|incêndios florestais

Serra da Estrela: demasiado pouco, demasiado tarde

Ao sétimo dia, o fogo não deu tréguas. O incêndio que deflagra na Serra da Estrela, que se estende por cinco concelhos e consumiu, pelo menos, 16 mil hectares, é sintoma de uma falta de investimento crónica.

Incêndio perto da aldeia de Sameiro, na encosta norte da Serra da Estrela, Covilhã, 9 de Agosto de 2022. 
CréditosMiguel Pereira da Silva / Agência Lusa

Às 12h de sexta-feira, o «incêndio mantém-se com uma frente activa com maior preocupação, na zona entre Videmonte e Linhares, entre o concelho da Guarda e o de Celorico da Beira», anunciou, em conferência de imprensa, Miguel Cruz, segundo comandante da Autoridade Nacional de Emergência e Protecção Civil (ANEPC).

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Incêndios: municípios são obrigados a pagar para cumprir as funções do Estado

Durante o período de contingência, decretado por causa da onda de calor, as autarquias vêem-se obrigadas a pagar serviços gratificados às forças de segurança para garantir a vigilância nos seus territórios.

CréditosMiguel A. Lopes / Agência Lusa

A denúncia parte da vereadora Carla Guerreiro, vice-presidente da Câmara Municipal de Setúbal (CMS), concelho que chegou a ser ameaçado pelo grande incêndio que deflagrou, há poucos dias, no concelho vizinho de Palmela.

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Greve dos guardas-florestais ajuda a perceber o que Costa tem tentado explicar

Os guardas-florestais vão estar em greve, esta sexta-feira, contra a falta de efectivos. Primeiro-ministro vem apontando «razões» para os incêndios, sem nunca falar da ausência de investimento público.

Rescaldo de incêndio florestal. Foto de arquivo (2017)
CréditosManuel de Almeida / Agência Lusa

O silêncio do Governo levou a Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais (FNSTFPS/CGTP-IN) a convocar uma greve dos guardas-florestais do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da Guarda Nacional Republicana (GNR). Além da paralisação, está também marcada para amanhã uma concentração, às 12h, em frente ao Ministério da Administração Interna, em Lisboa, com o objectivo de exigir ao Governo o arranque das medidas reivindicadas pelo sector. 

Em Maio, a estrutura sindical reuniu-se com o ministro da Administração Interna, que se comprometeu a realizar nova reunião no espaço de três semanas, mas o encontro nunca aconteceu. Perante a ausência de resposta às reivindicações, como a aprovação da tabela remuneratória específica para a carreira, a atribuição dos suplementos remuneratórios de função e de escala de serviço e a definição da autonomia funcional do corpo de guardas-florestais do SEPNA/GNR, foi marcada nova acção de luta, numa altura em que os incêndios florestais que devastam o País evidenciam décadas de desinvestimento no ordenamento e protecção da floresta, abandono do Interior e negligência da pequena agricultura

Razões há muitas

Desde o início da semana que o primeiro-ministro vem procurando passar a responsabilidade da prevenção (à semelhança do que se verificou na pandemia de covid-19) para os cidadãos, depois de anos a culpabilizar e perseguir os pequenos proprietários, tentando assim encontrar «razões» para o deflagrar dos incêndios, sem nunca assumir o que verdadeiramente tem faltado para os evitar. 

Depois de, no início da semana, ter afirmado que os incêndios «só ocorrem se uma mão humana, voluntariamente ou por distracção, os tiver provocado», António Costa assumiu esta quarta-feira que a causa estrutural dos incêndios é afinal a «floresta desordenada», evidenciando a questão do cadastro florestal, onde a actuação do Estado não tem sido exemplo. 

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Capoulas Santos e a inevitabilidade da seca

O homem que durante anos teve responsabilidades no Ministério da Agricultura fala sobre a seca como um problema a «relativizar», admitindo não haver «grande capacidade de inovação» nesta matéria. 

CréditosAntónio Pedro Santos / Agência Lusa

De forma intermitente, Capoulas Santos (PS) acumula responsabilidades na condução das políticas do Ministério da Agricultura desde a década de 90. Numa entrevista ao Jornal de Negócios e à Antena 1, publicada esta segunda-feira, o novamente eleito nas listas do PS pelo círculo de Évora fala da seca, mas diz que é um problema a «relativizar» por ser um «fenómeno com o qual os portugueses e os agricultores estão confrontados desde sempre». 

