a economia, a sociedade e o ambiente.
Também Miguel Viegas, deputado do PCP no Parlamento Europeu, chamou a atenção para as «consequências nefastas» deste acordo, centrando-se nos serviços públicos, no sector agro-alimentar e nos direitos laborais.
O CETA visa conduzir à privatização dos serviços públicos (educação, saúde, energia, transportes, serviços postais, habitação) e impedir que estes possam regressar ao domínio público. Este processo integra-se nas reformas estruturais promovidas pelas instituições europeias e tem como objectivo desmantelar as funções sociais do Estado e introduzir lógicas mercantis em todas as áreas até há pouco tempo abrangidas na esfera do serviço público.
No que aos direitos laborais diz respeito, o CETA não contempla um só mecanismo para impedir as partes de baixar os níveis de protecção dos trabalhadores e evitar um mais que previsível dumping legislativo em matéria laboral. Isto, num contexto em que o Canadá – porque não ratificou grande parte das 190 convenções da Organização Internacional do Trabalho – apresenta uma legislação laboral e de protecção dos direitos dos trabalhadores muito abaixo da dos países-membros da UE.
A questão da agricultura e da segurança alimentar tem tido grande destaque entre os opositores ao CETA, porque, sublinham, o acordo irá ter um forte impacto na produção agrícola, contribuindo para a destruição da pequena e média agricultura nos países da UE. Ao nível da segurança alimentar, salientam o fosso que separa a UE do Canadá, nomeadamente no que se refere aos organismos geneticamente modificados – OGM –, factores de crescimento, hormonas, entre outros aspectos.
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