A evolução do investimento público nos últimos seis anos constituiu sem dúvida um dos grandes fracassos da gestão do actual governo.
Nunca o peso do investimento público no PIB foi tão baixo como neste período, apenas cerca de 2%, o valor mais baixo na União Europeia, e nunca a diferença entre aquilo que anualmente se orçamenta e se executa foi tão grande como nestes últimos anos.
Não apenas se prometeu investir pouco, com se acabou a investir muito pouco. Prova disso é a diferença entre o valor anualmente orçamentado para investimento público e o valor executado, que em contabilidade nacional foi, no período entre 2016 e 2020, de 3619 milhões de euros, cerca de 724 milhões de euros por ano.
«Não é difícil perceber que o investimento público constituiu, nos últimos anos, uma das principais variáveis de ajustamento deste e dos anteriores Governos para alcançarem as tão almejadas metas do défice e da dívida»
Quantos investimentos previstos, e que tanta falta nos fizeram em período de pandemia, em equipamentos sociais, nomeadamente nos sectores da saúde e da educação, em infra-estruturas e equipamentos de transportes e outros, foram sacrificados em nome desta política orçamental para quem apenas o défice orçamental e a dívida contam.
Não é difícil perceber que o investimento público constituiu, nos últimos anos, uma das principais variáveis de ajustamento deste e dos anteriores Governos para alcançarem as tão almejadas metas do défice e da dívida. No nosso país o investimento público orçamentado anualmente fica aquém das nossas necessidades, dever-se-ia investir cerca de 5% do PIB, os últimos dados conhecidos referem-se a 2020 e o investimento público foi, neste ano, de apenas 2,3% do PIB.
O OE2022, há poucos dias apresentado na Assembleia da República, parece querer romper com a prática prosseguida nos últimos anos e apostar numa forte subida do investimento público, desta vez cerca de 30% em relação à actual estimativa de execução no corrente ano, procurando beneficiar já de um forte recurso a dinheiros do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Prevê-se que o próximo Orçamentado de Estado beneficie já de cerca de 3 mil milhões de euros do PRR, verba que ainda subirá mais nos anos seguintes, aproximando-se dos 4 mil milhões de euros até 2025.
Mas será que aqueles que se mostraram incapazes de executar montantes bem inferiores de investimento público serão agora capazes de executar estes montantes bem mais elevados?
«a partir de 2012, toda a estrutura técnica de acompanhamento da execução do investimento na Administração Central foi desmantelada, com o desaparecimento do Departamento Central de Planeamento, o que manifestamente fragilizou as capacidades da Administração Pública de acompanhar a execução do investimento público»
Essa dúvida subsiste, tanto mais que, a partir de 2012, toda a estrutura técnica de acompanhamento da execução do investimento na Administração Central foi desmantelada, com o desaparecimento do Departamento Central de Planeamento, o que manifestamente fragilizou as capacidades da Administração Pública de acompanhar a execução do investimento público.
Os fundos financeiros provenientes do PRR têm, no entanto, a curto prazo, uma grande vantagem comparativamente com todos os outros fundos comunitários a que até agora o nosso país teve acesso, tratam-se de subvenções comunitárias e como tal os investimentos que dele beneficiarem não têm que ter uma comparticipação nacional, são a fundo perdido. Ora, assim sendo, será bem menor a tentação do Governo – e ao contrário daquela que tem sido a sua prática nos últimos anos – de travar estes investimentos com a preocupação do controlo do défice orçamental, já que não estão em causa poupanças resultantes de menor financiamento nacional ao investimento público.
Como sempre aconteceu nas nossas relações com a União Europeia, o benefício destas subvenções comunitárias arrasta consigo um muito maior controlo da despesa de investimento realizada pela entidade concedente, a UE, e com os seus objectivos políticos definidos para o PRR, a «resiliência», a «transição ambiental» e a «transição digital».
É a própria regulamentação do PRR que prevê que o desembolso das tranches de financiamento, fique, em cada momento, dependente de uma avaliação positiva quanto ao cumprimento dos objectivos definidos e dos progressos alcançados pelo Estado-membro em questão.
Estes fundos provenientes do PRR, sendo subvenções comunitárias, não deixam de ser subvenções condicionadas, desoneradas do esforço da comparticipação nacional.
Desta forma, não deixa de ser mais uma fatia da nossa soberania nacional que se hipoteca com as regras deste Programa de Recuperação e Resiliência (PRR), sendo que não deixaremos de lá mais para a frente ter de pagar aquilo que agora recebemos como subvenção.
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