Ao mesmo tempo, defende que «não há medidas estruturais» que se possam adoptar para o armazenamento da água, a não ser construir barragens e usar de forma «mais eficiente e parcimoniosa» a água das mesmas.

Capoulas Santos dá o exemplo do Alqueva, no Alentejo. Uma infra-estrutura a que o PS ofereceu resistência e que, sendo essencial no quadro da gestão dos recursos hídricos, está desvirtuada, beneficiando sobretudo os grandes agrários e as suas culturas superintensivas. E foi certamente com este público na ideia que Capoulas Santos afirmou que «os agricultores estão preparados» para viver uma situação «que acontece com regularidade», admitindo ainda que os governos «têm sabido sempre responder com as medidas adequadas».

Como a realidade demonstra, a afirmação não faz eco. E não é preciso recuar muito para perceber que já podia haver medidas implementadas. Em Setembro de 2020, o PS, mas também o PSD e a IL, com a abstenção do BE e do PAN, rejeitaram um projecto de lei com vista a implementar um plano nacional de combate e prevenção aos efeitos da seca.

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Agricultura familiar sem voz na gestão de resíduos

Associação que representa pequenos e médios agricultores considera uma discriminação a sua ausência no órgão consultivo que acompanha a gestão de resíduos em Portugal.

Remoção de resíduos florestais
Créditos / O Instalador

A participação da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) na consulta pública do Plano Nacional de Gestão de Resíduos (PNGR 2030) foi aproveitada para repudiar a discriminação de que é alvo, ao ser excluída do Conselho Consultivo da Comissão de Acompanhamento da Gestão de Resíduos (CAGER), organismo público que acompanha acompanhamento e avaliação de políticas de gestão de resíduos, no âmbito da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).

Em comunicado emitido ontem, a CNA realça a importância que reveste a melhor gestão dos resíduos, incluindo os provenientes das actividades agrícolas, e mostra a sua disponibilidade para apontar soluções e ajudar a construir orientações estratégicas nacionais, em conjunto com as diversas entidades (do sector agrícola, do ambiente e outras).

A CNA afirma a sua vontade de contribuir para a melhor prevenção, produção e gestão de resíduos, em conjugação com a manutenção da actividade dos pequenos e médios agricultores e a protecção do ambiente, pelo desenvolvimento do País.

A associação que representa pequenos e médios agricultores lembra que, de acordo com os Dados do Recenseamento Agrícola 2019, a agricultura familiar representa mais de 90% das explorações agrícolas e cerca de 68% da mão-de-obra agrícola em Portugal, estando disseminada por todo o território, com particular incidência nas zonas rurais mais desfavorecidas.

Em portaria governamental publicada em 2016 (Portaria 306/2016, de 7 de Dezembro) o Governo definiu um Conselho Consultivo em que, além de diversos organismos públicos, participam a Associação para a Gestão de Resíduos (ESGRA), a Confederação Portuguesa das Associações de Defesa do Ambiente (CPADA), «cada uma das entidades gestoras de fluxos específicos de resíduos», «associações dos operadores de tratamento de resíduos» e «associações de produtores e distribuidores de produtos abrangidos por fluxos específicos de resíduos», mas onde primam pela ausência os representantes dos pequenos e médios agricultores.

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Entre as várias propostas avançadas então pelos comunistas previa-se a implementação de programas de reforço da capacidade de armazenamento de recursos hídricos, mas também de adaptação para as actividades agrícolas e agro-pecuárias, com medidas de apoio específicas para os produtores de raças autóctones, destinadas a salvaguardar a produção em situações de seca e carência hídrica.

Questionado sobre o facto de a agricultura e a pecuária estarem «praticamente ausentes» do programa do PS, Capoulas Santos responde com a preparação de um novo ciclo de fundos comunitários e com a conclusão da última reforma da Política Agrícola Comum (PAC) na vigência da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia. 

Reforma que, recorde-se, mereceu críticas por parte da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), desde logo por manter o incentivo ao agro-negócio e um sistema de mercado «muito desregulado», com a grande maioria dos agricultores portugueses a ter dificuldades para vender as suas produções a preços justos.  

