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A violência contra os trabalhadores é marca muito forte do campo brasileiro

Numa semana marcada por acções em defesa da Reforma Agrária, o MST destaca o forte simbolismo associado ao 17 de Abril, quando passam 23 anos sobre o massacre de Eldorado do Carajás.

Trabalhadores sem-terra em luta pela Reforma Agrária no Brasil
CréditosSebastião Salgado / mst.org.br

No âmbito do «Abril Vermelho» – Jornada Nacional de Lutas pela Reforma Agrária, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tem promovido, em conjunto com outras organizações, uma série de iniciativas desde o passado dia 10.

Ontem, véspera do 23.º aniversário do que ficou conhecido como Massacre de Eldorado do Carajás (em que agentes da Polícia Militar do estado do Pará mataram 21 trabalhadores do campo), trabalhadores rurais sem-terra realizaram actos em vários pontos do território brasileiro, «em defesa da Reforma Agrária, contra a Reforma da Previdência e todos os retrocessos protagonizados pelo actual governo», revela o Brasil de Fato.

Entre outras iniciativas, conta-se a ocupação do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) em Fortaleza (Ceará), no Recife (Pernambuco) e no Natal (Rio Grande do Norte), que, para além dos propósitos enunciados, visaram ainda homenagear as vítimas do crime cometido na «curva do S», em Eldorado dos Carajás, a 17 de Abril de 1996.

No mesmo contexto, em Porto Alegre (Rio Grande do Sul), cerca de 600 camponeses ligados ao MST levaram a cabo um protesto frente à 11.ª Superintendência Regional do Incra, para «denunciar a paralisia da política nacional de reforma agrária e reivindicar o assentamento às famílias acampadas».

Luta num contexto diferente, violência de há muito

Em declarações ao Brasil de Fato, Márcio Santos, da coordenação nacional do MST, disse que, todos os anos tem lugar, neste período, a Jornada Nacional de Lutas pela Reforma Agrária, como forma de relembrar o crime e de exigir políticas públicas para o campo brasileiro. No entanto, este ano o contexto é outro, pois é a primeira vez «após o período de redemocratização» que o MST promove uma jornada de lutas «num ambiente de crise democrática, de ameaça à democracia, de pressão», em que um Estado truculento «tenta retirar o direito legítimo de manifestação».

Sem tirar importância e simbolismo ao Massacre de Eldorado do Carajás, pelo que representa de violência contra os trabalhadores do campo, Santos sublinha que essa violência foi sempre um dos principais problemas a que os trabalhadores rurais tiveram de fazer frente no Brasil.

«Possivelmente, o 17 de Abril vai ficar, ao longo da história, como uma referência, quando o Estado sujou as mãos de sangue para defender os interesses de uma elite extremamente atrasada do campo brasileiro. Mas, para além do 17 de Abril, o campo brasileiro tem uma característica muito forte de violência, que vem desde o período da escravidão, das oligarquias agrárias que dão as cartas no Interior do Brasil», frisou.

Além de denunciar a paralisação das políticas de reforma agrária por parte do actual presidente brasileiro, Márcio Santos alerta ainda para as consequências dos constantes ataques de Bolsonaro contra o movimento social camponês, nomeadamente ao classificar o MST como «ilegítimo».

Ao fazer isso, Bolsonaro «abre precedentes para que grupos organizados e milícias rurais ataquem acampamentos, assentamentos, comunidades quilombolas, indígenas, promovendo a violência sistemática no campo brasileiro», denunciou.

De acordo com o Comissão Pastoral da Terra (CPT), em 2017 registaram-se no campo brasileiro 70 assassinatos, o número mais alto desde 2003. O estado com o maior número de vítimas foi o Pará, onde ocorreu o massacre de Eldorado do Carajás, revela o Brasil de Fato.

Juventude reunida no local do massacre

Desde o dia 10 de Abril, cerca de 300 jovens sem-terra estão reunidos num acampamento pedagógico na «curva do S», o local exacto onde se deu o Massacre de Eldorado dos Carajás. A iniciativa, que termina hoje, realiza-se pela 14.ª vez.

Aline Silva, porta-voz do MST, explicou ao Brasil de Fato que o acampamento, surgido em 2006 «em memória dos nossos mortos, trabalhadores que foram massacrados no dia 17 de Abril de 1996», constitui também «uma forma de resistência, para dizer que não nos calaremos diante da actual conjuntura, face a todas as formas de violência no campo» contra os trabalhadores rurais».

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