A seleção iraniana marcou um capítulo no Mundial 2022. Todo o seu caminho para aqui chegar se foi transformando num novelo de complexidades. O futebol e aqueles que o praticam não passam imunes às dinâmicas sociais de cada país, algo que aumenta tensões quando, nesse país, não se gozam de liberdades que se encontram fora dele. As palavras de Sardar Azmoun ou Mehdi Taremi foram fortes, se pensarmos que no contexto do seu país, a liberdade de expressão está fortemente limitada. O gesto coletivo de não cantar o hino transportou o protesto para a beira do apito inicial do árbitro, sendo impossível de disfarçar o incómodo que causou nos governantes do país e o peso que exerceu sobre todos aqueles que tiveram a coragem de o demonstrar.
Mas todos os protestos têm um lado b. O anúncio de reuniões entre enviados do governo iraniano e os jogadores transformaram este Mundial num enorme desafio humano a estes corajosos homens. Os protestos, em campo, foram substituídos por uma enorme vontade de vencer, demonstrando a mesma coragem no jogo que demonstraram nas ações. Mas até os mais fortes soçobram. Com as suas famílias ameaçadas, com um contínuo de mensagens de ódio a chegarem até si, com sinais evidentes de que os adeptos, nas bancadas e nas ruas do Catar, eram vigiados e incomodados por agentes iranianos, a equipa do Irão saiu de cabeça erguida e com o seu valor reconhecido, mas não deixa de ter enormes desafios pela frente. Cada mulher que deu a cara na bancada, cada homem que ergueu a sua voz e todos estes jogadores merecem que continuemos atentos porque, é certo, para eles o Mundial não terminou com a eliminação em campo.
Os que gerem e os que giram
A França geriu a sua equipa na derradeira jornada para se apresentar refrescada na partida dos oitavos-de-final. No entanto, a derrota perante a Tunísia e a chamada das suas principais estrelas a campo, nos minutos finais, para tentar evitar o descalabro, mostrou que o facto de não se temerem as consequências não significa que não existam consequências. Didier Deschamps fez demasiadas adaptações e acabou por colocar em causa a gestão pensada, com jogadores como Mbappé claramente incomodados por serem chamados a um jogo onde não queriam estar. Quem também não quis jogar foi a Polónia que, a perder por dois a zero, apostou tudo na vantagem que detinha nos pontos disciplinares. Uma estranha forma de sobreviver, a valer-lhes presença no jogo de hoje contra os campeões em título.
A Inglaterra é uma equipa de enorme qualidade, mas também de grandes altos e baixos na forma de evidenciar as suas qualidades. A um grande jogo frente ao Irão, com goleada associada, sucedeu uma pálida exibição perante os Estados Unidos. A uma primeira parte frágil perante o País de Gales, uma segunda parte de festa e golos. Tudo para que agora entrem em campo frente a um Senegal que foi construindo, peça a peça, uma prestação muito sólida no Mundial. Mesmo sem Sadio Mané, a capacidade defensiva dos senegaleses coloca-os num patamar competitivo muito elevado, apresentando a equipa de Aliou Cissé suficientes alternativas para ir a jogo para ganhar. Eventualmente o primeiro jogo realmente competitivo destes oitavos-de-final, com a Inglaterra a ter que superar o seu habitual desconforto frente a adversários africanos e o Senegal a tentar repetir a memorável caminhada de 2002.
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