O entrevistado regozijou-se ainda com a criação do Estatuto da Agricultura Familiar, uma reivindicação da CNA desde há várias décadas, como o próprio reconhece, mas omitindo que está por cumprir

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Um ponto que tem escapado à retórica do primeiro-ministro, e que motiva também a paralisação de amanhã, é a falta de guardas-florestais do SEPNA/GNR. Em Maio de 2021, o então ministro da Administração Interna assumiu que Portugal deveria ter mais de 500 guardas-florestais da GNR em 2022, o que não se verificou. Segundo dados do Governo, a GNR conta actualmente com cerca de 400 efectivos, que têm a missão de fiscalizar e investigar «ilícitos nos domínios florestal, caça e pesca». 

A Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Funções Públicas e Sociais lembra, a este propósito, que em 2006, com a pasta da Administração Interna tutelada por António Costa, o Corpo Nacional da Guarda Florestal foi extinto e os guardas-florestais transferidos «arbitrariamente» para o SEPNA/GNR, assumindo várias competências. Desde então, denuncia a Federação, estes trabalhadores continuam a aguardar um estatuto profissional equivalente aos de outros profissionais. 

Após os incêndios de 2017, o Governo ficou com a incumbência de, na lei de defesa da floresta contra incêndios, reconstituir o Corpo de Escutas Florestais, o que ainda não aconteceu. 

Não obstante as condições climatéricas, cinco anos após os trágicos incêndios de Pedrógão Grande, que devoraram vidas humanas e mais de 80% do Pinhal de Leiria, o País continua a padecer do desinvestimento em política florestal e da exiguidade do financiamento dos bombeiros e da Protecção Civil. 

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Ao impor a proibição de circulação em zonas florestais (medida indispensável no combate aos incêndios), o Governo não se devia, considera a vice-presidente do concelho sadino, esquivar a «garantir dos necessários meios para fiscalizar essa proibição». Isto «sem colocar as câmaras municipais perante a obrigação de pagamento de serviços gratificados» para cumprir uma responsabilidade que deve caber ao Estado central.

Sobre este assunto, e perante as informações que pôde recolher, a CMS realizou, com carácter de urgência, uma reunião do Conselho Municipal de Segurança para discutir esta situação, solicitando, em simultâneo, «uma reunião ao ministro da Administração Interna para procurar soluções para a escassez de recursos humanos das forças da autoridade no concelho».

A autarquia transmitiu, aos representantes da GNR, PSP e Capitania do Porto de Setúbal, a sua preocupação com a escassez de recursos humanos nas forças da autoridade. Esta lacuna resulta na necessidade de pagar por serviços gratificados (para cumprir o despacho do Governo em que se declara a situação de contingência), que já deviam ser assegurados pelo Estado.

Esta «é, inequivocamente, uma função central do Estado e que, no caso do período de contingência, resulta de uma obrigação imposta pelo Governo», defende a autarquia.

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Em Gouveia, a frente já se encontra dominada, progredindo apenas no distrito da Guarda.

No terreno, a enfrentar o incêndio que lavra desde a madrugada de dia 6 de Agosto, estão 1 571 operacionais de todo o país, apoiados por 457 veículos e 15 meios aéreos. Os dados mais recentes do Sistema Europeu de Informação de Fogos Florestais (EFFIS), apontam para a destruição de mais de 16 mil hectares.

Com 70 mil hectares de área ardida desde o início do ano, o secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros anunciou ontem, quinta-feira, a autorização da aquisição de mais 81 viaturas de combate a incêndios, a poucas mais de um mês do fim do verão.

O mediatismo da contratação do Sérgio Figueiredo brilha mais do que as chamas

Chega, PSD, Iniciativa Liberal, BE. Naquele que é um dos incêndios mais graves deste ano, que terá já destruído uma área muito substancial do parque natural, património da UNESCO, a maior parte dos partidos escolheram focar-se no faits-divers mediático do momento: a contratação de Sérgio Figueiredo, por parte do ministério de Fernando Medina. 

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A Política Agrícola Comum e os incêndios

Apesar das tímidas reprimendas da Comissão Europeia e de algumas medidas de cosmética por parte do Governo, tudo indica que alguma coisa irá mudar para que tudo fique na mesma.

