Uma investigação divulgada terça-feira no portal da BBC encontrou provas de que médicos nigerianos estão a ser contratados por uma empresa britânica da saúde para trabalhar em hospitais privados em condições que não são permitidas no NHS (Serviço Nacional de Saúde).
Um dos médicos que falaram com a BBC, Augustine Enekwechi, disse que foi abordado pela empresa privada NES Healthcare, especializada na contratação de médicos no estrangeiro, tendo-lhe sido oferecidos um emprego potencial e facilidades no visto.
Enekwechi disse que não viu que o contrato da NES o excluía da legislação que protege os trabalhadores no Reino Unido do trabalho excessivo e que o deixava vulnerável a uma série de deduções salariais.
O médico nigeriano acrescentou que o seu horário era «extremo» – uma vez, fez turnos de 24 horas durante uma semana – e que não podia sair das instalações hospitalares. Trabalhar ali era como estar numa «prisão», disse, sublinhando o cansaço intenso que sentia e a preocupação com o facto de pôr os pacientes em risco.
«Estava exausto, precisava de dormir»
A British Medical Association (Associação Médica Britânica; BMA) referiu-se à situação como «chocante» e defendeu que o sector privado deve estar alinhado com as práticas do NHS (público).
O caso de Augustine está longe de ser único. A BMA e a Doctors' Association (Associação dos Médicos) deram acesso exclusivo à BBC aos resultados de um inquérito que fizeram a quase duas centenas de médicos em hospitais privados. Na maioria dos casos, tinham sido contratados pela NES.
O inquérito também permitiu constatar que 92% tinham sido recrutados em África e que 81% eram provenientes da Nigéria. A maioria queixava-se de trabalho excessivo e de deduções salariais injustas.
Um outro médico nigeriano, Femi Johnson, disse à BBC que o seu centro hospitalar esperava que ele trabalhasse entre 14 e 16 horas por dia e depois estivesse de serviço à noite.
«Estava exausto, precisava de dormir. Não é humanamente possível fazer isto todos os dias durante sete dias», criticou.
Johnson acrescentou que, quando precisava de parar um tempo, o NES podia descontar-lhe dinheiro do seu salário para cobrir o custo de procurar um substituto.
«Trabalho análogo ao escravo»
Alguns médicos contratados pela NES foram ajudados por Jenny Vaughan, médica da Doctors' Association, que diz que o sistema de prestação de cuidados de saúde no Reino Unido se desenvolveu em duas camadas – uma para os médicos do Serviço Nacional de Saúde (NHS) e outra para médicos angariados no estrangeiro e a trabalhar no sector privado.
«Nenhum médico no NHS faz mais de quatro noites seguidas porque, francamente, sabemos que não é seguro», disse Vaughan, sublinhando que estes casos no sector privado são «análogos ao trabalho escravo… com excesso de horas, algo que pensávamos que tinha acabado há 30 anos».
«Isto não é admissível para os utentes. Isto não é admissível para os médicos», frisou.
Confrontada pela BBC, a vice-presidente da BMA, Emma Runswick, afirmou que a situação é uma «vergonha para a medicina no Reino Unido» e que as «condições de exploração» encontradas pelos «colegas estrangeiros» são «inacreditáveis».
De acordo com o portal The Punch, cerca de 10 mil médicos que se formaram na Nigéria trabalham actualmente no Reino Unido.
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