De acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), a sentença anterior, proferida a 4 de Junho último, violava o pressuposto de que só o Ministério Público tem competências para investigar crimes, argumento que um tribunal federal mexicano agora acolheu, declarando a «impossibilidade jurídica» da criação da Comissão da Verdade.
Esta seria liderada por representantes das vítimas e da Comissão Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), que, em conjunto com a PGR e o Ministério Público, teriam a seu cargo a direcção da investigação, segundo revela a TeleSur.
Na sentença que, no início de Junho, decretou a criação da Comissão, o tribunal afirmava ter encontrado provas de que a investigação do caso de Ayotzinapa, por parte da PGR, «não foi rápida, eficaz, independente ou imparcial».
As investigações do «desaparecimento forçado» dos 43 estudantes da Escola Normal Rural Raúl Isidro Burgos em Iguala, no estado de Guerrero, a 26 e 27 de Setembro de 2014, levou à detenção de mais de 120 pessoas e à obtenção de confissões, algo a que a PGR atribuiu o epíteto de «verdade histórica».
No entanto, investigadores independentes e pais dos jovens desaparecidos têm rejeitado as versões apresentadas pela PGR, por falta de provas forenses que as sustentem. E, na sentença de Junho, o tribunal afirmou «haver indícios suficientes para presumir que as confissões e acusações [formuladas] foram obtidas com recurso à tortura».
CIDH apoia criação da Comissão da Verdade
Ontem, após ser conhecida a sentença que impugna a Comissão, os familiares das vítimas do caso de Ayotzinapa e organizações que as representam afirmaram «lamentar profundamente» a decisão judicial, que deita por terra «a esperança de alcançar a justiça e a verdade no caso que tinha sido recuperado com a decisão corajosa» do tribunal em Junho, indica a TeleSur.
A «determinação» do tribunal em criar uma Comissão da Verdade e em «reactivar a investigação» também foi apontada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão autónomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), a 6 de Junho último, quando da apresentação do primeiro Relatório do Balanço de Acompanhamento do Caso Ayotzinapa.
Na apresentação, a representante da CIDH Esmeralda A. De Troitiño afirmou que Comissão permitirá atribuir às vítimas uma «posição privilegiada na coadjuvação da investigação».
Para além de considerar necessário que se abandone a narrativa da «verdade histórica» sobre o caso, De Troitiño criticou a «falta de celeridade» por parte da PGR e exigiu que sejam reconhecidas as «irregularidades» até agora verificadas na investigação.
Disse ainda que, «mais do que falar das responsabilidades de qualquer autoridade, à CIDH interessa-lhe o reconhecimento da responsabilidade do Estado mexicano sobre os factos».
Os 43 de Ayotzinapa
Foi há quase quatro anos que 43 estudantes da Escola Normal Rural Raúl Isidro Burgos, em Ayotzinapa, desapareceram em Iguala, no estado mexicano de Guerrero. Desde então, os familiares dos desaparecidos exigiram respostas ao governo de Peña Nieto, que foi acusado de silenciar o caso, ocultar elementos e dificultar as investigações independentes, num contexto geral de violência e impunidade.
Isso mesmo foi apontado no documento sobre a violência no México, elaborado em 2015 pelo relator especial das Nações Unidas contra a tortura, Juan E. Méndez. A CIDH criticou duramente as autoridades mexicanas em diversas ocasiões.
Espionagem a pais, advogados, investigadores
Ao longo do tempo, o governo mexicano foi também acusado de mandar espiar os familiares dos jovens e os seus advogados.
Numa sessão realizada no Peru há um ano, a CIDH acusou o governo do México de ter espiado os membros do Grupo Interdisciplinar de Especialistas Independentes (GIEI) que tinha enviado ao país azteca para investigar o desaparecimento dos 43 estudantes.
Os especialistas afirmaram ter recebido nos seus telemóveis mensagens para instalação de um «software infeccioso» semelhantes às que receberam os pais e os advogados. De acordo com um laboratório canadiano, através desse malware, adquirido a uma empresa israelita, o governo federal mexicano procurou infectar os telemóveis de modo a extrair informação ilegalmente.
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