A Política Agrícola Comum (PAC) continua a concentrar a maioria dos apoios dados à floresta. Por outro lado, todos reconhecem que a crise na pequena agricultura e a desertificação do mundo rural propicia a ocorrência de incêndio, conforme tem demonstrado a realidade. O Plano Estratégico para a PAC (PEPAC) estabelece as regras com as quais o Governo português pretende aplicar os fundos agrícolas de 2023 até 2027. A PAC representa um terço do orçamento da União Europeia e uma verdadeira «bazuca agrícola» que tem sido negociada à socapa entre o governo PS e os grandes interesses que parasitam o sistema desde que entrámos na União Europeia. Um primeiro esboço do PEPAC foi entregue à Comissão Europeia em dezembro do ano passado. Apesar das tímidas reprimendas da Comissão Europeia, que já enviou um conjunto de críticas ao PEPAC, e de algumas medidas de cosmética por parte do Governo, tudo indica que alguma coisa irá mudar para que tudo fique na mesma. Vamos continuar a ter uma PAC que dá mais a quem mais tem, deixando uma migalhas para a esmagadora maioria dos agricultores e, sobretudo, deixando uma ampla parte do nosso território abandonado à sua sorte.

Os mapas que apresentamos ilustram este regabofe no qual as ajudas, em vez de serem canalizadas para quem precisa, são concentradas na grande produção intensiva e no agronegócio. Acompanhamos as piedosas declarações da Comissão Europeia com a falta de respostas do PEPAC relativamente à floresta. No entanto, é necessário explicar que a valorização da floresta e a prevenção dos incêndios implica a revitalização dos territórios, apoiando os sistemas agrícolas que lá resistem apesar de estarem, na sua maioria, abandonados à sua sorte. O mapa da direita fala por si quanto à concentração dos apoios nas regiões do Alentejo, Ribatejo e Trás-os-Montes. Os outros dois mostram a localização dos territórios vulneráveis e a incidência dos incêndios entre 2010 e 2019. O contraste não poderia ser mais evidente. Os territórios vulneráveis são aqueles onde há uma maior prevalência de incêndios e onde são distribuídos menos apoios!

«Vamos continuar a ter uma PAC que dá mais a quem mais tem, deixando uma migalhas para a esmagadora maioria dos agricultores e, sobretudo, deixando uma ampla parte do nosso território abandonado à sua sorte.»

Tal como o PCP tem defendido, não são pequenos remendos que irão mudar a natureza de classe desta PAC. O que Portugal necessita é de colocar os seus recursos ao serviço do desenvolvimento do País e da sua soberania alimentar. É necessária uma verdadeira política de esquerda para a agricultura portuguesa que apoie a pequena e média agricultura, onde 40% dos produtores não recebem qualquer apoio (dados do último Recenseamento Agrícola do INE). É necessário recuperar os serviços de extensão do Ministério da Agricultura que foram definhando sob o jugo das políticas de austeridade. Este será ao mesmo tempo um passo decisivo para a coesão territorial e para a defesa e valorização da nossa floresta, onde predomina, à semelhança do restante espaço rural, o minifúndio. Em suma, é necessária uma política patriótica e de esquerda para a nossa agricultura!

O autor escreve ao abrigo do Acordo Ortográfico de 1990 (AO90)

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Em contra-ciclo, as direcções regionais do PCP de Castelo Branco e da Guarda divulgaram um comunicado em que sublinham a evidente falta de resposta, do Governo PS, às questões estruturais para a prevenção de incêndios: o «abandono do mundo rural, a degradação dos serviços públicos, a destruição da pequena e média agricultura e pecuária, que resultam na desertificação e no despovoamento».

«Este incêndio em particular, que lavra num Parque Natural, onde o Estado tem responsabilidades directas, traz à evidência não apenas a falácia da responsabilização individual em que o Governo assentou toda a sua retórica este verão, mas também a falta de investimento na área da conservação da natureza».

Desde 2017, sucessivos anúncios caíram em saco roto: o «cadastro florestal, a criação das equipas de sapadores florestais, a reconstituição do corpo de guardas florestais e medidas imprescindíveis no sentido de valorização do preço da madeira, o que impede a gestão activa da floresta, a promoção do livre associativismo dos pequenos proprietários e o impulso adequado aos agrupamentos de baldios e aos projectos promovidos por baldios», lamentas a estruturas do PCP.

Perante a dimensão dos prejuízos e dos impactos no território, o PCP informa, no comunicad, que as suas organizações e militantes «estão no terreno em contacto com as populações e vão realizar uma ronda pelos concelhos afectados com a deputada ao Parlamento Europeu, Sandra Pereira», no dia 16 de Agosto.

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