Depois da publicação de um despacho que prevê a criação de uma nova taxa de 300€ para entrega do doutoramento, o Reitor da Universidade do Minho, António Cunha, publicou em Maio um despacho que prevê que os Bolseiros de Gestão de Ciência e Tecnologia (BGCT) passem a obedecer às mesmas regras que os trabalhadores não docentes da instituição, apesar de não usufruírem de um contrato de trabalho. Entraria em vigor já este mês.
A equipa reitoral justificou esta decisão com o facto de a «Universidade do Minho ter registado uma evolução significativa na sua capacidade de atracção e gestão de fundos externos para a sua actividade de investigação, desenvolvimento tecnológico e inovação», afirmando ainda que «a este desempenho relevante da comunidade científica tem correspondido o investimento em Recursos Humanos qualificados para apoio à gestão da Ciência, ao abrigo do Estatuto do Bolseiro de Investigação».
A presente deliberação prevê ainda que os BGCT passem a obedecer às mesmas regras que os funcionários não docentes da Universidade do Minho, no que diz respeito aos horários de trabalho, atendimento, assiduidade, marcação de férias, entre outras. O registo e controlo da assiduidade será feito através de registo biométrico, estando já os bolseiros a ser contactados para fornecerem os seus dados e impressões digitais.
Esta decisão já foi contestada pelos bolseiros e pela Associação dos Bolseiros de Investigação Científica (ABIC), por considerarem que colide com o Estatuto do Bolseiro de Investigação (EBI), designadamente com a alínea 5 do artigo 1º que estipula que «é proibido o recurso a bolseiros de investigação para satisfação de necessidades permanentes dos serviços», assim como com o artigo 4º relativo à natureza do vínculo. O artigo 4º diz que «os contratos de bolsa não geram relações de natureza jurídico-laboral nem de prestação de serviços, não adquirindo o bolseiro a qualidade de trabalhador em funções públicas».
Sobre esta situação, a ABIC afirma ainda: «parece-nos, pois, inadmissível que os bolseiros sejam chamados a prestar os mesmos deveres que os demais trabalhadores da universidade sem, no entanto, usufruírem dos mesmos direitos, nomeadamente o direito a um contrato de trabalho e ao regime completo da Segurança Social.»
O PCP, para além de já ter apresentado na Assembleia da República um projeto de lei que visa eliminar da lei a figura do «bolseiro de investigação» tal como hoje existe, assumindo que a esmagadora maioria dos actuais bolseiros são trabalhadores por conta de outrem, fez perguntas ao Governo sobre esta situação da Universidade do Minho, exigindo uma intervenção que permita salvaguardar os direitos dos bolseiros de investigação.
Situação dos bolseiros de investigação e aquilo que reivindicam
A questão do emprego científico e do vínculo laboral dos investigadores constitui-se como uma questão central da vida dos bolseiros e de todos os que têm uma actividade profissional ligada à investigação científica.
O exemplo mais crasso do que acontece ainda hoje e há muitos anos, e que é contestado pelos bolseiros, é a substituição de contratos de trabalho de diferentes níveis de investigação por bolsas.
A instabilidade laboral que o vínculo precário imprime na segurança dos bolseiros obriga-os a saltar de bolsa em bolsa, e a recearem que em cada prazo de renovação estejam perante o termo da sua relação contratual. Esta não é uma situação nova, tal como não o são os índices remuneratórios dos bolseiros, que se mantêm inalterados desde 2001.
Generalizam-se os casos de real substituição de contratos de trabalho por bolsas, resultando em casos como bolsas para pessoal de secretaria e administração, ou, até mesmo, para jardineiros e pedreiros.
Da impossibilidade de acesso a um contrato de trabalho, resulta a impossibilidade de acesso a uma segurança social digna e condizente com o nível da função desempenhada, sem direito à devida assistência ou proteção social, nem no presente nem após o termo da bolsa.
A ABIC considera que é crucial reconhecer a importância da qualificação e estabilização dos recursos humanos na investigação científica e dignificar as suas condições de trabalho, tal como é preconizado pela Carta Europeia do Investigador.
Defendem assim que todos os investigadores, qualquer que seja o seu grau ou posição, sejam reconhecidos efetivamente como trabalhadores.
Neste sentido, no seu caderno reivindicativo, a ABIC considera imprescindível: aumentar o financiamento ao Sistema Científico Nacional bem como a transparência na atribuição de verbas; a contratualização efectiva de todos os investigadores (independentemente da fase da sua carreira); a atribuição de todos os deveres e direitos inerentes à condição de trabalhador com plenos direitos; a alteração drástica da forma como a FCT tem procedido nos concursos para financiamento da investigação e das bolsas individuais; e a actualização dos valores salariais de todos os investigadores.
Decisão do Conselho de Ministros a 24 de Março de 2016
O Conselho de Ministro de Março anunciou a contratação de doutorados como forma de substituição das bolsas de pós-doutoramento. Esta medida agora anunciada é uma exigência de sempre da ABIC, não apenas para os investigadores doutorados, mas para todos os trabalhadores científicos, independentemente do grau académico.
Se, por um lado, o anúncio de contratos é uma exigência antiga da ABIC, por outro, os bolseiros temem a forma como essa medida vai ser implementada, nomeadamente porque a tutela nunca referiu a integração destes trabalhadores na carreira de investigação científica.
O comunicado do Conselho de Ministros refere a substituição progressiva da atribuição de bolsas de pós-doutoramento por contratos. Em entrevista ao jornal Público, o Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, falou em «leque salarial amplo» e em «flexibilizar o emprego científico».
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